Imagem épica do Criador

Que maravilhoso conglomerado de torres! Quanta força nessas torres, quanta solidez nesse conglomerado! Que harmonia misteriosa: uma delicadeza,  contrastando
agradavelmente com o que têm de forte, de vigoroso, de guerreiro!

 

Em geral, uma pessoa imbuída de elevados sentimentos encontra especial agrado na admiração por algo que seja verdadeiramente admirável. Ela possui o que podemos chamar de espírito épico, ou seja, um espírito propenso a desejar e a se entusiasmar por tudo o que é maravilhoso.

Uma alma assim, impulsionada pelas graças que recebeu no batismo, e por aquelas que Deus derrama sobre todo católico, tende a ver as alturas épicas do pensamento. Mais ainda, as alturas épicas da ordem do universo, as alturas épicas da história, as alturas épicas quão mais sublimes e mais extraordinárias da Religião Católica e da Civilização Cristã.

Imaginemos, à guisa de exemplificação, que essa pessoa seja colocada diante de uma das mais belas construções do século XVI: o castelo de Chambord, no Vale do Loire, França. Contemplando o magnífico monumento exposto a seus olhos, tomar-se-ia de entusiasmada admiração.

Que maravilhoso conglomerado de torres! Quanta força nessas torres, quanta solidez nesse conglomerado! Que harmonia misteriosa naquilo que faz com que, ao mesmo tempo, elas pareçam estar colocadas um pouco ao acaso, mas deem, no seu conjunto, uma sensação de delicadeza, contrastando agradavelmente com o que têm de forte, de vigoroso, de guerreiro!

Há qualquer coisa de nobre nesses tetos azulados, que descem tão harmonicamente até a parte de cantaria. Há algo de robusto nessas pedras atarrachadas, agarradas ao chão de tal maneira que parecem dizer: “Quem quiser derrubar-me se espatifa, quem quiser arrancar-me do solo tem que tirar o mundo dos seus próprios gonzos, porque eu sou uma torre do castelo de Chambord e ninguém me leva daqui”.

Dessas análises ainda se poderia subir mais alto: como é bela a conexão entre a força e a delicadeza, entre o planejado do castelo e o aparente espontâneo da disposição daquelas torres! Como é belo, portanto, o ver juntas qualidades antitéticas.

E por que oferecem uma beleza especial as qualidades antitéticas juntas?

Porque o princípio de toda beleza é a unidade na variedade. E nada de mais variado do que a antítese completa entre a delicadeza e a força, e nada de mais belo do que ver os elementos dessa antítese se reunirem numa só harmonia. A unidade na variedade é bela porque é a melhor imagem de Deus na criação natural. É um dos princípios de perfeição e excelência que o Altíssimo pôs no universo. É uma das exigências da alma humana. Esta tende ao que é uno e bem-ordenado, mas também ao que é vário, diverso e movimentado.

Ora, nesse castelo há a unidade na variedade, e minha alma ali repousa e ao mesmo tempo pensa em Deus.

Sim, considerando os esplendores de Chambord, poder-se-ia fazer uma meditação que chegasse até Nosso Senhor. Admirando-os, vem-nos ao espírito este pensamento: “Que beleza, que elegância, que distinção, que nobreza, que grandeza, que “raffinnement”! Como isso nunca se conseguiu, a não ser na Civilização Cristã! Como, ó Senhor Jesus Cristo, vosso sangue é fecundo de toda graça e de todo bem, de maneira que mil e quinhentos anos depois de vossa morte, ainda nasce essa flor de beleza, ainda desabrocha esse encanto de civilização, porque ela é cristã nas suas raízes!

“Ó Senhor Jesus Cristo, Vós sois a fonte de toda graça, de toda glória e de toda beleza! Eu Vos adoro!”

Confiança inabalável em Maria

Uma carinhosa prece de São Bernardo de Claraval a Maria dá a Dr. Plinio ocasião para voltar a um tema predileto para esses dois varões: a bondade inestimável da Mãe de  Deus para com os homens e a confiança sem limites que n’Ela devemos ter.

 

Inigualável cantor das glórias de Maria Santíssima, São Bernardo compôs tocantes e piedosas orações dirigidas a Ela. Entre outras, uma que me apraz comentar, porque repassada de sentido e admirável sob todos os pontos de vista. Ei-la:

Ó doce Virgem Maria, minha augusta soberana, minha amável Senhora, minha Mãe amorosíssima! Ó doce Virgem, coloquei em Vós toda a minha esperança e não serei confundido. Doce Virgem Maria, eu creio tão firmemente que do alto do Céu Vós velais dia e noite sobre mim e sobre aqueles que esperam em Vós; estou tão intimamente convencido de que jamais pode faltar nada quando se espera tudo de Vós, que resolvi viver daqui para o futuro sem nenhuma apreensão, e me descarregar inteiramente sobre Vós em todas as minhas iniquidades.

Doce Virgem Maria, Vós me estabelecestes na mais inabalável confiança. Mil vezes obrigado por uma graça tão preciosa! Ficarei daqui por diante em paz sob vosso coração tão puro. Não pensarei mais senão em Vos amar, em Vos obedecer, enquanto Vós gerireis, Vós mesma, minha boa Mãe, os meus mais caros interesses.

Ó doce  Virgem  Maria,  que entre os filhos dos homens, uns esperem sua felicidade de sua riqueza, outros a procurem em seus talentos; que outros se apoiem sobre a inocência de sua vida ou sobre o rigor de sua penitência, ou sobre o fervor de suas orações, ou sobre o grande número de suas boas obras. Por mim, ó Mãe, eu esperarei só em Vós, só em Vós depois de Deus. E todo o fundamento de minha esperança será minha confiança mesmo em vossa bondade materna.

Doce Virgem Maria, os maus poderão me roubar a reputação e o pouco de bem que possuo. As doenças poderão me tirar as forças e a faculdade exterior de Vos servir. Eu poderei mesmo, infelizmente, minha terna Mãe, perder vossas boas graças pelo pecado. Mas minha amorosa confiança em vossas maternais bondades, esta jamais eu perderei. Eu a conservarei, essa confiança inabalável, até o meu último suspiro.

Todos os esforços do inferno não ma roubarão. Eu morrerei repetindo mil vezes vosso nome bendito e fazendo repousar sobre vosso Imaculado Coração toda a minha esperança.

E por que estou eu tão firmemente seguro de esperar sempre em Vós, se não é porque Vós me ensinastes, Vós mesma, ó doce Virgem, que Vós sois toda misericórdia e que não sois senão misericórdia?

Estou, portanto, seguro, ó boa e amorosa Mãe, de que Vos invocarei sempre e estou seguro de que Vós me consolareis. Eu Vos agradecerei sempre porque Vós sempre me aliviareis. Eu Vos servirei sempre porque Vós sempre me ajudareis. Eu Vos amarei sempre porque Vós sempre me amareis. Eu obterei tudo de Vós porque vosso amor, sempre generoso, irá além de minha esperança.

Sim, é de Vós só, ó doce Virgem, que, apesar de minhas faltas, eu espero o único bem que desejo, o meu Jesus, no tempo e na eternidade. É de Vós só, porque Vós é que meu Divino Salvador escolheu para me dispensar todos os favores, para me conduzir seguramente até Ele. Sim, é de Vós, Mãe, que, depois de ter aprendido a participar das humilhações e sofrimentos de vosso Divino Filho, espero ser introduzido na glória e nas delícias, para O louvar e bendizer, junto a Vós e convosco, nos séculos dos séculos. Assim seja.

Eis a minha maior confiança e toda a razão da minha esperança. “Ecce mea maxima fiducia et tota ratio spei meae”.

Confiança sem limites em Nossa Senhora

A oração é verdadeiramente maravilhosa, e possui as características da eloquência de São Bernardo. Quer dizer, uma prece com misto de humildade e de arrojo, de ternura e de fogo, de doçura e varonilidade, difícil de encontrar reunidas nas expressões de um só homem.

De um lado, a ternura para com Nossa Senhora chega ao último limite a que se pode chegar. Sobretudo, chega ao ápice a persuasão da ternura d’Ela para conosco.

Mas, de outro lado, no modo de cantar o carinho d’Ela, nada há de efeminado, nada há de indigno de um varão. Pelo contrário, existe uma espécie de audácia, de arrojo encorajado e estimulado por essa ternura, que faz da oração uma obra-prima, porque reúne a suavidade própria à uma pomba e o voo extraordinário da águia.

Em sua prece, o Santo penetra diretamente no Coração Imaculado de Maria. E com uma liberdade, um desembaraço ousaria dizer, com uma familiaridade cheios de veneração, mas de intimidade, que verdadeiramente nos espanta.

Ele fala da virtude da confiança, e mostra no que esta consiste. Depois, determina as razões dessa virtude. Para São Bernardo, a confiança consiste fundamentalmente em saber que Nossa Senhora é toda ternura, e n’Ela não há severidade. E como é essa a disposição d’Ela em relação a todos os homens, torna-se lógico, forçoso, inevitável que cada homem conhecedor disso deposite em Maria uma confiança sem limites. O autor da oração estabelece essa confiança em duas gamas: primeiro, quanto à vida terrena; em segundo lugar, quanto à vida eterna.

São Bernardo exprime sua certeza de que Nossa Senhora vai gerir os interesses dele nesta existência, e interesses terrenos propriamente ditos. É verdade que ele era religioso e não tinha preocupações materiais, pois eram todas atendidas no mosteiro. Porém, ele compôs essa oração para ser rezada por qualquer fiel, e não apenas pelos monges. Então se entende que nós, nos nossos interesses terrenos, naquilo que eles têm de legítimo, de santificante, devemos confiar em Nossa Senhora.

No auge das provações, confiança ainda maior

Mais. Devemos pedir que Ela faça por nós aquilo que não somos capazes de fazer.

Sabemos todos que a Providência tem desígnios insondáveis, e que pode, portanto, querer nos sujeitar de um momento para outro a sofrimentos que não prevemos. Sabemos também que a Providência quer, genericamente, daqueles a quem Ela ama, que passem por muitas provações. Nós sabemos, portanto, que nesta vida temos de sofrer. Sem embargo disso, por um movimento interno da graça, por um certo senso das proporções, etc., nós vemos que, em relação a outros interesses terrenos, muito provavelmente a Providência não quer que se percam e sejam imolados. Estes interesses nós devemos entregar aos maternais cuidados de Nossa Senhora. Ela velará por eles, os apoiará, os protegerá, de tal maneira que não precisamos nos deixar tomar de ansiedades, nem de torcidas, nem de sofreguidões.

Mas, no pior das nossas angústias e das nossas preocupações, devemos nos lembrar daquilo que diz o Pe. Saint Laurent no seu “Livro da Confiança”: quando a tormenta tenha chegado ao auge, é hora de preparar o incenso e todo o necessário para cantar o Magnificat, porque nesse momento Nossa Senhora intervirá e nos salvará. Quer dizer, essa é uma confiança inabalável. E confiança que cresce de ponto quando não se trata apenas de nossos interesses terrenos individuais, mas das questões de apostolado. A Santíssima Virgem deseja que procuremos o maior bem para as almas, e multiplica seu infalível socorro para que nossa missão evangelizadora seja coroada de sucesso. E mesmo quando nossos problemas apostólicos pareçam por demais complicados e comprometidos, devemos ter inteira certeza de que Ela tudo resolverá. Numa palavra, como Medianeira onipotente junto a Deus, Nossa Senhora nos alcança a solução para todas as nossas dificuldades, sejam grandes ou pequenas, corriqueiras ou imensas.

Se desconfiarmos de Nossa Senhora, tudo se perde

Essa verdade se aplica ainda mais à nossa vida espiritual. Nossa Senhora chama cada um de nós para a santidade. Se Ela assim nos atrai, não interromperá a obra que iniciou e nos conduzirá, se soubermos confiar, até o extremo da perfeição a que fomos convidados. Alguém dirá: “Dr. Plinio, belas palavras… Na realidade, elas são vácuas e não correspondem a nada, porque se eu pecar, estou criando obstáculos à ação de Nossa Senhora. E se procedo dessa maneira, não posso supor que Ela vá me santificar. Quer dizer, o senhor está afirmando algo muito bonito, mas vazio, sem consistência. É uma quimera.” A resposta está na própria oração composta por São Bernardo. Ainda que tenhamos a dor enorme de ter ofendido a Nossa Senhora, ainda que tenhamos o pesar de A ter ofendido gravemente, é preciso continuar a confiar n’Ela. Porque se desconfiarmos de Maria, então está tudo perdido. A porta do Céu é Ela. E se, pela nossa falta de confiança, fecharmos essa porta, nós mesmos nos condenamos.

Pelo contrário, se continuarmos a confiar n’Ela contra toda confiança, Nossa Senhora pelo menos receberá de nós essa forma de glória, que é a do pecador que continua a confiar n’Ela. É a homenagem da confiança daquele que A ofendeu e, nesse sentido, uma categoria de louvor que nenhum justo Lhe poderá dar.

Então, esperemos contra toda esperança, mesmo dentro das dificuldades e da buraqueira da nossa vida espiritual. É o que São Bernardo recomenda intensamente, fazendo-nos recordar aquela palavra de São Francisco Xavier, que o pior do pecado ainda o mais horroroso não é tanto a falta em si, mas o fato de o pecador, depois da queda, perder a confiança em Deus. Porque enquanto confia, o caminho permanece aberto. Tudo é possível.

Na hora da morte, a suprema proteção de Maria

Após falar dos interesses nesta vida, São Bernardo se refere aos da vida eterna. E manifesta este pensamento admirável: quando chegar a hora da morte dele, espera que a sua confiança seja tal que morra com o seu coração recostado sobre o Imaculado Coração de Maria.

É expressão, naturalmente, simbólica, mas revestida de um imenso valor, porque revela uma esperança muito grande em que Nossa Senhora, na hora da morte, nos ajude de modo particularíssimo. Que Ela diminua os horrores desse transe, e nos dê até uma passagem cheia dos sentimentos da presença d’Ela, se isso for para a sua maior glória e bem de nossa alma. E se, pelos superiores desígnios de Deus, devamos falecer em meio a grande aridez, tenhamos completa confiança de que Nossa Senhora fará redundar essa derradeira provação em maior benefício para nós. Ela se valerá desse sofrimento para abreviar nosso Purgatório, para salvar muitas outras almas, e para, afinal, nos levar ao mais alto do Céu, bem junto ao seu trono de Rainha e de Mãe  indizivelmente amorosa.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Santa Maria Goretti, um exemplo para a Igreja e para o mundo

Quando a impudicícia já ia fazendo estragos pelo mundo, Deus fez de uma menina de onze anos uma heroína da pureza. Dr. Plinio mostra o que o exemplo dela significa para nós.

 

O contraste entre os acontecimentos dolorosos no terreno da pureza, ocorridos em nossos dias, de um lado e, de outro, o exemplo dado por Santa Maria Goretti é tão flagrante que não podemos deixar de fazer um comentário sobre o tema.

Basta lembrarmos que enquanto a Igreja venera no dia de hoje uma santa a qual, ainda na infância, foi vítima de um atentado brutal, bárbaro, bestial, e sacrificou sua vida por amor à pureza, se introduzem atualmente costumes escandalosos, obscenos a tal ponto que não convém serem mencionados em nosso ambiente. A degradação moral não se detém, exceto quando já tenha destruído tudo aquilo que tende a destruir. E o último passo será o nudismo mais anarquista e completo.

Devemos dar glória à Igreja que continua, em meio à decadência geral, a apresentar aos homens um modelo contrário àquilo para o qual o mundo contemporâneo caminhe.

De maneira que isso é para nós uma fonte de alegria, de consolação, uma inspiração para a luta em defesa desses valores, por maior que seja a desolação reinante em certos meios a respeito desse assunto.

Santa Maria Goretti se nos apresenta como um incitamento ao zelo da Igreja pela pureza, ao valor dessa virtude que Ela sempre inculcou. De tal maneira que mais vale a pena à pessoa sacrificar sua vida do que perder sua castidade. Precisamos compreender que foi sobrenatural a virtude de nossa santa , e toda a desolação do mundo de hoje pode ser dominada e transformada em motivo de alegria, pela ação da graça divina.

Assim, não podemos desanimar na luta. Lembremo-nos de que a pureza foi restabelecida e elevada a um grau até então desconhecido no mundo antigo, pela introdução da religião católica entre os romanos. Esta continua sempre a mesma e o precioso Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, presente na Eucaristia, pode ser chamado em nosso dias, como o era no passado, o vinho que gera virgens. Portanto, possuímos entre nós o fermento de todas as vitórias e a causa de todos os sucessos. Basta termos fé, piedade, sabermos rezar, fazer penitência e reparação pelos pecadores, que conseguiremos vencer essa onda imensa de impiedade .

Eu gostaria de acentuar um ponto.

Em toda essa questão social de que tanto se fala hoje em dia, o problema da pureza ocupa um lugar preponderante. Não pode haver verdadeira ordem social sem autêntica ordem familiar; e esta não existe sem a virtude cujo nome enche os homens de respeito humano. Essa virtude precisa ser conhecida, admirada e praticada pelos católicos até a última perfeição. Sobre ela pouco se ousa falar: é a virtude da castidade conforme o estado da pessoa, ou a castidade perfeita, ou a matrimonial. Duas formas santas de virtude, que precisam ser adotadas e defendidas.

A ordem política e social rui inevitavelmente nos lugares onde a pureza não é observada. Não se pode construir seriamente a Civilização Cristã sem que, entre outras virtudes, a da castidade esteja na base. Dessa virtude Santa Maria Goretti nos deu belíssimo exemplo.

Há um princípio de Paul Bourget, muito verdadeiro, que é o seguinte: quando a pessoa não age de acordo com suas idéias, acaba pensando de acordo com seus atos.

Nossa sociedade, antes mesmo de adotar as idéias anárquicas, vai infelizmente caminhando para elas por meio dos costumes anárquicos.

Uma palavra sobre o homem que a assassinou.

Condenado à prisão, reconheceu em toda a extensão o mal por ele praticado e tornou-se um prisioneiro modelar. Após cumprir a pena, foi recebido como humílimo irmão leigo capuchinho, e solicitou à mãe de Santa Maria Goretti que o atendesse, pois queria pedir-lhe perdão.

Esta o perdoou e depois ambos combinaram comungar lado a lado num dia marcado, em uma determinada igreja.

Vemos aqui um exemplo de contrição verdadeira, num mundo onde esta é cada vez menos conhecida: uma cabeça que se humilha, um peito no qual se bate reconhecendo ter pecado, dizendo “mea culpa”.

Esses fatos nos ajudam a compreender que Santa Maria Goretti é nossa patrona, para nos preservar na virtude da pureza; e, se tivermos a desgraça de nos afastarmos desse caminho, para nos reconduzir a uma verdadeira penitência e sincera conversão.

É altamente oportuno pedir seu auxílio no dia de sua festa. Se ela chegou a perdoar, por essa forma sublime, seu assassino e conseguiu para um homem tão depravado uma forma tão alta de virtude, que ele se tornou um religioso; quem pode o mais, pode o menos. Compreendamos assim quanta confiança podemos depositar em sua intercessão.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 6/7/1965)

Oração: Pedindo graças que fazem parte do segredo de Maria

Ó Maria Santíssima, Esposa do Espírito Santo, obtende-me d’Ele a graça necessária para que eu olhe de frente a minha alma, fazendo um exame implacável e verdadeiro de tudo quanto nela se contém. Obtende-me amar o que ali puseste de bom e odiar o que há de mau. De sorte que, expulso dela o mal, triunfe o bem, e comece em mim aquela aurora do Reino de Maria, pelo qual devemos viver, lutar e morrer. E se tal for a minha fraqueza e falta de generosidade que eu não consiga corresponder às vossas graças, dai-me graças ainda maiores, aquelas que fazem parte do vosso segredo e das quais diz São Luís Grignion que o homem, como que, não lhes pode resistir.

Plinio Corrêa de Oliveira (Composta em 25/7/1970)

Santa Maria Goretti, alma verdadeiramente eucarística

Santa Maria Goretti manifestou a lucidez com que a virgem católica compreende e ama a sua pureza, sem necessidade de aulas, e que leva uma menina a enfrentar qualquer brutamonte, resistindo até quando está por morrer.

Aquela figura angélica entregou a sua vida com toda a resolução, para não perder o que ela amava mais do que a luz de seus olhos e a própria existência: a virgindade, a qual se aprende a amar como o dom mais precioso da vida, quando se tem uma alma verdadeiramente eucarística.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 23/4/1955 e 24/7/1981)

CLEMÊNCIA INDIZÍVEL

A realeza que Nossa Senhora exerce sobre o gênero humano não é a do juiz, mas a da advogada, isto é, d’Aquela que não tem por missão julgar e punir os pecadores, mas a de os defender.

Por isso tem Ela para conosco toda sorte de predisposições favoráveis, e sempre nos atende com inefável bondade.

Entretanto, a alma moderna, muito atribulada e tratada com terrível dureza pela atual tirania do demônio, encontra certa dificuldade em compreender o verdadeiro sentido da clemência de Nossa Senhora.

Tanto mais quanto uma falsa piedade apresenta esta misericórdia de modo alvar e adocicado, como se ela fosse uma espécie de cumplicidade com o erro. Ora, a ternura e a bondade de Maria não consistem numa vil condescendência para com quem praticou o mal, e sim na materna e invariável disposição de lhe conceder as graças necessárias para abandonar o erro e o pecado.

É nesse sentido que se deve entender a clemência de Nossa Senhora. E enquanto tal, ela é única, suprema e indizível.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Gloriosa Santidade

A Providência concedeu a Nossa Senhora a glória de se encontrar no píncaro da Criação, tendo acima d’Ela apenas o Homem-Deus, seu adorável Filho. Quem recebesse a suprema graça de comtemplá-La, teria, num só golpe de vista, a noção de toda a sabedoria e santidade da Igreja, da beleza de toda a sua liturgia em todas as épocas, do esplendor de todos os Santos, do talento de todos os doutores, do heroísmo de todos os cruzados e de todos os mártires. Porque não há virtude, qualidade e beleza que a Igreja tenha engendrado, e que não brilhe completamente em Nossa Senhora, com fulgor extraordinário.

Por isso, nosso louvor à Santíssima Virgem, além de ser um cântico à grandeza e bondade d’Ela, deve ser um reconhecimento efetivo dessa bondado e dessa grandeza, traduzido em atos concretos: ou seja, na imitação de todas as virtudes e predicados que Ela, numa perfeita correspondência à graça, possuiu e praticou no mais alto grau.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Confiança

“A confiança é uma espécie de fina ponta da esperança. Quando esperamos alguma coisa, temos alegria e a convicção de que algo de bom nos virá. É essa confiança que dá força a nossas almas e as fazem caminhar para a frente.”

Maravilhas que fazem sonhar…

Quando uma alma é reta e inocente, ela deixa falar em seu interior a apetência que tem de uma ordem de coisas inteiramente conforme com os planos de Deus para a Criação, de algo que havia no Paraíso em que todos viveríamos, não fosse a queda de nossos primeiros pais. Se tomássemos uma pessoa nesse estado de espírito, e a ela disséssemos: “Olhe, o Céu é assim, como o que você deseja no mais íntimo de seu ser”, não estranharia que tal pessoa sentisse intensa vontade de partir logo para o Éden celeste, ao encontro das maravilhas que tanto procura.

Tenho razões para afirmar que esse estado de espírito foi o ponto de partida da Idade Média. Que esta, na medida em que rezou, lutou, ou construiu, o fez orientada para aquele fim mais alto, movida por aquilo que vem expresso na Ladainha de Todos  os Santos:  ut mentes  nostras ad caelestia desideria erigas para que Vos digneis elevar as nossas almas a desejar as coisas do Céu.

Assim, poder-se-ia comparar a alma medieval a uma ogiva, séria, sólida, pensativa, levando tudo para cima. Ao mesmo tempo calma e reflexiva, pesando e analisando tudo, disposta tanto a se recolher, dizendo: “Quanta coisa existe de bom neste mundo”, e a subir para maiores considerações; ou então, inflexível na sua retidão, disposta a combater o que não seja conforme à verdade, ao bem e ao belo. Porém, com serenidade e isenção de ânimo, sem agitações nem trepidações.

Almas assim engendraram as grandes maravilhas da Idade Média.

Por exemplo, Notre-Dame de Paris. Uma catedral toda feita de seriedade, gravidade, estabilidade, pensamento, grandes considerações das linhas gerais, mil pormenores e detalhes harmônicos, panorama… e as torres que se lançam para o céu!

Tão magnificamente para o céu, que nenhum artista se atreveu a completá-las. Porque só quem as planejou tem alma para lhes conferir o arremate final. E as torres estão ali, ao mesmo tempo tragicamente incompletas, mas fazendo cada observador imaginar no subconsciente uma torre ideal, segundo o seu próprio feitio. Dir-se-ia que elas terminam num pontilhado, de acordo com o espírito de quem as contempla. De maneira que se nos dissessem: “Olhe, sabe de uma novidade!? Completaram as torres de Notre-Dame!”, tomaríamos um susto: “Será que fizeram errado!?”

Ou seja, de modo diverso desse pontilhado que, subconscientemente, cada um constrói no seu interior, olhando aqueles dois magníficos fragmentos de torre que nos convidam para o sonho. Porque, a partir daquele ponto, se sonha…

*

O mesmo sonho para o qual nos atrai a Sainte-Chapelle, do rei São Luís. Uma bonbonniere feita para ter almas dentro e não bombons. É o que pode haver de magnífico e encantador.

O espírito que a concebeu, se pudesse construir um edifício todo de cristal, sentir-se-ia realizado. Construiu um feito de vitrais!

Agrada-me imaginar a ação da graça sobre a alma desse artífice. Até então, ele apenas manuseava vidros comuns, de cores também comuns. Em determinado momento, ele sente no seu íntimo a inspiração vinda do alto de procurar uma cor ideal, mais bela do que todas as outras. Então compõe uma cor de sonho, ou toda uma policromia de sonho, para colorir, não só um vitral, mas um mundo, porque nos vitrais e rosáceas se representam batalhas, trabalhos, cenas do Antigo Testamento, episódios do Novo Testamento, enfim, a vida dos homens enquanto relacionada com a Igreja e a religião.

À medida que ele vai colorindo, em seu espírito vão brotando novas idéias. O vitral seguinte que ele fará, será precedido por uma crítica ao vitral anterior: “Atingiu inteiramente esse desejo de perfeição que você tem, ou alguma coisa está faltando?”

E a história dos seus vitrais passa a ser a dos vôos cada vez mais altos, até chegar a um ponto em que o homem diga: “Aqui não é possível ir mais longe”. Ele instala o vitral na parede. De repente lhe vem ao espírito a idéia de uma parede feita toda de vitral. Nasceu a Sainte-Chapelle!

*

Agora, para termos um pouco a idéia do que foi a civilização cristã medieval, precisamos imaginar uma noite na Paris do século XIII. A cidade dorme. Na Sainte-Chapelle, em Notre-Dame, o Santíssimo Sacramento aguarda no interior do sacrário a adoração dos homens. No Louvre de São Luís, repousa um rei que é santo, e que ordena com santidade todas as coisas do seu reino.

E assim, a história da França flui gloriosa e tranqüilamente, como flui o rio Sena aos pés do palácio do piedoso monarca.

O Carmo: do Antigo Testamento ao triunfo do Imaculado Coração de Maria

Ao entrar certo dia na Basílica do Carmo, Dr. Plinio pousou acidentalmente o olhar sobre uma parede na qual nunca antes tinha prestado atenção. E ali, inscritas, se lhe depararam estas palavras do Profeta Elias: “Zelo zelatus sum pro Domino Deo exercituum” (“Eu me consumo de um zelo incendiado pelo senhor Deus dos exércitos” — III Reis 19,10).

Sentindo de imediato consonância com essa fogosa declaração, Dr. Plinio refletiu: “Eis aí! Quem se torne zeloso, mas de um zelo ar dente, por Aquele que é o Senhor Deus dos exércitos, este preencherá por inteiro as exigências do amor de Deus”. E cresceu-lhe no espírito sua afinidade de longa data com a Ordem do Carmo, que pode ser considerada a Ordem profética por excelência, da qual Santo Elias é aclamado como Fundador. Dela, aliás, Dr.  Plinio fazia parte efetivamente, pois era membro de sua Ordem Terceira — o ramo dos leigos vinculados ao Carmo. Foi, inclusive, diversas vezes o Prior e Mestre de noviços do Sodalício Virgo Flos Carmeli. Além disso, Dr. Plinio exerceu, por 20 anos, a função de advogado da Província Carmelitana Fluminense, que englobava São Paulo. Todos esses são dados significativos a se ter em vista, na leitura de seus  comentários abaixo transcritos, sobre Aquela que é a “Flos Carmeli”, a Flor do Carmelo, cuja festa se celebra em 16 de julho.

Virgem fez ver à multidão ali reunida uma seqüência de quadros representando os Mistérios do Rosário. A cada nova cena desenrolada no céu, mostrava-se Ela sob algum título com que os fiéis habitualmente A invocam. E foi assim que, na visão dos Mistérios Gloriosos, Ela surgiu como Nossa Senhora do Carmo, cuja festa a Igreja celebra no dia 16 de julho.

Como tudo o que Maria Santíssima realiza tem sua razão de ser, haverá sem dúvida um nexo entre essa manifestação de Nossa Senhora do Carmo, os Mistérios Gloriosos e a mensagem de Fátima que Ela, naquela ocasião, revelava. Parece-me de grande interesse, portanto, procurarmos aprofundar essa relação, considerando também a especial beleza que ela encerra.

O termo Carmo corresponde ao Monte Carmelo, no Oriente. Ali, segundo uma tradição muito respeitável — e há todos os motivos para admiti-la como verdadeira —, o Profeta Elias reuniu um grupo de discípulos e com eles constituiu a Ordem do Carmo, em louvor da Virgem Mãe que deveria vir, e na espera d’Ela.

Portanto, o primeiro filão de devoção a Nossa Senhora, séculos antes de Ela nascer, foi formado pelos filhos do Profeta Elias que A aguardavam. E Santo Elias representa o extremo dessa devoção, porque, como é doutrina comum na Igreja, ele deverá lutar no fim do mundo contra o Anticristo, o último inimigo de Nosso Senhor e de sua Mãe Santíssima. Elias constitui, portanto, uma espécie de ponte entre o início e o fim da devoção a Nossa Senhora na história da humanidade.

É de se supor que, nos seus primórdios, essa devoção se desenvolveu e perseverou em meio a toda espécie de dificuldades e objeções. Pois surgiu no tempo em que o povo eleito cada vez mais se fechava à sua própria missão, ao seu próprio espírito, e, por isso, haveria de ter repulsa a esse veio carmelita que prenunciava a Virgem Mãe, assim como depois os hereges de todos os tempos tiveram ódio à devoção a Nossa Senhora.

Provavelmente, os eremitas do Monte Carmelo, representantes das primícias do amor à Santa Mãe de Deus, foram perseguidos, malvistos, caluniados e silenciados. Apesar disso, e na humildade de sua situação, previam o advento de Nossa Senhora.

E eles tinham razão, pois Ela veio. E não só veio, mas recebeu a maior glorificação que poderia ser tributada a uma mera criatura: tornou-se a Esposa do Divino Espírito Santo, encarnando-se n’Ela o Verbo, a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade.

Ao término de sua sublime existência terrena, Maria teve uma morte extremamente suave: uma separação da alma e do corpo efetiva e completa, mas de tal maneira delicada que a Igreja, na sua linguagem incomparável, dá ao passamento de Nossa Senhora o nome de “dormição”. Pouco depois, por desígnio e obra de Nosso Senhor Jesus Cristo, a Santíssima Virgem ressuscitou e foi levada aos Céus em corpo e alma. Assim recebeu Nossa Senhora outra glorificação: uma ressurreição à maneira da de Jesus, e uma Assunção também comparável à Ascensão d’Ele. Aliás, na linguagem de outrora, Nossa Senhora da Assunção é igualmente chamada de Nossa Senhora da Glória, para significar o incomparável brilho de que se revestiu o seu ingresso no Paraíso celeste.

Esse desfecho da vida terrena de Nossa Senhora pode ser tomado como o término da história do Carmo do Antigo Testamento (embora já se estivesse, rigorosamente falando, no Novo Testamento). Aqueles carmelitas tiveram a alegria e a insigne honra de cultuar a Santíssima Virgem em carne e osso, e não através de imagens. Nada impede presumirmos que Nossa Senhora subiu ao Monte Carmelo e ali se colocou à frente de seus filhos e devotos, em horas de inefável convívio. As hipóteses piedosas, inteiramente razoáveis, que a esse respeito se podem fazer, são inúmeras.

Com a Assunção de Nossa Senhora e sua glorificação no Céu, essa etapa da existência da Ordem carmelitana findou-se de modo magnífico, esplendoroso. Fica estabelecida uma relação entre o Carmo e a glória: a devoção perseguida, fiel, profética, luta até o momento em que é confirmada por Deus, e passa a reluzir no mais alto do Céu, na pessoa da Virgem Mãe.

Depois, recomeça a história do Carmo. A Ordem, existente apenas no Oriente Próximo, desenvolveu-se um tanto, mas tem-se a impressão de que os cristãos daquela região, nos primeiros séculos, não lhe deram grande importância, privando-se dos benefícios que ela poderia lhes trazer. Esta atitude para com o Carmo foi uma entre tantas infidelidades da Cristandade oriental, que terminou castigada pelas invasões sarracenas, as quais, entre outras calamidades, provocaram a fuga dos carmelitas para o Ocidente.

A Europa, toda católica, cheia de fé, empreendia as Cruzadas para a libertação dos Lugares Santos. Nesse continente os frades do Carmo começaram a vaguear, como membros de uma Ordem quase desconhecida, mal-admirada e à beira do desaparecimento. A família religiosa de Elias parecia um tronco seco e velho, fadado a se desmanchar em pó.

Era o instante esperado por Nossa Senhora para fazer florescer, no alto da ressecada vara, uma flor: São Simão Stock. Esse inglês de reconhecida virtude havia sido eleito para o cargo de Geral da Ordem. Todavia, não exercia uma autoridade efetiva sobre seus súditos, pois o Carmo ainda não possuía uma estrutura jurídica coesa e uniforme, capaz de conservar um espírito, promovê-lo e transmiti-lo à posteridade. [Situação que se prolongava depois de o Papa Inocêncio IV ter aprovado a regra dos “Irmãos de Nossa Senhora do Monte Carmelo”, em 1245.]

A virtude compensava, porém, a falta de autoridade. Rezando a Nossa Senhora com muito fervor, São Simão implorou-Lhe não permitisse o desaparecimento da Ordem do Carmo. Em meio a essa aflitiva situação, a Virgem Santíssima apareceu a seu bom servo [em 1251] e lhe entregou o escapulário, para se usar sobre a roupa.

Naquela época os servos usavam uma túnica como traje civil. Sobre ela punham uma túnica menor, que indicava, pela cor e por características peculiares, a identidade de seu senhor. O escapulário do Carmo era semelhante a essa pequena túnica. Nossa Senhora, portanto, entregava a São Simão Stock uma libré própria aos servos d’Ela, para ser usada por todos os carmelitas, e prometia: “Aqueles que morrerem revestidos dele, não sofrerão o fogo do inferno”. Quem usa piedosamente o escapulário do Carmo, receberá a graça da perseverança final e será libertado do purgatório no primeiro sábado após a morte. [Esta promessa abrange também os fiéis que usarem o pequeno escapulário, recebido em singela cerimônia das mãos de um padre carmelita ou de outro sacerdote que tenha a faculdade de o impor. Para se beneficiar do privilégio sabatino, o fiel deve cumprir uma condição — como a recitação diária de um terço —, a critério do sacerdote.]

A partir dessa misericordiosa intervenção da Mãe de Deus, a Ordem carmelitana refloresceu e conheceu outros períodos de glórias, acentuando por toda a Igreja Católica a devoção à Santíssima Virgem. No suceder de esplendores iniciado então, nasceram três sóis, para não citar senão eles, que hão de reluzir por todo o sempre no firmamento da Igreja: Santa Teresa, a Grande, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus.

Retenhamos, então, a grandiosidade da história do Carmo: uma alternância de glórias e infortúnios conducentes a um adelgaçamento que faz prever o desaparecimento. Mas acontece uma intervenção de Nossa Senhora, que salva e dá incomparavelmente mais do que se tinha antes. A prosperidade no Ocidente será muito maior do que a verificada na Ásia.

A par de sua insondável bondade, Nossa Senhora, ao intervir, mostrava também a confiança que se deve ter n’Ela, bem como seu papel central na obras que ama de modo especial. Ainda que estas cheguem ao ponto de tudo parecer perdido, devem esperar o momento que Ela se reserva para agir. Como dizia certo pensador católico, as grandes intervenções da Providência são precedidas de situações dramáticas, de modo a tornar clara a inutilidade de qualquer socorro humano. Uma vez provado o fracasso dos homens, e na própria hora da desolação e do caos, Deus intervém, e Nossa Senhora se faz presente.

Lição de confiança ainda mais necessária em vista do que ocorreu depois: enquanto a Ordem fundada por Santo Elias conhecia novos brilhos e novas glórias, a Cristandade que a acolhera tornava-se presa de um inexorável processo de ruína, que se acelerava no decorrer dos séculos. Até que, em 1917, numa colina de Fátima, Nossa Senhora censurou a decadência, recriminou o mundo pela torrente de pecados em que estava imerso, e anunciou os castigos que haveriam de cair sobre a humanidade, caso esta não se arrependesse e se emendasse de suas faltas. Depois, exprimindo-se com as famosas palavras que guardamos em nossas almas, fez a promessa do Reinado d’Ela: “Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará!”

E aqui voltamos à consideração daquele vínculo ao qual nos referíamos no início deste artigo: no ápice das aparições em que Nossa Senhora proclama a efetivação de sua realeza, sob a forma do triunfo do seu Coração Imaculado, Ela aparece revestida do traje de sua mais antiga devoção — a do Carmo. E, desse modo, realiza uma síntese entre o historicamente mais remoto, o mais recente — o culto ao Imaculado Coração de Maria — e o futuro glorioso, que é a vitória e o reinado desse mesmo Coração.

Eis várias das razões pelas quais a festa de Nossa Senhora do Carmo nos é muito grata a todos os filhos  e devotos da Santíssima Virgem.