São Nicolau

Personagem envolto na áurea e inocente legenda natalina, São Nicolau foi um modelo de caridade cristã, desvelado benfeitor do próximo mais necessitado, ao qual prodigalizava seu auxílio, sem que ele soubesse de onde viera o inestimável socorro.

Príncipe da Igreja, sucessor dos Apóstolos, sua compaixão e generosidade o tornaram para sempre essa figura mítica, repassada de bondade e carinho, fonte das alegrias e sorrisos com que as crianças festejam seus presentes de Natal.

Também eu, quando menino, aguardava ansioso a manhã do 25 de dezembro, na certeza de que o bom São Nicolau viria durante a noite depositar aos pés de nossa cama os brinquedos que tanto desejávamos. E ele os trazia sempre…

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Santo Annon: energia e astúcia

Utilizando sapiencialmente as qualidades que Deus lhe havia concedido, Santo Annon salvou a Reforma Gregoriana que estava passando por um gravíssimo período. Sua figura nos ajuda a compreender melhor a verdadeira fisionomia da Igreja.

Santo Annon, bispo e confessor, é um dos grandes e pouco conhecidos Santos da Idade Média. A seu respeito, temos a seguinte ficha preparada por um dos membros de nosso Movimento.

Pessoa de trato verdadeiramente agradável

Santo Annon é um dos grandes santos dos primeiros anos do Sacro Império Romano Alemão. Seus altos feitos ficaram registrados não só na História, como na Literatura, pois sobre a sua vida foi escrito um poema em 876 versos, clássico da literatura medieval alemã.

Professor da escola de Bamberg, Arcebispo de Colônia e Chanceler do Sacro Império, fundador de mosteiros, a ele se deve também, em grande parte, a introdução da reforma cluniacense na Alemanha.

Era uma personalidade invulgar. De porte majestoso, bem proporcionado, seus contemporâneos o descreviam como um belo homem, grande orador, e não menor “causeur”, suas aulas e sua prosa prendiam a atenção de todos os que o ouviam, nele admirando não só a ciência, como a ortodoxia de seu pensamento. A amenidade de seu trato e a extraordinária, e mais tarde legendária, energia impunham a todos respeito e veneração.

É uma bonita descrição de um desses homens completos, muito bem constituídos fisicamente e com essa dupla qualidade: um trato muito ameno, orador, “causeur” brilhante, e homem muito enérgico. Isto demonstra quanto é verdade aquilo que o liberalismo procura ignorar: a pessoa seriamente enérgica, quando não é ocasião de usar de energia, deve ser de um trato muito agradável. E a pessoa de um trato verdadeiramente agradável, nas horas de energia, sabe ser enérgica.

O que vem a ser um trato verdadeiramente agradável? Não o de um palhaço qualquer que conta anedotas, mas é um relacionamento elevado, nobre que, ao mesmo tempo, distrai, agrada e deixa a pessoa dignificada, enobrecida. Esse era o trato de Santo Annon.

Glorioso cooperador da Reforma Gregoriana

Continua o texto:
Em 1062, num período difícil da Reforma Gregoriana, ele a salvou de uma crise que poderia ter sido fatal.

Antes de São Gregório VII, a Igreja passou por vacilações enormes, por crises, por depressões morais tremendas. E essas crises morais foram todas elas contrariadas pelo movimento de Reforma Gregoriana, que São Gregório VII, então cardeal, impôs através de vários Papas que eram discípulos dele, e depois ele mesmo, elevado ao Pontificado, com uma energia não excedida e talvez não igualada, levou à sua perfeição. A esse movimento restaura-dor, um dos maiores que tenham havido dentro da Igreja, costuma-se chamar de Reforma Gregoriana. E foi uma glória de Santo Annon ter cooperado para essa reforma.

Dificuldades em época de sucessivos papas

Com efeito, Estevão IX, o primeiro Papa eleito pelo povo romano sem consulta ao Imperador, enviou ao Sacro Império o monge Hildebrando para convencer a Imperatriz Inês, que governava na menoridade do filho, futuro Henrique IV, a reconhecer a eleição. A Imperatriz Inês, que era Condessa de Poitiers e foi educada num ambiente cluniacense, não opôs dificuldades em aceitar. Mas Estevão IX morrera antes da volta de Hildebrando. Na hora da morte, o Papa fizera o clero e a nobreza jurarem que não elegeriam um novo soberano pontífice antes de Hildebrando chegar. Não respeitando o juramento, o clero e a nobreza se reuniram logo depois dos funerais, e elegeram o Santo Padre.

São Pedro Damião, Cardeal-Arcebispo de Óstia, protestou e fugiu de Roma, indo ao encontro de Hildebrando, que estava em Florença, e logo reuniram um Sínodo. Foi eleito Nicolau II, que a Imperatriz também reconheceu. As dificuldades começaram quando Nicolau II decretou que a eleição dos Papas seria feita pelo Colégio dos Cardeais.

A nobreza romana revoltou-se. E os adversários da Reforma Gregoriana conseguiram convencer a Imperatriz de que não devia aceitar o decreto. Pouco depois morreu Nicolau II, e Hildebrando fez o Sacro Colégio elevar ao sólio pontifício Alexandre II. O episcopado da Lombardia e alguns bispos alemães, com a anuência da Imperatriz, reuniram-se e elegeram o antipapa Cádalo, Bispo de Parma, que tomou o nome de Honório II.

Quem deve eleger o Papa? Questão decisiva para o êxito da Reforma Gregoriana

Aqui estava em jogo uma questão muito importante. A eleição do Santo Padre foi, em todos os tempos, um dos elementos decisivos da política mundial, tanto mais na Idade Média, quando o mundo era muito mais católico do que hoje e, portanto, muito mais sensível a qualquer pensamento, vontade, pronunciamento ou ato do Sumo Pontífice.

Porém, se tinha importância a eleição de um Papa, outra pergunta também era muito importante: quem o elegeria? Vemos definirem-se duas tendências diversas: uma que considerava estarem os nobres e o clero de Roma habilitados a eleger o Pontífice; outra julgava que este deveria ser escolhido pelo Sacro Colégio.

Em rigor, não era contra a instituição divina que o Papa fosse eleito pelos nobres e clero de Roma. O Direito Canônico pode atribuir-lhes tal faculdade como poderia concedê-la também ao povo romano. Mas do ponto de vista da conveniência, quer dizer, para assegurar melhor a eleição de um Papa digno do cargo, era muito preferível naquele tempo — e o é em tempos normais — que a escolha fosse feita pelo Sacro Colégio, pois este representa uma aristocracia, uma elite dentro da Igreja, sendo um conjunto de clérigos considerados mais eminentes, pre-claros e seguros pelos Pontífices anteriores.

A palavra “cardeal” vem de cardo, em latim, que significa o gonzo da porta. Os cardeais estão para a Igreja como os gonzos para uma porta: sustentam-na, permitindo e facilitando-lhe o movimento. Era, pois, natural que esse escol de colaboradores dos vários Papas, participando em grau subordinado do governo e conhecendo melhor do que ninguém o ambiente eclesiástico e as necessidades da Igreja, elegessem o Santo Padre.

Isso seria certamente mais adequado do que se a eleição ficasse a cargo de clérigos de uma ordem inferior, incumbidos da direção ou do exercício de atividades na diocese mais importante do mundo, é verdade, mas voltados para problemas locais, circunscritos à Diocese de Roma; enquanto os cardeais são uma elite internacional. Ora, a missão do Papa não é apenas local, mas principalmente mundial.

Por outro lado, os nobres romanos eram os senhores de pequenos feudos nos arredores de Roma, e que muitas vezes guerreavam por seus interesses. Havia o risco de escolherem um Papa de acordo com suas conveniências pessoais ou familiares.

Portanto, era natural que os partidários da Reforma Gregoriana quisessem transferir essa atribuição para os cardeais.

Vemos que se pronuncia um incidente no qual o monge Hildebrando, cardeal e futuro Papa São Gregório VII, convenceu o Pontífice novo de transferir os poderes de eleição para o Sacro Colégio. Naturalmente, o clero e a nobreza de Roma ficariam indignados com isso, pois perdiam um poderoso elemento de influência política. Então, foram logo ao encontro da Imperatriz do Sacro Império Romano Alemão para obter que ela se solidarizasse com eles.

Debaixo de certo ponto de vista, a Imperatriz tinha interesse nisso porque, no sistema anterior, o imperador — ou a imperatriz, quando o imperador era menor de idade — interferia na eleição. Entretanto, feita a eleição pelo Sacro Colégio, as possibilidades de interferência do poder imperial se tornavam muito menores.

Esse choque de interesses comprometia a Reforma Gregoriana que, sendo um movimento de reestruturação e reorganização da Igreja, estava maximamente empenhada em que o órgão adequado elegesse o Sumo Pontífice.

Num momento crucial, Santo Annon intervém com astúcia

Alexandre II e Cádalo foram para Roma e disputaram a cidade. O Papa tinha contra ele o Sacro Império, boa parte da nobreza, e não podia contar com o auxílio do chefe normando Roberto Giscard, que não estava em bons termos com a Santa Sé. Havia até indícios de que ele simpatizava com a causa de Cádalo, por interesses pessoais.

Foi nesse momento crucial que Santo Annon resolveu intervir. Combinou com alguns nobres alemães um golpe de Estado.

Sabia que a Imperatriz Inês gostava de parar em determinada ilha quando viajava pelo reino.

Era uma ilha aprazível e lá costumava ela repousar das fadigas da viagem.

Santo Annon mandou construir uma barca esplêndida, riquíssima, adornada com toda espécie de obras de ar-te: finíssimos tapetes cobriam o chão e as paredes; cortinas dos mais preciosos tecidos vedavam as janelas. Toda a barca estava revestida de boa madeira, com incrustações de ouro e pedras preciosas.

Quando a barca ficou pronta, Santo Annon permaneceu à espera de uma ocasião propícia para utilizá-la.

Notem a atmosfera bonita em que essas coisas se passavam: uma ilha aprazível, uma barca linda, com cortinas e incrustações de pedras preciosas, à espera da Imperatriz. Que lindo teatro para uma cena histórica! Como isso é mais bonito do que um avião para se passar qualquer episódio da História humana!

Essa ocasião se apresentou pouco depois, quando a Imperatriz anunciou uma viagem a Nimegue. Santo Annon, com outros conjurados, viajou diretamente para a referida ilha, chegando lá antes da corte. Quando esta lá aportou, na hora do almoço, Santo Annon, como Chanceler do Império, sentou-se ao lado de Henrique IV, que tinha então seis anos. Fez a conversa cair sobre a barca, e a descreveu com toda a minúcia, maravilhando o menino. Logo depois do almoço, Henrique IV manifestou o desejo de visitar a barca. Recebido com todas as honras, assim que o rei subiu a bordo, os remadores, já avisados, puseram a embarcação em movimento, afastando-a da ilha.

A Imperatriz e os nobres, que tinham ficado na ilha, promoveram um grande tumulto, e o menino-rei, amedrontado, atirou-se ao rio.

O menino-rei era uma víbora; foi o grande inimigo de São Gregório VII, mais tarde.

O Conde Egbert de Brunswick se jogou na água e o trouxe de volta para a barca. Santo Annon levou Henrique IV para uma das salas e teve com ele uma longa conversa, convencendo-o de ir para Colônia, onde seria convocada uma assembleia de nobres para discutirem a situação.

Faço um comentário colateral a respeito da mentalidade dos meninos naquele tempo. Às vezes, aos 14 ou 15 anos, meninos começavam a comandar exércitos, ou dirigir impérios; e, muitas vezes, dava certo. Vemos aqui Santo Annon tratando seriamente com um menino de seis anos sobre política e convencendo-o.

Alguém poderá objetar: “Mas o menino não tinha nenhuma resistência possível a oferecer a um homem da qualidade de Santo Annon”.

É possível. Em todo caso, Santo Annon julgou que não podia resolver o caso só com brinquedinhos e fazendo cocegasinhas no queixo do rei; mas precisava dar uma argumentação política. Deu, e o monarca aceitou. Quer dizer, trata-se de um nível de menino que não é comum.

Para se compreender bem essa atitude de Santo Annon é preciso esclarecer que, em caso de regência, a posse do rei pelo chanceler já era um bom título para que ele se tornasse regente. Portanto, quando o rei era menor, o regente do reino era a mãe, mas também podia ser o chanceler, se este estivesse na posse do rei-menino. E o golpe dele foi roubar o rei-menino dentro dessa “ratoeira” de madeiras preciosas, seda e pedrarias. Uma coisa que nos deixa um pouco interditados quanto à liceidade, se não fosse o fato de que é Santo Annon quem fez, e, portanto, isso deve ter suas razões históricas que provavelmente não aparecem na ficha.

Sínodo em Colônia

Em Colônia, os grandes da Alemanha se reuniram e, depois de se informarem dos acontecimentos, decidiram que a regência caberia ao arcebispo, em cuja diocese estivesse o rei. Como Henrique IV estava em Colônia, o regente seria Santo Annon. Que era Arcebispo de Colônia…

A 27 de outubro de 1062, reunia-se um sínodo presidido por Santo Annon, que aceitou o decreto de Nicolau II e reconheceu a eleição de Alexandre II; o Duque Godofredo de Lorena foi designado para levar o Papa a Roma, e dar-lhe posse da cidade. A Reforma Gregoriana estava salva.

Esse é um dos inúmeros atos que mostram não só o papel decisivo de Santo Annon numa crise gravíssima, mas também sua astúcia diplomática que repetiu em muitas outras ocasiões.

É lamentável ver como a notícia dessas grandes figuras se apaga. Como ela faria bem num livro de piedade! Como seria interessante ensinar alguém a dizer: “Meu Deus, dai-me a energia e a astúcia de Santo Annon! Santo Annon, rogai a Nossa Senhora por mim, para que eu me pareça convosco!” E rezar essa jaculatória diante de uma imagem de Santo Annon “bon parleur”, de espada na mão, olho de raposa e alma de bem-aventurado, organizando as coisas. Como isso faria bem!

Diferença entre o pecador medieval e o pecador filho da Revolução

Alguns anos depois, a Imperatriz Inês, que se tinha recolhido a um mosteiro, arrependeu-se do que fizera. Um dia a cidade de Roma surpreendeu-se, assistindo a um espetáculo só possível na Idade Média: a Imperatriz apresentou-se às portas da cidade, vestida como penitente, descalça e com uma corda ao pescoço, rogando permissão para entrar e pedir perdão ao Santo Padre por tudo quanto tinha feito. Recebida por São Pedro Damião, este a absolveu de todos os pecados e daí em diante, até a morte do Cardeal, foi seu confessor.

Ela, que tinha sido a grande inimiga de São Pedro Damião, reconheceu ter andado mal criando entraves ao movimento salvador da Reforma Gregoriana. Mas assim era a penitência na Idade Média, época que se poderia caracterizar pela radicalidade:  O indivíduo cometia, às vezes, pecados de arrepiar; mas, quando se arrependia, praticava também penitências de arrepiar.

Esta Imperatriz deixa todas as pompas terrenas, recolhe-se a um convento para cuidar de sua vida espiritual e, meditando, reconhece ter procedido mal. Em rigor, ela não seria obrigada a esse ato público de penitência. Que ela devesse procurar São Gregório VII ou São Pedro Damião para pedir perdão, era inteiramente cabível. Mas podia fazer isso reservadamente. Não, ela quis praticar um ato público de reparação, porque público tinha sido o seu pecado. Apresenta-se, então, às portas de Roma, vestida de saco, com uma corda ao pescoço, e se dirige a uma igreja para pedir perdão.

Depois de ter sido perdoada, torna-se amiga e penitente daquele a quem ela ofendera, confiando sua alma à direção dele. Que beleza há nessa reconciliação!

São Pedro Damião — vendo aquela Imperatriz vestida pobremente, ajoelhada perto dele, e recordando-se do tempo em que ela lhe dava dor de cabeça, introduzida ali como um cordeiro, e encantando, por esta sua atitude humilde, a alma deste santo Cardeal — louvava a grandeza da graça que opera tais transformações nas almas humanas. Isto é Idade Média!

Talvez nunca se tenha falado tanto a respeito do perdão quanto em nossos dias. Fala-se, por vezes, até o abuso. A propósito de qualquer coisa se repete: “Ah, Deus perdoa!”  Mas esse perdão que todo mundo está certo de receber, poucos pedem; e, quando pedem, fazem-no mais ou menos às ocultas. O senso da gravidade do pecado desapareceu. As pessoas perderam este senso, não são lógicas, falta-lhes coerência, não têm Fé viva. Elas só se lembram do pecado para dizer que vai ser perdoado; e só se recordam do perdão para poderem pecar mais tranquilamente. Essa é a mentalidade do homem contemporâneo.

Comparem o pecador medieval com o pecador filho da Revolução, e verão a enorme diferença: um é suscetível de grandes arrependimentos à maneira de Davi; grandes regenerações e, eventualmente, até grande santificação. O outro, se é que tem um arrependimento sério, pede um perdãozinho superficial.

Qual a causa desta diferença de atitude? Em última análise, este é o efeito da Revolução. É ela que exacerba no homem o orgulho, a vontade de não reconhecer a gravidade dos pecados e de não fazer penitência, criando-se o estado de dureza que vemos tão generalizado nos dias de hoje.

Quantos pecados cometidos em nossos dias mereceriam uma penitência pública! Nesses casos, um padre, antes de conceder a absolvição, agiria muito bem se exigisse uma reparação pública.

Entretanto, a debilidade, o liberalismo, tantas vezes até no próprio confessor, criam esse clima crepuscular no qual estamos…

Olhemos para figuras como a de Santo Annon e compreenderemos melhor a verdadeira fisionomia da Igreja.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de Conferência de 29/3/1974)
Revista Dr Plinio 213 – Dezembro de 2015

Vinde, a Santíssima Virgem vos espera!

Ao contemplar as aparições de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré, Dr. Plinio ressalta o caráter profético de suas mensagens e a afabilidade e a inocência que transparecem nas narrações da Santa.

Devemos começar agora o comentário dos fatos que se relacionam com a aparição de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré.

Ângulo de análise dos fatos precedentes às aparições

Para acompanhar bem o assunto é preciso conhecer a situação geral da França e da Europa naquele tempo, porque se trata de uma série de revelações de caráter profético, neste sentido da palavra: elas se deram em 1830 e Nossa Senhora previu fatos — naquele tempo mais ou menos improváveis — que se dariam em 1870, quarenta anos depois, exatamente.

Os fatos tinham muita relação um com o outro e, debaixo desse ponto de vista, essas aparições interessam de um modo todo particular, porque a revolução de 1830 é apresentada por Nossa Senhora como sendo o primeiro sinal de um conjunto de desordens na França, que haveria de culminar com uma revolução em 1870.

A revolução de 1830 foi liberal. A de 1870 foi a chamada Comuna de Paris, e talvez se possa dizer a primeira revolução comunista na Europa, se não se considerar a Revolução Francesa como uma revolução comunista. Isso é outra questão. Habitualmente não era tida como comunista. Hoje muitos historiadores reconhecem que ela, chegando ao seu auge, tomou o caráter, o espírito comunista pelo menos.

Enfim, deixando isso de lado, é, portanto, a ideia do liberalismo gerando o comunismo que é apresentada de algum modo pelas revelações. Ideia que se relaciona tanto com a RCR e com as preocupações habituais do Grupo, que eu não poderia deixar de realçar isto desde o começo.

Tática revolucionária de Napoleão

Qual era a situação da França e da Europa em 1830? Era a seguinte.

A Revolução Francesa deve ser considerada como um grande movimento revolucionário que começou em 1789, simbolicamente, com a queda da Bastilha e que, verdadeiramente, teve seu fim em 1815, quando Napoleão caiu pela segunda vez.

Napoleão é tido por muitos como o contrário da revolução, porque ele impôs ordem à França quando ela estava no caos e na desordem. Mas a questão é que Revolução não é apenas desordem, caos, é também uma ordem material na qual se impõe que as coisas fiquem de cabeça para baixo. E foi exatamente o que Napoleão fez.

Ele aproveitou a ordem que ele impôs e aproveitou o prestígio das vitórias militares que alcançou para impor à França, de modo estável, uma série de transformações que a Revolução Francesa introduziu, mas que eram mal aceitas pelo povo. Em algumas coisas Napoleão recuou em relação à Revolução Francesa, em outras coisas ele impôs. E isto fazia parte do jogo: ceder algo, mas tornar algo definitivo e irremediável.

Revanche da Revolução

Em 1815 se dá a Batalha do Waterloo, Napoleão é mandado para Santa Helena, e a ordem na França gira: os Bourbons são restaurados e reinam de 1815 a 1830.

A restauração dos Bourbons se deu na pessoa de Luís XVIII, um irmão de Luís XVI. Ele foi sucedido por Carlos X, que reinou de 1824 até 1830, um reinado rápido. Em 1830 houve uma revolução de caráter liberal que destituiu Carlos X, tido como um rei reacionário e ultramontano. Em seu lugar foi colocado um parente deles, o Duque de Orleans, que não tinha direito à sucessão ao trono e que reinaria de 1830 a 1848.

A introdução de um rei ilegítimo, de ideias conhecidamente liberais, representava uma revanche da Revolução. Podemos dizer que a Revolução deu um grande passo para trás com a restauração dos Bourbons; fez meio passo para frente com a implantação da monarquia burguesa de Luís Felipe, e daí para a frente os fatos se foram dando até a Comuna de Paris em 1870.

Carlos X era católico, mas via uma série de coisas muito estrabicamente. Apesar disso, por causa da onda da opinião contrarrevolucionária, a Religião fez muitos progressos na França, restaurou uma porção de coisas, de instituições que tinham caído, foi uma ocasião de re-catolicização.  Nesse período os adversários da Religião também se levantaram e houve motins, agressões, um desenvolvi-mento grande do anticlericalismo. Isso era um bom sinal do ponto de vista religioso, porque sempre que a Igreja é atacada por seus inimigos, quer dizer que ela está fiel a si mesma.

Devemo-nos situar nessa atmosfera para compreendermos o ambiente no qual se deram as revelações de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré, religiosa de São Vicente de Paulo.

As Irmãs da Caridade

O hábito das Irmãs de Caridade era preto, como são os hábitos das religiosas, mas com uma espécie de grande gola engomada branca. A cabeça era adornada por uma toca bretã um tanto estilizada pela inspiração e pelas mãos da Igreja. Naturalmente, um rosário pendente da cintura.

Eu não tive muito contato com essas freiras, mas conheci muitas e muitas delas. Eram, em geral, pessoas robustas, fortes e prontas para o trabalho. Algumas — isso não as desdourava em nada — um pouco camponesas. Olhar límpido, reto, atitude despretensiosa de quem preferia passar despercebida.

Elas eram destinadas muito frequentemente a tomar conta dos hospitais, atender os doentes, e a outras obras de caridade material. Obras de misericórdia temporal, que elas aproveitavam como ocasião para obras de misericórdia espiritual: aproveitavam para chamar um padre para o agonizante, convidavam uma criança para ir ao catecismo da paróquia ou no convento delas. Se encontravam alguém desventurado pela rua, paravam, perguntavam o que queria, ajudavam a pessoa, etc. Enfim, faziam tudo quanto pudessem para atender aos infortúnios, às carências materiais, mas, sobretudo, às necessidades espirituais dos mais variados ambientes por onde elas costumavam se infiltrar.

A elevação desse apostolado que elas realizavam era tão grande e elas eram de tal maneira admiradas por isso que uma irmã de São Vicente de Paulo costumava ser tida como próprio símbolo da Religião numa das suas expressões mais belas e mais comovedoras.

Quando Nossa Senhora deseja…

Catarina Labouré nasceu em 1806. Era filha de um casal de proprietários rurais. Sua mãe faleceu quando tinha apenas nove anos.

Catarina pediu autorização do pai para ser freira. Este se opôs terminantemente e julgou bom, para distraí-la, mandá-la para um lugar de prazer, um emprego onde ela podia se distrair, ter prazeres.

Paris já era, para as proporções da França e do mundo daquele tempo, uma cidade de luxo, uma cidade-turbilhão da alegria, do contentamento de viver mundano. O pai queria conduzi-la até Paris para a vocação desaparecer.

Mas quando Nossa Senhora quer, quer: Catarina acabou indo para Paris, tornou-se freira e recebeu as revelações.

Nos subúrbios de Paris

Catarina Labouré, no ano de 1828 foi posta pelo pai ajudando seu irmão num pequeno restaurante para operários, num dos bairros mais populosos de Paris.

Era um restaurante só de homens. Com certeza estes homens comiam ali porque não tinham tempo de ir para casa comer. Imaginem a beberagem, as conversas imorais, as canções. E a futura santa obrigada pelo pai a servir ali. Vejam o contraste e o “rio chinês” que o desígnio da Providência percorreu nesta ocasião.

Ela tinha nessa ocasião 22 anos, uma idade inteiramente inadequada para esse tipo de serviço. Ela ficava — era a defesa dela — quieta, e durante o serviço nunca descerrava os lábios. Falassem com ela o que fosse, perguntassem o que quisesse, ela servia sem dizer uma palavra. Era o meio de, naquele ambiente, se isolar e proteger a sua própria pureza, a sua piedade.

Ela se sentia supliciada em um ambiente tão livre como esse, onde os gracejos e até os galanteios a ela evidentemente não faltavam.

O operário daquele tempo era, em geral, muito corpulento, porque a indústria era muito menos mecanizada do que hoje em dia, exigia muito mais força no trabalho manual. Imaginem um restaurante pequeno cheio de homenzarrões. Entra uma donzela que não tem outra coisa senão seu Anjo da Guarda para defendê-la e que acaba domando o ambiente. Brincadeira de cá, gracejo de lá, galanteios de acolá. Ela tem apenas a defesa do repúdio e dos lábios cerrados. Ela domina.

Vê-se a virtude dominando o vício, o espírito dominando a matéria. Que bela vitória e como isso nos ajuda a conhecer o perfil moral da santa.

Em Châtillon-sur-Seine

Esse martírio durou cerca de um ano. Em 1829 Santa Catarina Labouré passou a residir com uma cunhada, que mantinha um pensionato para moças em Châtillon-sur-Seine, no departamento de Côte d’Or. Era aí que uma parte da nobreza da Borgonha enviava suas filhas.

Catarina viveu com mais liberdade e pôde melhorar algum tanto sua escrita. Mas a ortografia dela foi sempre muito irregular.

Em janeiro de 1830 ela entrava no hospital de caridade dirigido pelas irmãs de São Vicente de Paulo em Châtillon-sur-Seine.

Ela, que tinha vergado os operários do botequim, vergou também o pai.

Depois de três meses de postulantado, seguiu, enfim, para Paris. E em 1830, no mês de abril, pela primeira vez entrou no noviciado da Rue du Bac, onde as aparições se deram.

Ela era, portanto, noviça quando essas aparições se verificaram.

Junto ao coração de São Vicente

Três dias depois da chegada de Catarina, deu-se a solene transladação dos despojos de São Vicente de Paulo para a capela da Rue du Sèvre, grande cerimônia à qual assistiam o Rei Carlos X e o arcebispo de Paris, Mons. Quélan.

Que cena linda: o arcebispo de Paris com certeza presidindo a cerimônia, é provável que o pálio cobrisse os restos mortais de São Vicente de Paulo e ali fosse o rei também. Tudo leva a crer que antecedendo e fechando o cortejo das relíquias, havia personalidades do clero, da família real, da corte, povo em quantidade, provavelmente tropas apresentando armas, etc. Assim se deu a transladação do corpo de São Vicente de Paulo, que era o fundador da congregação religiosa para onde ela estava entrando e que era, naturalmente, venerado por todo o povo francês.

Santa Catarina, como noviça, frequentou várias vezes a capela de Saint-Lazare, onde foi colocado o corpo de São Vicente de Paulo. Conta ela:

O coração de São Vicente aparecia todas as vezes que eu voltava de Saint-Lazare. Apareceu-me três vezes de modo diferente, três dias seguidos: branco, cor de carne, o que anunciava a paz, a calma, inocência e a união; depois o vi vermelho, cor de fogo o que indicava o incêndio de caridade de seu coração; parecia-me que a comunidade devia se renovar, estender-se até as extremidades da Terra, o que de fato se deu. Por fim o vi vermelho negro, o que indicava tristeza. Vinham-me tristezas que tinha muita dificuldade em dominar. Não sei porque nem como essa tristeza se relacionava com a mudança de governo que havia proximamente na França.

São Vicente de Paulo, como santo, amando a França, a civilização cristã e sobretudo a Igreja, dava a conhecer a ela, antes da queda do governo, que o rei cairia. Exprimia a sua dor profunda fazendo ver o próprio coração nesses coloridos diferentes. Um vermelho quase preto que indicava tristeza, o que iria acontecer? Por que é que ela sabia de antemão?

Para que nós soubéssemos, é claro. Mas também para rezar e para ir pedindo pela causa católica na França antes mesmo da causa ser golpeada, de maneira a conseguir que o golpe não fosse tão grande e alguma coisa sobrevivesse.

Vemos a Providência que permite o golpe, mas prepara também algo que atenua. Vê-se aí a bondade e a misericórdia de Nossa Senhora.

Graças de perseverança

Certo dia uma voz interior disse à vidente: “O coração de São Vicente está um pouco consolado, porque obteve de Deus, por mediação de Maria, que suas famílias não pereceriam no meio dessas infelicidades e que Deus se serviria delas para reanimar a fé”.

Quer dizer, seria normal que o ramo masculino e feminino da obra de São Vicente de Paulo desaparecessem, mas Nossa Senhora obteve e pediu antes da revolução que essas duas famílias — eu interpreto assim, sendo ramo masculino e feminino — sobrevivessem para espalhar a fé pelo mundo inteiro. O que em larga medida aconteceu.

Revolução de julho

Os mais negros e tristes pensamentos ocorreram no dia da Santíssima Trindade, 6 de junho.

A revolução foi em julho.“Nosso Senhor me apareceu como um rei com a cruz sobre o peito no Santíssimo Sacramento. Isto se passava durante a Santa Missa, no momento do Evangelho. Pareceu-me que Nosso Senhor era despojado de todos os seus ornamentos, caindo tudo por terra”.

Isto se relacionava com a revolução que haveria daí.

“Foi então que tive o pensamento que o rei da terra seria despojado de suas vestes reais”.

Foi o que aconteceu nos últimos dias de julho.

“Daí os pensamentos que tive, que não saberia explicar, sobre a perda que se fazia.”

Como ela era uma pessoa pouco culta, não compreendia todo o alcance desse acontecimento, o que a Religião perdia com isso.

Ela estava com o espírito pouco afeito a medir os vais-e-vens da Revolução e da Contra-Revolução, mas Nosso Senhor Jesus Cristo lhe dava a entender uma profunda tristeza com esses fatos.

Aí os senhores têm uma coisa curiosa, que é o relacionamento direto… Eu não me lembro de ter visto uma coisa parecida — talvez houvesse — de uma revelação tão altamente provável, eu no meu foro interno a tomo como certa, com um fato político. Mas assim, um fato político determinado: “A fulano vai acontecer tal coisa, e por isso Deus está triste”. Eu não me lembro de uma coisa dessas, é um fato único — único ao menos para minha memória — e que eu gostaria de ressaltar.

O sobrenatural começa a manifestar-se

Imaginemos a cidade de Paris, naquele tempo enormemente menor do que ela é hoje, silenciosa, tranquila, ainda sem motores. Os automóveis ainda não existiam, o silêncio de toda a população que dormia era apenas de vez em quando interrompido pelas patas de um cavalo que batia sobre a pedra da rua e que ia puxando algum carrinho ou alguma carruagem depressa durante a noite para um lugar.

Não havia ainda luz elétrica e o dormitório das religiosas era iluminado por candeeiros. Todos dormiam, inclusive Catarina. Ali, completamente diferente do mundo fora, o maravilhoso sobrenatural começa a se desenrolar e Nossa Senhora faz a primeira das suas diversas grandes mensagens para o mundo no século XIX.

Vale a pena ler o próprio texto da santa contando o que se passou então. É um pouco longo, mas são suas próprias palavras. Isso fará um desenvolvimento do tema.

“A Santíssima Virgem vos espera…”

Ela diz o seguinte:
“Veio depois a festa de São Vicente. Na véspera, nossa boa Madre Marta nos fez uma instrução sobre a devoção à Santíssima Virgem, o que me deu desejo de vê-La. Deitei-me, pois, com o pensamento de que naquela noite mesmo eu veria a minha boa Mãe. Havia tanto tempo já que eu desejava vê-La.”

A inocência e a ingenuidade desse pensamento e o caráter filial são muito bonitos.

Enfim, às onze e meia da noite… Para aquele tempo era alta noite. “…ouvi me chamarem pelo nome:

‘Irmã Labouré! Irmã Labouré!’. Acordando, olhei do lado de onde vinha a voz, que era do lado da passagem.”

Deveria ser uma passagem no dormitório.

“Corro a cortina e vejo um menino de 4 ou 5 anos que me dizia: ‘Vinde à capela, a Santíssima Virgem vos espera’.

Devemos imaginar um ambiente com uma paz, tranquilidade, todas as freiras dormindo, esse menino aparece — ela depois descreve o menino — e diz: “A Santíssima Virgem vos espera”. Quer dizer, uma afabilidade de Nossa Senhora à espera dela.

“Logo me veio o pensamento: ‘Irão perceber’. O menino me respondeu: ‘Ficai tranquila. São onze e meia da noite, todo o mundo está dormindo. Vinde, eu vos espero’.
Quem é esse menino que diz “eu” aí?

“Vesti-me depressa e me dirigi para o lado do menino. Este tinha permanecido de pé sem avançar além da cabeceira de minha cama. Ele me seguiu, ou melhor, eu o segui, sempre à minha esquerda.”

“Por todos os lugares onde passamos as luzes estavam acesas, do que me admirava muito…”

Naturalmente ninguém via, era milagre. Tudo isso já é dado para causar impressão.

“Porém, muito mais surpresa fiquei quando entrei na capela. A porta se abriu mal o menino a tocou com a ponta do dedo e minha surpresa foi ainda mais completa quando vi todas as velas e castiçais acesos, o que me recordava a Missa de meia-noite”.

Como se fosse a Missa do Galo. “Entretanto, nada vejo da Santíssima Virgem.

O menino me conduziu ao presbitério, ao lado da cadeira de braços do senhor vigário. Ali me ajoelhei e o menino permaneceu de pé todo o tempo. Eu achava o tempo longo e olhava para ver se as vigilantes não passavam pela tribuna”.

No fundo, onde fica o órgão. Ela tinha medo que pudessem perceber, alguma coisa violasse o segredo.

Seria bonita a cena. Ela ajoelhada junto à cadeira do senhor vigário, as luzes todas acesas e pensando o que diria à vigilante sobre essa completa irregularidade.

“Ali se passou o momento mais doce de minha vida”

“Por fim chegou a hora. O menino me preveniu. Ele me disse: ‘Ei-la, a Santíssima Virgem’. Ouvi como um roçar de vestido de seda que vinha do lado da tribuna…

Era o “frou-frou” de quem está com um vestido de seda que, naquele tempo, ia até o chão. Produzia aquele ruído agradável e muito peculiar.

… perto do quadro de São José e que passava sobre os degraus do altar do lado do Evangelho sobre uma cadeira igual à de Santa Ana.

O que seria essa cadeira de Santa Ana?

“Eu estava em dúvida se seria a Santíssima Virgem. Nesse preciso momento o menino que estava ali me disse: ‘Eis a Santíssima Virgem’.

“Ser-me-ia impossível dizer o que senti nesse momento, o que se passava dentro de mim. Parecia-me que não via a Santíssima Virgem.

“Então o menino me falou não mais como uma criança, mas como um homem dos mais fortes e com as palavras mais fortes.

“Nesse momento, olhando para a Santíssima Virgem, dei um salto para junto d’Ela, pondo-me de joelhos sobre os degraus do altar e com as mãos apoiadas sobre os joelhos da Santíssima Virgem”.

Nossa Senhora estava sentada na cadeira do vigário. Santa Catarina apoiou as mãos sobre os joelhos de Nossa Senhora. Vejam a afabilidade dessa aparição, uma coisa extraordinária. Depois, para quem for São Tomé, que pôs a mão no flanco de Nosso Senhor, ela também tocou.

“Ali se passou o momento mais doce de minha vida. Ser-me-ia impossível dizer tudo o que senti. Ela me disse como deveria me conduzir em relação ao meu diretor espiritual, e várias coisas que não devo dizer. A maneira de me conduzir em meus sofrimentos, vir lançar-me aos pés do altar, e me mostrava com a mão esquerda o pé do altar, e ali fundir o meu coração. Aí eu receberia todas as consolações de que tivesse necessidade.”

Quer dizer, quando ela tivesse sofrimentos, não comentasse com ninguém, fosse ao altar e desabafas-se ali, mas num lugar indicado por Nossa Senhora para ela: “Aqui, nesse ponto, você venha”.
Os senhores compreendem quanto ela voltou a esse lugar fisicamente indicado por Nossa Senhora. Uma verdadeira maravilha.

“Então lhe perguntei o que significavam todas as coisas que eu tinha visto e ela me explicou tudo”.

Mas ela não disse o que era. Aqui não está.

“Fiquei não sei quanto tempo. Tudo que sei é que quando Ela partiu não percebi senão que alguma coisa se extinguia. Enfim, mais uma sombra que se dirigia para o lado da tribuna pelo caminho pelo qual Ela tinha chegado.”

“Levantei-me dos degraus do altar e percebi o menino onde o tinha deixado. Ele me disse: ‘Ela se retirou’. Nós retomamos o mesmo caminho, sempre todo iluminado. O menino estava sempre à minha esquerda. Creio que este menino era meu Anjo da Guarda que se havia tornado visível para me fazer ver a Santíssima Virgem, porque havia rezado muito a ele para que me obtivesse esse favor. Estava vestido de branco trazendo consigo uma luz miraculosa, isto é, ele era resplandecente de luz. Tinha a idade mais ou menos de 4 ou 5 anos.

De volta ao meu leito eram duas horas da manhã, pois ouvi tocar as horas.

Não tornei mais a dormir.

Está terminada a revelação.

Um veludo precioso

Não me consta que lá, na Rue de Bac, se indique qual foi o lugar mostrado por Nossa Senhora a ela. Evidentemente, qualquer um de nós que ali estivesse não deixaria de rezar, oscular o chão.

A cadeira está ali sobre um estradozinho e todo mundo que entra vai oscular a cadeira. Quando eu a osculei, deitei o olhar sobre o veludo e este pareceu-me novo. Fiquei desagradado, porque, se é novo, não é o veludo sobre o qual Nossa Senhora se sentou.

Na saída, perguntei à freira:
— Irmã, me faz favor. Esse veludo da cadeira é o próprio no qual Nossa Senhora Se sentou?

Ela disse:
— Não. Nós, há pouco, o substituímos por um veludo novo.

Eu pensei em ficar com o veludo para mim, e disse:
— Irmã, eu não poderia ter esse veludo? Ou ao menos um pedacinho dele?

Ela disse:
— Não.

Não me lembro se ela disse que foi jogado fora ou queimado. Eu não pude conter a minha surpresa e disse a ela:
— Mas, irmã! A senhora já pensou o que seria esse… Se a armação de madeira da cadeira se oscula, por que não oscular o veludo? Por que não guardar? A senhora já pensou que isto é uma relíquia.

— É…
Eu disse:
— A senhora já pensou quantas pessoas viriam aqui para receber das senhoras um pedacinho deste veludo?

Ela ficou assim meio surpresa e eu disse:
— Irmã, eu sou da América do Sul, sou do Brasil. Eu lhe garanto que a América do Sul desfilaria aqui para receber pedaços desse veludo!
— “Nous n’avons guère songé” — nem sequer pensamos nisso.

Uma promessa feita por Nossa Senhora

1830, julho. Colóquio com a Santíssima Virgem.
“Minha filha, o bom Deus quer encarregar-vos de uma missão. Tereis muitos sofrimentos, mas superareis estes sofrimentos pensando que o fareis para a glória do bom Deus. Conhecereis que é do bom Deus e sereis atormentada até que o tenhais dito àquele que é encarregado de vos conduzir. Sereis contraditada, mas tereis a graça e por isso não temais. Dizei com confiança tudo o que se passa em vós, dizei-o com simplicidade, tende confiança, não temais.”

Vemos quanto medo ela tinha do próprio confessor com o qual ela se deveria abrir.
“‘Vereis certas coisas. Prestai conta do que virdes e ouvirdes. Sereis inspirada na vossa oração. Prestai conta do que virdes em vossas orações”.

Os tempos são muito maus. Os males virão precipitar-se sobre a França; o trono será derrubado, o mundo inteiro será transtornado por males de toda ordem — ao dizer isto, a Santíssima Virgem tinha um ar muito penalizado —, mas vinde ao pé deste altar; aí as graças serão derramadas sobre todas as pessoas que as pedirem.

É uma promessa magnífica.

“‘Minha filha, gosto de derramar graças sobre a comunidade em particular. Eu aprecio muito. Sofro porque há grandes abusos contra a regra.’”

Nossa Senhora gostava da comunidade enquanto instituição, mas já naquele tempo havia muitos abusos no cumprimento da regra.

“‘As regras não são observadas, há grande relaxamento nas duas comunidades. Dizei àquele que está encarregado de uma maneira particular da comunidade. Ele deve fazer tudo o que lhe seja possível para repor a regra em vigor. Dizei-lhe de minha parte vigiar sobre as leituras, as perdas de tempo e as visitas’”.

“‘A comunidade gozará de uma grande paz, ela tornar-se-á grande. Momento virá em que o perigo será grande, acreditar-se-á tudo perdido.”

É curioso que este momento não é em 1830. Por que, como vai haver uma grande paz e se corrigirá os abusos, etc., etc., quando ela já está em julho e a revolução foi em julho?

Esses fatos não cabem aí, mas depois.

“‘Eu estarei convosco, tende confiança.
“Mas não se dará o mesmo com as outras comunidades: haverá vítimas — ao dizer isto, a Santíssima Virgem tinha lágrimas nos olhos. Para o clero de Paris haverá vítimas. Mons. Arcebispo — a essa palavra lágrimas de novo.”

Eu creio que não foi Mons. Qué-lan. Talvez aí seja uma profecia de 1870, não sei.

“Minha filha, a cruz será desprezada e derrubada por terra. O sangue correrá, abrir-se-á de novo o lado de Nosso Senhor, as ruas estarão cheias de sangue, Mons. Arcebispo será despojado de suas vestes — aqui a Santíssima Virgem não podia mais falar: o sofrimento estava estampado sob a sua face. “Minha filha, dizia Ela, o mundo todo estará em tristeza.”

A essas palavras pensei quando isto se daria: compreendi bem daí a quarenta anos.

Em 1870, onde realmente o arcebispo foi fuzilado abençoando os revolucionários e duas balas cortaram os dedos dele. Ele morreu abençoando.

Disse-me uma pessoa, muito competente nesses assuntos de História do século XIX, que o arcebispo era de tendência liberal. Ele teve de algum modo um castigo, porque os liberais o fuzilaram. Mas vejam como Nossa Senhora sofreu com o fato porque ele era arcebispo e, na pessoa dele, era a Igreja que sofria uma violência.

Vejam como Nossa Senhora ama as instituições eclesiásticas. Ela ama tanto uma congregação religiosa na qual Ela, entretanto, denuncia graves abusos. E Ela sofre tanto com o padecimento de um arcebispo. É a congregação enquanto congregação, o arcebispo enquanto arcebispo.

Isso deve nos fazer compreender o amor que nós devemos ter às instituições eclesiásticas, por mais que as vicissitudes humanas façam com que dentro delas se passem coisas que são contrárias
ao que se poderia querer.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraido de conferência de 7/11/1980)

Crescer na confiança

Eis uma linda cena da vida de São Francisco Xavier:

Era noite. Dentro de um barquinho em mar revolto, todos estavam aflitos e São Francisco rezando. Enquanto a nau era sacudida de todos os lados, o Santo ia percorrendo em espírito os nove Coros de Anjos, reverenciando os Patriarcas, recomendando-se aos Profetas, numa visita serena, calma, pedindo ajuda a cada um. As pessoas atônitas, olhando para aquela tranquilidade,  encontravam nela os meios de resistência.

É a atitude de um grande Santo que, por ter em abundância o espírito da Igreja, enfrenta os perigos da existência como um cavaleiro medieval enfrentava os riscos da guerra.

O cavaleiro era ávido de perigos e de aventuras, porque sabia defender assim a causa para a qual fora suscitado. Esta é a posição do varão católico quando se encontra em perigo: não é apavorar-se, mas crescer na confiança.

São Francisco Xavier e o autêntico idealismo

A extraordinária epopeia apostólica de São Francisco Xavier, enfrentando toda sorte de riscos a fim de conquistar os povos do Oriente para a Igreja Católica, oferece a Dr. Plinio ensejo para nos fazer compreender o teor do verdadeiro ideal: mais  do que a realização de uma grande coisa, é o glorificar a Deus, submetendo-se humildemente à sua superior vontade.

Pode-se dizer que o significado de certas palavras sofrem transformações ao longo dos tempos, de acordo com o entendimento das gerações que se sucedem umas às outras. Exemplo característico, a meu ver, são os termos “ideal” e “idealismo”.

Luminosidade e harmonia sonora

A palavra “ideal” possui uma ressonância peculiar, luminosidade, harmonia sonora — quase diria visual — que lhe dão significado próprio. De algum modo ela impele o menos poético dos homens a pronunciá-la como um cântico: ideal!

Quando se diz que alguém tem ideal, entende-se tratar-se de um valor maior que o simples e vil desejo de lucrar vantagem pessoal. Não se aplica, no sentido literal e plano do termo, a afirmações como esta: “Fulano cultiva um ideal, o de tornar-se riquíssimo”. Isto se refere a uma meta, um objetivo, uma ambição, não a um ideal.

Dizer-se de um indivíduo que ele é um homem ambicioso, pois deseja fazer coisas grandes, pode ser até um elogio. Porém, há diferença entre uma coisa grande e uma grande coisa.

O genuíno idealismo de São Francisco Xavier

Imaginemos, por outro lado, São Francisco Xavier dirigindo-se para a Índia e o Japão, como primeiro passo para alcançar também a China. Naqueles idos do século XVI, viajar da Europa para o Extremo Oriente podia representar tanto ou mais perigo do que, hoje, uma expedição de astronautas rumo à Lua.

O discípulo de Santo Inácio enfrentou riscos e dificuldades impensáveis, imbuído de um anelo muito superior ao dos mais audaciosos comerciantes da época: ele ia em busca de almas para Nosso Senhor Jesus Cristo. Viaja com o coração estraçalhado de dor diante das devastações que a Pseudo-Reforma produzia na cristandade européia, e talvez pensasse: “Vou para a Índia, Japão, China, convidar novos povos e almas ainda não evangelizadas a corresponderem à graça, e assim trazê-las para a fé católica que agora se mostra abalada no Ocidente”.

Quem procede desta maneira não realiza uma coisa grande, mas uma grande coisa. Isto se chama ideal. E todos os reluzimentos que esta palavra possa ter, fulguram com toda a sua beleza quando os esforços são empregados na mais alta das finalidades: salvar a-mas para a glória de Deus e de Maria Santíssima. Nesse ideal não está presente o egoísmo; para alcançá-lo, o homem entrega toda a sua vida, disposto a passar pelos maiores riscos, dissabores, perigos, sofrimentos, preocupado unicamente com o serviço divino.

Eis o verdadeiro ideal, autenticamente glorioso. E ao considerarmos essa disposição de São Francisco Xavier, nós o veneramos e lhe imploramos: rogai por nós.

Na aparência, um ideal fracassado

Contudo, a vida de São Francisco Xavier pode parecer, até certo ponto, frustrada. Como se sabe, seu maior objetivo era conquistar a China para Deus. Esteve na Índia e a evangelizou. Visitou o Japão e ali obteve imensas vantagens para a fé cristã. Em seguida partiu em direção à China, sua grande meta, pois este país de população incalculável, riqueza cultural extraordinária e grande prestígio em todo o Extremo Oriente, seria uma conquista incomparável para a Igreja Católica.

Mas, mistérios de Deus… Esse apóstolo de zelo e fervor invulgares morre antes de chegar àquela nação. Seu supremo ideal, a evangelização do povo chinês, não se realizaria. Doente, sentiu a morte se aproximar enquanto se achava na Ilha de Sancian, de onde já se divisava a China continental. Quis então expirar no puro amor de Deus, com seus olhos voltados para aquela China na qual não conseguiu entrar. Rendeu seu derradeiro suspiro em paz, embora não houvesse atingido seu ideal.

Diante dessa situação, vem-nos a perplexidade: “Por que Deus permite tal frustração? Por que o herói desejoso de conquistar para Ele algo tão excelente como toda a China não atingiu seu objetivo? Como entender esse (ao menos na aparência) fracasso?”

Encontro com um Bispo chinês do século XX

Estas questões me trazem à lembrança a figura de um Bispo que conheci em minha viagem a Roma, no início da década de 60. Embora não proviesse de ordem religiosa, achava-se hospedado num convento, ocupando uma espécie de quarto escritório, sem luxo mas dignamente arranjado. Homem alto, esguio, longilíneo, flexível em todas as partes do corpo, possuía o porte de um descendente dos mandarins. Conversou comigo em francês, com uma voz muito afável e amável, tratando-me de “Monsieur le Professeur”, enquanto eu me dirigia a ele chamando-o de “Monseigneur”.

Dotado de um charme próprio, gesticulava e alterava a fisionomia de acordo com seu modo de ser. Sobre a cabeça, um tanto pequena em relação ao resto do corpo, portava um chapéu preto, ornado de uma pena de pavão que oscilava conforme seus movimentos. Ao vê-lo, pensei: “Este homem é um porta penas de pavão perfeito!”

Numa palavra, esse Bispo trazia consigo toda a graça daquela antiga e misteriosa China que fascinou São Francisco Xavier. E no meu interior ecoou algo do imenso desejo que este santo missionário alimentou de conquistar o povo chinês para a Igreja Católica.

Hipótese entusiasmadora

Pode-se supor que se o grande ideal de São Francisco Xavier fosse realizado e tivéssemos uma China católica, a Santa Sé provavelmente consentiria em estabelecer uma liturgia peculiar àquele povo, com manifestações simbólicas dos dogmas da Igreja conforme as circunstâncias locais, um canto sacro próprio, edifícios sagrados inspirados nos estilos arquitetônicos chineses e segundo o talento de seus artistas. Imaginemos, por exemplo, a mirífica beleza de uma catedral feita de porcelana, e cuja torre, semelhante a um pagode, ostentasse no alto uma imagem da Imaculada Conceição! As estalas do presbitério talhadas em marfim, os bancos da nave central feitos de algum lindo bambu, encerado e perfumado…

Se, diante dessa hipótese, nossa alma se entusiasma, não será difícil calcular a intensidade do entusiasmo ainda maior que latejava no coração de São Francisco Xavier.

Dar glória a Deus, o mais elevado ideal

Ora, no momento em que maravilhas semelhantes começariam a se produzir, Deus, em cujas mãos estão as vidas dos homens, diz ao santo missionário jesuíta: “Cessa a tua luta, venha para o Céu!”

E Francisco, olhando para a China e por esta nação rezando, expira docemente no Senhor, dizendo sem ressentimento algum: “Deus que me insuflou esse ideal, não permitiu sua realização. Senhor, seja feita a vossa vontade assim na Terra como no Céu!”

Algum companheiro de São Francisco Xavier, vendo-o morrer assim, quiçá se tomasse de desânimo: “Então, não se dará a conversão do povo chinês? Dir-se-ia que as orações de São Francisco não foram atendidas, e seu ideal foi posto de lado”. Por essas dúvidas percebemos quanto é sutil o tema do idealismo, e de quantos aspectos se reveste, a serem considerados para compreendermos a obra de Deus.

Claro está, o ideal de São Francisco Xavier era a evangelização da China, porém não era seu fim supremo, que consistia em dar glória a Deus. Desde que o Altíssimo, por insondáveis desígnios, dele quisesse, não a China, mas um ato de submissão à vontade divina, São Francisco o aceitava como seu mais elevado ideal. O ideal que os anjos proclamaram na noite de Natal, em Belém: “Glória a Deus nas alturas, e paz na Terra aos homens de boa vontade”.

À semelhança do Divino Mestre e Nossa Senhora

Francisco era um desses homens de vontade boa, santa, reta, nobre, voltada para o ideal. Por isso morreu em paz na Terra, glorificando a Deus. E talvez o Criador tenha recebido mais louvor pela conformidade desta grande alma com os desígnios d’Ele, do que na conversão da China. Desse modo ensinou a todos os homens de boa vontade a cumprirem esse supremo ideal que é dar-lhe a devida glória acima de tudo.

Nisso se assemelham a Nosso Senhor Jesus Cristo, que padeceu e morreu proclamando sua conformidade com a vontade do Pai Eterno. No Horto das Oliveiras, bradou: “Pai meu, se for possível, afaste-se de Mim este cálice, mas seja feita a vossa vontade e não a minha”. Como se assemelham, igualmente, à Santíssima Virgem que, quando da Anunciação do anjo, diante do excelso convite para a maternidade divina, respondeu:

“Eis aqui a escrava do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra”.

“Faça-se”, Fiat, termo que aqui significa obediência, disciplina, confiança, bondade, ideal, glória a Deus.

Um mérito maior que o das conquistas

Alguém poderia apresentar a seguinte dificuldade: Dr. Plinio, eu estava certo de que avançar rumo ao ideal significava subir, subir, para finalmente atingi-lo. No momento em que a ideia de conquista mais me entusiasma, o senhor fala de renúncia. Isto quebra as energias de minha alma”.

Respondo: Meu caro, quebra os fracos. Tais considerações são feitas para que não seja pusilânime. Como se viu, o verdadeiro ideal é aquele que se prende ao fim supremo, is-to é, fazer a vontade de Deus infinitamente sábio e santo. As cintilações de minha inteligência pseudo-luminosa são inferiores à de um vaga-lume diante do sol que é a santidade e a sabedoria do Criador. Portanto, não há para o homem, nem autêntico ideal nem bom desejo que não sejam realizar a vontade divina.

“Faça-se em mim segundo a tua palavra”. Pronunciemos a frase da Santíssima Virgem, unamo-nos a Ela na mesma obediência e assim cumpriremos nosso ideal. Pode ser que num primeiro momento Deus espere de nós que desejemos nossas “Chinas”. Num segundo passo, teremos a impressão de que não as conquistamos, elas nos escaparam das mãos e nada conseguimos.

Nesta hora, recordemo-nos de São Francisco Xavier e, pelos rogos de Maria, digamos: “Meu Deus, aconteceu como quisestes; quero o que quereis. Fez-se a vossa vontade e não a minha. Morro em paz.”

Dessa forma nossa vida terá atingido sua finalidade, e de algum modo que não sabemos explicar, o mérito de nossa submissão será maior que o de todas as nossas conquistas.

Mais do que a China convertida

Certamente, ao perceber a morte se aproximar, São Francisco Xavier olhava para aquela nação tão amada e desejada, e pensou: “Meu Deus, esta China virá quando quiserdes. Ela vale muito, mas o Céu tem maior valor. Contemplando vosso Sagrado Coração e o Coração Imaculado de Maria, rogo-vos a graça de sempre ir para frente e para cima”.

Aos olhos de Deus, essa atitude se reveste de um alcance incalculável. Nosso santo não conquistou a China, porém, sem o saber, obteve inúmeras outras vitórias. Somente no Juízo Final saberemos quantas glórias foram dadas a Deus, muito maiores do que a China, simplesmente pela obediência animosa, intrépida e heroica de São Francisco Xavier!

Podemos imaginar que, ao expirar, ele tenha elevado a Deus uma prece semelhante a esta:

“Senhor, meu Deus, meu Criador, meu Redentor. Senhora, Maria Santíssima, Mãe de Deus e minha. Vim até aqui para vos obter a China. Porém, quereis de mim uma viagem maior, que eu transponha os sombrios umbrais da morte e vá para a eternidade. Quereis quebrar-me, separando minha alma do meu corpo, o qual em breve não se-rá senão um cadáver. Rogo-vos que minha alma, julgada por Vós em espírito de benignidade, seja conduzida ao Paraíso.

“Senhor, não pude conquistar a China, mas bem sei que de tudo quanto alcancei na vida, algo queríeis mais do que todo o resto: de Francisco, queríeis Francisco!

“Minha Mãe, aqui está Francisco. Oferecei-me a Deus, pois não nasci senão para isto! Salve Rainha, Mãe de misericórdia…”

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 20/10/1984)

São Francisco Xavier

Grande missionário da Companhia de Jesus no Oriente, comparável aos Santos Apóstolos da Igreja nascente, São Francisco Xavier deixou-se modelar pela abundância das graças que recebeu de Deus, tornando-se um varão de extraordinário espírito sobrenatural.

Exemplo de homem que soube enfrentar as dificuldades, as provações e os reveses desta existência, era como o cavaleiro medieval, que se entregava às vicissitudes das batalhas ávido de perigos e de heroísmos, na defesa da causa para a qual fora suscitado.

Também nós devemos fazer face às nossas aflições e necessidades, como o fazia São Francisco Xavier: resolutos, tranquilos e com inteira confiança na misericórdia divina. É essa a maneira pela qual o homem verdadeiramente cresce na sua estatura moral e pode alcançar o ápice de santidade para a qual é chamado.

Santo Elói Ourives, ecônomo e apóstolo perfeito

Perpetuado numa canção popular francesa, a figura do “grande Santo Elói” resplandece em sua época, unindo o extraordinário talento artístico ao discernimento ímpar de diplomata e, sobretudo, à excelência de suas virtudes. Dr. Plinio nos evoca as principais facetas da vida deste modelo de apóstolo, artesão e político.

Santo Elói distinguiu-se no seu tempo pelas qualidades sui generis que o caracterizaram, tendo sido sua vida semeada de fatos interessantíssimos dos quais nos dá conhecimento uma biografia escrita pelo Pe. Rohrbacher. Desta, algumas passagens merecem ser aqui comentadas.

Hábil ourives e diretor das finanças do reino

Escreve o ilustre hagiógrafo:
“Santo Elói foi dotado de invulgar personalidade. Viveu de 588 a 659. Natural de Limoges [França], revelou desde criança grande aptidão para os trabalhos manuais. Encaminhado para a profissão de ourives, tornou-se um dos mais hábeis artistas de seu tempo. Famoso é o caso da confecção do trono do Rei Clotário, que o queria ímpar e incrustado de pedrarias. Com o ouro recebido para tal fim, Elói fez não um, mas dois tronos igualmente preciosos.”

A ideia de um santo confeccionar um trono para um monarca, contribuindo com sua arte para a pompa real, talvez contrarie não poucos espíritos modernos, adeptos de uma simplicidade equivocada. Mais ainda os chocariam a iniciativa de Santo Elói de fazer algo aparentemente inútil: dois tronos em vez de um só…

“O rei então o nomeou seu ourives e diretor da Moeda.”

ais cargos tendiam a ser conexos naquele tempo, porque as moedas eram de ouro e quem exercia a função de ourives do rei poderia igualmente ser escolhido para dirigir a economia.

Como se vê, não era fácil a existência de alguns personagens daquela época.

Grande político e diplomata

“Sucedendo a Clotário seu filho Dagoberto, Santo Elói tornou-se grande amigo do soberano, revelando-se então insigne conselheiro, hábil político e diplomata.”

Vemos assim a ascensão de Santo Elói: de ourives passou a diretor da Moeda e, em seguida, diplomata.

“Afirma-se que os enviados de príncipes estrangeiros avistavam-se primeiro com ele, antes de se dirigirem ao monarca. Sua influência junto a Dagoberto era suficientemente grande para que o santo pudesse repreendê-lo contra sua moral, bastante relapsa, e também quanto ao seu modo desmazelado de trajar-se.”

Esta circunstância da vida de Santo Elói deu origem à conhecida canção popular francesa “Le bon Roi Dagobert” (ver quadro). Percebe-se, entretanto, que o bom Rei Dagoberto não era tão louvável assim, merecendo algumas censuras. Mas, possuía esta qualidade: simpatizava-se com Santo Elói, apreciava-o e devotava-lhe grande amizade. Mais ainda. Quando o santo conselheiro lhe chamava a atenção, o rei acatava a reprimenda com submissão e alegria.

Muito interessante o fato de Santo Elói corrigir o Rei quanto ao desmazelo de seus trajes, querendo assim que ele se vestisse com distinção e bom-gosto. Essa atitude do homem de Deus pode chocar certos espíritos contemporâneos, notadamente aqueles que chamaríamos de “heresia branca”. Pois, segundo esta, um rei deve usar roupas comuns e baratas, e desejar desfazer-se das galas e preeminências que cercam seu cargo.

Artífice de relicários e fundador de mosteiros

Continua a biografia:
“O tempo que lhe sobrava de seu trabalho na corte, de suas orações e obras de caridade, empregava-o em honrar com sua arte as relíquias dos santos.”

Hoje em dia vemos muitas pessoas aplicarem seu tempo livre em ninharias. O passatempo de Santo Elói era fazer relicários!

Imaginemos uma sala de estilo românico, pressagiando o gótico, cujas porta e janela dão para um pátio. A tarde começa a se confundir com o anoitecer. Nosso Santo, terminado seus afazeres, senta-se junto a uma mesa de ourives no palácio real, acende as velas de alguns candelabros, e continua a trabalhar nos lavores e polimentos de um bonito relicário, ornado de pedras preciosas, no qual ele guardará os restos de um bem-aventurado de sua devoção. Nessa tarefa, emprega ele toda a sua piedade e todo o seu talento artístico! É uma cena maravilhosa.

E se pensarmos que, na linguagem atual, Santo Elói era o Ministro da Fazenda daquele rei, que diferença em relação a certos estadistas contemporâneos!

“Atribuem-se-lhe os relicários de São Germano de Paris, São Denis, São Severino, São Martinho, Santa Colomba e Santa Genoveva. Além desses trabalhos, Santo Elói fundou numerosos mosteiros.”

Cumpre assinalar o extraordinário vigor de Santo Elói e sua intensa atividade. Afinal, era diplomata, político, ecônomo, ourives, artífice de relicários e ainda encontrava tempo e meios de fundar mosteiros! Foi um desses homens dos quais emanam mil obras, todas repletas de pensamento e santidade.

Zelo, sabedoria e bondade

“Tendo sido ordenado sacerdote, foi sagrado Bispo, ocupando a Sé episcopal de Noyon. Como muitos outros prelados da época merovíngia, foi um grande organizador, um apóstolo repleto de zelo, sabedoria e bondade.”

As fecundas ações deste homem de Deus evocam as de São Martinho de Tours, comentadas por nós em oportunidade anterior. Quer dizer, nas épocas de estruturação e organização da Cristandade medieval, a Providência suscitou vários santos que empreenderam inúmeras obras admiráveis. Um deles foi Santo Elói.

“Sua atividade irradiou-se para Flandres, Holanda e, segundo afirmam, Suécia e Dinamarca.”

Isso significa uma alta e árdua missão, pois naquele tempo a Suécia e a Dinamarca eram ainda habitadas por povos bárbaros. E até lá propagou-se o zelo apostólico do grande Santo Elói.

Velado por uma santa

Após essa vida de intenso serviço a Deus e ao próximo, ele receberia afinal o prêmio por suas virtudes. E o Pe. Rohrbacher registra esse tocante fato:
“Era grande sua fama, a tal ponto que, sabendo-o agonizante, a Rainha Santa Batilde fez longa viagem para vê-lo antes de morrer. Mas chegou a Noyon no dia seguinte ao de seu falecimento.”

Portanto, a magnífica existência de Santo Elói se encerra e logo se verifica esta bela cena: a Rainha Batilde, santa ela mesma, tendo notícia de que o Bispo de Noyon se achava à beira da morte, desloca-se por estradas difíceis, correndo riscos, protegida por um grande séquito, rezando para encontrar Santo Elói ainda vivo. Naturalmente, desejava receber algum conselho dele. Porém, alcança Noyon quando aquele já entregara sua alma a Deus.

Podemos imaginar a chegada de Santa Batilde à cidade, o cortejo de autoridades e de pessoas do povo que vão recebê-la e lhe transmitem a notícia da morte de Santo Elói. A Rainha se dirige imediatamente para junto do esquife, venera os restos mortais e eleva suas preces — por ele e a ele. É uma santa ao lado do cadáver de outro santo!

Eis um maravilhoso epílogo para uma vida pontilhada de episódios também maravilhosos, numa época repleta de maravilhoso.

Plinio Corrêa de Oliveira

“Não vos abandonarei”

Eu mesma estarei convosco. Tenho sempre velado por vós e vos concederei muitas graças.

Momento virá em que pensarão estar tudo perdido. Tende confiança, Eu não vos abandonarei.

Conhecereis minha visita e a proteção de Deus.

(Palavras de Nossa Senhora a Santa Catarina Labouré)

Santo André, Apóstolo: imitador do Divino Mestre em sua Paixão na Cruz

Ao ler a narração da morte de Santo André, Apóstolo, Dr. Plinio incentiva, uma vez mais, seus filhos espirituais ao amor à Cruz.

A Igreja comemora no dia 30 de novembro a festa do Apóstolo Santo André. Extraídas do Pe. Rohrbacher, como também do Abbé Daras, são as seguintes notas biográficas que passaremos a comentar.

“Santo André, primeiro Apóstolo a reconhecer Cristo, ao qual levou seu irmão Pedro, futuro primeiro chefe da Igreja, teve sempre um grande amor à Cruz. Na hora de sua morte, ao ver o madeiro no qual iriam pregá-lo, saudou-o com alegria.”

A saudação de Santo André à Cruz, feita neste momento, não deve ser considerada como pura literatura, pois cada palavra contém uma gravidade e um significado. Depois de açoitado, e ensanguentado, diante de sua cruz, a qual era em forma de “X” — por isto conhecida como Cruz de Santo André — está postado o Apóstolo mártir. Diante dela ele profere as seguintes palavras:

Cruz belíssima, desejada e amada com doçura

“Ó Cruz belíssima, que foste glorificada pelo contato que tiveste com o Corpo de Cristo! Grande Cruz, docemente desejada, ardentemente amada, sempre procurada, e afinal preparada para meu coração apressado, desejoso de ti.”

Eis a beleza da exclamação de um homem para a hora do sofrimento que Deus preparou para ele, e para a aceitação do cálice que ele tem de beber, a fim de obter sua glória no Céu. Cálice este, que, quando não sorvido, não alcança o prêmio celeste. Chega afinal a hora de seu máximo sofrimento, de seu martírio. Ele conhece o sofrimento, pois refletiu incontáveis vezes sobre a Paixão de Nosso Senhor, que assume sua alma nessa circunstância.

A cruz, que era um objeto de desprezo, um instrumento de punição para criminosos, contudo é por ele intitulada como “cruz belíssima”.

Por que belíssima? Ela foi glorificada pelo contato que teve com o Corpo de Cristo. Então ele acrescenta que a desejara com doçura.

Neste gesto é possível notar os inúmeros anos de amor ao martírio, que lhe tinha sido previsto e profetizado, a espera do momento em que ele faria por Deus este ato de holocausto desinteressado. Por amor a Jesus, ele deixou-se matar, assemelhando-se ao vaso de Santa Maria Madalena, quebrado com unguento junto aos pés do Senhor, sem utilidade prática, num ato de amor  desinteressado, em holocausto que não tinha outra razão de ser, senão seu próprio sacrifício. De forma tal que mesmo não sendo útil às almas, ou edificante para muitos, e ainda que não fosse uma humilhação para os adversários da Igreja, para manifestar a Deus que ele levava seu amor até aquele ponto, desejou a Cruz docemente, como algo suave.

Que beleza é a alma de um mártir, e quão belos sãos os esplendores existentes na alma de um mártir!

O que dá sentido à vida não é o prazer, mas a Cruz

“Grande Cruz, docemente desejada, ardentemente amada,…”

De todos os modos os homens fogem do sofrimento. O sofrimento é exatamente o que não desejam. Qualquer forma de luta contra as paixões, qualquer forma de renúncia ao mal, causa-lhe horror. A ideia predominante é de que a vida foi dada ao homem para que ele possa obter proveitos e vantagens, e que é preciso gozá-la, e o que não é fruir a vida, é morrer.

Pelo contrário, Santo André amava ardentemente sua cruz, compreendendo que o verdadeiro sentido da vida de um homem não é o gozo ou o prazer que tem, mas o sacrifício que pratica. Isto dá sentido à vida de um homem e, portanto, todo homem verdadeiramente sobrenatural, verdadeiramente homem, almeja o encontro com sua grande Cruz, com seu grande martírio.

Este é o filho da Cruz, o amigo da Cruz, como fala São Luís Grignion de Montfort.

Amar a Cruz, da qual todos fogem

“… sempre procurada…”

Não são muitos os homens que no momento de prestar contas a Deus, podem dizer que sempre buscaram a Cruz, e que em todos os acontecimentos de sua vida procuraram o sacrifício. Pelo contrário, geralmente os homens fogem da Cruz, pois não desejam de forma alguma o sacrifício. Entretanto, Santo André pôde dar de si mesmo o testemunho: “sempre procurada”. Assim, no instante de ele aproximar-se de sua cruz, estava disposto ao sacrifício.

Continua:
“… e afinal preparada para meu coração apressado, desejoso de ti.”

Manifesta-se aqui que Deus afinal concedera a Cruz para o coração que tinha grande afã da crucifixão.

O martírio significa o último holocausto. Nosso Senhor afirmou: “Ninguém tem um maior amor do que aquele que dá a vida pelos seus amigos (Jo 15, 13).

Ninguém pode dar maior prova do amor de Deus, do que desejar desta forma a Cruz.

“Cruz preparada para o meu coração, desejoso de ti, recolhe-me, ó cruz! Realmente abraça-me, retira-me dos homens, leva-me depressa, diligentemente, ao Mestre. Por ti Ele me receberá, Ele que por ti me resgatou.”

Pode haver uma oração mais bela do que esta? Existirá uma alma mais pronta para a visão beatífica do que uma alma que no momento da morte fala de tal forma?

Pode haver cátedra semelhante à Cruz?

“Por três dias esteve pregado na cruz, e durante três dias, do alto da cruz, ensinou aos homens”.

O fato é tão impressionante que pertence àqueles aos quais não competem comentários… Ficar dias preso à cruz, pregando ao povo, e ao cabo desses dias morrer, é um milagre extraordinário.

Apresenta a cruz como a mais grandiosa e augusta de todas as cátedras, cátedra do homem que sofre e, em nome de seu sofrimento, fala ao povo e produz enorme impressão. É uma tão grande plenitude de apostolado, que verdadeiramente não se sabe o que dizer.

Imaginemos um homem que era idoso, atado à cruz, no desconforto tremendo daquela situação, com açoites marcando seu corpo, possivelmente com as mãos e os pés perfurados. Nessa dor tremenda é mantido em vida por um verdadeiro milagre. Continua pregando ao povo, e a um povo ardoroso, contrito, provavelmente genuflexo, que lhe “bebia” as palavras, uma por uma. É uma das mais belas cenas de pregação católica de todos os tempos e de todos os lugares.

Pode-se imaginar quais foram as palavras, os ensinamentos, as graças, enfim, o martírio de Santo André? Que cátedra! Quem durante a vida possuiu uma cátedra semelhante à Cruz?

“Senhor, Rei Eterno da glória, recebei-me assim pendido como estou ao madeiro, à Cruz tão doce. Vós sois meu Deus, Vós a quem vi. Não permitais que me desliguem da Cruz; fazei isto por mim, Senhor, que conheci a virtude da Vossa Santa Cruz.”

E com estas palavras expirou.

Prêmio no Céu e nesta terra

Uma morte tão pulcra, da qual poder-se-ia dizer que apenas a de Nosso Senhor superou em beleza, era merecedora das maiores honras por parte da Santa Igreja, como de fato constatou-se séculos depois.

“Santo André foi sempre objeto de grande devoção por parte dos católicos. Assim foi, com indescritível entusiasmo, que a cabeça do santo foi recebida em Roma por Pio II, a 11 de abril de 1462. O Papa dirigiu-se ao encontro da preciosa relíquia. O cardeal grego, Besarion apresentou-lhe a caixa que a continha, e que estava colocada sobre um estrado. Antes de receber o sagrado depósito, Pio II pronunciou tocante alocução. Depois, beijou, chorando, a cabeça do Apóstolo, rezou diante dela; em seguida tomou-a nas mãos, segurando-a bem no alto, fez a volta no estrado para mostrá-la a todos os assistentes. Neste ponto, cantos e gritos dessa imensa multidão elevaram-se de todas as partes como uma única e grande voz, implorando a misericórdia de Deus.

A cabeça do Apóstolo foi depositada em São Pedro.”

Vê-se a descrição da linda cerimônia com que o Papa Pio II recebeu a relíquia de Santo André. O crânio de Santo André estava no Império Bizantino, infelizmente cismático. E à medida que os turcos invadiam o Império, algumas das relíquias insignes foram sendo retiradas do Império e levadas por mãos fiéis para terras católicas, onde pudessem ser adequadamente veneradas. Assim ocorreu com o crânio sagrado de Santo André.

Esse crânio foi recebido pelo Papa com toda a veneração narrada. Ele mesmo toma o relicário onde estava o crânio, e dá a volta no estrado para mostrar ao povo que o crânio de Santo André estava em Roma. Depois, o crânio, com enorme veneração, é levado até à Basílica de São Pedro e é colocado num relicário embutido numa das colunas da Basílica Vaticana.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 30/11/1964 e 29/11/65)

A mais augusta das cátedras

Santo André amava ardentemente a sua cruz, compreendendo que não é o gozo e o prazer que dão sentido à vida de um homem, mas o sacrifício que ele realiza. Portanto, todo homem verdadeiramente sobrenatural deseja carregar sua própria cruz.

Nosso Senhor disse: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a vida por seus amigos” (Jo 15, 13). Ninguém pode dar maior prova do amor de Deus, do que desejar, por esta forma, a cruz.

A cruz é a mais grandiosa e augusta de todas as cátedras. É a cátedra do homem que sofre e que, em nome e com os acentos de seu sofrimento, fala ao povo. Isso representa uma tal plenitude de apostolado, que verdadeiramente não se sabe o que dizer!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 30/11/1964 e 29/11/1965)

Revista Dr Plinio 188 (Novembro de 2013)