Vocação para harmonia e síntese

Agraciado pela Providência com um cordial e generoso “savoir faire”, o povo brasileiro desponta na História para exercer a importante missão de harmonizar as mais diversas nacionalidades. É o que, através de vívidos exemplos, nos mostra Dr. Plinio na exposição abaixo transcrita.

Quando consideramos o futuro do gênero humano e nos colocamos diante da idéia da unidade das nações1, nos referimos um tanto aos dias de hoje, mas, sobretudo, voltamos nossos olhos para o dia de amanhã. Poderíamos nos perguntar, então, se já existem povos que constituam essa unidade e qual o papel deles no concerto universal.

América Latina e o mundo vindouro

Creio que, por algum lado e de certo modo, esse plano está se realizando na América Latina, a qual representa o mundo de amanhã. Sua história é ainda tão recente que seu próprio passado é o dos outros povos europeus. Quando estes começam a decair, brotaram as nossas raí­zes e desabrocharam de forma incipiente as nossas glórias.

O século XX foi dos Estados Unidos; o XIX da Inglaterra; o período (quase mil anos) desde Carlos Magno até fins do século XVIII, da França. Espanha e Portugal não chegaram a ter primazia, mas deram origem à América Latina, e a história daqueles terá sua continuação nesta última, conforme os planos da Providência. Isso ocorrerá no século XXI, o qual, indubitavelmente, será do subcontinente latino-americano.

Em função desse acontecer histórico, vale dirigir nossa atenção para o brasileiro e o hispano.

Atualmente, fala-se muito e se cogita em estender o Pacto Andino desde o norte dos Andes até a Patagônia, abrangendo também o Brasil, embora ele nada tenha de andino. É um modo sul-americano de constituir uma grande unidade. E nos causa não pequeno entusiasmo a idéia de que essa magnífica unidade religiosa, étnica, cultural, eu diria lingüís­tica, estabeleça uma espécie de superestrutura arqui-política.

A índole do brasileiro, ideal para a unidade das nações

Quanto ao Brasil — onde nosso movimento foi fundado — percebo perfeitamente este fato: Deus criou suas características geográficas e a índole de seu povo de tal maneira que este adquirisse uma mentalidade a fim de servir idealmente para essa obra resumitiva do futuro. E a grande originalidade do brasileiro está em fazer compêndios dessa natureza. É sua missão na História.

Para auferir esse talento de sintetizar, recordemo-nos dos clubes de Carnaval no Rio da década de 40, quando essa festa estava num auge e se apresentava menos como folia do que desfile do maravilhoso, feito pelo povinho dos subúrbios. Este é propriamente o sentido nobre e bonito do Carnaval. Então havia salões freqüentados por homens de cor vestidos à maneira das cortes de Luís XIV e Luís XV, cabeleira empoada e sapatos de fivela, acompanhados de “marquesas” de ébano! Aquilo que poderia parecer sumamente ridículo, era contudo elegantíssimo.

Essa gente é de tal modo unida a Portugal que somos um povo luso-brasileiro, dotado de intensa cordialidade, vivendo num território imenso, e sempre de braços abertos para acolher os mais diversos imigrantes: desde o africano com seus costumes que adotamos, ao francês com sua cultura pela qual nos deixamos embeber. África e França se encontram harmoniosamente no ambiente brasileiro, em que a mulher de ébano se veste de Pompadour…2

Por expressar esses valores, o Carnaval carioca conquistou a admiração do Brasil inteiro, e obteve certa fama no mundo todo. É uma arte bem brasileira conseguir algo que pareceria impossível, isto é, conciliar duas coisas tão opostas: a simplicidade da neta das selvas e a cultura da marquesa. E tal arte é alcançada sem estudar, sem usar laboratórios ou levantar problemas teóricos e resolvê-los, mas remexendo coisas com uma indolência naturalmente sábia, por onde elas vão se colocando no lugar próprio e de modo acertado.

No fim das contas, o brasileiro nem percebe bem o que fez; boceja, alimenta-se de uma fruta e prossegue a toada normal de sua vida. Ele agiu com esse particular savoir faire [saber fazer] que possui, muito valioso por ser mais subconsciente do que consciente.

Temperado pelo “azeite português”

O Brasil descende de uma nação representativa para a Europa daquilo que esta precisava. Poder-se-ia comparar o continente europeu a uma carruagem magnífica — como as do museu do Palácio de Versailles que me deslumbraram em menino — cujas molas estivessem quebradas e o entrosamento dos eixos com as rodas pouco lubrificado. Por essa razão, ela andaria penosamente, sacudindo as plumas, quebrando os vidros, chiando por toda parte. Seria uma caricatura de carruagem.  Se alguém a azeitasse e consertasse o molejo, as plumas voltariam ao normal, os vidros não se partiriam, os passageiros não se segurariam nos damascos por receio de cair, e os rangidos grotescos desapareciam. E novamente se ouviriam a corneta dos postilhões, o trote elegante dos cavalos e os chicotes estalando no ar.  Era a carruagem que passava…

Portugal é propriamente a nação-azeite da Europa, ele a complementa, mas seu florescimento não foi inteiramente conhecido por esta última. Ele possui a doçura, o afeto, a serenidade, afabilidade e uma acolhida que não se sente em nenhum outro lugar do velho mundo. Sua expansão, através da influência, teria dado à história do pensamento, do sentimento e da ação dos europeus o imbricamento e o contexto que lhes faltou.

A Europa empurrou Portugal para um canto. Porém, ao mesmo tempo que plantava uvas para fabricar seu esplêndido vinho, a nação lusitana dentro de sua própria alma produzia azeite, o qual foi derramado pelo Brasil inteiro, embebendo-o e o transformando no povo “azeitado” por excelência. Suave, amável, compreensível, voltado a admirar os outros, comprazendo-se de encontrar neles uma qualidade, encantando-se quando aprende uma moda, um estilo e um arranjo novos. Não pensa em se comparar com ninguém. Senhor de uma vastidão de terras continental, distribuindo-as para os que as desejam, com toda naturalidade, como quem não está fazendo favor.

Além disso, recebe no seu imenso território as mais variadas raças, penetrando-as no mais íntimo da alma e realizando isso de curioso: qualquer povo radicando-se neste País, ainda que sem miscigenação, ele “embrasileira”. É o resultado do “azeitamento”. De um modo inteiramente ordenado, o estrangeiro, sem perder as suas características originais, acaba passando por uma mutação na essência de seu espírito.

Mais italiano no Brasil que na Itália…

É fato notório que no Sudeste do Brasil a imigração italiana verificou-se torrencial.  Se compararmos o ítalo-brasileiro com o argentino, chileno ou uruguaio de ascendência italiana, ou até com o próprio filho da cantante Península, julgo realizar-se mais no Brasil do que na Itália, Argentina, Chile ou Uruguai a figura convencional e folclórica do italiano.

A “Canaã” deles é o Brasil, para onde se mudam em grande quantidade. E posso dar o testemunho pessoal de que encontrei o autêntico ítalo no Brás, na Mooca, no Belenzinho3, e não comi na Itália uma pizza tão genuína como as elaboradas em certas pizzarias de São Paulo.

Percebe-se dessa forma como a brasilidade penetra e muda algo nos povos, mesmo não havendo a mistura de raças. E tal mutação, que é indizível, efetua-se acrescentando e azeitando. A imagem adequada desse fato é a de uma gota de azeite espalhando-se sobre uma folha de papel, deixando intacta a substância desta, que nem sequer fica mais grossa, porém se faz transparente à semelhança de um vidro.

Grandiosa missão de harmonizar os povos

Assim é ação de presença do povo brasileiro, que torna afáveis as coisas, encaminhando-as para a síntese.  Um exemplo peculiar: os imigrantes vêm para o Brasil com a idéia de, quando ricos, voltarem a viver na mãe-pátria. Entretanto, muito antes de granjear fortuna, já estão resolvidos a retornar ao seu país natal — para uma visita e não para morar lá outra vez. Querem residir no Brasil, e aqui morrer.

Quer dizer, há uma nova forma de imperialismo, exercida pelo azeite, que domina, penetra e se faz sentir nas mais diversas localidades do ­País. Se o imigrante se fixa no Rio, torna-se carioca; se em São Paulo, fica paulista; em Minas, se “amineira”; no Rio Grande do Sul, se “engaúcha”.

Assim, devido ao modo de ser de seu povo e ao ambiente por ele criado, o Brasil é um pólo de atração. Pode-se dizer que essa gente está preparada para contemplar com amor todas as etapas do passado e as variantes do espírito humano. E isso ela o faz simplesmente olhando, apreciando os valores, descartando os defeitos, destilando: tal coisa é má, não está de acordo com os ensinamentos da Igreja; tal outra, apesar de pagã, se encaixa na doutrina católica; e aquela outra foi predisposta por Deus para, em certo dia, servir aos interesses da Esposa Mística de Cristo.

O brasileiro consegue apanhar e acertar todas essas coisas para constituir no fim do mundo a grande síntese da História. Seria o compêndio da doçura, abarcando a Terra com amor, compreendendo todos os valores humanos num só olhar, e usando de seu território de proporções continentais para alojar e harmonizar tudo, com vistas a uma síntese final.

Essa missão encerra uma grandeza superior e mais bela do que as legiões de Júlio César avançando e estendendo as fronteiras do império romano… 

1 ) Cf. “Dr. Plinio” número 87.

2 ) Marquesa de Pompadour (1721-1764). Uma das mais prestigiadas damas da corte francesa, então estabelecida no Palácio de Versailles. Apesar de uma vida moral pouco louvável, destacava-se pelo luxo e elegância de seus trajes.

3 ) Bairros paulistanos.

Brasilidade…

Como muitos de meus conterrâneos, percorri parte considerável do Brasil e conheci brasileiros de todas as latitudes e longitudes. Comprazendo-me na observação de nossas características, sempre me maravilhei diante da seguinte ­realidade que pode passar por trivial e inexpressiva.

Apesar da imensa extensão geográfica deste País, das influências locais centrífugas como, por exemplo, a predominância das imigrações hispânica, alemã e outras no Sul, e não obstante a nossa tão decantada heterogeneidade racial, acaba-se revelando no Brasil uma força centrípeta, discreta, doce, incessantemente ativa e invencível, que é a de aglutinação. Força tão assombrosa que nos permite conversar com alguém do Amazonas ou do Pará, do Rio Grande do Sul ou de Santa Catarina, sem que se notem — ou quase não se percebam — diferenças.

Travemos contato com um brasileiro de olhos amendoados e nariz pouco adunco, ou com um de predominância indígena, um negro ou qualquer habitante típico de determinada região, e notaremos um denominador comum, um predicado que penetra todos os espíritos, e merece ser chamado de “brasilidade”.

Essa peculiaridade nacional é uma das nossas grandes riquezas, consoante e harmônica com os tesouros naturais, as paisagens exuberantes, o litoral de beleza insuperável, nossas obras e monumentos históricos, coloniais e outros, que atraem a admiração de pessoas do mundo inteiro.

Encanta-me igualmente reparar o fato de haver recantos da alma brasileira ainda mais ou menos intactos, ilesos, aonde aparecem em certos momentos lampejos dessa força de aglutinação sob aspecto diverso: traços psicológicos, intelectuais e morais.

É quase proverbial a rapidez de intuição e a facilidade de correlações, tão típicas da inteligência do brasileiro de todos os quadrantes. Assim como qualquer coisa de filosófico e até de metafísico, que aflora muito nas canções caipiras e outras expansões populares. Filosofia, metafísica que não têm a claridade do sol, mas a da lua: difusa, esparsa e geral. Contudo, existe!

Além disso, há no meio de toda a psicologia do brasileiro uma característica que julguei perceber nos mais variados ambientes, regiões e panoramas de nossa pátria: uma certa esperança — quase diria uma precognição — de que o Brasil ainda será um grande País. A Providência permitiu que não tivéssemos o progresso acelerado da Europa dos séculos XIX e XX, e assim estamos prestes a ingressar no século XXI com vastidões do nosso território que são, nas mãos de Deus, como folhas de pergaminho ainda em branco.

E vivendo ao lado das gigantescas montanhas, das igrejas barrocas, das praias luminosas e acariciadoras, de uma Baía da Guanabara, ou dos pampas gaúchos, o brasileiro, imbuí­do como que naturalmente da Fé cristã, possui essa elevação de alma por onde sabe que algo acontecerá um dia que o colocará à altura de suas grandezas e dos valores depositadas pela Fé no seu coração.

Tenho a convicção de que, quando chegar essa hora, pelos rogos de Maria Santíssima o Espírito Santo agirá sobre nós. E então, o mesmo fator determinante para que a antiga civilização européia se convertesse e desse origem à Idade Média, fará com que brote deste solo, não uma cristandade medieval, mas o que esta deveria ter sido se houvesse correspondido aos planos divinos. Persuadido estou de que as extensões do chamado “pulmão verde” do mundo estão reservadas para esse dia.

Hífen de ouro

Diante de tantas maravilhas criadas por Deus no universo, pode-se pensar que seria talvez incompreensível que Ele não as coroasse com uma beleza complementar e suprema.

Imaginemos um joalheiro que possua um escrínio repleto de pedras preciosas, avulsas, ainda não articuladas como jóias. Ele as toma e as espalha em cima de um lindo feltro que cobre sua mesa de trabalho, faz incidir sobre elas uma luz que realça o esplendor e o valor de cada uma, e se põe a admirá-las. O homem se encanta com aquele tesouro. Se for um joalheiro inteligente, breve lhe ocorrerá a seguinte idéia: “Como constituir um conjunto com essas pedras? Pois são tão belas que merecem ser reunidas num todo que as exceda em pulcritude. Como fazê-lo?”

De fato, se as pedras são lindas, a jóia na qual se encaixarão o será mais, posto que o conjunto das coisas ordenadas adquire beleza superior ao mero amontoamento desarticulado dessas mesmas coisas. A ordem é um degrau a mais para o esplendor, e este, propriamente dito, decorre não só da graciosidade de cada parte, mas da ordenação com que as partes estão dispostas. Esta é a beleza das belezas.

Portanto, o joalheiro inteligente não poderia deixar de pensar: “Essas pedras têm tais e tais características, tais e tais encantos; mandarei fazer com elas uma jóia”. Ele analisa suas pedras e elabora o desenho segundo o qual elas estarão melhor dispostas para formar a jóia desejada: “No centro virá aquele brilhante magnífico; e para que o broche seja mais refulgente, incrustarei de um lado rubis, depois uma camada de safiras e outra de esmeraldas…” E assim por diante, seguindo sua valiosa inspiração, ele acaba compondo o objeto precioso.

Sendo um grande joalheiro, sem hesitações nem contradições, decidido a executar o plano primeiro traçado por sua idéia, ele chama um de seus funcionários e lhe entrega aquele esboço: “Leve este desenho ao ourives e peça que me monte essa jóia, usando ouro do melhor quilate, a fim de que a beleza do metal complete o esplendor das pedras.”

Dias depois, o ourives entrega a encomenda ao joalheiro. Este abre a caixa lavorada com esmero, abre as dobras de veludo, de seda, até que seus olhos se rejubilam com o fulgor da linda jóia ali encerrada. E o ourives lhe diz: “Senhor, aqui estão as suas pedras, e aqui está a jóia que idealizou. Eis a beleza que minhas mãos lhe entregam! Minhas homenagens!”

Ora, Deus tendo criado todas essas maravilhas esparsas no universo, quais as gemas avulsas do joalheiro, haveria de lhes traçar uma ordem. Como centro dessa ordem, governando-a, resumindo-a num conjunto precioso, Ele pôs o gênero humano. E neste, foi intenção do Criador que existissem homens mais perfeitos, mais santos e mais admiráveis, e existisse o ápice, a jóia máxima: o Homem tão perfeito, tão inteligente, tão sábio e poderoso que excedesse em beleza, sabedoria, virtude e poder a todas as criaturas humanas.

Em torno desse Homem, como os rubis e safiras ao redor do brilhante, dispor-se-iam todas as perfeições do universo. Esse é o Homem-Deus, hífen de ouro ligando de modo magnífico o Céu e a Terra.

Todas as belezas do mar e do firmamento, todos os tesouros escondidos nas entranhas do solo, todos os variados encantos da fauna e da flora, todas as grandezas e maravilhas engendradas pelos homens em todos os tempos não constituem senão pré-figuras ou ecos d’Aquele que é o ápice da História: Nosso Senhor Jesus Cristo, de cujo Sangue infinitamente precioso vertido por nós em sua Paixão e Morte, nasceram todos os esplendores da Civilização Cristã. v

Hífen de ouro(Extraído de conferências em 24/3/1984 e 13/10/1989)

Santo Inácio de Loyola – Alma repleta de lógica e enlevo

Desde os bancos do Colégio São Luís, onde tomou conhecimento da vida e obra de Santo Inácio de Loyola, nutriu Dr. Plinio grande devoção ao fundador da Companhia de Jesus, e uma entusiasmada admiração pela lógica e clareza adamantinas do autor dos “Exercícios Espirituais”. Veremos, pelas suas considerações transcritas a seguir, como estes e outros preciosos predicados da alma inaciana o encantavam.

 

Quando analisamos o modo de ser e de agir de Santo Inácio de Loyola, percebemos que o amor e o enlevo que ele tributava às instituições e aos ensinamentos da Igreja, redundavam em reflexos daquelas perfeições na sua própria alma, sem contudo empanar suas peculiaridades.

Tornando-se ainda mais Santo Inácio

Por exemplo, encantava-se com o modo de um Papa cuidar de uma fabulosa pluralidade de assuntos com inteira calma e sobranceria, conduzindo sem sobressaltos o orbe católico. Ora escrevendo uma bula pelo centenário de uma universidade ou de um estabelecimento católico famoso, autorizando a ereção de uma prelazia apostólica nas missões, resolvendo um delicado problema de relações com determinado país ou uma crise religiosa em tal outro, solucionando uma questão de corporações numa certa nação envolvendo problema moral bastante delicado, etc. — as mais variadas ações do Sumo Pontífice falavam de maneira intensa à alma de Santo Inácio.

Especialmente o enlevava discernir a ação do Espírito Santo, possante, sábia, serena, imensa, pairando sobre a Igreja e governando-a. Na medida que se enlevava, a obra do Espírito Paráclito se prolongava em Santo Inácio e algo dessa qualidade da Igreja passava a viver nele, tornando-o capaz de, até certo ponto, agir do mesmo modo. Dir-se-ia que uma força sobrenatural doravante o habitava, fazendo-o mais ele mesmo, porque sua vocação e seu carisma específico se enriqueciam.

Pode parecer um paradoxo que algo extrínseco passe a ser inerente a ele, orientando sua vida. Santo Inácio não se transformava num autômato?

A meu ver, dava-se o contrário. Ele se tornava mais Santo Inácio de Loyola.

A regra aplicada aos discípulos

E é interessante notar que o sucedido com Santo Inácio se verificava, guardadas as proporções, entre ele e seus discípulos. Ou seja, quando se lê a história da Companhia de Jesus, vê-se que o Fundador procurou formar a mentalidade de seus seguidores de acordo com o que hauriu da Igreja, encaminhando-os para a perfeição. E os jesuítas, por sua vez, procuravam se conformar a Santo Inácio, tendo não poucos alcançado de fato a heroicidade de virtudes. Lembremo-nos, por exemplo, de São Francisco Xavier, entre os primeiros e, posteriormente, São João Berchmans, São Luís Gonzaga, etc.

Tem-se a impressão, aliás, de que na Companhia de Jesus, mais do que nas outras ordens religiosas em relação aos respectivos fundadores, essa união e essa conformidade de alma manifestou-se sobremodo rigorosa e enfática, por razão compreensível. Na época em que Santo Inácio foi suscitado por Deus para impulsionar a Contra-Reforma, alguns aspectos da vida da Igreja pareciam de tal maneira alterados que, para se ter o perfeito conhecimento dela, era indispensável conhecer uma pessoa plenamente católica, e se estabelecer com esta um vínculo particular. Esta forma de contato pessoal era o meio de a Igreja manter sua influência sob o espírito dos fiéis.

E para os jesuítas que tinham Santo Inácio como modelo, a união com a Igreja se fazia através do influxo da pessoa do seu fundador, conhecida nas horas de enlevo com o auxílio da graça, e assimilada, no sentido próprio da palavra, pela meditação, ponderação, etc.

Portanto, para que um jesuíta do século XVI não se deixasse contaminar pelas idéias errôneas do tempo, deveria considerar os fatos através dos olhos de Santo Inácio.

Doutrina personificada

Por outro lado, cumpre admitir que é muito conveniente ao católico conhecer a doutrina personificada. Necessidade que também se explica facilmente.

Imaginemos alguém que estudasse um compêndio de Doutrina da Igreja, mas nunca tivesse visto um bom católico. Ele não teria uma perfeita noção da Santa Igreja. Agora suponhamos o contrário: ele conheceu um católico no sentido pleno do termo, mas ainda não estudou essa doutrina… Quase se poderia dizer: quem conheceu a pessoa do bom católico entendeu a Igreja mais do que quem analisou apenas sua doutrina.

Nesse sentido, figuremos uma conversa entre jesuítas a respeito dos escritos de Santo Inácio. Não deveriam eles estudar o texto inaciano como o faria um crítico qualquer, ou seja, excluindo o fator enlevo. Não. Antes, deveriam procurar discernir a mentalidade do seu fundador ao conceber aquelas linhas, e chegar a cogitações mais altas, como, por exemplo, considerar que a matriz daquele estilo existia na alma de Santo Inácio, com uma superabundância da qual aquele livro ou aquela oração era uma parcela.

Deveriam compreender que Santo Inácio era capaz de escrever a uma eminente autoridade eclesiástica, com um cunho enérgico e afirmativo, chamando-lhe a atenção por atitudes que causavam estranheza nos meios católicos fervorosos, bem como de usar de astúcias para resolver um grave problema, sem nada perder de sua seriedade, gravidade e firmeza.

Os jesuítas, se fiéis à sua vocação, tinham de admirar essas qualidades de seu fundador, conformar-se com elas, enlevar-se com o enlevo dele pela Igreja, e procurar ver a ação do Espírito Santo instruindo e conduzindo as atitudes do grande Santo Inácio de Loyola.

Encantos com os raciocínios do Mestre Costa

Não me esquivo de aduzir um exemplo pessoal, de quem — embora não sendo jesuíta — cedo sentiu-se enlevado com a lógica luminosa de Santo Inácio, e desejou adquiri-la para toda a vida.

Quando frequentei o Colégio São Luís, uma das matérias era lecionada por um jovem professor, ainda seminarista da Companhia de Jesus, ao qual chamávamos Mestre Costa (futuramente Pe. Costa). Ele desfiava seus raciocínios de caráter apologético, explicava isto, aquilo, aquilo outro, e me entusiasmava ver a coerência dos pensamentos dele: concatenados, determinados, caminhando a passos resolutos e direitos para a conclusão. Eram meus primeiros encantos com a lógica.

Eu percebia os movimentos do raciocínio no espírito do Mestre Costa, ágil, lúcido, forte, e me alegrava admirar uma alma, uma inteligência que se movia assim. Mais. Sentia um verdadeiro alívio no meu interior, como se algo longamente estagnado começasse a se mexer e a andar. Era uma espécie de libertação da minha presença habitual em ambientes poucos afeitos à lógica, pouco reflexivos, amantes das impressões: “acho que… talvez seja… parecer-me-ia que…”. Sem me dar conta, meu temperamento desejava outra postura de alma, pedia uma definição. Afirme! Abra o peito e tome a responsabilidade da conclusão: diga que é assim, e assunto encerrado.

Ora, no raciocinar do Mestre Costa havia isto: ele concluía. E de tal maneira que prendia o interlocutor na sua conclusão, sem possibilidades de fuga. Eu dizia para mim mesmo: “Um dia saberei também concluir, como o Mestre Costa!”

Meu encantamento era tanto maior quanto percebia que o professor chegava a conclusões com as quais muitos estavam em desacordo. Em geral, os pretensos “espíritos fortes”, homens bigodudos, vistosos, com aparência de mandões e que julgavam a época da Religião já ultrapassada. Pois o Mestre Costa começava a dispor sua argumentação, pensamento a pensamento, comprimindo e silenciando o seu oponente, para as delícias de minha alma.

Entusiasmo pela lógica inaciana

Mas, em meio às suas digressões, essa lógica brilhava de maneira particular ao fazer o elogio da Companhia de Jesus e de Santo Inácio. Com uma característica curiosa: quando se exaltava nas exposições, a ponta do seu nariz movia-se ligeiramente. Essa peculiaridade atraía muito minha atenção, e era notada de forma especial quando ele se referia ao fundador. Eu pensava:

“Está vendo? Esse homem é um brasileiro como eu, e hauriu as suas possibilidades mentais nesse mesmo Brasil em que estou. Se ele possui essa lógica dentro da alma, não a obteve da maré de relativismo que corroeu largamente a mentalidade atual, e sim de Santo Inácio, de quem ele é filho. O fundador dos jesuítas lhe concedeu essa dádiva.

“Ora, se eu admirar infatigavelmente Santo Inácio, quem sabe este me concederá, a mim também, um pouco dessa lógica ? Depende de eu ser muito puro, inteiramente puro, intransigentemente puro… Porque este espírito não é dado a quem não é casto. Se eu perseverar na prática da castidade, começará a nascer em mim uma lógica como a do Mestre Costa, como a de Santo Inácio de Loyola. Vamos para a frente! Meu entusiasmo está adquirido!”

 

Plinio Corrêa de Oliveira

 

Florença e a perfeição das formas – II

Cidade com edifícios de proporções perfeitas, Florença, como todas as antigas urbes, viu transformarem-se em museu seus palácios e outras bonitas residências. Isso se deve ao fato de que seus habitantes, em determinado momento, quiseram romper com Aquele que disse de Si mesmo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6).

 

Por certo, nesse casario há residências onde as escadas devem ter alguns degraus podres, as donas de casa brigam umas com as outras, de andar para andar, ameaçando-se com aquele rolo para fazer macarrão, e se vê um velho subir até o quarto andar, no qual ele foi morar por ser mais barato, mas tem medo por causa do coração… À noite ele sentiu umas dores no peito e não sabe se é bronquite ou começo de enfarte; então saiu muito preocupado e agora sobe devagarzinho, levando sua bengalinha e o jornal do dia debaixo do braço, e fumando o último cigarrinho que ele aspira até o fim, porque não pode comprar muitos; e vai curtir sua pobreza e seu isolamento junto a um gato no quarto que ele ocupa.

O povinho que a Revolução massacrou

Entrevê-se um formigamento de gente nesse casario. De gente vivaz, que fala, comenta, canta, trabalha, que quando dorme ronca; enfim, gente estuante de vida e, exceto o meu velho do gato, o resto todo com muita saúde. E esse velho, a doença dele é só velhice. Mas essa é inevitável…

Esse formigamento de vida não há em um arranha-céu moderno, nem nas pobres “vilas-Moscou” das periferias de certas cidades. Ora, é este o povinho que a Revolução massacrou, proclamando a soberania popular. Em Florença, e em outros lugares, algo disso ainda vive.

Notem, agora, aquela outra ponte que não tem construções colaterais e cujo traçado pode ser melhor apreciado. Vejam a beleza da ponte e também da iluminação pública. Que lampadários bonitos, delicados! Comparem com a iluminação que encontramos, por exemplo, em determinadas avenidas de São Paulo: as luminárias parecem esqueletos de não sei que animal pré-diluviano, que tinha um pescoço compridíssimo encimado por uma cabecinha inútil. Nesta ponte, ao contrário, tudo é proporcionado.

A propósito da arquitetura desta ponte, vem-me à memória a seguinte comparação. A Ponte Alexandre III, de Paris, é muito bonita, construída no século XIX, porém ultra enfeitada.

Esta aqui não tem um enfeite. A beleza está na linha dos arcos, mais nada. É o que se chamaria, na linguagem de hoje, um estilo despojado. Isso faz lembrar, em relação aos enfeites, um caso que se contava na Grécia.

Realizou-se um concurso de arte — creio que de pintura, não me lembro bem —, no qual concorriam artistas de vários lugares. Um deles, persa, representou uma mulher com um traje riquíssimo que visava realçar a beleza de sua obra. Outro pintor, um grego, figurou uma grega com uma simples túnica branca.

O júri deu a primazia à pintura grega.

O persa protestou, argumentando que a sua estava muito melhor vestida. Os gregos responderam: “Tu a fizeste rica porque não soubeste fazê-la bela”.

Uma construção estética reputada perfeita

Vemos em outra fotografia a Catedral de Florença, toda feita de mármore branco e preto. A mesma coisa que nós encontramos nas fachadas laterais da Catedral de Orvieto, onde há mais mosaicos. Notem o choque: Florença, muito mais importante e mais rica do que Orvieto, nem tem comparação, ousa fazer para si uma catedral que não possui um mosaico na frente. Mas a superioridade de Florença, segundo o meu modo de entender, está exatamente em que cores bonitas, mosaicos, etc., são enfeites fáceis, para imaginações débeis. Na Catedral de Florença existe uma proporção perfeita entre a torre, o corpo da igreja e a abóboda com aquela torrezinha em cima. E depois o tamanho das naves laterais. E isso está tão bem calculado, como as rosáceas nas portas, as colunatas, a rosácea grande, que é uma construção estética reputada perfeita. Então, a reflexão, o equilíbrio, a profundidade, zombam do ornato, do charme, da graça, e Florença tem uma beleza autêntica a qual resiste à metralhagem dos olhares analíticos que querem encontrar um defeito.

A Catedral parece dizer: “Eis-me aqui, despojada e sem maquiagem; eu sou eu, veja como sou linda!”

Não sou um especialista em matéria de arte. Não afirmo, portanto, como quem se acha entendido, o seguinte. Mesmo porque o valor do argumento da autoridade de incontáveis críticos, que têm achado isto perfeito, pesa mais do que o meu. Mas, em minha opinião, essa cúpula se fecha muito belamente em cima, tem uma proporção bonita com a barra branca sobre a qual ela se pousa, porém ela é muito pesadona para o conjunto do edifício. Ao menos eu a sinto assim.

Vemos na torre da Catedral, por exemplo, alguns vestígios do gótico nos vários andares, mas muito poucos. É muito bonito como os andares vão se afinando discretamente para cima. O branco está utilizado aqui magnificamente. Os vários espaços e dimensões, os ornatos dos diversos elementos, tudo está perfeitamente bem posto, e é muito bonito, não tem dúvida.

Mania do despojado

No interior da Catedral o despojamento vai bem mais longe. Não se pode negar que as dimensões, a altura das colunas são muito bonitas, que os arcos estão muito bem colocados, e que tudo quanto a Catedral apresenta é muito belo. Mas se tomamos, por exemplo, o altar do fundo, vemos como ele é pequeno em comparação com o tamanho da igreja, e como fica um espaço em cima, provavelmente destinado ao arejamento e à entrada de luz, mas que não traz nenhuma ideia piedosa. São meras janelas.

Se fosse uma arquitetura elaborada segundo outra escola artística, essas colunas teriam, em cada ângulo, um nicho com a imagem de um Santo portando seu instrumento de martírio. Ali não: tem-se a impressão de que uma tropa de ladrões entrou e roubou os ornatos da igreja.

Minha posição pessoal diante do monumento: respeito, admiração, vejo inegavelmente grandes valores artísticos, mas minha afinidade não vai para isso. A mania do despojado parece-me conter uma censura a Deus que não fez um universo despojado. É bonito que apareça, de vez em quando, alguma coisa despojada. Com isso eu concordo. Mas que haja a mania do despojado, com isso eu não posso concordar. E é como se apresenta a arte florentina.

Os entusiastas do despojamento dirão: “Mas Dr. Plinio, assim aparece melhor a linha lógica”. Eu respondo: “Está bem, mas nem tudo que aparece melhor é bem feito”. Isso é para pessoas incapazes de perceber a linha dentro da pluralidade dos ornatos. Não julgo que eu esteja afligido por esse mal. Em uma obra de arte com uma muito bela linha e lindos ornatos, estes não estragam a linha.

Residência de uma antiga família transformada em hotel

Ainda em Florença, mas nos arrabaldes da cidade, há um hotel excelente. Ao que tudo indica trata-se da residência de uma antiga família de banqueiros — Florença foi um centro bancário muito grande — ou de nobres que viviam fora da cidade na opulência, e cuja propriedade foi transformada em hotel.

A mim, que impressão dá? Como se trata de uma casa de uma família — seja de nobres ou de banqueiros — portadora de certa tradição, esta eleva e dignifica a vida de família, porque dá a ela uma nota de eternidade. A família percebe melhor as obrigações que lhe impõe um grande passado ao qual se sente ligada. Os mortos parecem ornatos dos vivos. E por outro lado, os que estão para nascer parecem a luz que entra para a família, a qual vive há séculos e pretende viver séculos ainda, na beleza de uma grande continuidade familiar.

Vemos ali uma casa grande construída para se levar uma vida de família, não como se entende hoje, dentro de um apartamento, mas com quartos de dormir grandes, salões espaçosos; uma residência feita para que se passe muito tempo nela, com conforto, tempo para pensar, ler, conversarem uns com os outros, para formarem grupos de dois ou três e irem passear pelo jardim que, aliás, é magnífico.

Podemos imaginar a magnificência de uma recepção dada numa propriedade como essa, à noite, com orquestra tocando, senhoras e senhores com trajes de gala, condecorações, desse tipo de recepções com tanta categoria que até os prelados do lugar apareciam. Então a hora da chegada do grão-duque, do cardeal-arcebispo, de tal autoridade militar, de tal grande artista que vai cantar, outro que vai acompanhar ao piano… Tudo isso em meio à conversa que rumoreja, enquanto incessantemente garçons fazem circular grandes pratos com pequenas delícias, bandejas repletas com taças e garrafas com bebidas. Se a noite é quente, uma parte dos convidados sai e conversa também do lado de fora.

Tudo isso foi transformado em um hotel muito bem mobiliado, onde se paga para estar, e no qual um turista anônimo entra, mete-se nas cobertas durante a noite, e no dia seguinte sai.

Notem o conforto, a estabilidade, a dignidade. Não é verdade que uma família como essa pareceria estar destinada a durar séculos? Entretanto, está morta, como uma concha que se encontra na praia, na qual o respectivo caramujo morreu. Por que morreu? Porque essa gente toda foi rompendo com Aquele que disse de Si mesmo: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida” (Jo 14, 6).

Paganizou-se, estancou.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 23/11/1988)

 

Rainha e Mãe de misericórdia

As primeiras palavras da Salve-Rainha inspiram a quem as recita a plena confiança de que será atendido, apesar de suas misérias.

 

Pediram-me para fazer o comentário da Salve-Rainha. Devido ao pouco tempo de que disponho, vou comentar apenas as primeiras palavras desta bela oração: “Salve Rainha, Mãe de misericórdia…”

Rainha que tudo tem e tudo pode

Salve, em latim, é uma saudação, e passou assim para o português. Os latinos costumavam dizer salve como saudação, sem nenhum nexo e sentido com a ideia da salvação, “salvai-me”. Não é isso, é uma mera saudação. Então, “eu Vos saúdo”.

Agora vem outro ponto: “…Rainha, Mãe de misericórdia”.

Vemos aqui uma harmonia muito bonita. O autor da oração coloca antes de tudo o título d’Ela de Rainha.

Nossa Senhora é Rainha? Evidentemente, Ela o é, pois é a Mãe do Rei, e um Rei que faz tudo quanto Ela deseja.

Maria Santíssima é chamada a Onipotência Suplicante. Ela, de Si, é uma criatura humana como nós, mas a súplica feita por Ela é onipotente, porque pode tudo diante de Deus.

Assim, também enquanto suplicante, Maria é Rainha, porque Aquela que pode tudo é Rainha. Então, vem desde logo uma ideia posta ao alcance do fiel: Aquela a quem ele vai se dirigir é uma rainha; logo, Ela tem e pode tudo.

A rainha e o rei são de uma riqueza enorme. Normalmente são as pessoas mais ricas do reino, que dispõem da maior soma de poderes, honrarias e riquezas de toda ordem. Ela é a Rainha, quer dizer, tudo quanto Lhe peçamos Ela pode dar.

Ademais, Deus, que é o Filho d’Ela, concede tudo quanto sua Mãe insondavelmente perfeita Lhe pede. O resultado é que, quando pedimos alguma coisa a Ela, temos a certeza de que Ela pode dar, porque Ela tem. Isso nos leva a nos encher de confiança no nosso pedido.

Não há carinho como o materno

Mas vem logo depois: “Mãe de misericórdia”.

Mãe já traz consigo a ideia de misericórdia, porque o mais misericordioso e compassivo dos entes, numa época em que a instituição da família funcione normalmente, é a mãe. Mesmo o pai pode ser muito bom e seu afeto é indispensável para completar a educação do filho. Mas o carinho é com a mãe.

Lembro-me de ter assistido, certa vez, a uma cena minúscula em casa, entre meu pai e minha mãe.

Eu costumava, naquele tempo, sair logo depois do almoço para meu escritório de advocacia. Minha mãe me acompanhava até a porta do elevador, junto à qual tem uma escada. Às vezes eu estava com muita pressa e me impacientava com a lentidão do elevador, e descia a escada a toda pressa. Lembro-me de que, enquanto eu descia, ouvia minha mãe dizer: “Filhão, cuidado com o corre-corre.” Era um último sinal de carinho.

Mas um dia desci muito precipitadamente e esqueci um objeto em casa. Chegando na rua, senti falta do objeto e voltei para apanhá-lo. Passei ao lado de uma pequena sala de estar onde ela e meu pai costumavam ficar durante o dia. Estavam conversando, certos de que eu tinha ido embora.

Meu pai estava sentando numa poltrona e minha mãe, em pé junto a ele, dizia:

— João Paulo, hoje para o jantar eu mandei fazer tal prato. Você acha que o Plinio ficará satisfeito ou seria melhor preparar outra coisa?

Não parei para olhar, mas tive a impressão de que meu pai estava louco para tirar uma sesta, e respondeu negligentemente que estava bem.

Não satisfeita com a resposta, ela acrescentou:

— Não, mas quem sabe se fizer de tal outro jeito seria melhor.

— Também está bem — respondeu ele.

Como ele estava querendo dormir e ela continuava a insistir, ele disse:

— Bem se vê que mãe é mãe. Se fosse comigo eu diria: “Rapaz, tem aqui para jantar tal coisa, se você não quiser, vá jantar num restaurante”.

Ora, mamãe queria exatamente evitar que eu fosse para o restaurante, pelo gosto de estar e conversar comigo. É o carinho da mãe que é todo especial, único.

Mãe toda feita de misericórdia

Entretanto, não contente com esta ideia, o autor da Salve-Rainha pôs: “Mãe de misericórdia”. É uma Mãe toda feita de misericórdia.

O que quer dizer “misericórdia”? Cordis, em latim, é o coração. Miseri, os miseráveis. Portanto, para com os miseráveis Ela é “toda coração”. Os miseráveis são aqueles que não têm do que viver, estão na miséria. Porém, moralmente falando, são os pecadores que ofenderam muitas vezes a Nossa Senhora e deram a Ela razão para estar descontente. Se esses pecadores se voltarem e rezarem para Ela, encontrarão n’Ela uma Mãe de misericórdia toda disposta a atender.

Então, está tudo reunido para inspirar a maior confiança: Ela é uma rainha que tem tudo e pode tudo; é Mãe de misericórdia, “toda coração”, inclusive para os filhos mais miseráveis.

Quem pode deixar de ter toda a confiança na bondade d’Ela em que será atendido, quando faz esta oração?

(Extraído de conferência de 5/3/1992)

 

A verdadeira paz interior

Evocando o sublime exemplo da Santíssima Virgem durante a Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, Dr. Plinio nos ensina que a verdadeira paz não está na ausência da dor, das angústias nem da luta, mas na tranqüilidade que brota da ordem.

Na Ladainha Lauretana, Nossa Senhora é invocada como a Regina Pacis, Rainha da Paz. Procuremos analisar o significado mais profundo desse título que a devoção católica atribuiu à Santíssima Virgem.

A paz referida nessa invocação pode ser considerada sob dois aspectos. Em primeiro lugar, a do íntimo das almas; segundo, a exterior, isto é, da sociedade.

Conceito errôneo de paz interior

Para compreendermos a primeira acepção, devemos antes tomar em conta que diversos conceitos e palavras atinentes a assuntos de piedade sofreram, ao longo dos últimos tempos, ponderosas distorções no modo de defini-los.

Assim, costuma-se julgar que a paz interior de uma pessoa consta de dois elementos. Ela não é assaltada por nenhuma tentação, nem se vê, portanto, às voltas com lutas internas. Sua vida espiritual é tranqüila, distendida, agradável, sem problemas. Essa pessoa se assemelharia a alguém que está sentado dentro de um helicóptero em ascensão, no qual, sem qualquer esforço, chega ao céu com toda a paz.

Em conseqüência, ela não tem nenhuma cruz ou sofrimento. Não tem angústia a propósito de doenças, de carências materiais ou por dificuldades familiares. Para ela, tudo transcorre numa serena e perfeita ordem, sem atritos nem adversidades com os quais tenha de lutar.

Tal é o conceito corrente de paz interior.

A paz externa, fruto da prosperidade econômica?

Vejamos agora a idéia comum que se tem de paz externa.

O Papa Pio XII tinha como lema do seu brasão pontifício esta frase tirada de Isaías (32, 17): Opus Iustitiæ Pax — A obra da justiça é a paz. Ora, segundo a noção hoje propalada, a paz não é a obra da justiça, da virtude, mas de uma certa prosperidade materialista. Importa, antes de tudo, a estabilidade econômica, as contas bancárias de todos conservadas e nutridas, as aposentadorias asseguradas, as pessoas alimentadas, com o conforto e bem-estar diários garantidos. Não há brigas por questões pecuniárias, todos vivem alegres e tranqüilos. Então a paz reina na nação.

Quando todos os povos se encontrassem nessa feliz situação, alguns imaginam que não haveria confrontos internacionais, nenhum país desejaria agredir outro e a população mundial levaria uma existência calma e pacífica.

A Rainha da Paz não teria padecido angústias

De acordo com esse equivocado conceito, a devoção a Nossa Senhora Rainha da Paz consistiria em cultuar a Mãe de Deus enquanto protetora desse róseo estado de coisas, pois é o modelo da pessoa que nunca teve provações, angústias, dores. Ela foi concebida sem pecado original e, portanto, sua vida inteira foi muito calma, sem dificuldades. Teve um Filho e um marido muito bons, residiu numa pequena cidade chamada Nazaré, onde não havia atrito de nenhuma espécie, e Ela passava seus dias inteiramente desanuviada.

Verdade é que seu Filho, a certa altura, sofreu e Maria, durante a Paixão, experimentou algum desgosto, do qual logo se recuperou, resignada. Pouco depois Ela O viu subir aos céus, e se alegrou ao perceber o Filho bem colocado. Acabaram-se os problemas, Ela passou o resto de sua vida na tranqüilidade doméstica, sob os filiais cuidados do apóstolo João.

Esse é o ideal de certas mentalidades, quando falam de Nossa Senhora da Paz.

Um predicado que não exclui lutas e sofrimentos

Ora, a procura de uma correta interpretação desse título mariano nos levaria a considerar que a primeira notícia de Nossa Senhora nas Sagradas Escrituras no-La mostra como adversário do demônio, e como Aquela que esmagaria a cabeça da serpente: “Porei inimizade entre ti e a mulher”, disse Deus à víbora, entre tua descendência e a dela” (Gn, 3, 15). Ou seja, há uma atitude fundamental de repulsa e de combate ao mal naquela que é invocada como Rainha da Paz.

Além disso, como se infere das palavras divinas, todas as lutas travadas pela Igreja e pelos católicos contra os adversários da Fé têm na mulher, isto é, em Nossa Senhora, o primeiro exemplo de coragem e de força para vencê-los.

Então, se a paz fosse simplesmente ausência de luta, como a Virgem Maria seria a Rainha da Paz?

Mais ainda. Se a paz consiste em não ter sofrimento nem angústias, como explicar as palavras de Simeão dirigidas a Nossa Senhora, segundo as quais um gládio de dor transpassaria o coração d’Ela?

Na verdade, Maria sofreu um dilúvio de dores na Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ela viu surgirem e crescerem as antipatias, as animosidades e o ódio em relação a seu Divino Filho; d’Ele ouviu a predição de que sofreria e morreria crucificado, e não O abandonou um só instante, acompanhando-O e partilhando de seu martírio até o Consummatum est no alto do Calvário, até a deposição do Corpo sagrado na sepultura. E tudo Ela sofreu numa atitude de luta e de paz, para a redenção do gênero humano, para esmagar o demônio e vencer a morte.

Assim, a autêntica noção de paz não exclui a luta nem o sofrimento. E onde está a Rainha da Paz, está a inimizade contra a serpente e contra o mal.

Possui a paz quem deseja a ordem

O que é a paz?

Segundo a definição de Santo Agostinho, a paz é a tranqüilidade da ordem. Quando uma alma possui firme propósito de se manter em ordem, custe o que custar, embora enfrentando as maiores dificuldades, angústias e perturbações, ela tem a paz. Por isso diz São Francisco de Sales que Nosso Senhor Jesus Cristo, no Horto das Oliveiras, não perdeu a paz nem a alegria na fina ponta de sua alma, porque estava disposto continuamente a cumprir seu dever.

Do mesmo modo podemos afirmar que Nossa Senhora não deixou de ter paz nem mesmo no Calvário, pois seu espírito estava em ordem, realizando sua missão de Co-redentora da humanidade.

Portanto, quando a ordem vence e incute, quer interna, quer externamente, sua tranqüilidade própria, ainda que em meio a uma série de lutas e sofrimentos, a paz impera. Tanto mais vigorosa e resoluta, quanto maiores as dificuldades em face das quais deve se afirmar. Esse conceito se aplica às instituições, aos povos e à vida espiritual de cada pessoa.

Paz de fundo de alma, mesmo na “amargura muito amarga”

Aplica-se, sobretudo, como acima evocamos, ao Divino Redentor e à sua Mãe Santíssima, em cujos lábios a piedade católica colocou aquelas palavras do profeta: “Eis na paz minha amargura muito amarga” (Is 38, 17).

Ao tecer essas considerações, longe estou de pretender que não se deve apreciar as épocas de tranqüilidade, ou as horas de distensão e bonança que a Providência nos permite desfrutar em nossa vida. Antes, devemos pedir a Deus, por meio de Nossa Senhora, que nos conceda essas épocas de “respiração”, onde não haja dores ou dificuldades. Contudo, não podemos fazer disso o ideal da paz, pois sabemos que são momentos de consolações no meio de lutas e trabalhos. Como os tiveram, aliás, Nosso Senhor Jesus Cristo e sua Mãe em Nazaré, em casa de Lázaro, Maria e Marta, etc.

Assim, ao invocarmos a Rainha da Paz, peçamos a Ela que imprima bem vivo em nossa alma o amor à paz verdadeira que é a tranqüilidade da ordem, e não a ausência da dor e da luta. E quando nos acharmos opressos por dificuldades, roguemos-Lhe que nos conceda, complementarmente à paz interior alicerçada na ordem, alguma distensão, dispondo circunstâncias propícias que nos façam respirar um pouco na vida.

É um pedido legítimo que, estou certo, Ela atenderá com a abundância de sua maternal misericórdia.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 10/7/1964)
Revista Dr Plinio 124 (Julho de 2008)

Guerra de tendências

A vida de Dr. Plinio, analisada à luz da batalha das tendências por ele travada e transposta para a história dos povos, permitiu-lhe formar princípios dos quais deduziu uma teoria e com esta elaborou o livro “Revolução e Contra-Revolução”, que constitui, em grande parte, as memórias dele.

A primeira sensação que tive, relacionada com a Revolução tendencial, foi a da pressa. Entre a geração de mamãe e a minha havia uma intermediária, de primos. Dona Lucilia tinha, em números redondos, trinta anos a mais do que eu. Assim, entre ela e mim havia primos quinze anos mais velhos do que eu, parentes e vários amigos da família.

Choque entre dois modos de ser

Pouco depois de Dona Lucilia, começava a aparecer uma geração na qual a alegria do viver estava deslocada. Não era mais o bem-estar daquela placidez, com tempo diante de si, mas uma forma de vivacidade que consistia em andar e falar depressa, em estar continuamente alegre, satisfeito, em contar coisas tendentes ao engraçado, ao divertido, ao sensacional.

Eu presenciei, mas de forma confusa, o choque desses dois modos de ser e notei que, ou me engajava nesse modo de ser novo e mudava minha personalidade, abandonando essa placidez e tomando esse trem que ia para a frente, ou seria tido como sem graça por essa gente nova. Era toda uma orquestração tendencial que ia nascer, na qual a estabilidade fecunda, pensativa, forte, mas compassada, cedia lugar ao corre-corre em busca de prazeres, agitação e excitação.

Conferi esse modelo comigo mesmo, perguntando-me, entre outras coisas, se me adaptaria a isso. E pensava: “Eu não sou assim. Sou tranquilo, gosto das coisas plácidas e que andam passo a passo. Não quero essa alegria saltitante.”

Por exemplo, via determinada pessoa entrar em casa assobiando a última música da moda. Alguém perguntava:

— Que música é essa?

Gargalhada…

— Ah, você não sabe?! É tal música assim.

E sentava-se com uma cara radiante, quando eu não via razão para estar radiante. Aliás, não vejo nenhuma necessidade de passar a vida radiante, mas sim de modo tranquilo. É uma coisa completamente diferente. E concluía: “Não tenho embocadura para isso. Se fosse meter-me nisso, falsearia minha personalidade. Mas, pior, não se deve ser assim. Deve-se ser como quem? Como mamãe. Ali está certo, está direito, está bom…”

Estabelecia-se entre mim e os adeptos da nova mentalidade um diálogo de surdos que terminava amavelmente porque todo mundo era amável, mas com um pensamento assim na cabeça deles: “Esse menino não tem jeito… É um desmancha prazeres mesmo!” E eu com outra reflexão: “Essa gente não tem jeito. Não se pode viver perto deles. Eu vou destoar mesmo.”

Mecanização geral da vida

Essa impressão acentuou-se à medida que a influência do pós-guerra, carregada de vida mecânica, se intensificou. Em São Paulo, os carros puxados a cavalo foram ficando mais raros, enquanto os automóveis e bondes mais numerosos. A mecanização geral da vida foi entrando e dando um ritmo mais apressado a todas as coisas.

Fiquei colocado diante da seguinte situação: eu tinha tendência à lentidão e à preguiça. Sentia a preguiça como uma espécie de peso em cima de mim, que me tornava todos os movimentos lentos, lerdos, pesados, desagradáveis, e me fazia encontrar gosto na inação. Isso devia ser vencido por uma vida ativa. Ora, vida ativa só era possível no ritmo daquela que todo mundo levava, porque era necessário tomar o bonde, ir para o colégio, voltar correndo, ir ao dentista, depois passar por casa para fazer não sei o quê, e isso precisava ser feito dentro daquela velocidade, não tem remédio, do contrário “perdia o bonde”.

Donde uma espécie de reajuste interno tendencial para combater a preguiça, nunca permitindo deixar para mais tarde o que eu pudesse fazer logo. E começando sempre, se  pudesse optar, pelo mais desagradável. Porque para o mais agradável se tem ânimo; o difícil é fazer logo o mais desagradável, de maneira a nunca me permitir, nesse ponto, moleza nenhuma, mas dentro do corre-corre dos pés conservar a tranquilidade do modo de ser e da alma, de molde a dar, com a estabilidade antiga, uma force de frappe1 nova, juntando as duas reações.

Contraste entre a posição tendencial da pureza e da impureza

Ligada a isso, outra coisa tornou-se clara para mim: o contraste entre a posição tendencial da pureza e da impureza. A castidade tem isto de próprio: quem a vive verdadeiramente é comedido e encontra sabor em tudo, até nas menores coisas. Ela se contenta com pouco e se alegra muito com coisas pequenas; não precisa viver correndo atrás de delícias. Um pequeno prazer, um pequeno atrativo já a regozija inteira. Quando lhe acontece de receber uma delícia, o homem puro se alegra também e, cessada a delícia, ele não entra na depressão, mas continua a vida animado pela alegria que teve.

No homem impuro é tudo ao contrário. As alegrias pequenas não lhe satisfazem, parecem bagatelas. As coisas que se repetem lhe parecem enfadonhas. Ele só quer alegrias enormes e, quando elas passam, cai na depressão. Antes de chegar a alegria, ele fica na torcida; depois da alegria, vem a frustração. Essa é a vida do impuro. Não preciso entrar em descrições, porque todos nós vemos o mundo encharcado disso.

Eu notava muito o contraste nesse ponto entre pessoas de minha geração, em torno de mim, sonhando com maravilhas, e o desdém que tinham pelas coisas agradáveis e pequenas que a vida oferece. Eu me regozijava, às vezes, com essas coisas, mas não comentava com eles. Por exemplo: sábado à noite, tendo todo um domingo diante de mim, eu me deitava. Era o dia em que, em minha casa, se trocava a roupa de cama. A cama dava impressão de inteiramente nova; quarto tranquilo, todo revestido com um papel de parede de que eu gostava muito, um quadro de Nossa Senhora em esmalte, uma mesinha com pequenos objetos. Eu me deitava e pensava: “Como me sinto bem e estou contente! Vou ter amanhã o dia inteiro de repouso; irei de manhã à Missa, depois voltarei para casa e vou brincar com os soldadinhos de chumbo; chegada a hora do almoço, terei um superalmoço. À tarde, vou ao cinema e depois é o desfile nas confeitarias. Por fim, janto. Como é agradável deitar-me agora na previsão desse dia!”

Mas eu via os outros de minha idade indo dormir; era completamente diferente. Não tinham vontade de que chegasse a hora de repousar, queriam ficar conversando e mexendo. Era preciso ir arrancando-os para a cama, meio brigados com a governanta. A hora de dormir era triste porque iam entrar nas sombras da noite. Para mim as sombras eram amigas. Apagada a luz, eu ainda ficava ouvindo um pouco os grilos num terreno baldio perto de casa, com um cheiro de vegetação que vinha dali. Logo passava da reflexão para o sono. Contudo eu não ousava elogiar isso diante de ninguém, pois percebia que não sentiam isso assim.

A hora de levantar também me era agradável. Mas levantar sem corre-corre; sentar na cama e rezar, tomar um pouco a noção das coisas que me rodeavam: a luz que entrava pela veneziana, os sons domésticos, os ruídos da rua, a vida que começava a pulsar em torno de mim. Depois me levantava com calma e, primeira coisa: “Bom dia, mamãe!”, depois fazia minha toilette e começava a vida.

Outros se jogavam para fora da cama. Eu pensava: “Mas o que é isso? Essa eletricidade perto de mim!” Tinha vontade de dizer: “Fora!” Mas não podia, tinha de engolir por inteiro. Se fosse algum primo que ia passar a noite comigo e conversava com exagero, eu respondia pausadamente até que ele também se domasse um pouco. Outra coisa altamente apreciável para mim, mas não para ele: tomar café com leite, pão com manteiga. Não tinha geleia, nem queijo, nem outras delícias. Era o comum. Mas um pão no qual se sentia o bom gosto do trigo, uma manteiga feita do genuíno leite, passada abundantemente sobre o pão. Um prazer simples, mas cheio de suco para uma alma equilibrada.

Uma espécie de xadrez humano

Eram tendências que se chocavam. Resultado: eles gostavam de brigar, eu detestava a briga. Discussão, sim, é agradável, pois entra o florete do argumento. A meu ver, é a mais bela forma de esgrima que o espírito humano excogitou. É lindo! Disso eu gostava. Mas, brigar…! Então um diz para o outro: “Eu te parto a cara!” Que intenção é essa? “Primeiro, com a minha não pode. A sua, não tenho o menor intuito de partir, pela simples razão de que não perco tempo com ela. A sua cara me desinteressa do modo mais total possível. Nem sequer para quebrar, ela me importa. Concebo bem que você tenha as mesmas disposições a meu respeito. Portanto, cada um com sua cara, e não quebre a do outro.”

O senso da hierarquia, muito desenvolvido em mim, vinha de todo o ambiente doméstico de que falei, marcado pela recusa à pressa. No momento em que recusei a pressa revolucionária, preservei dentro de mim o senso da hierarquia. Porque a vida com pressa é feita sem hierarquia, as pessoas não têm hierarquia de valores e, no convívio, não existe a hierarquia de pessoas. Elas se cortam a palavra umas às outras. E me causava muita estranheza exatamente a vida igualitária dos meus companheiros de colégio.

Ficam assim apresentados alguns problemas com os quais me deparei ainda em pequeno: uma escolha e uma definição temperamental e tendencial; um choque entre uma posição e outra; depois esses choques se multiplicam, porque a posição inicial se desdobra em posições afins, tanto de um lado quanto de outro, formando uma guerra de tendências.

Então, havia pessoas com as quais eu estava em guerra total, ou seja, eram completamente opostas a mim. Elas percebiam isso, como eu também, e inaugurava-se uma verdadeira batalha, disfarçada pela educação comum. Quer dizer, não se podia mostrar, mas havia luta.

Eu notava também a existência de indivíduos divididos tendo, em parte, tendências boas que afinavam comigo e, em parte, tendências más que afinavam com a Revolução. Esses constituíam uma “terra de ninguém” entre os dois extremos de tendências opostas, e que estavam na guerra total, procurando acentuar nos intermediários as tendências afins para puxá-los ao seu próprio campo, constituindo uma espécie de xadrez humano. Eram a Revolução, a Contra-Revolução e o semicontrarrevolucionário, apresentados tendencialmente e já entrevistos no tempo de pequeno. Assim, minha vida de criança e de mocinho era levada nessa batalha das tendências, mas sem uma conscientização inteira.

Montando um vocabulário como quem confecciona uma joia imensa

Que papel faz dentro disso a conscientização?

Por incrível que pareça, sentia tudo isso em pequeno, mas, foi tal a inibição causada pelo fato de ninguém aludir a tais considerações, que só vim a explicitar essas coisas mais ou menos a partir dos meus vinte e cinco anos, e devagar. Implicitamente, eu tinha torrentes disso; porém, não saberia explicitar para os outros, como não saberia fazê-lo para mim. Ademais, para saber por em termos é preciso ter toda uma linguagem. É quase outra ordem da realidade e outra paragem do espírito humano, que exige um vocabulário próprio para se chegar a explicitar.

Esse vocabulário não se procura no dicionário. Encontra-se testando: “Tal palavra serve, tal outra não serve. O que quer dizer essa, o que quer dizer aquela?” No uso do dia a dia, reter as palavras: “Essa serviu para explicar tal coisa, vou reter; aquela outra palavra vai me servir, mas em tal ocasião…” Assim ir montando o vocabulário como quem monta uma joia imensa, com milhares de pedras preciosas ou semipreciosas, para poder explicitar essas coisas. Isso não faz uma vida mole, mas uma existência sumamente entretida. No dia em que o homem pode dizer antes de dormir: “Hoje encontrei uma palavra!”, esse foi um dia positivo na vida dele.

Quando explicitei isso para mim mesmo, consegui montar as regras que instintivamente eu tinha seguido. Então, em grande parte, a obra Revolução e Contra-Revolução constitui minhas memórias. Não que eu tenha pensado naquela ordem teórica, histórica, filosófica. Esses pensamentos não afloraram em minha cabeça assim, mas constituíam um magma fecundo no qual as ideias iam se ordenando.

As batalhas internas de um povo são parecidas com as de uma alma

Em sentido figurativo, cada povo tem uma cabeça, um espírito, uma alma, à maneira de um homem: o que neste são tendências diversas, naquele são partidos políticos, correntes filosóficas ou artísticas. As batalhas internas de um povo são extraordinariamente parecidas com as de uma alma. Logo, é conhecendo as lutas internas de nossa própria alma e da dos outros que interpretamos bem os fatos históricos.

Minha vida analisada e reanalisada à luz da batalha das tendências por mim travada, e transposta para a história dos povos, permitiu-me uma remontagem da minha experiência, formando princípios, dos quais deduzi uma teoria e com esta elaborei um livro.

Neste sentido, esse livro constitui as minhas memórias, mas não só. É a minha previsão. Porque, como na luta das tendências, percebi, com a ajuda de Nossa Senhora, quais eram as regras do jogo, daqui por diante sei como esse jogo deve continuar. Sempre aprenderei algo de novo, porque as tendências são insondáveis, e não presumo esgotá-las. Qualquer alma humana tem um fundo incognoscível. Entretanto, é possível conhecer muita coisa e, por aí, saber o traçado do futuro. A previsão política é, em boa medida, a análise de como estão as tendências hoje e no que elas vão dar amanhã. Com isso, a previsão política é fecundada como a água fecunda a raiz de uma planta. Na raiz do pensamento previsor está o conhecimento das regras das tendências. Essa é a vantagem de conhecer as tendências.

Entretanto, todas as coisas verdadeiramente muito elevadas são passíveis de serem exploradas. Por exemplo, a música. Quanta coisa magnífica se faz com ela, mas também quanta vilania! Todas as artes são assim. Ora, agir nas tendências é uma arte; logo, pode ser tomada para o melhor e para o pior.

Onde está a dignidade disso? Quando se vive toda essa intensa vida das tendências, há determinados momentos em que o espírito se distancia desse jogo e faz a pergunta: “Mas, afinal, o que aqui é verdade, o que é erro? O que é bem, o que é mal?” Passo, então, a fazer disso uma análise lógica, com argumentos, raciocínios, para saber como uma coisa se costura na outra. E faço, eu mesmo, a crítica do meu pensamento para verificar se ele enfrenta as objeções. Então, vemos surgir, à maneira de um píncaro de neve sobre uma montanha muito verde, a lógica fria, rutilante e, dentro da sua frialdade, espelhando melhor o Sol do que a relva nas encostas da montanha. E podemos formular a teoria.

Um modo de ser eminentemente hierarquizante

Por exemplo, eu tenho um modo de ser eminentemente hierarquizante. Não basta dizer que possuo esse modo de ser para provar que é justo que isso seja assim. Quem me dá o direito de ser assim? A ordem natural das coisas feita por Deus é assim? Se for, então é bom que eu seja assim. Do contrário, não é bom. Porque a medida de todas as coisas de nenhum modo sou eu, que fui criado por Deus. A medida de todas as coisas é Ele. O que Ele ensinou a esse respeito? Por que Ele ensinou? Qual foi a intenção d’Ele?

E aqui entraria a teoria esplendorosa, magnífica, de São Tomás que contraria o igualitarismo. Explica o Doutor Angélico que, ao criar seres que refletissem suas infinitas perfeições, Deus não poderia fazer um único ser, porque qualquer criatura é tão insuficiente para realmente espelhá-Lo que ela seria caricata.

Mas essas criaturas, por sua vez, para O refletir têm que ser diferentes umas das outras. Se Deus criasse dois seres iguais, Ele cometeria o erro que um gago pratica quando pronuncia duas sílabas inúteis: “Eu que-quero.” Porque na palavra humana cada sílaba tem um som. O resto é linguagem de criança, ou de uma pessoa que não tem a locução normal, bem construída. Então, por causa disso, Deus formou criaturas diferentes, e assim sendo, criou-as desiguais, pois não há seres diferentes sem que um seja superior ao outro em algum ponto. Logo, ou não haveria Criação, ou existiria hierarquia.

Então, Gloria in excelsis Deo! (Lc 2, 14). No fim, o cristal de rocha do raciocínio, em arestas tomistas definidas que rutilam ao Sol, é o encanto e a glória da montanha. Assim, nos entusiasmamos tanto com as tendências quanto com o raciocínio, e glorificamos a Deus que nos deu esta riqueza: sermos verdadeiros instrumentos de música de tendências e cristais reluzentes de raciocínio.               v

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 7/7/1979)
Revista Dr Plinio 257 (Agosto de 2019)

1) Do francês: força de ataque.

Santo Inácio de Loyola – A coerência sem meios termos

Uma conversão assumida com extraordinário vigor de espírito, a santidade abraçada e levada às suas últimas conseqüências: na vida de Santo Inácio de Loyola a força de vontade e as atitudes extremas foram uma constante, e sua inflexível coerência constitui, no dizer de Dr. Plinio, a nota mais bela da existência do grande Fundador da Companhia de Jesus.

 

Santo Inácio de Loyola nasceu em 1491, na casa-torre dos senhores de Loyola, em Azpeitia, norte da Espanha. Era o décimo terceiro filho do casal e entrou aos l9 anos como pajem na corte do Rei Fernando V. Dotado de temperamento ardente e belicoso, a carreira das armas o seduziu. No cerco de Pamplona foi gravemente ferido na perna. Durante longa convalescença, por falta de livros de cavalaria, que o apaixonavam, deram-lhe para ler a Vida de Jesus Cristo e dos santos. Tal leitura foi para ele uma revelação. Compreendeu que  a Igreja também possuía sua milícia, a qual, sob ordens do representante de Cristo, luta para defender na Terra os interesses sagrados do Deus dos exércitos.

Cavaleiro de Cristo e da Igreja militante

Na célebre abadia de Montserrat, Inácio depõe a espada aos pés da Santíssima Virgem e sua alma generosa, outrora seduzida pela glória mundana, não mais aspira senão  pela maior glória do grande Rei que doravante servirá. Na noite da Encarnação, a 25 de Março, depois da confissão de suas faltas, fez a vigília de armas e pela Mãe de Jesus é armado cavaleiro de Cristo e da Igreja militante, sua esposa. Será em breve general da admirável Companhia de Jesus, suscitada pela Providência para combater o protestantismo, o jansenismo e o paganismo renascente. A fim de conservar em seus filhos a intensa vida interior que supõe a atividade militante à qual os destina, Santo Inácio lhes dá uma forte hierarquia e lhes ensina, em magistral tratado aprovado pela Igreja, seus Exercícios Espirituais que têm santificado milhares de almas.

Tudo para a maior glória de Deus

O lema que santo Inácio escolheu para sua milícia foram: “Ad Maiorem Dei Gloriam — Para a Maior Gloria de Deus”. Eis toda a sua santidade. E o fim da Criação, o fim da elevação do homem ao mundo sobrenatural, o fim dos preceitos do Evangelho em que almas generosas renunciam às coisas lícitas para se ocuparem mais livremente dos interesses de Deus e para lhe darem essa totalidade de glória acidental, cujo uso pelos homens, de coisas ilícitas, O havia privado. A 13 de julho de 1556 morre Santo Inácio, pronunciando o nome de Jesus. Sua Companhia, espalhada pelo mundo inteiro, contava então dez províncias e cem colégios.

Homem de decisões extremas

Sobre a vida de Santo Inácio de Loyola, cujos aspectos constituem um conjunto sobremodo arquitetônico e rico, poder-se-ia tecer inúmeros comentários. Entretanto, gostaria de ressaltar um lado que me parece ser a nota mais bela de sua existência, o ponto pelo qual ele brilhou especialmente no firmamento da Igreja.

Refiro-me à sua força de vontade e de decisão que o fazia tomar, em todas as suas atitudes, a posição mais extrema, mais aguda, aquela que chegava ao fim último, sem meios termos.

Tomemos em consideração, por exemplo, o conhecido episódio de sua perna quebrada no cerco de Pamplona. Não se pode conceber algo de mais tremendo do que um homem, então mundano e voltado para as honras terrenas, ao se ver na contingência de mancar para o resto da vida em virtude de um erro ortopédico, decidir mandar quebrar de novo o osso imperfeitamente consolidado para que a perna ficasse em ordem. E isto porque, pelos cânones da elegância naquele tempo, um fidalgo capenga seria malvisto na corte e teria sua carreira política e militar prejudicada.

Ora, Inácio de Loyola encarou de frente o futuro que essa deficiência lhe traçava. Pesou tudo em sua crueza: “Quero viver na corte, desejo seguir a carreira militar. Se eu ficar coxo de uma perna, não brilharei entre meus pares, não dançarei, não terei valor algum como soldado. Ora, devo lutar, devo luzir na corte. Se não me livrar dessa carência física, minha vida está rateada. Então, vamos quebrar de novo esta perna!”

Imaginemos agora um cirurgião munido dos instrumentos e métodos ortopédicos daquele tempo, desferindo pancadas sobre um osso mal jungido, rompendo-o e ligando-o de novo. O que isso significava de dolorido e dramático, só quem o sofreu pode saber!

Em seguida, os longos dias e as horas intermináveis de inércia num leito, aguardando a consolidação do osso e a recuperação dos movimentos da perna, seriam horrivelmente enfadonhos para aquele homem super-ativo, afeito a batalhas e grandes realizações.

Vê-se nessa atitude a decisão extrema do homem que mediu tudo e resolveu aceitar um sacrifício momentâneo em prol de seu futuro brilhante. Excluindo-se os motivos meramente mundanos que o levaram a essa situação, percebe-se naquele Inácio de Loyola o senso da preeminência do definitivo sobre o efêmero, uma fibra de alma para enfrentar tudo que fosse preciso e uma capacidade de olhar os problemas de frente que nos deixam admirados.

Santidade levada às últimas conseqüências

O mesmo vigor de espírito, a mesma força de decisão e de vontade ele empregará no momento de se converter e abraçar o chamado de Deus. Homem mundano e militar vaidoso, esquecido das coisas do Céu, sente-se tocado de modo irresistível pela graça e, como procedera em relação ao defeito físico, medita nas suas lacunas morais: “Tenho de encarar de frente as verdades eternas, o Céu, o inferno, a salvação ou a condenação. Recebi graças, compreendi como o ser autêntico católico significa dedicar-se ao serviço de Deus, a amá-Lo sobre todas as coisas nesta Terra e na eternidade. Não ser assim é procurar apenas a felicidade transitória do mundo, mas também o infortúnio e a injúria a Deus. Essa é a verdade, e tenho de encará-la.

“Devo tirar todas as conseqüências que daí pendem para mim, Inácio de Loyola, e estas consistem em seguir a voz da graça que me pede, à vista dessas considerações, uma completa mudança de vida, vivendo ao contrário do que até agora vivi, construindo para mim uma existência feita de abnegação, de humildade, mas, sobretudo, de coerência. Serei coerente até o fim na verdade que considerei e abracei por inteiro”.

E temos, assim, o programa de vida magnífico de Santo Inácio de Loyola. Ele não recuou diante de nada e empreendeu tudo quanto foi necessário para levar essa coerência até os últimos limites. Recordemos, por exemplo, o fato de ele se pôr como um mendigo, sujo e maltrapilho, pelas ruas de sua cidade, sendo reconhecido pelos seus antigos amigos fidalgos que o interpelavam com risos sarcásticos nos lábios:

— Sois vós, Inácio? O que aconteceu?

— Faço isto por amor a Deus e em reparação de meus pecados.

Os outros riam mais alto e se afastavam. Se nos colocarmos, cada um de nós, na pele de Santo Inácio em semelhante situação, numa rua de nossa cidade natal, poderemos talvez aquilatar o que essa atitude representava de vitória sobre o amor próprio e os apegos mundanos.

Pouco depois, ele funda a Companhia de Jesus, obra minúscula, constituída de meia dúzia de discípulos, com a intenção de deter a avalanche da reforma protestante pela Europa do século XVI. Santo Inácio decide realizar essa coisa extraordinária: uma ordem militar, no sentido mais elevado da palavra, para opor barreiras ao inimigo da Igreja.

Mais uma vez, é a eterna coerência levada às últimas conseqüências. Ele empreende a obra jesuítica, levanta diques à Revolução e, afinal de contas, consegue salvar e preservar vastos territórios do mundo católico.

Tratado da coerência humana

Esse espírito coerente levado até o fim, esse tratado da genuína coerência humana se acha expresso nos célebres Exercícios Espirituais escritos por Santo Inácio. Da primeira à derradeira linha, tudo neles não é senão o ver os problemas de frente, sem nenhuma mitigação covarde.

Poder-se-ia distinguir, nos Exercícios Espirituais, duas gamas de coerência levadas ao último ponto: uma, que é o pólo de todas as outras coerências, exprime-se pelo direito soberano de Deus, de Nosso Senhor Jesus Cristo e da Santa Igreja Católica, de serem amados sobre todas as coisas pelos homens; a segunda se traduz pela desconfiança a nosso próprio respeito, pela consideração da maldade de toda criatura humana concebida no pecado original, pela falta de lealdade que cada um tem para consigo mesmo e nossa desonestidade em assumirmos os bons propósitos — o que, tudo, deve ser visto igualmente de frente e até o fim.

Na junção dessas duas gamas de coerência temos uma obra característica da alma de Santo Inácio. Encontra-se ali uma super-coerência que só as almas autenticamente virginais possuem, e constitui para nós um indizível modelo de pureza de intenção, aliada à pureza do corpo.

Pedir a graça de sermos coerentes na santidade

Assim sendo, para concluir esses comentários, creio oportuno invocarmos a intercessão de Santo Inácio de Loyola, rogando a ele nos obtenha a graça de o imitarmos nessa sua extraordinária coerência. Que tenhamos, como ele, a coragem de vermos nossos defeitos de frente, por piores e desagradáveis que sejam, e, como ele, tenhamos a coerência sem meios termos para abraçar a verdade inteira, a virtude completa, o caminho da santidade levado até as últimas consequências.

Claro está, sem a graça divina nada alcançamos. Sem a infalível proteção de Maria Santíssima, dificilmente vencemos nossa maldade e nossas fraquezas. Porém, rezando e confiando nesse patrocínio de nossa Mãe celeste, nossas defecções e debilidades serão sobrepujadas e obteremos de Deus os dons necessários para correspondermos à plenitude do que Ele deseja de nós.

Pode mesmo parecer milagroso que alguém, considerando suas misérias, chegue ao grau de virtude de Santo Inácio de Loyola. Pois devemos pedir esse milagre da misericórdia divina, uma vez que a todos os homens são franqueadas as graças necessárias para alcançarem a perfeição.

Seja essa a nossa ardente súplica ao grande Santo Inácio de Loyola em sua festa.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 30/7/1966)