Não durmamos enquanto se renova a Paixão!

Em suas invectivas ao povo israelita, os profetas do Antigo Testamento eram instrumentos da misericórdia de Deus: seu objetivo era chamar o povo à conversão. De igual forma procederam os Papas ao longo dos séculos. Já as admoestações de Dr. Plinio tinham amiúde por objetivo despertar os católicos para suas obrigações, como se pode ver neste artigo.

 

Há dois funestíssimos erros, que não raramente lavram entre os católicos brasileiros e que, com extraordinária oportunidade, devem ser desmascarados na Semana Santa.  Como freqüentemente ocorre, esses erros não provêm propriamente de premissas falsas, mas de premissas incompletas. É uma visão parcial e estreita das coisas, que os  provoca. E só uma meditação acurada, feita à luz de considerações naturais ou de argumentos inspirados em motivos sobrenaturais, pode pôr à luz o mau germe que neles se  culta.

Ineficiência da Igreja diante da crise? O primeiro desses erros consiste em acoimar de ineficiente a ação da Igreja, para a solução da crise contemporânea. […] E [dizem] que, portanto, é preciso apelar para uma outra organização, que, ela sim, salvará a civilização católica.

Argumentemos. E argumentemos só com a infalível autoridade dos Pontífices. Porque se para algum católico um argumento inspirado nas palavras dos Papas não for suficientemente convincente, é melhor que esse católico estude bem o seu Catecismo, antes de tentar “salvar a civilização”.

Diz o Santo Padre Leão XIII, e, depois dele, todos os Pontífices o têm repetido, […] que essa crise moral gerou crises econômicas, sociais ou políticas. E só quando ela for    resolvida, serão resolvidos os problemas relacionados com as finanças, a organização política e a vida social dos povos contemporâneos.

Por outro lado, a solução desse problema moral só pode estar na ação da Igreja, porque só o Catolicismo, armado de seus recursos sobrenaturais e naturais, tem o dom maravilhoso de produzir nas almas os frutos de virtude indispensáveis para que floresça a civilização católica. O que acabamos de dizer é diretamente extraído das Encíclicas. Basta abri-las, para encontrar o que afirmamos.

Como conseqüência, de duas uma: ou os Papas estão errados, ou devemos reconhecer que só o Catolicismo salvará o mundo da crise em que está mergulhado. Portanto, é  inútil discutir se, no país A ou no país B, os católicos agiram ou não agiram bem. […]

Se é verdade que só a Igreja pode remediar os males contemporâneos, é só nas fileiras da Igreja que devemos procurar lutar pela eliminação desses males. Pouco nos importa que outros não cumpram o seu dever. Cumpramos o nosso. E, depois de termos feito todo o possível — a palavra “todo” significa tudo, mas absolutamente tudo, e  não apenas “um pouco” ou “muito” — resignemo-nos diante da avalanche que vem. Porque, ainda que pereçam o Brasil e o mundo inteiro, ainda que a própria Igreja seja devastada pelos lobos da heresia, ela é imortal. Nadará sobre as águas revoltas do dilúvio. E é de dentro de seu seio sagrado que sairão depois da tempestade, como Noé da  Arca, os homens que hão de fundar a civilização de amanhã.

Duas lições, para duas mentalidades erradas

Mas é aí que não querem chegar certos católicos. Como os [apóstolos antes de Pentecostes], eles só compreendem Cristo sobre um trono de glória. Eles só Lhe são fiéis nos  dias parecidos com o Domingo de Ramos, quando a multidão O aclama e cobre o seu caminho com suas vestes. Porque, para eles, Cristo deve ser um Rei terreno. Deve dominar o mundo constantemente. E se, por algum tempo, a impiedade dos homens O reduzirem de Rei a Crucificado,  de Soberano a Vítima, não mais querem saber d’Ele. […]

No entanto, Cristo quis passar por todos os opróbrios,todos os vexames, todas as humilhações, mostrando que  a História da Igreja também teria seus Calvários, suas  humilhações, suas derrotas. E que muito mais meritória  era e é a fidelidade no Gólgota do que no Tabor.

Foi para ensinar a gente assim que Nosso Senhor se submeteu a todas as humilhações, no Calvário. Entretanto, foi para ensinar gente diferente que Ele quis a glória do Domingo de Ramos.

Há gente de uma mentalidade detestável, que acha absolutamente natural que Cristo sofra, que a Igreja seja vexada, humilhada, perseguida. Gente comodista, “cujus Deus venter est” — “que têm por Deus o seu próprio ventre”, e que pensa que, como a Igreja deve imitar a Cristo, é natural que todos os [seus inimigos] se atirem contra ela e a  façam sofrer. É a Paixão de Cristo que se repete, dizem eles. E enquanto essa Paixão se repete, eles levam sua vida farta e cômoda, nas orgias, nas imundícies, na exacerbação  e todos os sentidos e na prática de todos os pecados.

Para gente como esta é que foi feito o látego com que foram expulsos os vendilhões do Templo.

Devemos estar sempre com a Igreja

Não é verdade que devamos cruzar os braços ante as investidas dos inimigos da Igreja. Não é verdade que devamos dormir enquanto se renova a Paixão. O próprio Cristo  recomendou que seus Apóstolos orassem e vigiassem. E se devemos aceitar os sofrimentos da Igreja com a resignação com que Nossa Senhora aceitou os padecimentos de  seu Filho, não é menos exato que será um motivo de [reprovação] para nós, se nos portarmos ante as dores do Salvador com a sonolência, a indiferença e a covardia de  discípulos infiéis.

A verdade é esta: devemos estar sempre com a Igreja, “porque só ela tem palavras de vida eterna”. Se ela é atacada, lutemos por ela. Mas lutemos como mártires, até a efusão  e nosso sangue, até o emprego de nosso último recurso de energia e de inteligência. Se, apesar disto tudo, ela continuar a ser oprimida, soframos com ela, como São  João Evangelista aos pés da Cruz. E estejamos certos de que, neste mundo ou no outro, Jesus misericordioso não nos negará o esplêndido prêmio de assistirmos à sua glória  divina e suprema.

Plinio Corrêa de Oliveira (Excertos do “Legionário”, nº 236, de 21/3/1937.Título e subtítulos nossos.)

Proporcionado à Mãe e ao Filho de Deus

Maria Santíssima é a mais perfeita dentre as meras criaturas. Se tomarmos a soma das excelências de todos os Anjos e homens que já existiram, existem e existirão, não teríamos sequer pálida ideia da perfeição da Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Se Deus foi tão magnificente no predestinar e modelar a Mãe que daria ao mundo o Salvador, e em cumulá-La das mais preciosas graças, não seria menos pródigo no escolher o homem que deveria ser o esposo dessa Virgem e Mãe.

Um varão tinha de ser considerado proporcionado, por seu amor a Deus, sua justiça, pureza, sabedoria e todas as demais qualidades, a tal Esposa e a tal Filho. Esse homem, escolhido para esposo de Nossa Senhora e pai jurídico do Filho de Deus, foi São José.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/3/1967)

Consorte da Sede da Sabedoria e pai do Leão de Judá

Para se ter alguma noção do semblante de São José seria preciso deduzir, à maneira de suposição, o caráter de um homem que esteve à altura de ser o pai d’Aquele cuja Sagrada Face está estampada no Santo Sudário de Turim. Quer dizer, o homem que foi o educador, o guia, o protetor do Senhor daquele rosto impresso no Sudário; um homem da mesma linhagem, parente e esposo da Mãe d’Ele.

Conceber algo menor do que isso é não ter ideia da extraordinária figura de São José, modelo de fisionomia sapiencial porque consorte da Sede da Sabedoria, do Espelho da Justiça, Maria Santíssima. Modelo de fortaleza, porque pai do Leão de Judá, Nosso Senhor Jesus Cristo.

A este verdadeiro São José devemos elevar nossas preces, rogando-lhe interceda por nós junto à Virgem Santíssima e a seu Divino Filho, e nos alcance a graça de o imitarmos nas suas excelsas virtudes.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/3/1967)

Revista Dr Plinio 252 (Março de 2019)

Encarnação do Verbo: o mistério da Contra-Revolução

A Festa da Anunciação do Anjo a Nossa Senhora nos convida a admirar este sublime paradoxo: no momento em que a Virgem Santíssima afirmava ser a serva do Senhor, o próprio Deus quis fazer um supremo ato de servidão, de dependência e de escravidão em relação a Ela. Nisto encontramos a perfeição do espírito da Contra-Revolução.

 

Em seu Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem(1), São Luís Grignion de Monfort tem o seguinte pensamento:

Os verdadeiros devotos de Nossa Senhora terão uma devoção especial pelo mistério da Encarnação do Verbo, a 25 de março, que é o mistério adequado a esta devoção,…

Quer dizer, da sagrada escravidão.

…pois que esta devoção foi inspirada pelo Espírito Santo: primeiro, para honrar e imitar a dependência em que Deus Filho quis estar de Maria, para glória de Deus seu Pai e para nossa salvação; dependência que transparece particularmente neste mistério em que Jesus se torna cativo e escravo no seio de Maria Santíssima, aí dependendo dela em tudo; segundo, para agradecer a Deus as graças incomparáveis que concedeu a Maria, principalmente por tê-La escolhido para sua Mãe digníssima, escolha feita neste mistério. São estes os dois fins principais da escravidão a Jesus Cristo em Maria.

Um grau de sujeição inimaginável

O pensamento muito profundo é de que Nosso Senhor, vivendo em Maria durante o tempo da Encarnação, esteve em uma dependência incomparável d’Ela, pois sendo já inteiramente lúcido, ficou, entretanto, completamente dependente, como uma criança no seio materno depende de sua mãe.

É o maior estado de submissão que se possa imaginar. Uma criança fora do ventre materno tem uma vida própria, liberdade de movimentos, enfim, todo um dinamismo próprio ajudado pela mãe. Mas não vive, propriamente, da vida da mãe. Pelo contrário, a criança que está no seio materno, vive da vida da mãe; em tudo é conduzida e, por assim dizer, circunscrita por ela.

Como sujeição, é um estado bastante semelhante ao de escravidão, porque neste o escravo renuncia completamente à sua liberdade para ficar inteiramente circunscrito pela vontade de seu senhor. Sua vida, seus atos são para o serviço de seu senhor, seus pensamentos tendem a ele. Assim era Nosso Senhor em relação a Nossa Senhora.

Aquele que, sendo infinito, criou o universo e a quem o Céu e a Terra não podem conter, foi contido pelas entranhas indizivelmente gloriosas da Santíssima Virgem e teve para com Ela um grau de sujeição inimaginável!

Em resposta ao “Non serviam” de Lúcifer, o “Amém” do Filho de Deus

Portanto, quem quiser ser verdadeiro escravo de Nossa Senhora deve venerar de modo muito especial essa miraculosa e insondável sujeição de Jesus a Maria, na qual o infinitamente maior deixou-Se dominar e conter pelo menor, na realização de um plano divino, cuja sabedoria excede a qualquer cogitação humana.

Por outro lado, este é o mistério da Contra-Revolução, porque se a Revolução é um grande “Non serviam”(2), o mais alto grau de alienação – praticado pelo Filho de Deus em Maria Santíssima – é o mistério que mais esmaga a psicologia, a mentalidade e os falsos ideais da Revolução. Em lugar do “Non serviam” é o “Amém”. Lúcifer bradou: “Não servirei”; Nosso Senhor disse: “Assim seja” a tudo quanto Nossa Senhora quis.

Exatamente isso dá uma constrição especial no homem de espírito revolucionário, diabólico. Não é apenas ver a Deus servido por sua criatura e, portanto, sendo observada aí uma espécie de ordem de mérito, mas é o próprio Criador querendo obedecer à sua criatura e esta mandando n’Ele. É levar a obediência a um grau que se não soubéssemos, pela Revelação, ter havido a Encarnação, nunca poderíamos imaginar que essa virtude chegaria a tal extremo.

Se isso deu tanta glória a Deus, a ponto de naquilo que abusivamente poderíamos chamar a História d’Ele – porque Deus é infinito e não tem História – Ele quis que figurasse esse ato de obediência insondável, compreendemos também como a obediência praticada por nós dá glória a Nossa Senhora. Em contrapartida, como a revolta injuria a Maria Santíssima e seu Divino Filho.

Vemos, assim, até que ponto a Revolução é odiosa a Deus, e isso nos leva a compreender melhor o Inferno, com seus tormentos eternos, o desespero completo, o esmagamento perpétuo do demônio, à vista do fato de que ele atentou contra este princípio: ele deveria obedecer e não quis.

Certos teólogos dizem que a revolta de Lúcifer deu-se porque lhe foi mostrado o plano da Encarnação e dada a ordem de adorar o Verbo de Deus Encarnado. E por ser um anjo de tão alta categoria, ele não quis e revoltou-se.

Esta hipótese, que me parece totalmente provável, adquire uma clareza ainda maior se pensarmos no demônio considerando Nosso Senhor Jesus Cristo contido no claustro sacratíssimo de Nossa Senhora e obedecendo a Ela. Ver essa obediência do Verbo Encarnado a uma criatura infinitamente menor do que Deus – por mais excelsa que seja –, e a inferioridade d’Ele em relação a essa criatura, isso deve ter levado ao paroxismo a indignação de Lúcifer.

A festa da Contra-Revolução

Nós podemos dizer, portanto, que o dia 25 de março é a festa da Encarnação do Verbo, da escravidão a Nossa Senhora, da Contra-Revolução. É a festa na qual se celebra o espírito de obediência, o amor à hierarquia, à ordem, à dependência, a tudo quanto a Revolução odeia.

É mais do que concebível que nos preparemos para essa festa por meio de orações especiais para pedir a Nossa Senhora que esse espírito representado pela Encarnação atinja em nós a plenitude desejada por Deus quando nos criou.

De outro lado, vemos também o espírito mais do que humilde e contrarrevolucionário de Maria Santíssima em face deste mistério. Quando Ela soube que o Verbo Se encarnaria n’Ela, sua reação não foi de Se vangloriar, mas de pronunciar esta frase humílima: “Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38). Como se dissesse: “Se Deus quer de mim essa coisa inexplicável, isto é, que eu mande n’Ele, até isso Ele pode exigir de mim. Portanto, se Deus pede o meu consentimento a essa situação inimaginável, por obediência a Ele, n’Ele mandarei! Mas é Ele o Senhor, e a sua vontade, em todas as coisas, eu farei.”

Como ganha um realce especial, à luz disso, a atitude de Nossa Senhora na Anunciação, dizendo-Se escrava de Deus no momento em que Ele queria fazer um ato supremo de servidão, de dependência, de escravidão em relação a Ela! Encontramos nisto a perfeição do espírito da Contra-Revolução.               v

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/3/1971)

Revista Dr Plinio 252 (Março de 2019)

 

1) Cap. VIII, art. 1, §4, n. 243.

2) Do latim: “Não servirei.”

Oração para a Semana Santa

Jesus é depositado no sepulcro. Na aparência, é o fim, tudo está acabado… Na realidade, em breve tudo começará a renascer.

Junto a Vós, ó Refúgio dos Pecadores, os Apóstolos começam a chorar seus pecados. Logo virão a Ressurreição, a Ascensão e Pentecostes!

Quanto mais vitorioso parece o demônio, mais próxima está a vossa vitória.

Nestes dias em que, pelo atrativo de uma liberdade mal compreendida, está-se chegando a um assombroso desregramento dos costumes, ao caos na cultura e à anarquia nos países, dai-me, ó Mãe, uma fé firme nas promessas que fizestes em Fátima, uma esperança abrasada de que elas não tardam em se cumprir, uma certeza da derrota da Revolução e da instauração de vosso Reino. Amém.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

São Leandro, Bispo de Sevilha

Sem o auxílio da graça, o homem é incapaz de obter êxito em seu apostolado; porém, amparado por ela, consegue o inimaginável. Disto nos dá um belo exemplo São Leandro de Sevilha, o qual extirpou a heresia que havia quase dois séculos grassava na Espanha.

Os grandes movimentos da História, em geral, são impulsionados por homens a quem Deus concede uma grandiosa missão, comunicando-lhes seu espírito e sua força. Um destes homens foi São Leandro de Sevilha. Convertendo os godos e salvando uma nação inteira do jugo dos arianos, ele bem pode ser considerado um dos fundadores da Idade Média.

Acompanhemos com especial veneração sua ficha biográfica(1):

São Leandro nasceu em Cartagena, Espanha. Seus pais pertenciam à alta nobreza, e sua família estava repleta de santos. Um de seus irmãos, Santo Isidoro, sucedeu-o no trono episcopal de Sevilha; o outro, São Fulgêncio, foi Bispo de Cartagena. Sua irmã, Santa Florentina, tornou-se religiosa.

Quando era jovem ainda, São Leandro retirou-se para um mosteiro, tornando-se perfeito modelo de ciência e piedade. Seus méritos o levaram à Sé Episcopal de Sevilha, onde não diminuíram em nada as austeridades que praticava.

Quando Leandro foi nomeado bispo, parte do território espanhol estava dominada pelos visigodos arianos havia cento e setenta anos. Entregando-se imediatamente ao combate da heresia, o novo Bispo rezava e implorava o auxílio de Deus. O sucesso coroou seu zelo, e em pouco tempo a heresia já contava com menos adeptos.

Entretanto, Leovigildo, então rei dos visigodos, e também ariano, irritado com a atividade de São Leandro, e principalmente com a conversão de seu filho primogênito, condenou o santo ao exílio e o filho à morte.

Seu segundo filho, Recaredo, que vindo a ser um fervoroso católico, ao herdar o trono conseguiu a conversão de todos os seus súditos.

São Leandro dedicou-se a manter o fervor dos fiéis e foi a alma de dois grandes concílios: o de Sevilha e o de Toledo, os quais condenaram o arianismo.

Homem de ação, Leandro a todos inspirava o amor à prece, especialmente aos religiosos. Escreveu instruções admiráveis à sua irmã sobre o exercício da oração e o desprezo do mundo. Reformou a liturgia na Espanha.

Afligido por numerosas enfermidades, o apóstolo dos visigodos faleceu em 596.

A ação do Espírito Santo e a pujança da santidade

A ficha é riquíssima de aspectos passíveis de comentário. O primeiro deles é o florescimento de santos numa mesma família da alta nobreza espanhola: Santo Isidoro de Sevilha — um dos maiores santos da história da Espanha —, São Fulgêncio, Santa Florentina e São Leandro.

Vemos que beleza há na conjunção de tantos santos numa mesma estirpe. Com isso, Deus faz sentir a importância do fenômeno “estirpe” na formação dos santos e na realização dos planos da Providência.

Por outro lado, observamos a pujança de santidade existente naquela época. Trata-se de um dos mais belos fenômenos da História, onde inúmeros santos inauguraram o Reino de Nosso Senhor Jesus Cristo durante a Idade Média; fenômeno não atribuível a nenhum homem, a nenhuma Ordem religiosa, mas diretamente oriundo da ação do Espírito Santo.

De fato, a não ser por um verdadeiro sopro universal do Divino Espírito Santo, não seria possível o surgimento de tantas almas santas ao mesmo tempo.

Em pleno domínio dos bárbaros arianos…

Ao ser eleito Bispo de Sevilha, São Leandro encontrou-se diante do seguinte problema: havia cento e setenta anos, bárbaros hereges exerciam uma função dominadora na Espanha.

Ao contrário do que muitos pensam, a maior parte dos bárbaros não era pagã, mas sim ariana. Quando invadiram o Império Romano, muitas tribos bárbaras já haviam sido visitadas, em suas respectivas regiões, por um Bispo ariano chamado Úlfilas(2), o qual as perverteu para o arianismo.

Desta maneira, enquanto descendentes dos antigos cidadãos do Império Romano, os católicos eram os vencidos, os pobres, estavam por baixo e gemiam sob o jugo dos arianos, os quais, por sua vez, constituíam o povo novo, forte e vencedor.

…a Providência suscita São Leandro de Sevilha

São Leandro recebeu, então, da parte de Deus, a missão de derrubar o domínio ariano. De que maneira ele o fez?

Em primeiro lugar, chorando diante de Deus e pedindo, por meio de Nossa Senhora, os auxílios necessários para a tarefa que deveria realizar de modo admirável. Cônscio da incapacidade humana perante as tarefas apostólicas, São Leandro sabia que o homem não é senão um instrumento de Deus e de Nossa Senhora, os verdadeiros realizadores do apostolado. Assim, as conversões deram-se em número colossal e o poder ariano foi diminuindo graças às suas pregações.

Aspectos fugazes, porém importantes, se desvendam na vida de São Leandro, uma das maiores figuras da hagiografia e da história espanhola.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 26/2/1964 e 27/2/1967)

1) Butler, Alban. Lives of the Saints – With Reflections for Every Day in the Year.
2) Educado no Catolicismo, Úlfilas aderiu ao arianismo por ocasião de uma viagem a Constantinopla, onde Eusébio o sagrou bispo. Tendo voltado para o grêmio dos godos, dedicou-se à conversão de seus irmãos de raça à fé ariana.

São José – Modelo de cavaleiro

Um dos episódios mais bonitos da vida de São José é a fuga para o Egito.

O Santo Patriarca recebe em sonho a visita de um Anjo que lhe diz que o Rei Herodes está querendo matar o Menino Jesus. Então ele sai às escondidas, com Nossa Senhora e seu Divino Filho, e vão para o Egito.

A defesa do maior tesouro que houve na Terra — e tesouro maior do que esse não há no Céu — ficou inteiramente confiada a São José, que representava o braço vigoroso, a previdência, a força varonil na defesa de um Menino que era ao mesmo tempo Deus, mas quis ser fraco nas mãos de São José.

Nós louvamos e apreciamos muito a vocação de Godofredo de Bouillon, que comandou as tropas na reconquista de Jerusalém. É o cruzado por excelência, é uma coisa linda! Entretanto, muito mais do que retomar o Santo Sepulcro para Nosso Senhor é defender a Ele próprio! E disto São José foi encarregado bela e gloriosamente. Ele foi, portanto, o cavaleiro-modelo na defesa do Rei dos reis, do Filho de Deus encarnado.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 30/7/1989

São Domingos Sávio – Alegre apóstolo da seriedade

Considerado a obra prima da educação Salesiana, Domingos Sávio, eminentemente piedoso e cumpridor de seus deveres, foi o grande discípulo de São João Bosco. Vivendo em fins do século XIX, doze anos de idade foram suficientes para demonstrar sua vida exemplar na prática das virtudes e na observância da Lei de Deus.

Sendo uma época em que tomava livre curso o ateísmo e a anti-religiosidade, penetrando até mesmo na mentalidade e na formação das crianças, São Domingos foi um admirável apóstolo da seriedade. Mostrando uma sabedoria muito superior à sua idade provou possuir uma compreensão profundamente séria e sobrenatural, baseada na Fé, de tudo quanto devia realizar.

Difundiu em torno de si uma atmosfera de compostura, seriedade e calma, que entretanto não fazia com que as crianças deixassem de serem autênticas, proporcionando um meio de reflexão e de compostura. Opondo-se, portanto, ao traço característico da Revolução na infância, que é a falta de educação e de cerimonial; que faz dos indivíduos, quando forem homens formados, os adversários de todas as tradições de um tempo em que se cultivava a seriedade e a cerimônia.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/3/1973)

São Domingos Sávio modelo de pureza e seriedade

A boa formação de uma criança e de um adolescente, observava Dr. Plinio, deve proporcionar-lhes um equilibrado e sadio impulso para a maturidade. Sobretudo, para alcançarem o ideal de perfeição moral a que todo homem é chamado. Como a seguir veremos, luminoso exemplo dessa educação bem assimilada encontramos em São Domingos Sávio, discípulo predileto do grande São João Bosco.

 

No mês de março a Igreja celebra a memória de um Santo cuja vida me causou grande admiração, e a respeito do qual gostaria de tecer alguns comentários. Não tanto evocando seus traços biográficos, quanto ressaltando sua fisionomia moral, que deixou profunda impressão no meu espírito. Trata-se de São Domingos Sávio, discípulo de São João Bosco.

Obra-prima da educação salesiana

Faleceu ele antes de seu mestre, aos 12 anos de idade, e foi considerado a obra-prima da educação dada pelo célebre apóstolo da juventude. Menino eminentemente piedoso, exímio cumpridor dos seus deveres, conservou sempre uma castidade exemplar, tendo sido proclamado pelo Papa Pio XI como o padroeiro da pureza, depois de São Luís Gonzaga.

Essas reflexões se prendem a uma recordação pessoal, que me parece oportuno registrar.

Há alguns anos, a convite do Arcebispo de Mariana, Dom Helvécio Gomes de Oliveira, desloquei-me até essa histórica cidade de Minas para fazer uma conferência sobre São Domingos Sávio. Após o almoço, disse ao reitor do Colégio salesiano onde a sessão se realizaria à tarde:

— Peço que o senhor me consiga uma biografia de São Domingos, pois apesar de sabê-lo canonizado, ignoro os pormenores de sua vida.

Com muita solicitude ele me procurou uma biografia do Santo, porém bastante resumida. Comecei a lê-la e me lembro que o biógrafo acentuava diversas qualidades comuns aos bons meninos. Assim, São Domingos Sávio era muito devoto, obediente aos seus superiores, de modo especial a São João Bosco, além de fazer apostolado junto a seus colegas, sendo um exemplo de zelo pelas almas.

Os “birichini” de São João Bosco

Contudo, pensei: “Infelizmente, com esses dados, não me é possível proferir uma conferência que não seja uma repetição de tantas outras realizadas ou preparadas, a respeito de vários bem-aventurados…”. Com efeito, naquela época encontrava-se certos formulários para sermão ou exposição de vidas de santos, que diziam: “São tal, mudando a data e o nome, serve para tais e tais santos”.

Ora, ao ler o opúsculo que o reitor me conseguira, percebi que escapara ao biógrafo o traço mais marcante e acentuadamente contra-revolucionário da vida de São Domingos Sávio, que, creio eu, indicava o “segredo” de sua santidade.

Para que esse traço fique bem explicitado, importa considerarmos o fato de que nosso santo viveu em meados do século XIX, um período em que a Revolução atingia um auge, e o espírito revolucionário, portanto, lograva grande concessão da parte dos adolescentes que principiavam a frequentar escolas. De um lado.

De outro, temos que São João Bosco lecionava para os “birichini”, apelativo dado na região de Turim aos meninos de famílias modestas. Nesse sentido, é esplêndida a vocação dos salesianos: ensinar sobretudo para as classes populares, instruindo-lhes nos misteres profissionais em estabelecimentos para essa finalidade. Eram meninos com grande vitalidade e efervescência, mas tendentes a travessuras e à falta de seriedade (a qual, aliás, se alastrara por todas as camadas sociais).

Admirável apóstolo da seriedade

Nesses ambientes São Domingos Sávio mostrou-se um admirável apóstolo da seriedade, manifestando uma sabedoria superior à existente em meninos de sua geração. E na medida própria à mentalidade de uma criança, possuía uma compreensão invulgar de tudo quanto deveria fazer. De maneira que não praticava uma ação nem dizia uma palavra que não revelassem uma reflexão séria — nas proporções de um menino, insisto — baseada na fé e profundamente sobrenatural.

Por isso ele difundia em torno de si uma atmosfera de compostura, de seriedade, de calma, sem fazer com que os meninos deixassem de ser autênticas crianças. De outro lado, proporcionava-lhes assim um meio eficaz de se oporem à mania do brinca-brinca, da falta de educação, da ausência de cerimônia e boas maneiras.

“Morte ao pecado mortal”

Essa característica de São Domingos Sávio se faz notar num episódio de sua vida, do qual tomei conhecimento quando li outra biografia dele, escrita pelo próprio São João Bosco. Este escreveu:
Domingos veio ver-me no dia anterior ao início da novena da Imaculada Conceição, em 1854, e teve comigo o seguinte diálogo. Disse ele:
— Eu sei que a Virgem concede grande número de graças a quem faz bem suas novenas.
— E tu o que queres fazer nesta novena, em honra da Virgem?
— Quisera pedir muitas coisas.
— Quais, por exemplo?
— Antes de tudo quero fazer uma confissão geral de minha vida, para ter bem preparada a minha alma. Depois procurarei cumprir exatamente as florzinhas que cada dia da novena se darão nas boas noites.

“Florzinhas” (fioretti em italiano) significavam pequenos propósitos a praticar, recomendados na “boa noite”, gênero de alocução famosa que Dom Bosco dirigia aos seus alunos. Consistia geralmente de breves comentários de algum fato do dia, ocorrido no interior ou fora do colégio. Continua a narração, com a pergunta de São João Bosco:
— E não tens mais nada?
— Sim, eu tenho uma coisa: quero declarar morte ao pecado mortal.
— E o que mais?
— Quero pedir muito, muito à Santíssima Virgem e ao Senhor que me mandem antes a morte do que deixar-me cair no pecado venial contra a modéstia.

Ou seja, contra a virtude da castidade. E São João Bosco acrescenta:
“Deu-me então um papelzinho em que ele tinha escrito esse propósito e manteve suas promessas porque a Santíssima Virgem o ajudava. São Domingos Sávio tinha, nessa ocasião, doze anos de idade.

Ressalta-se, assim, na estrutura de alma de uma criança, o traço distintivo de São Domingos: extraordinariamente sério, conseqüente, lógico em tudo. Ao mesmo tempo, alegre, de espírito sadio e maduro.

Reflexão ratificada pelos devotos de São Domingos

Dando-me conta desse cunho característico de São Domingos Sávio, comecei a minha conferência em Mariana dizendo que me achava diante de todo o corpo docente de um colégio salesiano, numa sessão que se realizava sob a presidência de um Arcebispo também salesiano e, portanto, exporia minha impressão pessoal, submetendo-a ao juízo deles. Acrescentei que a leitura de uma vida de São Domingos Sávio deixara em meu espírito essa ideia: merecia ele ser chamado perfeitamente de apóstolo da pureza das crianças, mas deveria também ser denominado seu apóstolo da seriedade.

Desenvolvi o tema, mostrando a importância do papel da seriedade para se alcançar a perfeição espiritual: não basta ser sério para ser santo, porém não se pode ser santo sem ser sério.

Tão logo enunciei a tese de que São Domingos era o modelo da seriedade entre as crianças, houve um aplauso geral iniciado pelo Arcebispo e todos os professores, seguido naturalmente pelo público. Naquela época, São Domingos Sávio estava sob o foco das atenções, pois era recém-canonizado e os salesianos difundiam muito a devoção a ele. Sua vida, portanto, era bem conhecida de seus irmãos de vocação e devotos. A ratificação daquela tese concedida por esse corpo docente salesiano, com tal ênfase, demonstrava-me a veracidade da minha observação.

Como vivemos num tempo em que a falta de seriedade se torna cada vez mais aguda e crítica, parece-me de importância capital rogarmos a São Domingos Sávio que seja nosso padroeiro para a seriedade, e nos alcance do Sagrado Coração de Jesus, pelas mãos de Maria Santíssima, uma perfeita prática dessa virtude da qual ele é um excelso modelo.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências em 9/3/1971 e 9/3/1973)

Vós fostes, Senhor

“Vós fostes, Senhor, um modelo de paciência. Vossa paciência não consistiu, entretanto, em morrer esmagado debaixo da Cruz, quando Vo-la deram.

Conta uma piedosa revelação que, quando recebestes das mãos dos verdugos vossa Cruz, Vós a beijastes amorosamente, e, tomando-a sobre os ombros, com invencível energia a levastes até o alto do Gólgota. Dai-nos, Senhor, essa  capacidade …. de sofrer heroicamente, não apenas suportando o sofrimento, mas indo ao encontro dele, procurando-o e carregando-o, até o dia em que tenhamos a coroa da vitória eterna.”

Plinio Corrêa de Oliveira