Descrevendo as belezas existentes no palácio de Versailles, sua solidez e dignidade, Dr. Plinio afirma que todo católico precisa desejar o maravilhoso para amar a Deus, enquanto que a Revolução visa a abolir o amor ao belo.
O palácio de Versailles foi construído por ordem de Luís XIV, segundo os preceitos e princípios da arte francesa e do espírito francês, para simbolizar a glória da monarquia e o brilho da majestade real.
Le Nôtre: o maior jardineiro de todos os tempos
Notemos, em primeiro lugar, a vegetação. O europeu cuida extremamente da vegetação e tem por jardins, árvores e parques um zelo todo especial. Esta coloração tão bela é fruto do trabalho, ao longo de séculos, de pessoas que aspiravam ao píncaro em matéria de relva, e que por isso plantaram relvas maravilhosas.
O resultado é que olhamos para este panorama e temos uma sensação de verdor, de vida, de saúde, de frescor que descansa os olhos. Mas repousa principalmente a alma, ao considerar uma criatura de Deus tão cheia de viço primaveril. Trata-se, portanto, de alta cultura em matéria de relva, como encontraremos também em Versailles uma elevada cultura em matéria de arquitetura. Porque tudo ali é alta cultura e custou esforço, vontade de produzir maravilhas por parte de gerações inteiras.
É interessante considerar como a vegetação está toda ela bem aparada, formando desenhos, o que evidentemente dá trabalho também. Esses desenhos foram elaborados pelo maior jardineiro de todos os tempos: Le Nôtre(1). São desenhos geométricos nos quais entrou um mundo de pensamentos e o cuidado de estabelecer a harmonia com a fachada do castelo.
Dignidade, fortaleza, estabilidade
Analisemos agora o castelo. Ele visa exprimir a dignidade, a fortaleza e a estabilidade da realeza. São os três valores que caracterizam todo poder na Terra. Quando este é digno, forte e estável, ele impõe o respeito. Há, portanto, como pressuposto dessa obra, uma teoria do poder.
Ao contemplar Versailles surge logo a exclamação: Que bonito este castelo! Mas somente prestando atenção notamos como esta beleza é obtida. Encontramos três zonas de leveza diferentes no castelo: primeiro, o que chamaríamos o rés do chão. Tem-se a impressão de algo forte, que toca no solo e constitui um fundamento vigoroso. O robusto da base é acentuado pela abundância de pedras, todas rajadas, que dão a impressão de estarem postas umas sobre as outras, quase como um muro. É a ideia da solidez.
Vem depois a ideia da dignidade. Consideremos o andar de cima: são janelas altas, constituindo uma fachada muito longa. Mas enquanto no andar inferior os arcos não têm colunas, no superior cada janela está entre duas colunas. Por ser esbelta, a coluna dá um ar de leveza e confere a esta parte do castelo um caráter de nobreza. Este andar é leve e fidalgo, enquanto o anterior, forte e serviçal.
De vez em quando se destacam corpos do edifício formando terraços, para quebrar a monotonia da fachada. É o cenário apropriado para aparecer, por exemplo, o rei com a família real e outras pessoas da nobreza, constituindo moldura para o monarca. Quer dizer, é uma apresentação, para todos, de uma hierarquia política e social ornamental, decorativa, nobre, pomposa, que mostra a sua beleza, mas ao mesmo tempo manifesta-se afável, risonha, numa proporção humana com os que estão embaixo; sem esmagá-los pela sua altura, mas isolando-se.
O último andar é tão pequenino que a vista quase abstrai dele. O olhar se concentra no restante e quase prescinde desse pequeno andar que parece servir apenas para suportar troféus guerreiros e estátuas. E, por cima, tem o céu. Forma-se, assim, uma espécie de transição entre a ordem política e social, e Deus. O castelo parece não ter fim, ele se perde em figuras alegóricas, em formas etéreas, e se funde com o horizonte celeste. Foi esta a intenção ao construí-lo.
Degustar sua beleza como se prova um fino licor
Esta concepção arquitetônica corresponde bem aos erros da época: a atenção está toda voltada para o rei, para a esfera política e social; o elemento forte e o leve são quase molduras para ressaltar a realeza. Temos, assim, a glorificação da realeza feita pelo castelo.
Para explicitarmos o que o castelo tem de maravilhoso, é necessário que o contemplemos algumas vezes por espaços de tempo bem diversos. Só então essas considerações vão se destacando e percebemos toda a realidade. É como provar um licor fino: às vezes sentimos seu sabor somente depois de tê-lo engolido. Aqui também: é a segunda ou a terceira análise que nos torna mais palpável o que acabo de explicitar, e nos faz degustar completamente o que o castelo de Versailles diz para aqueles que o visitam.
Embora esse castelo exista como uma concha vazia, pois tudo quanto nele era vivo foi exterminado ou levado embora, até hoje os turistas do mundo inteiro vêm vê-lo. É uma fama de beleza que se mantém pelo consenso de todos que o visitam.
Como é bonito ter havido todas essas ideias no espírito dos que compuseram esse castelo e, séculos depois, alguém, olhando para ele, recompor essas ideias e, por assim dizer, dar-lhes vida! Tal é a densidade de pensamento que uma obra de arte pode conter.
Essas considerações ajudam-nos a readquirir o gosto pelo maravilhoso. A alma de um católico tem que desejar o maravilhoso para amar a Deus. Somos criados para ver a Deus face a face; e contemplar essas maravilhas é uma preparação para o Céu. Preparam-se para o Céu os povos dotados desse amor ao maravilhoso que a Revolução de tal maneira quer abolir.
Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 29/3/1967)
1) André Le Nôtre (1613 – 1700). Foi jardineiro do Rei Luís XIV de 1645 a 1700.