Acredito que ao longo de sua existência neste mundo, tem o homem incontáveis oportunidades de perceber a presença mais adorável, perfeita e sublime que imaginar se possa — a de Nosso Senhor Jesus Cristo, manifestada pelas ações da graça em nossa alma, quando meditamos em sua infinita grandeza, ou quando nos sentimos tocados por essa ou aquela representação artística de seu sagrado semblante.
Nesse sentido, sempre me comprouve de modo particular uma imagem de Nosso Senhor que se encontra no lado externo da famosa e linda catedral francesa de Amiens. Essa escultura O retrata numa tão majestosa e bondosa beleza, que ela passou a ser chamada de “Le Beau Dieu d’Amiens”: o belo Deus da cidade de Amiens.
Imaginemos quais sentimentos povoariam nosso coração se, enquanto passeássemos por um campo, de repente víssemos andando em sentido contrário o “Beau Dieu d’Amiens”!
Poderíamos então contemplá-Lo na nobreza do seu porte, no ereto de seu corpo, na harmonia de seus traços, na delicadeza de sua atitude, no que Ele possui de régio — pois a imagem na catedral é a de um Rei em toda a sua magnitude — e de hierático. Trata-se de uma figura que, a bem dizer, participa da heráldica, de tal maneira transparece nela o caráter sacral, as mãos em atitude de quem abençoa e ensina, estreitando ao peito o livro do Santo Evangelho.
Admiraríamos a luminosa cor de sua túnica, de seu manto, a formosura de sua face, emoldurada pelos cabelos e a barba igualmente formosos.
Caminhamos mais alguns passos, e Ele está à nossa frente. Antes mesmo de nos darmos conta, caímos genuflexos, tanto nos envolveria a noção da superioridade, da perfeição e da bondade infinitas de Jesus! Essa ideia nos faz dobrar os joelhos e nos aconchegarmos a Ele, como se Lhe disséssemos: “Contra todas as tempestades sois Vós, Senhor, o meu amparo. Protegei-me!”
Podemos crer que Nosso Senhor abandonaria a atitude hierática que a imagem de Amiens nos apresenta, e sorriria para nós. Essa nobreza divina, posta em sorriso, em quantas delicadezas se desfaz? Em quanta amenidade transluz? Em quanta clemência? E Ele nos pergunta: “Filho, o que queres?”
Os olhos profundos de Jesus — os quais imaginamos castanhos claros — penetram nos nossos, e nós, pelo olhar d’Ele, percebemos que o Mestre nos conhece melhor do que nós mesmos, nos ama de um amor acima de qualquer predileção humana, e sabe de todas as nossas necessidades, para todas é Ele próprio o remédio.
Jesus nos indaga, pois, sobre o nosso desejo. E teríamos vontade de Lhe responder:
— Senhor, quero tanta coisa, que nem sei dizer! Porém, Vós sabeis tudo quanto anelo. Mais: sabeis de tudo quanto preciso. Pois em meio a tantas volições minhas, quantas vezes estão ausentes as coisas de que realmente necessito, e quantas se atêm a coisas que me são supérfluas! Mas, Vós, Sabedoria eterna e encarnada, conheceis tudo que verdadeiramente me importa. Senhor, tende pena de mim!”
Um desejo mais elevado nasce em nossa alma, o de estar sempre com Ele; que o “Beau Dieu” nunca nos abandone. E quando começamos a balbuciar uma súplica nesse sentido, um fenômeno curioso, maravilhoso se opera: Jesus desaparece aos nossos olhos, e temos a impressão viva de que Ele está em nós! Misteriosamente, Ele habita em nosso interior, como se morasse numa casa, e ali, dentro de nossa alma, reza ao Padre Eterno por nós, cumula-nos de graças, favores, dons que nem sabemos descrever.
Tomados por sentimentos indizíveis, a Ele nos dirigimos:
“Senhor, eu estava certo de que me daríeis algo superior a todos os meus desejos. Concedeste-me a presença eucarística. Dentro de mim, realizais maravilhas e produzis benefícios dos quais só terei completa noção no Céu, quando, pelas mãos misericordiosas de vossa Mãe Santíssima, para lá me levardes e eu vos contemplar face a face. Senhor, para Vós, a minha gratidão inteira!”
Eis como poderíamos conceber um encontro com o “Beau Dieu d’Amiens”, em algum recanto daqueles agradáveis campos franceses…