As primeiras impressões sobre a Idade Média que tocaram minha alma — as quais encontrariam mais tarde na palavra “Cristandade” a sua expressão adequada — vieram através de livros para crianças folheados por mim, um ou outro cartão postal que me caía sob os olhos, assim como fotografias e gravuras retratando paisagens e monumentos da antiga Europa, e que produziam no meu espírito verdadeiros frêmitos de entusiasmo na consideração das coisas medievais.
Encantavam-me as catedrais góticas, as ruínas de castelos ou as velhas construções conservadas intactas, admirava o mundo da heráldica que começou a luzir à minha vista como um conjunto de vitrais sem vidro, escudos medievais parecendo rosáceas impressas num papel resplandecente, tudo me falando da mesma época em que floresceu a música sacra, uma época em que a fé católica espargia grande influência sobre a mentalidade e a sensibilidade humanas, dando origem a uma ordem temporal de esplendor incomparável.
Ogivas, torres, campanários, vitrais, armaduras… Detenho-me na contemplação destas últimas.
Poucas vezes o homem se tem revestido, no sentido material da palavra, de tal manifestação de força como quando se cobre de ferro, com pequenas aberturas no elmo que o permitam ver e respirar. De resto, está todo envolto pelo ferro, manifestando um misto de prudência e de coragem que traduz o equilíbrio da sabedoria cristã. Coragem e prudência que indicam, ao mesmo tempo, um amor à vida, uma consciência plena do inestimável preço da existência humana para protegê-la de tal maneira, e uma inteira disposição para sacrificá-la, se preciso for, a serviço de Deus e da Igreja.
O homem se veste inteiro de metal, para se defender e para se lançar no centro do perigo, revelando a magnífica estatura do combatente que soube compreender e amar verdades eternas, preceitos morais, tesouros de fé cristã pelos quais vale a pena não só lutar, mas morrer. É praticar essa mesma fé cristã até as suas últimas e gloriosas conseqüências.
Assim, toda a sua personalidade se acha tão imbuída do espírito católico que ele se apresenta revestido de ferro, afirmando a serena convicção de seu direito e da santidade de sua causa. Na véspera de partir para uma batalha em que lutará pelos interesses da Igreja, ele se entregou à vigília das armas: rezou, implorou o socorro do Céu, pesou e mediu os sacrifícios, as dores e, quiçá, o holocausto supremo que se aproximavam. E ele a tudo aceitou de antemão. Os penachos de seu elmo deixaram de ser meros enfeites, e sua armadura uma simples afirmação de riqueza ou categoria.
Simbolizam, agora, a intrepidez de uma alma heroica. São reflexos da sabedoria cristã. Representam a força a serviço da sublimidade.
Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 102 (Setembro de 2006)