Ao cumprimentar um grupo de jovens que acabavam de se consagrar a Jesus, pelas mãos da Santíssima Virgem, Dr. Plinio descreve a beleza da alma que se abre para a vida da graça através do Batismo, passando a trilhar os caminhos da virtude, semeados de lutas, tentações e vitórias, até alcançar a santidade para a qual somos todos chamados.
A esplendorosa cerimônia na qual tantos jovens se consagraram a Nossa Senhora como escravos de amor, segundo o método de um dos maiores santos mariais de todos os tempos, São Luís Grignion de Montfort, suscita algumas reflexões que me parece oportuno serem aqui externadas.
A vida e todas as outras coisas, quando consideradas à luz da Fé, são muito mais belas do que observadas apenas com a luz elétrica ou solar. Assim, o ato que acabamos de presenciar, feito belamente na Terra, tem muito mais pulcritude se atentarmos para as realidades sobrenaturais nele contidas.
Duas maravilhas de Deus observadas no jovem
Quando se vê uma pessoa jovem trilhando os caminhos da existência com força, energia, ênfase e resolução, diz-se: “Como é linda a vida!”. Mas, a Fé nos ensina ter Deus criado o primeiro casal — Adão e Eva — que se multiplicou e povoou o mundo, transmitindo a vida a seus descendentes. Naquilo que é apenas carne, o Criador incute uma alma espiritual, imortal, constituída à imagem e semelhança d’Ele. Primeira maravilha.
A criança nasce. Pouco depois, segundo costume dos países católicos, é batizada, e uma outra vida misteriosa se soma à que já possuía. É a segunda maravilha. Antes do Batismo, tinha ela a vida da alma e a do corpo. Este último contém elementos dos reinos animal, vegetal e mineral. E sua alma espiritual é o princípio das vidas animal e vegetal que nele existe. O homem é um compêndio de tudo quanto há na criação, uma obra-prima de Deus.
A vida sobrenatural
Porém, mais magnífica é a vida sobrenatural.
Entre dores indizíveis, no alto do Gólgota, Nosso Senhor bradou: “Eli, Eli, lamma sabactani! — Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?!”, e inclinando a cabeça, disse: “Tudo está consumado”, exalando seu último suspiro. Ele morreu por amor a nós, redimiu todos os homens e nos abriu as portas do Céu.
Sendo o que deu origem a todo o gênero humano, Adão continha de algum modo em si todos os que dele deveriam descender. Por isso o pecado original atingiu a humanidade inteira e era preciso que alguém a resgatasse. A Segunda Pessoa da Santíssima Trindade se encarnou no ventre puríssimo da Virgem e habitou entre nós. Jesus Cristo, Homem-Deus, expiou por essa e todas as outras faltas dos homens, e nos obteve um tesouro maravilhoso: a graça.
Esta é um dom sobrenatural criado por Deus, que nos torna participantes da própria vida divina.
Todos nós temos a felicidade de sermos católicos, pois recebemos a graça do Batismo. E embora não vejamos com os olhos da carne, pela luz da Fé sabemos que em cada um há algo da vida de Deus.
O Altíssimo não foi criado; é o Criador de todas as coisas. A graça é uma participação criada na existência incriada d’Ele. E cada um de nós é uma tocha que arde com a graça divina. Esta é a realidade, apesar de não a percebermos fisicamente.
A grande batalha do homem
Junto com esse maravilhoso início da vida sobrenatural, começa para o homem a grande batalha de sua existência neste mundo.
Antes de receber a Primeira Comunhão, a criança aprende no catecismo os Dez Mandamentos da Lei de Deus. Como eles são belos e apaziguam a alma! Lembro-me — há tantos anos! — de quando os aprendi, decorava-os e dizia para mim mesmo: “Que coisa bonita! Não mentir, não roubar, honrar pai e mãe, amar a Deus sobre todas as coisas, não tomar em vão o Santo Nome, etc.”.
E, encantado, pensava: “Se todas as pessoas agissem assim, como o mundo seria belo e diferente do atual!”
Com mais ou menos intensidade, todos devem experimentar sentimentos desses, quando aprendem os Dez Mandamentos. Porém, por mais belos que eles sejam, ao chegar a hora de praticá-los, começa a batalha! É árduo cumprir o decálogo. Conforme a pessoa, alguns Mandamentos são mais custosos ou menos. Mas, respeitá-los integral e duravelmente… oh! que dificuldade!
Donde o ensinamento da Igreja, segundo o qual ninguém, por mais virtuoso que seja, consegue praticar estavelmente todos eles, apenas pelo esforço humano. Para isso, é preciso a graça. Ela é que nos escolhe. Não fomos nós que a escolhemos. O que éramos no momento em que fomos batizados? A maior parte, uma criança levada pelos pais e padrinhos à igreja para receber o Sacramento do Batismo. Enquanto o padre o administrava, o bebê, sem o uso da razão, pronunciava ou articulava sílabas que mais tarde seriam palavras. Ele estava tendo impressões que depois seriam pensamentos. Naquele instante, era uma simples criancinha.
Certo dia, começa o uso da razão, da vontade, e chega a hora da tentação. Tem desejo de mentir, de se encolerizar com os pais, preguiça de estudar, desobedecendo portanto à ordem recebida dos progenitores; vontade de fugir da aula…
A esse propósito, recordo-me dos meus tempos de menino, quando estudava numa sala que dava para o jardim de casa, sobre o qual deixava vagar meus olhos. Nossa governanta, “Fräulein” Mathilde, fiscalizava-me e eu pensava: “Se eu pudesse andar ou correr por esse jardim!” Primeiro, para me ver livre da aritmética ou da geografia, matérias não muito apreciadas por mim. Além disso, em vez de ficar assentado junto a uma escrivaninha, estaria respirando o aroma das flores. Mas, tinha de obedecer e continuava a fazer minhas lições.
Entretanto, há um momento em que não temos mais a presença da “Fräulein”, tornamo-nos mocinhos, ninguém nos vigia e cumprimos o dever porque a consciência diz a cada um de nós: “Os Mandamentos proíbem fazer tal coisa. Você quer ou não obedecer a Deus? Do alto do Céu Ele o vê!”
Por um lado queremos; por outro, não. E pensamos: “Como é bom estar em paz com Deus, mas, como é agradável fazer aquilo que Ele proíbe… O que escolho? Deus ou o gostoso?”
Tem início a batalha, a qual se estende até o último suspiro de vida, por mais velho que o homem morra; até o derradeiro momento de sua existência ele se acha sujeito à tentação, e se nela consentir, pode perder a própria alma.
O papel da graça nessa luta
Como se fosse a mão de Deus abrindo nossos olhos, a graça sempre nos adverte: “Meu filho, tal ato não é bom; aquele outro é correto. Veja como Eu o amo. Considere o Sagrado Coração de Jesus, o Imaculado Coração de Maria; os Mandamentos, a Igreja, o seu ensinamento; a Comunhão que você pretende receber e não pode ser sacrílega. Lembre-se da confissão que fez há pouco, na qual se comprometeu a não mais pecar. E agora, você ainda vai me ofender?
Meu filho, coragem! Força!”
A pessoa diz “não!” à tentação e progride na virtude.
(Continua em próximo número)