“Que as vossas cogitações sejam as minhas”

Ó Mãe indizivelmente grande, ó Rainha inexprimivelmente doce e acessível, ó arco-íris que reúne numa síntese incomparável os dois aspectos da grandeza, isto é, a superioridade e a dadivosidade: suplico-Vos me ajudeis a observar, a analisar, a compreender e a enlevar-me com vossa grandeza. Concedei-me que, pela meditação da vossa grandeza, as vossas cogitações e vias sejam as vias e as cogitações [deste filho]. Atendei a essa súplica, ó Coração Régio, Sapiencial e Imaculado de Maria. Amém.

(Oração composta por Dr. Plinio, na década de 60)

O centro da nossa existencia

A ossatura e a certeza de minha alma são o amor e a obediência à Santa Sé. A tal ponto que posso me definir espiritualmente como sendo escravo de Maria, e intelectualmente, como escravo da Santa Sé, aderindo a ela em tudo, por tudo, em todas as circunstâncias. A segurança de meus raciocínios se baseia no fato de serem desdobramentos da doutrina da Igreja, pois se algo há de que estou seguro, é da vinculação efetiva, indestrutível, entre Nosso Senhor, Nossa Senhora e a Santa Sé Católica, Apostólica, Romana. E quem diz Santa Sé, diz, sobretudo, o Papa.

O Papado é o centro da Igreja. A Igreja é o centro de nossa vida. Logo, o Papado é o centro de nossa existência.

Plinio Corrêa de Oliveira.

O socorro maternal que por nós intercede

O simbolismo mais tocante da imagem de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro está contido no gesto com que o Menino Jesus se apóia em Nossa Senhora, a qual segura as mãos d’Ele, significando que Ela governa os movimentos de Seu Divino Filho. Este era um antigo símbolo de homenagem e de obediência, o qual consistia em que o inferior colocasse suas mãos entre as do superior. Isto significava o domínio, o poder, deste sobre aquele, porque um homem que segura as mãos de outro evidentemente segura-o por inteiro.

Representando o Divino Infante desse modo o artista foi muito feliz e conseguiu indicar o que de fato acontece: a Santíssima Virgem pode tudo sobre o Menino Jesus e, nesse sentido, sua oração O “governa”!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 18 de novembro de 1968)

Nossa Senhora do Perpétuo Socorro

Tendo diante de si um quadro de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, invocação mariana que lhe tocava o mais fundo da alma, Dr. Plinio ressalta a importância de se recorrer a Maria Santíssima sob este título tão consolador: o socorro que nos vem sempre, a todo momento, maternal e infatigável.

 

Ao contrário de nossos costumeiros comentários sobre o Santo do mês, desta feita não os basearemos em biografia, mas numa gravura que retrata a imagem de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, cuja festa se celebra no dia 27 de junho.

Linda invocação de uma imagem bizantina

Preliminarmente, convém esclarecer um ponto que poderia ser levantado pela minha caríssima geração nova.

Este quadro é de inspiração bizantina, e não se deve ver nele o gênero de beleza que apresentam as imagens ocidentais, como, por exemplo, Nossa Senhora Auxiliadora, Nossa Senhora do Carmo, Nossa Senhora de Fátima, etc. Analisando-as, percebe-se que seus rostos são entalhados com requinte e esmero, como a face de uma boneca. Embora não seja esse o tipo de graciosidade refletida na fisionomia de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, pintada há vários séculos, entretanto ela nos revela uma intensa expressão.

Difundida na Igreja pelos padres redentoristas, trata-se de uma linda invocação, pois indica a misericórdia invariável de Maria Santíssima. O perpétuo socorro é um auxílio, um ato de clemência, de piedade, ininterrupto, que nunca se detém nem se suspende. “Nunca” significa em nenhum minuto, em nenhum lugar, em nenhum caso. Por pior que seja a situação de quem recorra a Nossa Senhora, sendo a Mãe de misericórdia, Ela sempre o atende.

Sobre o fundo áureo da glória

Esse quadro possui um fundo dourado, bastante usado durante o antigo império romano do Ocidente e do Oriente, e parte da Idade Média, nas pinturas de personagens eminentes, os quais não eram representados pelos artistas em salas, quartos ou paisagens, mas sobre o ouro, a fim de exprimir a ideia de que estavam desligados de qualquer outra coisa que não fosse a glória. Assim, essa imagem representaria o esplendor da Rainha do Céu, com sua fronte circundada por uma auréola ricamente lavorada, como o é também a que emoldura a face do Divino Filho ao braço da Mãe.

 Nossa Senhora está revestida de um manto azul que Lhe envolve igualmente a cabeça. Constitui uma espécie de xale, no qual refulge um adorno semelhante a uma estrela. Sob esse manto, a Santíssima Virgem traja uma túnica vermelha frisada com galões de ouro e enfeixada, à altura do pescoço, por uma pedra preciosa.

Todos esses aspectos têm seu simbolismo, por isso devemos notá-los antes de apontar o valor e o alcance de cada um deles.

O Menino Jesus se acha sentado sobre a mão esquerda de Nossa Senhora, inteiramente encostado n’Ela, como uma criança muito familiarizada com sua mãe e tendo prazer de estar junto a seu regaço. Entretanto, se distrai com alguma coisa para a qual está olhando. Dir-se-ia haver, da parte do artista, uma certa imperícia, pois o Divino Infante é um tanto grande para ser carregado dessa forma por Maria Santíssima, dando a impressão de desequilíbrio nas proporções dos personagens. O próprio tipo do corpo d’Ele, sem falar do tamanho, transmite mais a ideia de um adolescente do que um menino. Seja como for — e apesar de algum crítico por demais exigente apontar outros aparentes defeitos, que não são senão expressões do estilo próprio da época e dessa cultura — tal imagem é considerada uma grande e interessante obra de arte.

Vestindo uma túnica verde, o Menino-Deus traz na cintura um tecido róseo e, sobre o ombro direito, uma capa dourada que lhe envolve o resto do corpo. Sendo esta muito ampla, forma numerosas pregas, as quais me parecem bem estudadas, dando a impressão, juntamente com a túnica e a faixa, de naturalidade.

Em cada lado da imagem há um anjo ostentando instrumentos da Paixão. Ambos aparecem de asas e auréola. O da direita, com vestes vermelhas, porta a Cruz que, curiosamente, possui três braços de tamanhos distintos. O da esquerda, de túnica verde, segura uma lança e a esponja na qual foi embebido o fel oferecido a Nosso Senhor no alto do Calvário.

Extraordinário afeto materno

A imagem de Maria é sobremaneira expressiva, devido à atitude profundamente materna que Ela demonstra. É a Mãe que carrega seu Filho com naturalidade e afeto extraordinários, transparecendo a intimidade magnífica da Santíssima Virgem com o Menino Jesus. A expressão de seu olhar é recolhida, de quem reza. Ela segura o Filho com desvelo e, ao mesmo tempo, com imenso respeito e veneração. Está certa de que tem nos braços o próprio Deus encarnado e a sua atitude é de adoração.

A face de Nossa Senhora talvez pudesse ser um pouco mais bem desenhada. Embora a boca seja delicada, o pescoço parece rígido demais, e o nariz se estende num comprimento excessivo. Mas esses pormenores secundários não diminuem o sopro da arte autêntica, patenteado na expressão recolhida e carinhosa da fisionomia, bem como na nobreza do porte.

Tocantes simbolismos

Analisemos agora o simbolismo. Nossa Senhora está revestida de uma túnica vermelha e um manto azul. Nos primeiros séculos do Cristianismo, a cor azul distinguia as virgens e a vermelha, as mães. De maneira que essa conjugação cromática nos apresenta Maria como a Virgem-Mãe. Trata-se de uma bela combinação, um simbolismo acertado e discreto que define Nossa Senhora.

No meu entender, o simbolismo mais tocante está contido no gesto com que a Mãe segura as mãos do Menino Jesus, envolvendo-as suavemente, indicando como Ela governa seu Divino Filho. Tal atitude representava, nos tempos antigos, a homenagem e a obediência do inferior para com seu superior, e do poder deste sobre aquele, pois uma pessoa que segura as mãos de outra evidentemente a domina por inteiro. Então, para mostrar como a virgem pode tudo junto a Deus, através da oração, com muita naturalidade o artista representou o Menino Jesus prestando este ato de submissão à sua Mãe Santíssima. A posição d’Ele é tão natural e freqüente entre as crianças que, sem conhecer esse simbolismo, não se diria que o pintor teve a intenção de exprimi-lo.

É próprio de quadros como esse que o significado dos símbolos quase não aflore, e assim, quem o contemple, pode ter o gosto de adivinhar o sentido de cada um deles. Trata-se de uma ocupação piedosa e nobre, que retém a atenção e é incomparavelmente superior às distrações do tipo palavras-cruzadas, por exemplo…

Nossa Senhora segura o Menino Jesus o qual olha para dois anjos portando instrumentos de sua Paixão. Quer dizer, ao mesmo tempo em que se lembra n’Ela a Virgem e a Mãe, recorda-se n’Ele o Redentor do gênero humano, esperado pelos Patriarcas e Profetas.

O socorro por um fio

Pormenor pitoresco, no pé esquerdo do Divino Infante vê-se a sandália bem presa, porém a do pé direito está desatada, quase caindo, como que obrigando-O a um movimento necessário para retê-la. Penso que esta última significa a situação da alma pecadora, sustentada pelo Menino-Deus para não cair no abismo da perdição. Indica, portanto, o perpétuo socorro: é Nossa Senhora que intercede pelo faltoso, junto ao Filho que Ela segura nos braços e pode salvar o homem acabrunhado de culpas.

Tenho conhecido em minha vida tantas almas suspensas, como esta sandália, e depois se erguerem e ficarem firmes como a outra, que não seria desprovida de beleza se tal fosse a explicação desse pormenor.

Aliás, no verso de um “santinho” dessa imagem que me foi presenteado certa vez, vinha esta linda interpretação: “A sandália desatada, quiçá símbolo de um pecador preso ainda a Jesus por um fio, o último — a devoção a Nossa Senhora”.

Nos ângulos superiores do quadro há algumas letras gregas que significam “Mãe de Deus”; à direita do Menino Jesus, outras que querem dizer “Jesus Cristo”. As que aparecem acima do anjo à esquerda significam “São Miguel Arcanjo”, e as que estão sobre o anjo à direita, “São Gabriel”.

Por fim, a estrela que refulge no manto de Nossa Senhora indica, uma vez mais, seu perpétuo e maternal socorro, sua misericórdia infatigável a nos guiar em meio às vagas tormentosas desta vida, rumo ao Céu.

 

Obra-prima da Idade Média

Típica cidade medieval italiana, Orvieto é rendilhada de pitorescos arcos românicos, de ogivas e edifícios góticos talhados em grandes pedras, cujo conjunto compõe um urbanismo lindo e imprevisto.

Sobretudo, nela se ergue, a meu ver, uma das fachadas de igreja mais esplêndidas que há no mundo. Ao se contemplar a frente da catedral de Orvieto, ornada de cenas que representam a vida de Maria Santíssima, têm-se a impressão de um frescor de colorido que se diria, à primeira vista, inexplicável. Com efeito, construída na Idade Média, séculos de chuva, de neve e de sol incidiram sobre esses painéis que, entretanto, conservam um viço magnífico.

A explicação, porém, é simples: são mosaicos. Portanto, quadros compostos de incontáveis pedrinhas coloridas, numa combinação de matizes e tonalidades tão fascinante que faz dessa fachada uma das maravilhas da arte católica na Terra.

A rosácea central, emoldurada de esculturas e lavores góticos, apenas ressalta a feeria das cenas policromadas que ornam os vários tímpanos. De modo particular, tal frescor de colorido se nota na pintura superior onde se vê a coroação de Nossa Senhora e naquela que encima o pórtico principal, em que aparece a Virgem Santíssima venerada por anjos. Estes como que esgotaram suas manifestações de devoção a Ela, e já não sabem o que mais fazer para exprimir sua veneração, sua admiração e seu amor à Mãe de Deus. Toda a cena se insere num “décor” extraordinário e rico em detalhes, simbolismos, etc. Como essas, as outras cenas também se rivalizam em beleza e atratividade, evocando significativos episódios das vidas de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Nossa Senhora.

O restante da fachada é um requintado trabalho de arquitetura, com molduras, colunas, arcarias e florões góticos, recortados em lindo mármore branco, vermelho ou preto. Na verdade, a escultura medieval se esmerava em adornar seus monumentos e edifícios — de maneira especial as igrejas — com pormenores bonitos. Daí se poder observar num pequeno pedaço de coluna ou de arco, todo um fantástico trabalho de artífice que procurava dar de si o melhor, o mais perfeito.

Na delicadeza e no frescor das suas cores, na animação dos personagens representados em seus mosaicos, no movimento dos seus arcos, na elevação de suas colunas e torres elegantes, a catedral de Orvieto é uma autêntica obra-prima da Idade Média. v

 

Plinio  Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 17/11/1988)

 

Maternal bonança

Maria Santíssima nos socorre em meio às intempéries espirituais que todos padecemos ao longo de nosso palmilhar rumo ao Céu.

Tempestades das lutas face às tentações, ao pecado, à tibieza, ou diante das aflições do dia-a-dia.

Tempestades da vida, tempestades da alma. Em todas essas circunstâncias mais borrascosas ou menos, Nossa Senhora vem ao nosso encontro, como a mãe que se debruça, sôfrega de solicitude, sobre o filho necessitado. Acode-nos imediatamente, 

Fruto da santidade da Igreja

Na história da Inglaterra, vemos os grandes processos de atonia, de tibieza, de indiferentismo que preparam depois toda a massa católica para as maiores defecções que deram no protestantismo.

Mas, ao lado disso, nos deparamos com uma coisa bonita: a permanência da nota da santidade da Igreja. Porque, apesar de todas essas tristezas, é na Igreja que se vão encontrar os mártires, os homens de um caráter admirável, que preferem tudo a ceder diante do adversário, e que expõem tudo quanto têm, e até a própria vida, para se manterem fiéis à verdadeira tradição e à continuidade eclesiástica.

Quer dizer, mesmo quando a putrefação invade os meios católicos, a santidade da Igreja produz frutos excepcionais e tão maravilhosos como fora da Igreja não se encontram.

Assim, ao mesmo tempo em que a Igreja é traída, renegada, vemo-la deitar uns lampejos memoráveis que provam a divindade dela. Nisto está uma espécie de afirmação contínua da assistência do Divino Espírito Santo na Igreja.

Esta me parece ser a reflexão mais oportuna que podemos fazer sobre o martírio de São João Fisher.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 22/6/1965)

São Luís Gonzaga

Mais do que pela alta nobreza de sangue que o distinguia, São Luís Gonzaga reluziu na história por sua santidade estelar, especialmente vincada na prática exímia e heroica da virtude da castidade. Resguardando sua alma com um requinte de pudor e de fidelidade aos Mandamentos divinos, rejeitou até o fim da vida qualquer forma de mal, sempre ancorado na verdade, na lógica e na justiça.

Varão talhado para grandes lutas, de físico vigoroso e espírito delicadíssimo, pode-se dizer que a inocência de São Luís começa onde a de muitos outros terminaram. Por isso a Santa Igreja o exaltou como o arquétipo da pureza e como uma de suas mais rutilantes glórias.

São João Batista, percursor do Cordeiro de Deus

No mês de junho a Igreja comemora a festa de São João Batista, o Precursor de Nosso Senhor Jesus Cristo. Apresentamos a nossos leitores um eloquente comentário tecido  por Dr. Plinio, pelo qual conheceremos mais profundamente a vida e a personalidade daquele santo varão cuja voz clamou no deserto, preparando os caminhos do Senhor.

 

A vida e missão profética de São João Batista, marcadas pela vigorosa personalidade do Precursor, teve um início que nos enche de admiração e enlevo, por nele estar envolvida a própria Mãe de Deus.

Como se sabe, na mesma ocasião em que o Verbo Eterno se encarnava no seu seio puríssimo, Nossa Senhora recebeu do Anjo a revelação de que sua prima Isabel também esperava uma criança. Ciente dessa feliz circunstância, Maria decidiu atravessar as estradas e montanhas da Judeia para se encontrar com sua parente e compartilhar com ela as alegrias daquela futura e tão ansiada maternidade.

O encontro entre as duas é uma das mais lindas páginas da História Sagrada, magistralmente imaginado e retratado pelos maiores artistas da iconografia católica.

Além disso, foi nesse momento que Nossa Senhora entoou o único hino que se tem notícia haver brotado de seus lábios virginais — o “Magnificat” jubilosa do Batista, conforme o exprimiu Santa Isabel: “Donde me vem esta honra de vir a mim a mãe de meu Senhor? Pois assim que a voz de tua saudação chegou aos meus ouvidos, a criança estremeceu de alegria no meu seio” (Lc 1, 43-44).

Nossa Senhora falou, e um frêmito de contentamento percorreu o frágil corpo do menino no claustro materno. Por quê?

Segundo conceituados autores — não se trata, portanto, de opinião imposta pela Igreja —, São João Batista, sendo o último dos profetas do Antigo Testamento, podia aquilatar o que representava a Mãe de Deus e o significado da Encarnação que n’Ela se operara, tão intimamente relacionada com sua missão. Afinal, ele iria anunciar o advento iminente do Salvador do mundo. Assim, ao ouvir a voz da Virgem Bendita, ao sentir a presença de Deus, o menino estremeceu de alegria. E, também de acordo com os teólogos, nesse momento, ainda no seio materno, ele foi santificado por Maria.

Podemos conjecturar que Nossa Senhora comunicou, de um modo misterioso, algo do espírito d’Ela a São João Batista. E tudo quanto este fez em sua vida, era uma decorrência dessa graça inicial recebida pela intercessão de Maria, constantemente intensificada até atingir uma plenitude no momento de seu martírio. Então, o São João Batista asceta e austero, o pregador do Cordeiro Deus, o herói que enfrenta Herodes e morre como testemunha da Fé, sublime de grandeza e de serenidade, nos revela reflexos da própria alma de Nossa Senhora que lhe foram participados no encontro das duas primas.

Desse fato maravilhoso decorre uma importante aplicação para nossa vida espiritual. Pois nele discernimos o poder insondável de Nossa Senhora como Medianeira de todas as graças e onipotência suplicante em nosso favor. O eco da voz d’Ela santificou um homem de um momento para outro, infundiu-lhe um grau eminente de perfeição moral.

Ora, isso é o que devemos esperar que a Santíssima Virgem obtenha para cada um de nós. Peçamos a Ela, com inteira confiança, que fale no íntimo de nossa alma, e que esse timbre imaculado nos santifique de um instante para outro, concedendo-nos uma virtude que anos de lutas e de trabalhos não nos proporcionaram. Por isso, todo aquele que tenha algum desânimo, tristeza ou perplexidade na vida espiritual, pode fazer sua a prece que a liturgia tomou das palavras do centurião a Jesus, e dirigir-se a Maria Santíssima: “Senhora, eu não sou digno de ouvir a vossa voz, mas dizei uma só palavra e a minha alma será transformada, se Vós assim o quiserdes”.

Portanto, devemos desejar que a voz de Nossa Senhora nos toque a alma e a faça estremecer de júbilo, como o fez com a alma de São João Batista.

Semelhança física com Jesus

A par desse extraordinário acontecimento ocorrido nos primórdios de sua existência, é sobremaneira belo considerarmos o papel de São João na vida do Filho de Deus. Basta imaginarmos quantas vezes Nosso Senhor não terá louvado e glorificado São João Batista no interior de sua alma! Quanto vezes, pregando para as multidões, observando a alma deste, daquele ou daquele outro, preparada pela “voz que clamava no deserto”, terá pensado: “Aqui passou o meu dileto, meu precursor, o homem nascido do mesmo sangue que eu, descendente de David, abrindo os caminhos dos corações para Mim. E naquele lampejo de virtude, naquele olhar de simpatia, naquele ato de adoração, naquela maior facilidade para tal conversão, naquela pureza expressa em tal outra alma, vejo o fruto da pregação do meu dileto!”

Quantas e quantas vezes assim se encontraram as almas do Precursor e de Nosso Senhor Jesus Cristo!

Agora, qual era o aspecto físico e o semblante moral desse homem?

As descrições no-lo apresenta um tanto parecido com Nosso Senhor. Jesus era de estatura elevada, de uma compleição harmoniosa e forte, com uma plenitude de varonilidade unida a uma delicadeza e a uma nota de sobrenatural, constituindo um todo do qual podemos ter ideia contemplando o Santo Sudário de Turim.

Assim também seria São João Batista, porém com uma característica diferente. O Precursor representa a penitência, o jejum, a flagelação, a solidão no deserto, a mortificação. Por causa disso, seu corpo tinha a pele bronzeada por mil sóis, pelos calores ardentes do Oriente Médio. Além disso, apesar de forte, sem ser esquelético nem de natureza doentia, era entretanto muito magro, de tal maneira os jejuns o haviam consumido.

Retidão e severidade

Quanto ao feitio moral, é inegável que São João Batista, embora repassado de bondade e compaixão, era a própria representação da severidade. Ele peregrinava por todas as partes clamando: “Fazei penitência, porque o Senhor está próximo!”, e sua única preocupação era a de cumprir a vocação para a qual fora suscitado: levar os corações a se purificarem, para receber dignamente o Messias.

Ora, fazer penitência não é coisa simples. Só se convence alguém a se mortificar, quando o convencemos de que pecou. E nisso estava o cerne da missão de São João Batista. Quer dizer, ele se entregara ao jejum e aos sacrifícios, para pagar pelas faltas do povo. Para que Deus, em atenção à penitência que ele próprio praticara, concedesse eficácia às suas palavras e perdoasse aqueles aos quais pregaria.

Porém, para aquela gente em grande parte tomada pela ganância, voltada para as coisas terrenas, adoradora do conforto e da vida agradável (na medida que as condições daquele tempo o permitiam), aparece um homem que era o contrário de tudo isso. Desprendido, desapegado, um facho ardente de amor de Deus, vivendo apenas para realizar sua tarefa. Àqueles que esperavam um Messias temporal, um rei poderoso, este era anunciado, não por um guerreiro nem por um potentado, mas por um homem penitente.

O Batista produziu um choque nas pessoas. E o contraste do homem sensual, ganancioso, com aquele varão reto, simples, eloquente, que o tempo inteiro bradava: “Fazei penitência!”, deixava as consciências profundamente abaladas. Ele produzia uma grande vergonha. As pessoas compreendiam, no contato com São João, que não deviam ser ruins. E o Precursor completava esse efeito, dizendo-lhes: “Endireitai os caminhos do Senhor. Aí vem o Messias. O dia de Deus está próximo”, etc.

Ele era, portanto, a própria expressão da limpeza de alma, porque o puro detesta o sujo, o reto detesta o sinuoso, o corajoso aborrece o covarde. Nisso ele era a severidade, essa virtude pela qual se rejeita o que deve ser rejeitado. Diante das suas admoestações, os outros sentiam e reconheciam seus próprios defeitos. Ele passava e todos o respeitavam, todos os obedeciam. E assim ia preparando os caminhos de Deus.

Até o desenlace de sua intensa trajetória neste mundo, interrompida de modo criminoso pela poltronice e luxúria de um rei infame, incapaz de resistir às artimanhas da mulher que desposara ilegitimamente. A pedido dela, São João Batista morreu decapitado, vertendo seu sangue em união com o do Cordeiro de Deus, que logo seria também imolado no Calvário.

Graça a pedir a São João Batista

Uma pergunta que acredito muito interessante é esta: se São João Batista passasse por uma cidade de hoje, que efeito ele produziria? Se, de repente, em nosso bairro, em nossa rua, em nossa própria casa, surgisse esse homem com a sua fisionomia austera e bondosa, dizendo-nos: “Fazei penitência!”, que sentimentos despertaria em nós?

Imaginemos que, ao vê-lo, sentíssemos com maior agudeza todos os nossos defeitos e o mal que há neles; penetrássemos nossa consciência no mais fundo, permitindo que se realizasse conosco o que David exprime no Salmo: “Peccatum meum contra me est semper”. Ou seja, os meus pecados, minhas faltas como que se destacaram de mim e se puseram à minha frente como um outro homem, onde permanecem continuamente me censurando. Ali estou eu com todos os meus defeitos.

Achar-nos-íamos preparados para receber esta presença celeste, cheia de severidade e de bondade? Amaríamos aquele que nos apontasse os nossos defeitos por inteiro? Seríamos ávidos dessa revelação e dispostos a aproveitá-la? Nós o agradeceríamos? O que nos aconteceria?

A melhor reação que poderíamos manifestar não é outra senão de reconhecido enlevo, de humildade e sincera contrição perante as justas censuras que ele nos dirigiria. Nossa atitude deveria ser a de quem se sente feliz e aliviado por lhe terem sido reveladas as faltas que o impedem de trilhar as vias da perfeição. E exclamar: “Que maravilha de homem! Veja como ele detesta os meus pecados! Como ele é puro, íntegro, sem nada dessa mazela horrorosa que há em mim! Como ele aponta com clareza o que tenho de ruim, e me deixa contente porque alguém me admoesta como mereço!”

Em seguida, ajoelharíamos e oscularíamos os pés dele, rogando-lhe: “Ó enviado de Deus, dizei-me tudo. Necessito dessa repreensão que me tire de meu letargo espiritual e me dê vontade, finalmente, de ser bom. Fazei descer sobre mim as torrentes regeneradoras e purificadoras de vossa severidade. Falai, que eu vos escuto!”

E assim, como outrora preparou ele os caminhos do Senhor em Israel, São João Batista também aplainaria em nossas almas as veredas que a conduzem ao Reino de Deus.

Peçamos, pois, ao santo Precursor que, pela intercessão de Maria Virgem, alcance-nos da misericórdia divina essa insigne graça de reconhecermos e vencermos nossos defeitos, para nos tornarmos dignos da bem-aventurança eterna.

Roma sparita

A Roma dos Papas não tinha a monotonia das grandes cidades modernas, mas possuía muita fisionomia, porque as pessoas, ao fazerem suas residências, comunicavam-lhes seu caráter, seu modo de ser, com o pitoresco que causa o sorriso.

 

Vou expor o que era a Roma papal, para termos um pouco a ideia de que tipo de cidade se tratava, e depois iremos considerar algumas fotografias selecionadas de um álbum chamado “Roma sparita”, ou seja, “Roma desaparecida”. Quer dizer, a Roma papal que foi demolida pelas reformas nela introduzidas pela Casa de Sabóia, a qual unificou a Península Italiana e se tornou a única dominadora da Cidade de Roma, onde estabeleceu a sua capital, transformando-a, de cidade antiga que era, numa grande cidade do tipo moderno.

Cidade não planejada, com muita fisionomia

O que vem a ser a Roma do tempo dos Papas? É, ao mesmo tempo, uma Roma medieval com todas as características da vida medieval, um tanto reformada no tempo do período do “Ancien Régime”(1), e uma cidade eminentemente eclesiástica.

Quando falo de uma cidade medieval, o que eu quero indicar? Era uma cidade raras vezes planejada de antemão. Por exemplo, se tomarmos, em São Paulo, o bairro Higienópolis, perceberemos que o traçado das ruas não foi espontâneo: as casas não foram se acrescentando umas às outras normalmente, mas houve uma empresa que planejou e fez o loteamento do bairro, devido ao qual todas as ruas são em linha reta e se cortam em ângulo reto, fazendo do bairro uma espécie de tabuleiro de xadrez. O mesmo se poderia dizer do bairro do Pacaembu, que foi urbanizado por uma grande empresa norte-americana.

Na época em que o Pacaembu foi urbanizado, o urbanismo tipo Higienópolis estava fora de moda. Tinha-se considerado que as avenidas retilíneas, cortando-se em ângulo reto e formando quarteirões quadrados, eram monótonas. Então fizeram zigue-zagues e curvas no Pacaembu, que existem também em outros bairros de São Paulo: Pinheiros, Jardim América, Jardim Europa, em que não se usa mais a linha reta, mas as grandes curvas macias.

Porém o que nos interessa no momento é o fato de que as ruas não foram feitas por cada morador, que colocou sua casa onde queria, portanto, um pouco mais recuada da rua, ou um pouco mais para a frente, e dando à via pública um gráfico todo casual, fortuito; aquilo foi planejado de antemão.

Também as construções eram menos planejadas do que se tornaram depois. Uma família construía uma casa; nascia um filho, mandava construir um quarto no teto da residência; nascia outro filho, colocava dois quartos. De repente um velho, que morava num quarto da casa, começava a ter reumatismo: abria-se uma janela no lugar onde devia entrar sol para o ancião se aquecer. Não se incomodavam em saber se a casa ficava simétrica ou assimétrica, bonita ou feia. Era uma necessidade do velho para não ficar reumático. O idoso ficava muito pouco consolado com a ideia de sentir seu reumatismo, para evitar que quem passasse fora achasse feia a janela que ele ia abrir. Ele queria o sol sobre a perna ou o braço doente. Quer dizer, circunstâncias imprevistas foram formando essas cidades.

Por causa disso, elas não tiveram a monotonia das grandes cidades modernas e possuíam muita fisionomia: porque as pessoas que iam fazendo essas construções imprevistas comunicavam seu caráter, seu modo de ser, sua fisionomia às casas que estavam sendo construídas.

De onde Roma, como todas as cidades desse tipo, era uma cidade com fisionomia. A esse dote de ter fisionomia, nós poderíamos chamar, em certo sentido, de pitoresco. O pitoresco é a fisionomia quando, pelo imprevisto, ela faz sorrir um pouco.

O Panteon e o túmulo de Adriano

Há outra coisa que se acrescentava à Roma: ela era uma cidade velhíssima, nascida mitologicamente de Rômulo e Remo. Portanto, uns sete, oito séculos antes de Jesus Cristo. E com aquele senso de conservação existente na Europa, do qual nós, brasileiros, não temos uma ideia. Até hoje certos prédios do tempo dos remotos romanos são utilizados para uso comum. O Panteon de Roma era o templo onde adoravam todos os deuses gentílicos antigos. E, para a Roma de antigamente, era uma igreja bem grande. O Panteon esteve franqueado ao culto pagão até o momento em que Constantino mandou fechá-lo. Quando o Imperador deu a ordem de fechar, não pensem que, à moderna, derrubaram o Panteon; ele mandou instalar uma igreja católica ali. E o Panteon é hoje uma paróquia. As pessoas se casam, são batizadas, confessam-se lá, e a igreja funciona como qualquer outra. Ali, há séculos, Júpiter era adorado, e agora é adorado Nosso Senhor Jesus Cristo. E o prédio ainda se conserva.

A sepultura do Imperador Adriano foi aproveitada: é uma torre cilíndrica de pouca altura e imenso diâmetro. Foi utilizada, durante a Idade Média, para fortaleza. Depois, uma parte dessa fortaleza foi aproveitada para palácio. O túmulo de Adriano não existe mais. Mas podem-se visitar as muralhas da fortaleza e o palácio, que agora é museu. De maneira que houve a seguinte mutação: de sepultura de Adriano para fortaleza, de fortaleza para palácio, de palácio a museu.

Em Roma havia mais de 400 igrejas

Vejamos, agora, as fotografias.

Eis um pórtico, um arco numa rua no gueto de Roma. A rua existe para uma casa que está em cima.

Ali, uma rua popular, com a roupa lavada, estendida e gotejando em cima de quem passa; duas velhas comentam qualquer coisa. É a pequena vida caseira que sai da casa e se espraia pela rua afora. Reconheçamos que é bem diferente da Avenida Paulista(2).

Observem um recanto da velha Roma. Uma casa, o alinhamento caprichoso da rua, uma bonita torre no meio de casarões velhos, que eu quase chamaria leprosos. Um dossel sobre a imagem talvez de Nossa Senhora com o Menino Jesus. Nichos com imagens de Santos assim eram frequentes na Roma daquele tempo.

Vejam a escadaria que perfura uma casa a qual já foi construída assim. A rua é uma escadaria que passa no meio da velha casa, sem eira nem beira, tem um bonito balcão de alguma família nobre ou rica que mora aqui. E isso é uma coisa muito comum até hoje na Itália. Metade da casa é cortiço, a outra metade é um palácio de nobres.

Duas irmãs da Caridade de São Vicente de Paulo, com seus lindos chapéus bretões, andando numa espécie de praça de terra, sem calçamento, da velha Roma, com uma magnífica palmeira se espraiando suavemente no clima romano. Uma nobre torre antiga e mais adiante outra torre. Roma era uma cidade com mais de 400 igrejas.

Cidade das fontes

Esse terreno foi rebaixado para a construção das casas. Mas aqui, por qualquer razão, o dono não quis que rebaixasse e ficou alto. E permaneceu a árvore que se eleva de modo pitoresco aqui. Um muro, uma água parada e uma bela igreja ao fundo.

Pormenor da vida do tempo: um cachorro, que procura comida pela rua. É um cão sem dono, na infeliz situação dos cachorros sem dono.

Uma senhora conduzindo o filho para passear. A criança está vendo o cachorro, mas ela está tocando uma espécie de corneta para ver o que o cão faz. Manifestação musical do gênero italiano. O cachorro é utilitário e está se preocupando exclusivamente com a comida. Não liga para nada.

Aqui o reboco da casa caiu, mas ela pode durar mais mil anos. Não pensem que a escada é para escorar a casa; está encostada do lado de fora para qualquer coisa. Um cavalo bem lustroso e bonito, uma porta com um nobre arco, um pátio cimentado de pedras, mas sem qualquer regularidade.

Outra viela romana. Nas cidades medievais as ruas eram muito estreitas para caber tudo dentro das muralhas. A iluminação pública já havia começado. Aqui há um poste com iluminação a gás, que era o grande progresso do momento. Também significava progresso a placa com o nome da rua.

Está chovendo, duas senhoras passam abrigadas num guarda-chuva insuficiente, e aqui há uma comerciante oferecendo algum produto. Notem a desigualdade do solo, como é tudo feito mais ou menos ao acaso.

Isso não se vê de jeito nenhum em rua moderna: um arco comunicando uma casa com a outra. Eu não sei por que se condena isso, que é uma coisa que pode prestar muito serviço.

Uma bela torre. Está mal cuidada e velha, mas é nobre como uma velha marquesa que conserva sua nobreza, apesar de todas as devastações do tempo e do dinheiro.

Numa praça pública, um homem dança, e outro não presta atenção na dança. Esse aqui parece um aleijado apoiado num bordão, e vai andando com uma sacola e uma caixa de música. Essas cidades eram todas muito musicais. Cantava-se, tocava-se violino, dançava-se mais ou menos em todos os lugares e ouvia-se música sair de todas as janelas, com a voz bonita e o senso melódico tão frequente na Itália.

Cena pitoresca mais uma vez. O burrico puxado pelo homem, carregado, que vai devagarzinho pela cidade. Provavelmente um vendedor ambulante.

Aqui, uma como que pequena coluna, e dali brota água. Roma é a cidade das fontes, em geral com água muito límpida, muito boa.

Significado da palavra ”pitoresco”

Uma torre que foi fortaleza durante a Idade Média. Tudo caiu, mas ao lado foi construído um pitoresco jardim suspenso. Um dos pitorescos em Roma são os terraços como esse, onde se colocam guarda-sóis grandes e há restaurantes no local. Um homem toca violino para os que comem e bebem, e ficam olhando o movimento da rua, onde se vê um monge dominicano atravessando-a. A cidade dos Papas era a cidade dos frades.

Esse menino tem um lado pitoresco. É um menino de rua que não teve nenhuma educação e, portanto, está deitado na carroça como estaria em sua casa. Se ele estivesse de bruços na cama, tentando pegar um rato no quarto dele, sua atitude não seria diferente. Apesar disso, o gesto todo dele não deixa de ter certa harmonia e muita naturalidade. Não é um gesto feio. Tem certa harmonia de posição e de atitude, e a naturalidade de uma pessoa que se sente completamente à vontade na cidade. É a cidade dele, feita para ele, na qual ele está em casa como em sua residência particular.

Esse inteiro “laissez faire”(3) faz parte do pitoresco da atitude do menino. Alguém diria que isso não deveria ser assim, e que ele não é um menino educado. Não é verdade. A educação tem vários graus. Ele possui essa forma principal e mínima de educação, que é a virtude. Ele está composto, direito, porque é um menino que teve uma educação pura. A pureza é o principal da educação, e não as maneiras. Maneiras ele não tem, mas possui a compostura do menino direito. É o essencial.

A ideia que eu tenho de pitoresco é imaginar morando ali gente que são os pais e tios desse menino e desse outro que está atrás. Talvez esse casal e esses dois homens sejam moradores aqui. E gente do povinho, inteligente como é habitualmente o italiano, gente que mora nos casebres, mas que se pôs numa situação muito pitoresca: tendo sempre diante dos olhos esse templo, a torre e o Tibre milenários, e que presencia tudo isso como de um terraço. O cenário é magnífico: encostado num templo pagão, uma torre do fim da Idade Média, olhando o rio romano passar como quem vê a vida fluir com toda a navegação do Tibre.

Isso é pitoresco porque forma quadros. A palavra “pitoresco” vem de pintura: “pictus”, pintado. O pitoresco está no homem do povinho, com sua inteligência, sua vivacidade, inalando tudo isso sem saber bem o que é, e vivendo aqui à romana. Quer dizer, à noite, fazendo um jantar entre o parapeito e a casa, comendo uma polenta, bebendo vinho quente e tocando num instrumento de corda que talvez tenha uma corda ou duas a menos, e cantando a plena voz numa noite enluarada de Roma. Isso é pitoresco.  v

 

(Continua no próximo número)

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 29/1/1977)

Revista Dr Plinio 207 (Junho de 2015)

 

1) Do francês: Antigo Regime. Sistema social e político aristocrático em vigor na França entre os séculos XVI e XVIII.

2) Extensa via pública localizada entre as zonas centro-sul, central e oeste da cidade de São Paulo.

3) Do francês: deixai fazer. Aqui tem o sentido de distender-se.