A maceração da uva no lagar e o envelhecimento do mosto nos barris de carvalho são fatores imprescindíveis para a produção de um bom vinho. Além disso, a videira deve ser plantada em solo seco e pedregoso. Em suma, a videira só dá bom vinho em condições aparentemente adversas, ou seja, se “sofre”. Mas, é somente o fruto da videira que necessita de obstáculos para fazer desabrochar o melhor de si?
O vinho bem pode ser comparado ao ser humano. Cícero, grande orador latino, dizia que “os vinhos são como os homens: com o tempo, os maus azedam e os bons apuram”(1). E, de fato, tal como o fruto da videira necessita “sofrer” e “esperar” para alcançar o requinte de seu próprio sabor, assim é o ser humano: para adquirir a plenitude de sua personalidade, não requer comodidades nem prazeres, mas padecimentos e docilidade à vontade divina.
O sofrimento é, pois, um valioso bem para o homem.
Possui a natureza humana uma capacidade de sofrer que necessita ser atendida. O pior sofrimento do homem seria jamais sofrer, o que, aliás, é utópico neste vale de lágrimas. Com a dor, o ser humano sai de seu egoísmo, compreende a sua contingência e se abre para o sobrenatural. E para muitos, como ocorreu com o Apóstolo, é a dor o marco inicial do caminho da conversão para Deus.
Pois “não há coisa mais adequada para conferir nobreza à alma do que o sofrimento; e não pode haver nobreza para a alma sem sofrimento.” (Conferência de 23/4/1964)
Por isso, pode-se dizer que quem não sofreu, não viveu. Uma biografia só tem valor quando seu protagonista passou pelo crisol da dor. Diz São Luís Grignion de Montfort que “sem a cruz a alma se torna vagarosa, mole, covarde e sem coração. A cruz a torna fervorosa e cheia de vigor. Quando nada sofremos, na ignorância permanecemos. Temos inteligência quando bem sofremos”(2). Mas não precisamos ir à procura do sofrimento, uma vez que ele está a todo o momento batendo à nossa porta. Justamente na plena e conformada aceitação dele se encontra o verdadeiro heroísmo, igual ou maior até do que o das armas. Pois bem podem as dores morais ser mais penosas do que as físicas. E é a dor, somente ela, que nos faz verdadeiros heróis diante do Senhor: o sofrimento bem aceito produz o precioso vinho espiritual da santidade.
A dor moral de Nosso Senhor Jesus Cristo no Horto das Oliveiras, ao aceitar antecipadamente os indizíveis padecimentos da Paixão, foi autêntico, sublime e insuperável heroísmo. Assim, a Mãe das Dores, apesar de não ter sido tocada fisicamente, sofreu com seu Divino Filho mais do que qualquer ser humano foi capaz de fazê-lo na História, a ponto de ser chamada a Rainha dos Mártires, e ser para todos os homens modelo perfeito e autêntico de prática heroica das virtudes, ou seja, de santidade.
Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plino 164 (Novembro de 2011)
1) http://www.academiadovinho.com.br
2) São Luís Grignion de Montfort. Cântico XIX, O triunfo da Cruz – 18.