Nossa ação de graças quando comungamos deve ser completa. Além de adorarmos Nosso Senhor Jesus Cristo, devemos prestar-Lhe também os outros atos de culto. A seguir, em continuação ao artigo publicado no mês anterior, Dr. Plinio nos sugere uma maneira de agradecermos tão grande dádiva.
Qual é a razão de ser da ação de graças após a Comunhão?
Ação de graças
A ação de graças é um ato de justiça, e quem não a faz é injusto.
Quando se recebe um dom muito grande, o qual não é o pagamento de uma ação boa que se fez, mas vai muito além, deve-se dar ação de graças.
Imaginemos um homem que é banhista, o qual deve ajudar as pessoas a tomarem banho de mar. Antigamente havia essa profissão. Esse banhista acompanha no mar um grupo de pessoas e evita que uma delas morra afogada. Não tem propósito que esta, chegando à praia, diga: “Olha, você foi o meu salvador”. Porque o banhista é um profissional pago para isso, e aquela pessoa não entraria no mar a não ser com ele; o banhista não expôs sua vida, fez apenas algo simples, não um favor. Ao final, ela poderia dizer: “Obrigado. Até logo, aqui está o seu dinheiro”.
Entretanto, se uma pessoa está se perdendo no mar e um homem se atira na água com todo o risco, salva-a e a conduz para a praia, a primeira coisa que ela deve dizer-lhe é: “Muito obrigado”. Trata-se de um dever de justiça.
Vou indicar alguns favores que Nosso Senhor nos fez. O primeiro: não existíamos e, por sua onipotência, Ele nos criou. Isso é mais do que salvar a vida. Um homem que salva minha vida adia uma morte que, ao cabo de algum tempo, terei. Quem me criou deu-me a vida da alma, a qual nunca deixarei de possuir. Eu, Plinio Corrêa de Oliveira — como todo ente humano — jamais deixarei de existir. Enquanto Deus for Deus, eu serei. Na Comunhão, Ele vem a mim e eu não agradeço?
Segundo favor: Ele Se encarnou, tornando-se homem com a mesma natureza de cada um de nós. E o faria por um só de nós. Isso é extraordinário, e devo agradecer.
Terceiro: Nosso Senhor nos libertou da escravidão do pecado, derramando todo o seu Sangue e morrendo na Cruz. Podemos pensar, por exemplo, no momento em que Ele disse: “Eli, Eli, lammá sabachtáni — Senhor, Senhor, porque me abandonastes!”(1) E depois, inclinando a cabeça, Jesus expirou. Aquela dor última, pior do que todas as outras; aquele estraçalhamento final em que a alma se separa do corpo; aquela sensação de abandono em que até o Padre Eterno parecia O haver deixado: tudo isso Ele sofreu como se fosse só por mim, Plinio. O Redentor está presente em mim e não vou agradecer-Lhe?
Quarto: vendo a infinita distância entre Ele e eu, Jesus deu-me sua Mãe para ser também minha Mãe. Quando o Salvador disse a São João: “Filho, eis aí tua Mãe”(2), e a Nossa Senhora: “Mulher, eis teu filho”(3), Ele sabia que nós existiríamos. Fomos dados a Ela, e Maria Santíssima nos foi concedida naquela ocasião. Não vou agradecer?
Quinto: Ele me fez membro da Igreja Católica. É um favor inefável.
Sexto favor: o Redentor agora está presente em mim. Nossa Senhora é capaz todas as formas de gratidão em um grau inimaginável. Posso, então, dizer: “Senhor, sou filho de vossa Mãe. Pela devoção, Ela está presente em mim, recebei-A. Minha Mãe, dai-Lhe ação de graças como Vós sabeis fazer em nome de todos os homens”.
Reparação
Tratemos agora da reparação, a qual é uma das ações mais augustas que um homem pode praticar em relação a alguém que foi objeto de uma injustiça. Aquele que repara presta honra e, por esta honra, faz justiça.
Imaginemos que alguém, passando junto a mim, me diga um ultraje e não posso me defender. Um outro, sabendo disso, declara-me: “A respeito do senhor, afirmo tal coisa…”, que é o oposto daquele ultraje. A ofensa fica reparada pelo ato de admiração, de amor, que este último fez. Esse é o sentido da reparação.
A reparação elimina, por assim dizer, a falta cometida. Ela é um ato de justiça.
Quanto cada um de nós, por não ter correspondido à graça, deve pedir perdão e reparar, dizendo, por exemplo: “Senhor, fui incorreto para convosco em tal ocasião; em outra, talvez tenha chegado a pecar; isso me dói. Nesse momento eu Vos peço: aceitai o que há em minha alma de contrário a esse pecado. Fui negligente ouvindo um sermão ou uma prédica; acolhei agora meu desejo de bem aproveitá-los doravante. Se tive covardia diante de um inimigo vosso e não soube lutar contra ele, aceitai meu desejo de ser corajoso.
Meu Senhor, não basta o meu desejo, dai-me força para cumpri-lo. Fui mole, poltrão, relapso, mentiroso. Meu Deus, é possível até que eu tenha sido impuro. Aceitai a minha admiração pela lealdade, pela pureza. Tornai-me puro como Vós. Vós curastes a lepra, considerada a pior das doenças, a cegueira, a paralisia. E também as lepras, as cegueiras, as paralisias da alma. Perdoai a paralisia de minha alma preguiçosa, a lepra da alma impura, etc.
Aqui convém rememorar alguns pontos de meu exame de consciência. “Pelos rogos de Maria, tende pena de mim e dai-me a força que eu quero ter. Faço isto para reparar diante de Vós a ofensa que Vos fiz”.
Mais ainda. Devo considerar a Revolução(4), bem como os pecados por ela promovidos, e pedir perdão a Nosso Senhor.
Petição
Somente no final vem a petição. Muitas pessoas, logo que recebem Nosso Senhor, começam a dirigir-Lhe o petitório: “Eu quero isso, aquilo, aquilo outro”.
Às vezes, vendo-se pessoas comungarem nas igrejas, tem-se a impressão de que o primeiro pedido feito por alguma delas é: “Meu Deus, curai a minha dor de garganta, fazei que venha logo o ônibus para eu voltar para casa, que o meu marido seja promovido, que meu filho passe no exame, fazei, fazei, fazei…”
Não. Os pedidos precisam vir no fim. E deve-se começar por rogar os bens para a alma, depois os para o corpo. Porque a alma vale mais do que o corpo. Então, pedir graças tais como: fidelidade à vocação, muitos flashes(5), correspondência à graça, paciência com fulano, devido respeito para com sicrano, etc.
Depois os bens do corpo. Pode-se pedir saúde e uma série de outras coisas. Porém, o mais importante é rogar os bens da alma.
Deve-se sempre pedir os bens do corpo?
Depende do trabalho da graça em nossa alma. Às vezes Nossa Senhora nos dá vontade de sofrermos algum mal corporal para resgatarmos os nossos pecados e os pecados dos outros. Nesse caso, pedimos a Nossa Senhora que mantenha aquele mal do corpo para sofrermos em reparação de nossas faltas ou de outra pessoa. Quer dizer, deve-se pedir aquilo que tem propósito. As outras coisas, não.
Quem é tentado de inveja, deve pedir muito a graça de não ceder. A pessoa vê um colega da mesma idade que refulge como um sol, e ela é a estrelinha apagada que só brilha um pouco quando o sol vai se deitar. Ela cogita: “Mas meu Deus, eu gostaria tanto de ser aquele sol; como seria uma coisa magnífica!” Então, deve essa pessoa tentada dizer: “Meu Deus, Vós me destes pouco, e tanto a ele. Dou-Vos graças por terdes dado mais a ele. Dai um pouquinho a mim também, pois sois tão bom!”
Creio que todos ouviram falar do caso do Padre Antonio Vieira, famoso pregador português.
Ele era muito pouco inteligente e por isso não podia ser jesuíta, pois a Companhia de Jesus somente admitia quem possuía comprovada inteligência. O Padre Antonio Vieira estava rezando diante de uma imagem de Nossa Senhora — que eu vi num museu de Salvador, na Bahia; puseram-na num museu em vez de colocá-la num altar — e, de repente, teve um estralo na cabeça, mas de doer.
tornou-se, creio eu, o mais inteligente dos homens que até aqui tenham falado em língua portuguesa. Simplesmente um colosso!
Maria Santíssima atendeu ao pedido dele.
Como seria bom, por exemplo, ter uma fotografia dessa imagem de Nossa Senhora e colocá-la num livro de estudos! Quando houvesse alguma dificuldade, rezar-se-ia à Virgem e se conseguiria entender melhor. Pode-se pedir na Comunhão que Nosso Senhor ilumine nossa inteligência.
Tudo terminado, diz-se “muito obrigado” a Nosso Senhor e a Nossa Senhora. É uma vênia final. Maria Santíssima é, de certa forma, como a mãe que temos em casa. Após o rei ter saído, digo-Lhe: “Minha Mãe, eu Vos agradeço…” E posso inclusive comentar com Ela a visita, com os pensamentos que estão em minha alma. E depois nos retiramos em paz.
Em minhas Comunhões, eu sempre inverto um pouquinho a ordem. No momento em que recebo a Hóstia, eu rezo um “Memorare” para pedir a Nosso Senhor — portanto, começo pedindo, mas é o único pedido que faço no início — aumento da devoção para com Nossa Senhora; e rogo por meio d’Ela. Sei que Maria Santíssima quer que minha devoção para com Ela aumente em cada momento.
Os que me vêem receber a Comunhão estejam certos: na hora em que a Sagrada Eucaristia pousa em minha língua, estou começando a rezar o “Memorare”. Isso não falha nenhuma vez. Logo depois, eu rezo interiormente o “Magnificat” para, por meio de Nossa Senhora, manifestar minha alegria porque Ele está dentro de mim. É uma forma de adoração esta alegria.
Depois, se não tenho nenhum ponto especial para considerar, eu faço adoração, ação de graças, reparação e petição.
Alguém poderia perguntar: “Além do aumento da devoção a Nossa Senhora, o senhor nunca começa pedindo alguma coisa?”
Sim, certamente. Porque essas regras gerais têm exceções. Nossa alma é viva e tem movimentos. Conforme estes, um princípio genérico pode ser alterado. Quando se está com uma grande aflição, pode-se começar por pedir que ela seja sanada. Por exemplo, a mulher adúltera que se encontrou com Jesus, quando alguns homens iam apedrejá-la. Ela não começou com a adoração, reparação, etc., porque aqueles indivíduos a apedrejariam. Mas disse de início: “Senhor, salvai-me porque estão querendo matar-me”. Ele foi bondoso e a salvou.
Nada na Igreja Católica, em Nosso Senhor Jesus Cristo, em Nossa Senhora, é ditatorial. É de bom alvitre seguir as regras que foram explicadas, quando algum movimento da alma muito vivo não nos indica o contrário.
Cada um deve proceder de acordo com o seu próprio modo de ser. Apresentei alguns princípios apenas com a intenção de ajudá-los, não de traçar uma linha de conduta obrigatória.
Resta-me apenas desejar que meus ouvintes, quando forem comungar, façam a preparação e a ação de graças com esse cuidado. A Igreja aconselha que se sigam esses quatro atos de culto, e eu lhes recomendo vivamente fazerem isso.
Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/7/1977)
1) Mt 27,46.
2) Jo 19,27.
3) Jo 19,26.
4) Revolução: Dr. Plinio assim denominava o processo multissecular que procura destruir a Igreja e a civilização cristã (cf. Revolução e Contra-Revolução, Editora Retornarei, São Paulo, 5ª edição em português, 254 páginas.)
5) Cfr Dr. Plinio, Nº 55, página 16.