Segundo o ensinamento da Igreja, no Paraíso Celeste, além da visão beatífica que inunda de gáudio as almas dos justos, há também uma realidade material — o Céu Empíreo — onde Deus semeou maravilhas inimagináveis, para que os corpos ressurrectos vivam imersos num universo físico que lhes fale das grandezas de seu Criador.
Por essa disposição divina percebe-se quão necessário é ao homem alimentar o seu espírito, não só na consideração dos aspectos teóricos e doutrinários da Religião, mas igualmente através das coisas temporais que o façam desejar aquelas superiores belezas da bem-aventurança eterna.
Compreenderam-no muito bem os filhos da velha Europa, a Europa da Civilização Cristã, os quais corresponderam de modo único às graças que receberam da Providência, alcançando realizações magníficas nesta terra. Por isso, até hoje olha-se para os esplendores europeus como para uma espécie de mito que a Religião Católica elevou à condição de ante-câmara ou de “seminário” do Éden celestial.
Tempo houve, pois, em que todo o teor da vida era diverso do de nossos dias, num continente onde foi possível ao homem idealizar e construir um mundo de maravilhas, de coisas arquitetônicas e sapienciais capazes de nos falar do Céu e, ao mesmo tempo, deleitar de maneira virtuosa o “irmão corpo” de quem as contempla. São os símbolos excelentes e nobres daquelas magnificências que nos aguardam no Céu Empíreo.
Dado, porém, que o efeito é sempre menor que a causa, comprazo-me em salientar que a maior dessas pulcritudes da antiga Europa é precisamente o espírito daqueles que as conceberam, as almas sedentas das grandezas celestiais, os corações nos quais se sentia este anseio de modo mais intenso do que naquilo que produziram e legaram à posteridade.
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Pensa-se nisto, ao considerar uma Sainte Chapelle e o monarca que a construiu, São Luís IX; ao admirar um Eremo delle Carceri e seu mais ilustre habitante, São Francisco de Assis; ou ao examinar a pujança e beleza de formas de uma Torre de Belém, diante da qual poderia se passar uma noite inteira, sob as refulgências do luar, meditando no heroísmo dos valorosos portugueses de que ela é portentosa expressão.
E por que não lembrar do palácio do Rei Sol, do Versailles de Luís XIV, cujas linhas e arquiteturas, no que têm de virtude e catolicidade, nasceram da Igreja e, a “fortiori”, estavam contidas na mentalidade e no modo de ser dos homens e instituições sagrados que incutiram nos seus artífices o espírito católico? Logo, num São Vicente de Paulo, por exemplo, insigne santo do tempo do pai de Luís XIV e que frequentava a corte, proporcionando uma abertura de alma para as virtudes que realizaram Versailles.
O mesmo se poderia dizer do Escorial, concebido por Felipe II de Espanha, o qual era mais “Escorial” que todo o seu famoso palácio. E como não imaginar a influência sobre essa idealização de uma alma que sobrepujava a do próprio Rei: a grande Santa Teresa de Jesus, ela mesma um “Escorial do Céu”?
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Portanto, na causa de tantas maravilhas que duram há séculos e que ainda hoje encantam o mundo, havia toda uma estrutura moral, virtudes e qualidades de alma, havia um portentoso vínculo entre Igreja, Religião e civilização, concorrendo para realizá-las.
Para se dizer tudo, havia o Sangue infinitamente precioso de Nosso Senhor Jesus Cristo e as lágrimas de Nossa Senhora, fontes de graças inapreciáveis que fecundaram e geraram um mundo inteiro posto na perspectiva das grandezas eternas, apetecendo-as e procurando espelhá-las do modo mais perfeito possível nesta terra de exílio.
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E assim são os esplendores da Europa cristã, da Europa sacrossanta, cujos passado e relíquias nos enchem do desejo de, ali chegando, oscular o solo em que primeiro pousam nossos pés. Porque, seja como for, é a parte do mundo por excelência onde os sofrimentos de Cristo e as dores de sua Mãe Santíssima engendraram uma grandiosa civilização, antecâmara do Paraíso Celeste.