O mistério da vida…

Quem nunca terá pensando no que consiste a vida? Analisá-la em seus mais variados graus pode deixar qualquer um estarrecido diante dos mistérios que ela contém. Diante de tão interessante tema, Dr. Plinio discorre magnificamente à maneira de um navegador que perscruta os mares desconhecidos.

 

O tema a respeito do qual me pediram que tratasse é de tal vastidão, imensidade e complexidade, que se fizéssemos um simpósio de um ano não teríamos senão aflorado o assunto.

Considerações sobre heráldica

Imaginemos, por exemplo, um leão heráldico. O leão é, sem dúvida, um espécime magnífico do que a vida pode produzir. Como a figura desse animal, pintada sobre uma superfície, é pouco em comparação com um leão de verdade! Entretanto, ela tem, sob certo ponto de vista, uma beleza maior do que o próprio leão vivo, pois apresentando suas formas de modo mais característico, pode ele ser mais bem compreendido. E, para se entender bem uma série de leões vivos, nada melhor do que ter visto um leão bem pintado.

Representar bem um leão, procurando, não propriamente imitá-lo, estilizá-lo, mas sublimá-lo, é o que faz a heráldica. Através desta, tudo é idealizado de um modo esquematizado, captando ao mesmo tempo a anatomia e a fisiologia; mais ainda, aquilo que se poderia chamar a vitalidade e a “mentalidade” do animal. E, se olharmos para cem leões vivos, teremos aprendido menos do que vendo um leão heráldico.

Leão heráldico, tintura-mãe da “leonicidade”

O que de misterioso tem a vida do leão, por onde ele parece melhor, em alguns aspectos, quando não está vivo, mas esquematizado? É que ele foi visto, considerado, por um ser com um tipo de vida mais alto, que é o homem. E o leão, depois de ter formado uma imagem na mente humana, ter criado no espírito humano uma impressão tão forte, propiciou ao homem talentoso, após uma análise, a vontade e os meios de exprimi-lo.  E isto pintado pelo homem tem, sob certo ponto de vista, mais vida do que propriamente quando vivo no leão.

Por quê? Porque a imagem do leão desprendeu-se deste e entrou na mente do homem, passando assim para um circuito e um grau de vida superior. O leão corre, salta, ruge, mas não entende a si próprio porque ele não entende nada. Mas alguém que entende e tem, portanto, um grau de vida incomparavelmente mais elevado, olhou para o leão e tirou de dentro dele algo mais alto do que o próprio leão e pintou este algo. Assim, o que há de precioso na vida do leão, mas meio escondido, disfarçado, a vida da alma conseguiu apresentar melhor à nossa atenção.

De maneira que o pensamento de quem concebeu o leão heráldico, hirto, “figé”(1), faz com que este seja como que o leão dos leões, uma tintura-mãe da “leonicidade”. O conceito de leão deixou de ser um leão concreto e passou a ser um leão de quintessência.

Talento de um pintor ao representar uma fisionomia

Outro dia, ao folhear um álbum e deparar-me com uma pintura representando uma mulher, eu pensava o seguinte: “O imponderável de um talento! A fisionomia desta mulher é de uma velha, mas neste rosto o artista pintou uma pele de moça”. Aquilo produzia uma sensação de contradição, que causava mal-estar.

Entretanto o mais curioso é que a pele, sendo ao mesmo tempo de moça, tinha qualquer coisa de ensebado, de uma pessoa que se lava pouco. E de uma forma de ensebamento que dá um brilho falso e ruim à pele. Não era o brilho da limpeza, mas um lustre de sujeira que foi aplicado naquela pele de moça.

Que talento tem aquele pintor para saber exprimir, por meio de tintas sucessivas sobre uma superfície lisa, até a sensação da ligeira pátina de sujeira que pode tornar repugnante a pele mais brilhante! O que há na pele de uma pessoa que parece agradável de ver, e o que nela existe por onde engendra algo que lhe é mortal e, se ela deixa durar, a torna repugnante? Que quintessência de talento precisa ter um homem para saber ver isto e passar, por cima de uma pele que ele pintou, não sei que lustrina ou verniz imitando exatamente a sujeira! Que tesouros de observação tem ele sobre a vida! O que existe na vida humana, por onde ela algumas vezes frutifica a plenitude de si mesma, e outras vezes produz sua própria deterioração e degenerescência? Fonte, ao mesmo tempo, do que há de mais admirável e mais repugnante? De uma pedra não sai nada de repugnante, também não emerge nada de admirável.

 Alguém poderia dizer:

— O brilho!

Eu digo:

— O brilho é uma coisa admirável, mas é algo que, posto na pedra, ela devolve. A pedra é inerte, não tem vida. O homem, entretanto, para elogiar um olhar, diz: “Esse olhar é brilhante”. Mas o olhar vivo é tanto mais, que ele nunca elogiará um brilhante dizendo: “Parece o olhar”.

Um dos brilhantes mais conhecidos e bonitos, o “Koh-I-Noor”, está na coroa da Rainha da Inglaterra. Pode-se fazer daquele brilhante qualquer elogio, afirmar que ele lembra uma inteligência rútila etc. O olhar humano tem tal vida que se pode dizer a uma pessoa: “Seus olhos são como o “Koh-I-Noor”. Mas não se pode afirmar a este último: “Tu és como um olho!”

Metáfora da floresta

Quais as reciprocidades, qual o jogo das analogias, o que é, no fundo, esse mistério da vida que se oculta e se mostra de um modo fugaz em todos esses exemplos que apresentei, de maneira a termos, ao mesmo tempo, a impressão de apanhar coisas finas e definidas, mas, quando se vai apalpar, vê-se que algo foge, é indefinido e resiste a qualquer definição?

Com efeito, a palavra “vida” não se define, e também o vocábulo “morte”; sendo a morte a cessação de algo que não é definido, ela mesma não pode ser definida. Porque o termo “não”, posto diante do indefinido, não define o indefinido.

Isso não nos impede de ter certa noção de vida e de vitalidade. Que uso fazer dessas noções, tendo em vista as finalidades para as quais estamos reunidos aqui? O que é a vida natural da alma? O que é vida sobrenatural? O que é a vida de Deus? O que é vida?

Aí nós esbarramos com um mistério; podemos apalpá-lo, como faz um cego, mas sem o ver, e é para apalpações que vos convido nesta reunião. Apalpações que faremos tanto quanto possamos, não procurando abarcar o tema inteiro.

Realizaremos algumas incursões no assunto, à maneira de um viajante que penetra numa floresta grande demais; ele sabe que jamais poderá percorrê-la inteira, mas, para ter algumas ideias a respeito da floresta, nela faz algumas incursões. Depois disso, ele não sai com um mapa da floresta, mas leva na alma exemplos do que há dentro dela, algumas noções sobre a vida da floresta. Percebendo que a floresta era variável quase ao infinito, ele compreendeu que as incursões o ajudariam a ter uma ideia dela, a qual é mais rica do que se apenas a contemplasse de fora para dentro.

A vida é uma floresta; alguns estão no meio da picada, outros perto do fim, e outros no começo, mas a picada é a mesma. Convém fazer nela, de um lado ou de outro, incursões, apalpar pontos, a fim de extrair ideias e depois fazermos algumas considerações. Mais do que isso não nos permite o tempo, ainda mais numa reunião como esta. Vou tomar a vida de baixo para cima, desde o que ela tem de mais elementar e mais simples, até chegarmos ao mais complexo.

Modo de agir dos antigos navegantes portugueses

Empregaremos a marcha de “proche en proche”. O espírito humano funciona exatamente à maneira dos antigos navegantes portugueses, que chegaram até a Índia. Eles desciam um trecho ao longo do litoral africano, depois voltavam para Sagres e desenhavam o mapa. Descansavam e desciam mais um tanto. Regressavam e anotavam o que tinham visto, em conexão com o anteriormente feito. E assim, navegando de ponto em ponto, chegaram até a dobrar o Cabo da Boa Esperança.

Lá, eles estavam tão longe que o caminho da certeza já não lhes era possível. Em vez de voltar para Sagres, resolveram seguir em frente. No Cabo, segundo Camões, apareceu o gigante Adamastor para intimidar o gênio lusitano. Nossos ancestrais portugueses vararam o espectro do Adamastor e entraram pelo Oceano Índico. Então, mais valia a pena continuar, e assim chegaram à Índia; e mais tarde até a China e o Japão.

Há certo ponto atingido pelo espírito humano, do qual ele não volta atrás para formar certezas, mas embarca nas hipóteses. Ou ele, pela experiência, encontra a certeza na ponta da hipótese, ou não sossega, não se sente satisfeito. Vamos então viajar um pouco e lançar algumas hipóteses; assim teremos obedecido à segurança e à ousadia do gênio luso, do qual tantos de nós procedemos.

A pedra, a grama, o homem

Consideremos a coisa mais simples, comum, que a ordem natural pode oferecer aos nossos olhos. Imaginemos que um indivíduo, andando pelo campo, encontre uma pedrazinha sobre uma graminha. Quantas pedrinhas e graminhas haverá pelo mundo?  Só a sabedoria divina conhece.

Sendo reflexivo, ele se detém e vê que a pedrinha está colocada ligeiramente em cima da grama, a qual cresceu inicialmente sob a pedra, fez algumas voltas e continuou a se desenvolver.

O indivíduo tem uma impressão de superioridade e, ao mesmo tempo, de inferioridade da pedra. Esta pesa sobre a planta de tal maneira que a tornou torta; a pedra é, portanto, mais forte do que a planta.

Entretanto, a planta tem algo dentro de si por onde ela não se conforma com a pedra; apesar de ser mais fraca, ela empurra a pedra como que com o cotovelo. Ela se adapta à forma da pedra e encontra o caminho do sol. A grama tem uma superioridade de outro gênero, que só uma palavra, de quatro letras, pode explicar bem: “v”, “i”, “d”, “a”. Ela tem vida, e por isso resiste, encontra um caminho, se esgueira, fura e brilha à luz do Sol, embora a pedra queira atrapalhá-la.

E a pedra, que foi colocada ali, fica estupidamente naquele local, se ninguém a retirar, enquanto o mundo for mundo. Se for uma pedra enorme, ela pode comprimir tudo quanto é vivo. Mas se quem tem vida não se deixar comprimir por ela, o ser vivo é tão superior à pedra que faz dela o que entende.  Assim, se compreende o que é a matéria não-viva, e se tem um sinal do que é a vida.

O Pão de Açúcar, por exemplo, tão colossal. Quantos milhares de homens ele esmagaria; entretanto, chegou um dia em que o homem conseguiu esticar um fio até seu topo e fazer passar uma carreta, dominando o Pão de Açúcar, servindo-se dele para um passeio. E o Pão de Açúcar não pôde nem mover-se.

Embora enorme e majestoso, ele não sentiu sequer o que lhe acontecia. E essa formiga chamada homem construiu um torreão em cima dele, amarrou-o com um fio de linha e se diverte com ele.

O que é então a vida?

Heliotropismo

No que diz respeito ao vegetal, a vida se apresenta — estou indicando sintomas externos — como uma possibilidade de tirar de si mesmo uma mudança de sua situação. A planta cresce, se desenvolve, fenece. Ela existe dentro do tempo, está sujeita a mil condições, a mil infortúnios, mas de si tem uma coisa que o mineral absolutamente não possui: uma energia pela qual, por um princípio que lhe é próprio, crava raízes na terra e seleciona o que lhe convém. Ela se expande na direção dos minerais que lhe são úteis.

O melhor dos mineralogistas não conhece tão bem os minerais como uma planta, incapaz de conhecer-se a si própria ou qualquer outra coisa. E o trabalho dela, por debaixo da terra, é de antenas delicadas, por onde ela faz esta coisa admirável que o ser inerte não é capaz de realizar: encontrar, sugar e transformar em si mesma algo que não é ela.

Quer dizer, ela faz um encontro e um trabalho de assimilação, de apropriação, que é o crescimento dela. E, da noite de suas raízes, ela tira a parte dela que brilha e frutifica.

O mais extraordinário é que ela não conhece nada; a planta não tem nem sequer sensibilidade. E sem ter sensibilidade ela, entretanto, porque tem isto chamado vida, possui determinada ordenação por onde pega o que lhe convém e se desenvolve.

O heliotropismo é a procura que a planta faz do sol. Algumas até giram, fazem torções para encontrar o astro rei, como o girassol. Se alguém quisesse caricaturar o Sol, imaginaria o girassol, que é a figura do bajulador procurando imitar o bajulado, voltando-se para este, mas sem conseguir imitá-lo em nada; sol vulgar, rasteiro, amarelo, quando o outro é dourado. O girassol tem uma bordadura que imita o dourado e um cebolão marrom, no seu interior. O marrom é o estado plebeu do ouro e o estado mortal do amarelo. 

O que é propriamente o heliotropismo? Os cientistas já o estudaram. Eles conseguem tornar tantas coisas sem graça; entretanto, aprofundando-se o que dizem, pode-se verificar a existência de alguma graça no assunto. O Sol traz consigo certas transformações do ar e determinados graus de calor necessários para que a planta, a qual, movida pela vida, procura — notem bem — a sua própria conservação e seu próprio desenvolvimento. Trata-se, portanto, de uma forma de energia nascida de dentro do próprio vegetal, que procura sua conservação e depois a plenitude — o que não se conserva não alcança a plenitude; mas às vezes o que não alcança a plenitude, se conserva. Isto que está na planta, e dessa forma se desenvolve, o que é?

A graminha e o “Koh-I-Noor”

É um mistério. Mas um mistério ordenadíssimo, que torna o vegetal muito superior ao mineral e faz da graminha — mesmo a mais insignificante, que não é alimento para o nobre cavalo, nem tapete para um leão, mas comida de formiga — algo intrinsecamente mais nobre do que o “Koh-I-Noor”.  Este não reage, não opera, não cresce, não tende para perfeição nenhuma, é parado; dentro dele não habita nenhuma energia vital. A planta, porque é capaz dessas coisas, vale mais que o “Koh-I-Noor”. Isso de tal maneira é verdade que se imaginássemos dois artistas, um fizesse o “Koh-I-Noor” e o outro elaborasse um vegetal, diríamos que muito maior é aquele que soube fazer uma planta. Em outros termos, a grandeza de Deus se reflete muito mais numa plantinha feita para alimentar formiga do que no “Koh-I-Noor”.

O “Koh-I-Noor” vai para a coroa da Rainha da Inglaterra. A graminha… Se um lacaio relaxado deixar que uma graminha fique no caminho da Rainha, no dia da coroação ou da inauguração do Parlamento, ela pisa em cima da graminha sem perceber. Ela calca o tesouro, mas leva sobre a fronte a coisa secundária!

Metafisicamente falando, a obra-prima de Deus é mais a graminha do que o “Koh-I-Noor”. De fato, o Criador colocou as coisas graduadas para nossas vistas, de maneira a podermos percebê-Lo mais no “Koh-I-Noor” do que na graminha; mas na realidade a graminha é mais do que o “Koh-I-Noor”.

A graminha não sabe nada, mas dela se pode dizer o que Nosso Senhor afirmou sobre os lírios do campo: “Olhai para os lírios do campo, não tecem nem fiam, entretanto Salomão, em sua grandeza, não se vestiu como eles!”(2). Poderíamos dizer: “Olhai para a graminha, não tem ciência nem sensibilidade, entretanto nenhum botânico sabe, com tanto acerto, o que convém a ela; a graminha procura nas trevas, na escuridão, aquilo que lhe convém e o encontra”.

Gramado de uma grande fábrica

Considerem uma fábrica moderna fabulosa. Ela não realiza o que faz uma graminha, quando deita um milímetro a mais de seu próprio vegetal.

Houve até quem dissesse que os vegetais eram fábricas feitas por Deus: por ordem de seu Criador, a natureza fabricava coisas que o homem não sabia produzir. A comparação só não me agrada porque diminui a importância da grama. A vida, que está no vegetal, é mais do que algo organizado pelo homem para produção de caráter material, remexendo coisas minerais, químicas etc.

Imaginem uma fábrica na qual há um gramado. Quem haveria de dizer que, no fundo, o gramado é mais do que a fábrica? Um técnico poderia explicar tudo o que se faz na fábrica, mas nenhum grande cientista seria capaz de dizer o que é a vida que anima aquele gramado.

Se compreendêssemos a lição de sabedoria que Deus nos dá! Enquanto estamos aqui conversando, a grama de nosso jardim está respirando. O Criador sabe o que cada folha de vegetal está fazendo, por causa desta vida que lhe deu. E numa hierarquia tão bem calculada que cada vegetal faz tudo quanto está na sua natureza, mas não sobe um milímetro, um grau, além de sua natureza; faz o que está de acordo com a ordem vegetal, mas não é capaz de realizar nada de animal; pelo contrário, serve de moldura e de comida para o animal. O gramado é um banquete das formigas e dos passarinhos, e não vive senão voltado para os seres de ordem superior. Então compreendemos que tesouros da sabedoria divina existem num simples canteiro.

Glorificar a Deus por ter criado os vegetais

Se fôssemos capazes de entender isto, nos ajoelharíamos e glorificaríamos a Deus pelo que a planta faz na sua raiz e na parte que aparece acima da terra. Diríamos:

“Meu Deus! Vós fizestes, entre outras coisas, as plantas tão feias na sua raiz e tão belas na parte que aparece. Mas, de outro lado, para que vossas regras, dentro do imobilismo de certos padrões, tivessem todas as mobilidades possíveis, fizestes em algumas plantas raízes tais que elas formam os mais bonitos parques para os palácios.

“E algumas dessas raízes se comparam ao trigo, para alimentar o homem: o cará, a mandioca, a batata e tantas outras. Vós quisestes que a planta, às vezes, desse no fundo da terra aquilo que ela costuma apresentar, a título de fruto, balançando ao céu. Desejastes fazer tudo isso diverso e, apenas neste grau primeiro de vida, nos destes uma possibilidade quase infinita de meditação.

“De todo esse formigamento de vida, Vós sois o Autor. Mas um Autor sem esforço, sem o trabalho da aplicação, que faz tudo isso com a serenidade e a facilidade que nenhum de nós homens conhece.”

Eis aí uma primeira noção da vida, que nos aproxima diretamente de Deus. E nos faz compreender que esse primeiro degrau da vida, debaixo de certo ponto de vista, já é um santuário. Nós nos sentimos pequeninos, desconcertados, mas temos uma experiência interna curiosa. Olhando para a planta, na perspectiva em que estou falando, nós dizemos: “Como somos grandes em relação aos vegetais!”

O que qualquer homem é capaz de falar sobre uma planta, ou fazer dela, é uma coisa fenomenal! Pobre planta! Mas Deus põe ali mistérios, perto dos quais somos pequeninos e então dizemos: “Aquele que conhece o que não conhecemos e fez o que não podemos fazer, e nos fez a nós mesmos, é superior a nós, assim como somos superiores à planta”

Podemos então imaginar, vagamente, como Ele nos vê. Somos incomensuravelmente superiores a um vegetal, o Criador é infinitamente superior a nós. Como será Ele, que criou a mim e a planta, e fez que eu pensasse o que acabo de dizer sobre ela, e quis esse contraste, essa comparação, para que me reportasse a Ele, tivesse uma figura d’Ele, e me enchesse de respeito e de amor para com Ele, mas me sentisse face a Ele menor do que a menor das plantas diante do Himalaia? Oh, meu Deus! Que lição! E quanta sabedoria d’Ele para que, sem me revelar nada, nem me falar nada a não ser o que está nos livros da Revelação, entretanto, me desse um espírito por onde eu fosse capaz de calcular tudo isso e ver quem Ele é!

O homem criou uma planta imaginária: o lírio heráldico

Deus aparece ao homem e lhe diz algumas coisas a respeito da vida que Ele criou; mas não se sabe quando surgiram os seres vivos. Que coisa gloriosa o homem receber essa comunicação de Deus! E como Deus me amou fazendo com que eu conhecesse tal comunicação; e, de outro lado, deu-me inteligência por onde algo eu descobrisse e me dignificasse. Porque descobrir não é de nenhum modo criar, mas tem analogia com criar. E o Criador, que é infinito, deu-me a possibilidade de fazer essa analogia.

Um homem colhe uma planta, um lírio, por exemplo, e o transforma num lírio que não existe: o lírio da heráldica. Esse homem criou uma planta imaginária. E nisso ele se parece um pouco com Aquele que criou a planta real.

Isso é uma analogia que Deus, a propósito dos vegetais, bondosamente concedeu ao espírito humano.

É bonito receber a Revelação! Mas também é bonito andar com os passos da inteligência e construir uma determinada coisa. Como é bonito viver! Porque isso é viver. E como é bela a vida!  v

 

Continua no próximo número…

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 2/2/1980)

Revista Dr Plinio (Abril de 2011)

 

 

1) Fixo, imobilizado.

2) Mt 6, 28-29.

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