Encerrando com fecho de ouro seus comentários a diversas escadas, Dr. Plinio se refere com enlevo àquela por ele considerada arquetípica: a “Scala Santa” de Roma. Erguida no antigo pretório de Pilatos, em Jerusalém, Nosso Senhor a subiu e desceu na Sexta-Feira Santa, e do alto dela, chagado e coroado de espinhos, foi apresentado ao povo sob o anúncio de “Ecce Homo!” .
Analisamos nas exposições anteriores como a construção de uma escada deve se orientar no sentido de fazer desta um ornato para a ação de subir e descer, seja do homem, seja da mulher, impondo-lhes a arte de realizá-la. É uma forma de dignificar a natureza humana, inclusive nos seus atos mais corriqueiros.
O mais esplendoroso subir de escada
Passemos, agora, ao ponto pinacular dessas cogitações.
Qual foi o personagem que com mais nobreza e esplendor subiu a rampa, a escada, a montanha mais majestosa da História?
Trata-se de um perseguido, humilhado, desprezado, fustigado, coberto de feridas do alto da cabeça à planta dos pés, condenado à morte, diante de cujo nome todo joelho deve dobrar-se: Nosso Senhor Jesus Cristo.
Tudo o que Ele fazia era infinitamente nobre, mesmo nas situações mais próprias a significar opróbrio, repúdio e humilhação. Em sua natureza humana aliava uma simplicidade e uma magnificência insondáveis. Jamais houve alguém que se comparasse a Ele em humildade e nobreza.
Podemos imaginá-Lo em diversas ascensões. Por exemplo, escalando com os três Apóstolos o Monte Tabor, em cujo cimo haveria de se transfigurar. A cada passo Ele se tornava misteriosamente mais glorioso, e irradiava seu esplendor para os discípulos os quais, atônitos, encantados, mudos de admiração, acompanhavam seu Mestre.
Podemos vê-Lo galgando a escada do Pretório de Pilatos. O Redentor, digno, afirmativo, seguro de si, fitando o ímpio governador com a tristeza de um pai, mas ao mesmo tempo com a majestade de um Deus.
Para o alto, rumo ao supremo sacrifício
Ou ainda O contemplarmos — que sublimidade! — vencendo as encostas do Calvário com a cruz às costas. Desfigurado, triturado como um verme, sem se deixar abater pelas três quedas, subia, subia, subia rumo ao sacrifício supremo para redimir os homens.
Quem O acompanhava?
Simão de Cirene, por certo sumido em adorações que ateavam fogo em sua alma. Provavelmente, sentia ele receber do Céu uma disposição particular para servir de socorro ao Cordeiro de Deus naquele momento. E percebia então que, enquanto prestava auxílio a Jesus, o próprio Nosso Senhor o ajudava a carregar o peso do madeiro.
Seguiam-No também as santas mulheres, as quais, devido à dilaceração da dor, não se sabe até que ponto percebiam a majestade da cena. Porém, entre elas se achava uma, incomparavelmente superior às demais, que compreendia e admirava não só o sacrifício, mas igualmente a glória e o esplendor daquela subida. Era Nossa Senhora. Conhecia a majestade do próprio Filho e O adorava. Ela, a mãe do Rei, via-O caminhar para algo de infinitamente mais alto que o trono…
Como é nobre um monarca galgar os três ou quatro degraus que o conduzem a seu régio assento. Contudo, como é mais glorioso, a perder de vista, o Homem-Deus subir o Calvário, levando a cruz na qual deveria morrer por nós! Não é capaz de ter ideia da verdadeira nobreza, nem a noção global da Paixão, quem não compreender a majestade de Nosso Senhor subindo o Gólgota.
A “Scala Santa”: simples e inigualável
Por essa razão, a escada mais nobre que conheci, a qual não galguei de pé, mas de joelhos, foi a “Scala Santa”, em Roma. Transportada de Jerusalém, onde Nosso Senhor a subiu durante a sua Paixão, é uma escada construída em mármore comum, sem maiores requintes. Os cuidados por sua preservação determinaram que fosse recoberta de madeira, evitando-se assim que a ascensão dos incontáveis peregrinos a desgastasse.
Em cada local onde caíram gotas do preciosíssimo sangue de Jesus, há um óculo com revestimento transparente: o fiel pode osculá-los, recitar suas orações e depois continuar, de joelhos, o caminho que os pés divinos, chagados, feridos, machucados — e em seguida perfurados na crucifixão — subiram por amor a nós.
Embora seja simples, sem ornatos, é a escada das escadas. Comparada com ela, as outras nada são. Falam-nos de beleza, de nobreza, de dignidade humana, sim. Porém, a existência nesta Terra não consiste apenas nisso. Ela é, sobretudo, a participação na vida, paixão e morte de Nosso Senhor.
É, antes de qualquer coisa, a luta pelo reino de Cristo.
Plinio Corrêa de Oliveira