A catedral é figura da Cidade de Deus, da Jerusalém Celeste, imagem do Paraíso, como afirma a liturgia da sagração das igrejas.
As paredes laterais são símbolos do antigo e do novo testamento. Os pilares e as colunas são os Profetas e os Apóstolos que sustentam a abóbada, representação de Cristo, a sua chave. As janelas translúcidas que nos separam da tempestade e derramam sobre nós a claridade, são os Doutores da Igreja. O portal é a entrada do Paraíso embelezada pelas imagens em pedra, pelos baixos relevos pintados e dourados e pelos suntuosos batentes de bronze.
A casa de Deus deve ser iluminada pelos raios do sol resplandecente da caridade como o próprio Paraíso, porque Deus é a luz, e a luz dá beleza às coisas. Assim também se deve aumentar a iluminação interior da catedral, abrindo janelas tão amplas quanto o permitam os vértices das grandes arcadas e as próprias abóbadas.
Belo, semeado de poesia, esse texto de um ótimo medievalista francês nos faz degustar, de modo intenso, a noção de símbolo.
Trata-se de considerar as magníficas catedrais góticas, não apenas como um recinto fechado onde se presta culto a Deus sem riscos de se expor às intempéries, mas, muito além desta finalidade prática e indispensável, como uma grandiosa imagem do Paraíso celestial. Algo que nos lembra a bem-aventurança eterna e dela nos oferece consoladora prelibação. Desse modo, as catedrais são verdadeiras obras-primas de simbolismo, cada um de seus ricos aspectos encerrando significados e conceitos que nos remetem para as realidades do Céu.
Então, o templo majestoso e imenso é a figura do lugar onde Deus vive, cercado das almas dos justos. É a cidade do Altíssimo, a Jerusalém Celeste, como no Antigo Testamento a Jerusalém terrena foi a urbe santa, ela mesma representação da futura Igreja Católica, da Civilização Cristã, da sociedade temporal organizada de acordo com os princípios do Reino de Nosso Senhor Jesus Cristo. De tudo isto a catedral é um extraordinário símbolo.
E os detalhes de sua construção acrescentam belezas e expressões diversas nessa simbologia. Por exemplo, a linda ideia de se ver as paredes laterais como evocações do Velho e do Novo Testamento, ou de admirar aquelas esguias e sólidas colunas como se fossem os severos Profetas da Antiga Lei e os compassivos Apóstolos da era cristã. Mais ainda. Contemplar a vastidão da elevada abóbada e pensar que lá está a chave da Igreja, Nosso Senhor Jesus Cristo, sobre o qual tudo repousa e em honra de quem tudo foi edificado!
O pórtico imponente recorda a entrada do Céu. São portas de bronze, de carvalho, entalhadas e lavradas com requintes de perfeição e candura, emolduradas por centenas de imagens de santos e figuras históricas dispostas em esplendorosa ordenação. Ao transpô-las, devemos nos lembrar de que um dia — pela infalível intercessão de Nossa Senhora — as portas da catedral celeste se abrirão para nós e penetraremos na glória de Deus, unindo-nos aos Anjos e aos bem-aventurados que ali nos precederam.
A nota de poesia é dada pela claridade que inunda o interior do templo através das amplas janelas translúcidas, pelas refulgências policromadas dos vitrais tocados de sol. São os Doutores da Igreja esplendendo sua sabedoria, são os raios da caridade com os quais se ilumina o próprio Paraíso.
Como Deus é a luz, convém que a catedral tenha luz, e a tenha no pleno jorro da fulguração do sol, e na aconchegante, espetacular matização dos vidros coloridos.
Toda a arquitetura do gótico se desenrolou à procura das janelas cada vez maiores, sem prejuízo da estabilidade do edifício, até chegar a uma Sainte-Chapelle de Paris, verdadeiro escrínio cujas paredes são vitrais… É uma caixa de cristal onde todas as cores de luz brincam e folgam, constituindo desenhos maravilhosos que nos lembram a luz eterna do Paraíso.
Assim, ao entrarmos numa catedral, levemos conosco esse pensamento: “Graças à misericórdia infinita de Deus e à insondável bondade de Maria, passarei um dia pelas portas do Céu; verei os Profetas, os Apóstolos e os Doutores, como vejo aqui estas colunas. Sobretudo, serei inundado pela luz divina, como agora me envolve essa luminosidade que, de todas as partes, invade o recinto sagrado”. E então a nossa presença na igreja aumentará em nós a alegria e a esperança dos grandes triunfos do Céu.
Quanto mais nos sentirmos opressos, perseguidos nesta Terra, tanto mais devemos nutrir essa nossa apetência pelo Paraíso, onde as misérias presentes se extinguem por completo, dando lugar apenas à perfeita e eterna felicidade, sem que nada a possa perturbar. Pois ali não teremos somente todas as alegrias possíveis, mas o fundamento de todos os gáudios — Deus Nosso Senhor e o olhar indizivelmente afável de sua Mãe Santíssima.
Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 80 (Novembro de 2004)