A hora do beijo

Por um desses insondáveis desígnios da Providência, a semana em que se comemoram os 500 anos do descobrimento da Terra de Santa Cruz é também a semana da Cruz por excelência, a de nosso Divino Salvador. Que ela seja a luz a indicar os rumos da nação brasileira, são os nossos mais ardentes votos, ao transcrevermos alguns  comentários de Dr. Plinio sobre a Paixão e Morte de Jesus, redigidos há mais de meio século.

 

O Domingo de Ramos é o pórtico jubiloso que transpomos hoje, para entrar nas tristezas da Semana Santa. E, sempre que em terras cristãs se celebra a Paixão e Morte do Senhor, vem à lembrança dos fiéis a cena empolgante e ignominiosa, em que o filho da perdição mostra aos esbirros, com um beijo, Aquele a quem tinha vendido.

Nesta hora em que a malícia humana parecia ter atingido extremos incríveis, a misericórdia de Deus superabundava. Dizem os autores espirituais que ninguém pode calcular a intensidade da graça que Judas recebeu e rejeitou, quando ouviu da Vítima Divina o último apelo: “Judas, com um beijo trais o Filho do Homem”? Hora de imensa  misericórdia para com o miserável vendilhão, sem dúvida. Mas hora, também, de imensa misericórdia para conosco. Os atos que o Divino Mestre praticou, nessa ocasião, são para nós ensinamentos de um valor sem limites. Paremos, para pensar neles um pouco.

Muito se tem falado sobre os trinta dinheiros, e sobre o beijo… Hoje em dia, a lembrança de tudo isto ainda é mais insistentemente aguçada porque vivemos na época da “quinta-coluna”, época em que todos os ideais espirituais e temporais têm seus “quintacolunistas”, seus “Papen” ou seus “Quislings”(1), e em que, portanto, não é possível não  lembrar o “Quinta-Colunista ” por excelência, aquele que por preço mais barato fez o serviço maior, com “êxito” mais completo. Mas, precisamente porque o tema já tem sido muito tratado, meditando a “hora do beijo” não é do beijo que vamos falar.

Quando foi preso, Nosso Senhor praticou duas ações aparentemente contraditórias, e é sobre esta contradição que queremos meditar.

Lição para nós: o Mesmo que aterroriza, consola

A contradição se resume em poucas palavras. De um lado, falou tão alto, atroou tanto os ouvidos, que os esbirros caíram por terra. De outro lado, abaixou-Se Ele mesmo até  o chão, para tomar uma orelha e a recolocar no lugar. O Mesmo que aterroriza, consola. O Mesmo que fala com voz insuportável para os tímpanos, reintegra uma orelha  cortada.

Não há nisto, para nós, algum ensinamento? Nosso Senhor é sempre infinitamente bom, e foi bom quando disse aos que O procuravam, que era Ele Jesus de Nazaré, a quem  queriam, como foi bom quando consertou a orelha de Malco. Se queremos ser bons, devemos imitar a bondade de Nosso Senhor, e aprender com Ele, que há momentos em que é preciso saber prostrar por terra com santa energia os inimigos da Fé, como há ocasiões em que é preciso saber curar os próprios males daqueles que nos fazem mal.

Por vezes, para curar é preciso gritar…

Por que falou Nosso Senhor tão alto, quando respondeu “Ego Sum”? Só para atordoar fisicamente os que O prendiam? Mas para quê, se Ele Se entregava voluntariamente à  prisão? É que Ele falou ainda mais alto a seus corações, do que a seus ouvidos, e se lhes falou alto aos ouvidos, não foi senão para lhes falar ainda mais alto aos corações. Não sabemos qual foi o proveito que aqueles homens fizeram da graça que receberam. Mas certamente o temor que tiveram, quando tombaram à voz do Mestre, lhes foi salutar como foi salutar a Saulo, quando a mesma Voz lhe gritou “Saulo, Saulo, por que me persegues?”

Nosso Senhor lhes falou alto aos ouvidos. Prostrou-os por terra. Mas sua voz que abatia corpos e ensurdecia ouvidos, erguia almas que estavam prostradas, e lhes abria os  ouvidos dos espíritos, que estavam surdos. Às vezes, pois, para curar é preciso gritar.

“Senhor, que ouçamos!”

Com Malco, Nosso Senhor procedeu de outra maneira. Quando lhe restituiu a orelha cortada pela fogosidade de Pedro, Nosso Senhor certamente lhe queria fazer um bem  temporal. Mas curando-lhe o ouvido, Nosso Senhor lhe quis sobretudo abrir o ouvido da alma. E Ele que a uns curara da surdez espiritual com o estrondejar divino da sua  voz, Ele mesmo curou da mesma surdez espiritual a Malco, dizendo-lhe palavras de bondade, e restituindo-lhe a orelha que perdera.

Vivemos em um século afetado, por certo, pela mais terrível surdez espiritual. Se há época em que os homens ouvem a voz de Deus, é a nossa. Se há época em que contra ela  endurecem os corações, é por certo a nossa.

O Divino Mestre nos mostra que se queremos dissolver em nós e no próximo esta terrível surdez, é Ele só que o pode fazer, e os meios humanos em si mesmos de nada  valem.

Nesta ocasião, façamos nosso um pedido que se encontra nos Santos Evangelhos. Quando um cego viu certa vez a Nosso Senhor, lhe bradou: “Domine, ut videam” — Senhor, que eu veja! Hoje, aproveitemos as comemorações da Semana Santa para Lhe pedir que ouçamos: “Domine, ut audiam”. Não sabemos, na sabedoria de sua misericórdia, de que maneira Nosso Senhor curará nossa surdez espiritual.

Sangramos como Malco, e estamos surdos como os esbirros. Pouco nos importa que Ele queira curar-nos por este ou aquele meio: cumpra-se sua vontade divina. Fale-nos  Ele pela voz terrível das provações e dos castigos, fale-nos Ele pela voz branda das consolações, uma coisa sobretudo Lhe pedimos: Senhor, que ouçamos!

Nosso Senhor vencerá, e com Ele, a Igreja

Que pelo menos nós, católicos, ouçamos plenamente a voz de Nosso Senhor, e que, correspondendo em nossa santificação interior, de modo completo e irrestrito, às graças  que Ele nos dá, realizemos dentro de nós aquele pleno reinado de Nosso Senhor, de que os inimigos da Igreja parecem esperançados de arrancar os últimos vestígios sobre a face da terra.

Nosso Senhor prometeu indestrutibilidade à sua Igreja, e prometeu que se salvaria toda alma verdadeiramente fiel. Confortados nessa esperança, meditemos com serenidade  s tristezas destes dias de universal conturbação, como as agonias desta Semana da Paixão. Nosso Senhor é o grande Vencedor. Ele vencerá, e com Ele vencerá a  Igreja.

Plinio Corrêa de Oliveira (Transcrito do “Legionário”, nº 659, 25/3/1945. A nota e os subtítulos são nossos.)

1) Von Papen, embaixador alemão, e Quisling, dirigente norueguês: personagens da II Guerra Mundial, cujos nomes se transformaram em sinônimo de “traidor”, por terem  favorecido, nos seus respectivos cargos, as ações criminosas do nazismo.

São Leão IX: ascendendo ao ápice pela virtude

Comentando uma biografia do Papa São Leão IX, Dr. Plinio analisa o importante papel da graça e da virtude, bem como os benfazejos perfumes da santidade.

 

Tendo-me sido fornecida uma sintética, porém atraente, biografia de São Leão IX(1), pediram-me para que tecesse a respeito dela alguns comentários, o que farei de bom grado.

Aliança entre a grandeza terrena e o serviço de Deus

ão Leão IX nasceu no ano de 1002, nos confins de Alsácia. Seu pai era Conde de Ingersheim e primo-irmão do Imperador Conrado, o Sálico. Sua mãe lhe deu o nome de Bruno. Ao atingir a idade de 5 anos, foi confiado, por seus pais, à educação de Bertoldo, o venerável Bispo de Toul, o qual dirigia então uma escola no próprio palácio episcopal.

Como vemos por esses dados, São Leão viveu em plena Idade Média. Neste trecho já se encontra uma nota interessante e peculiarmente medieval, ou seja, o fato de haver uma escola dirigida pelo bispo e que funcionava no próprio palácio episcopal.

No colégio, Bruno foi confiado particularmente a um primo seu, chamado Aderico, filho do Príncipe de Luxemburgo; os dois se tomaram de uma íntima amizade. Seu primo foi-lhe modelo de todas as virtudes e serviu extraordinariamente para sua formação.

Havia na Idade Média, pessoas pertencentes à mais alta categoria social e que se destacavam, sobretudo, por sua extraordinária virtude. Formava-se assim uma aliança entre a grandeza terrena e o serviço de Deus.

A Igreja Católica como centro de tudo

Tendo recebido do Bispo de Toul as sagradas ordens, foi nomeado clérigo da Capela do palácio do Imperador Conrado, o Sálico.

Todos os Imperadores tinham sua própria capela, na qual um conjunto de capelães mantinha o culto. O fato de ser clérigo na capela imperial era, portanto, uma situação de alta confiança, pois conferia a oportunidade de estar em contato direto com o Imperador.

Por outro lado, é digno de nota o fato de o Imperador ter sua capela própria, donde decorre que o elemento central de sua vida de corte era a recitação do Ofício Divino, a Santa Missa e outras práticas de culto católicas.

Esse piedoso costume, por sua vez, provinha da convicção profunda e verdadeira que estava radicada na sociedade daquele tempo: a Igreja Católica deve estar no centro de todas as coisas. E, portanto, na Corte imperial o elemento central devia ser a capela, onde estava presente o Santíssimo Sacramento, ou seja, Nosso Senhor Jesus Cristo, o Rei dos Reis. Também ali devia estar a imagem de Nossa Senhora Rainha e Mãe. Como isso é diferente dos costumes laicos e divorciados da verdadeira posição católica!

A virtude outrora era um título de ascensão

Bruno foi imediatamente bem visto pelo Imperador, que impressionado com suas virtudes passou a tratá-lo de “meu sobrinho”.

Ser tratado de primo e sobrinho do Rei era considerado pelas cortes daquele tempo uma honra extraordinária. Ele realmente era parente do Imperador, mas não em grau tão próximo; era filho de primos e não de irmãos do Imperador, portanto não era de fato seu sobrinho. Mas, o Imperador o tratava como sobrinho, elevando-o assim à categoria de Príncipe da Casa Imperial. A principal razão dessa honraria era a alta consideração do Imperador pelas virtudes de Bruno.

Como na Idade Média a maior parte das pessoas procurava a todo custo manter a posse do estado de graça, criava-se um ambiente onde a virtude era bem vista, e constituía um título de ascensão e não um título de perseguição como cada vez mais vem se tornando nos dias atuais.

Algum tempo depois, no ano de 1026, o Imperador recebeu a visita de clérigos da Diocese de Toul, que lhe anunciavam a morte do Bispo e o desejo de toda a população que Bruno fosse designado para a diocese vaga. Conrado acedeu, apesar de Bruno não ter ainda a idade canônica.

Aqui vemos um costume medieval que como outros é preciso ser bem entendido. É preciso levar em conta que a nomeação de um Bispo sempre foi privilégio papal. Porém, para isso o Papa pode receber indicações, as quais ele é livre de aceitar ou recusar. Ora, na Idade Média mantinha-se o costume proveniente dos primeiros tempos da Cristandade, pelo qual o povo da diocese podia aclamar ou propor um nome, mas cabia ao Papa ratificar ou não a proposta.

Com a implantação do Sacro Império, os Imperadores também tomaram o hábito de propor candidatos ao episcopado. Então se formava uma corrente de mediações, onde o povo propunha ao Imperador um nome e este, por sua vez, estando de acordo, propunha ao Papa. Mas, a palavra final sempre cabia ao Sumo Pontífice.

Apesar da pouca idade, Bruno imediatamente se destacou entre os Bispos da região por sua capacidade e pela virtude com que dirigia a diocese.

Note-se, portanto, a rapidez dessa ascensão, a qual se deve, acima de tudo, às suas notáveis virtudes.

Quem se humilhar será exaltado!

Durante 22 anos Bruno governou pacificamente e com brilho a Diocese de Toul. Com a morte do Papa Dâmaso II no ano de 1048, os romanos mandaram uma deputação ao Imperador Henrique III para pedir-lhe que designasse um novo Papa. O Imperador Henrique III reuniu, para esse efeito, uma Dieta em Worms, da qual participavam todos os Bispos do Império. Logo, todas as vozes designaram Bruno, Bispo de Toul, como futuro Papa. Tendo sido consultado, Bruno, por humildade, de nenhum modo queria aceitar o cargo; pediu então que lhe dessem alguns dias para refletir.

Pediu tempo para refletir, mas de fato, o que ele queria era escapar do encargo de ser Papa.

Terminado o prazo, apresentou-se diante de toda a Dieta de Worms reunida e disse que ele iria fazer uma confissão pública de todos os seus pecados, para fazer notar quanto ele era pecador e de nenhum modo digno do papado. Ajoelhou-se e fez sua confissão pública.

A confissão constava de matérias tão leves, que o fato que ele considerava mais grave e pavoroso, mal dava matéria de um pecado venial. Tendo terminado, todos se levantaram e o aclamaram.

Só um Bispo com tal limpeza de consciência poderia ser o Papa.

Como última tentativa, ele levantou um sério problema: o Imperador não tinha direito de nomeá-lo Papa. O Papa só pode ser eleito pelo clero de Roma, na forma canônica, ouvindo, quando queira, o povo de Roma.

Então ele iria a Roma a fim de lá consultar se o clero e o povo o queriam como Papa.

Retirou-se e, tomando o traje de peregrino, saiu a pé de Worms em direção a Roma.

Que extraordinária firmeza possuía esse homem, para tomar tal decisão, pois viajar a Roma supunha, entre outras dificuldades, a travessia dos Alpes, com suas neves eternas, montanhas escarpadíssimas e caminhos de cabras para transpor, pelo que essa viagem sempre foi considerada perigosa.

Ele poderia ter ido andando até o mar Adriático e lá tomar um barco. Mas ele quis, como um penitente, ir a pé até Roma, onde esperava ser recebido como um mero peregrino.

Ao chegar às cercanias de Roma, encontrou a população da cidade à sua espera.

A cidade de Roma naquele tempo deveria somar entre duzentos a trezentos mil habitantes.

Vestido como peregrino, com as vistas baixas e sem olhar nem dar atenção para ninguém, entrou em Roma, dirigindo-se diretamente ao túmulo de São Pedro para rezar.

É possível a abundância do estado de graça numa época

Este é realmente um homem reto, que faz as coisas como devem ser feitas.

O povo de Roma, aclamando-o, quis naquele mesmo dia entronizá-lo. Mas ele disse que esperassem até o dia seguinte, para ainda poderem pensar. Mas, por fim, chegou o dia seguinte e o povo estava de tal maneira decidido de que ele deveria ser o Pontífice, que ele acabou por aceitar, sendo então entronizado na Sé Romana.

Este apreço geral pela virtude daquele homem dá uma ideia do espírito que vigorava naquele tempo, e faz ver como é possível o estado de graça ser tão abundante em determinada época. Pois, sem ele, esses atos e gestos verdadeiramente extraordinários não se realizariam desta forma.

Por inspiração divina, tomou o título de Leão, considerando que devia, à testa da Igreja, lutar como verdadeiro leão. De fato, não tardou em começar a luta contra os verdadeiros inimigos da Igreja.

Um “Leão” em defesa da Igreja

Quais eram os verdadeiros inimigos da Igreja?

Naquele tempo, havia se difundido um abuso péssimo chamado simonia. Que consistia no seguinte: como a indicação dos cargos clericais era frequentemente feita pelo Imperador e pelo povo, acontecia que muitos homens vorazes, querendo ter cargos lucrativos, pagavam ao povo ou ao Imperador para serem indicados para o episcopado, ou então para que um parente ou alguém ligado a ele fosse nomeado Bispo, Abade e até mesmo Cardeal. Chegava-se até o absurdo de subornar os Cardeais e o povo de Roma, para elegerem determinado Papa, comprando assim até a Tiara romana.

Esse processo de escolha não podia deixar de trazer os piores inconvenientes. Através dele, muitas vezes, eram os mais ordinários que assumiam cargos eclesiásticos, dentre os quais estavam pessoas de costumes inteiramente desregrados, que por um lado constituíam um escândalo geral na Cristandade, e por outro um perigoso amolecimento ante as investidas de pagãos.

Estes vinham de todos os lados: os normandos vinham através do mar do Norte, penetravam pelo estreito de Gibraltar e atacavam o Sul da Itália; havia ainda restos de bárbaros que vinham dos países eslavos; e também os maometanos que atacavam por todas as partes.

Neste momento em que a Cristandade precisava lutar especialmente para defender-se, ela se apresentava extraordinariamente debilitada, pela decadência espiritual causada pela simonia.

Por isso, tendo assumido o papado, Leão IX começou a reunir diversos Sínodos e outros tipos de reuniões eclesiásticas, a fim de imediatamente punir e depor os Bispos que tinham tomado o cargo indignamente, nomeando bons para substituí-los. Isso causava, como é de se esperar, as mais acirradas indignações.

Zelo na defesa dos súditos

Ocupava-se ele com esse árduo trabalho, quando recebeu o aviso de que os normandos estavam por invadir a Apúlia, território do qual o Papa era Rei. Portanto, competia a ele defender seus súditos. Sem hesitação, foi a toda pressa à Alemanha a fim de pedir ao Imperador, seu parente, que mandasse um exército para defendê-lo.

Tendo o Imperador prometido enviar-lhe auxílio, o Papa desceu até a famosa Abadia beneditina de Monte Cassino, uma das mais célebres do mundo, a qual não ficava a muita distância de Roma, e lá permaneceu à espera da chegada do exército imperial. De fato, algum tempo depois chega o exército, porém, para sua surpresa, este era constituído por apenas 500 lorenos. Isto porque o exército imperial, quando chegou próximo aos Alpes, desistiu de descer.

A este punhado de combatentes tinham se incorporado pelo caminho alguns contingentes italianos, aos quais se somaram ainda alguns romanos, que eram senhores feudais da região. Assim constituiu-se o parco exército de resistência. Chegaram, por fim, os normandos, aos quais, apesar da desvantagem numérica, o exército do Papa ofereceu dura resistência que resultou numa tremenda carnificina.

Contudo, os normandos acabaram por vencer a batalha e levaram cativo o Papa, ao qual, devido à dignidade e respeitabilidade de sua pessoa, dispensaram toda forma de honras e cuidados.

Mas de todos os fatos da vida de Leão IX, nenhum me parece tão marcante da aprovação divina ao seu modo enérgico de agir, quanto às circunstâncias de sua morte.

A doce mensageira da felicidade eterna

A doença, doce mensageira da felicidade eterna… Como é linda esta expressão e contrária ao horror à doença que se tem em nossos dias. Claro que se deve combater a doença, mas com essa resignação deve-se aceitá-la. …a doença veio anunciar-lhe que sua hora tinha chegado. No dia 12 de fevereiro de 1054, ele celebrou por última vez o Santo Sacrifício da Missa onde dirigiu à multidão uma exortação comovedora.

No dia seguinte, sabendo que sua hora estava próxima, ele quis ser transportado da cidade de Benevento para Roma. Foram os próprios normandos que reivindicaram a honra de levá-lo numa liteira.

Que esplêndida glória ser carregado numa liteira pelo próprio “inimigo”!

Desta forma o Papa voltou ao Palácio de Latrão no mês de abril de 1054, época na qual habitualmente ele reunia o Sínodo dos Bispos das províncias eclesiásticas circunvizinhas de Roma. Ele então as convocou para o dia 17 de abril. Reunidos os Bispos, ele lhes disse: “Eu me recomendo à vossa fraternidade porque o tempo de minha dissolução chegou”.

Esta frase proferida pelo Papa é a reminiscência de uma citação de São Paulo, que manifestava o desejo de ser dissolvido, quer dizer, ter separada a alma do corpo, para subir a Jesus Cristo.

“Na última noite, em visão, a glória da Pátria celeste me foi manifestada. Eu reconheci entre os grupos de mártires aqueles que morreram na Apúlia, para defesa da Igreja”. Aqueles valentes lorenos que morreram na Apúlia, em defesa da Igreja, os quais eram mártires, estavam à espera que Leão IX fosse juntar-se a eles no Céu.

“Vem, nos disseram eles, e permanece entre nós, porque foi por teu intermédio que nós conseguimos as eternas felicidades. Mas uma voz, ao mesmo tempo, se fez ouvir, dizendo: ‘Não já, mas daqui a três dias somente’.”

No dia seguinte, ele reuniu de novo os Bispos, e sendo posto numa liteira foi conduzido pelos seus fiéis normandos em procissão até à Basílica de São Pedro, onde ele desejava morrer.

Hoje, carne e sangue; amanhã, poeira e cinza

Que lindo cortejo deve ter sido aquele! O Papa carregado numa liteira, os Bispos a seu lado, certamente cantando e portando círios, seguidos por um tropel de normandos armados, todos caminhando rumo à Basílica de São Pedro. Creio que não houve desfile militar que tenha superado em beleza aquela cena.

Prosternado diante da sepultura do Príncipe dos Apóstolos, Leão IX rezou pela Igreja e pela conversão dos pecadores. Assim que terminou, um delicioso aroma, superior ao perfume mais puro, se exalava da sepultura de São Pedro. Era o primeiro Papa manifestando seu agrado diante desse seu digno sucessor. Permaneceu então durante cerca de uma hora em silenciosa contemplação. Bispos, normandos e o povo em grande número estavam a sua volta.

Em certo momento ele mandou trazer pão e vinho. Os abençoou, comeu três pedaços de pão, bebeu um pouco de vinho e distribuiu o resto entre os assistentes. Ninguém comeu. Todo mundo guardou como relíquia os pedaços de pão que ele distribuiu.

Levantando-se então, dirigiu-se para o túmulo que ele mesmo tinha mandado preparar para si na Basílica. Lá, dirigindo-se aos Bispos, disse: “Vede, meus irmãos, como é miserável, frágil e efêmera a glória humana. Que esse exemplo jamais saia de vossa memória. Do nada eu fui um dia elevado ao que há de mais alto; e agora vou ser reduzido novamente a nada. Eu terei como moradia esse cárcere escuro e estreito. Hoje ainda convosco sou carne e sangue. Amanhã serei poeira e cinza”.

Que linda pregação! Qual terá sido a reação dos Bispos e mesmo dos normandos que estavam ao seu redor, vendo aquela cena grandiosa de um homem anunciando sua morte?

Adormeceu com uma calma indizível e acordou no Céu

Todos os assistentes se puseram aos prantos… O Papa então os despediu dizendo: Venham amanhã assistir a meu último suspiro.

São Leão retirou-se ao palácio próximo onde passou toda a noite em oração. Na manhã seguinte, sustentado por dois assistentes, voltou para a Basílica e veio prosternar-se diante do altar-mor. Estendeu-se sobre uma cama que tinham preparado junto ao altar, fez sinal com a mão para impor silêncio e dirigiu ao povo uma última exortação.

Depois, chamou para junto de si os Bispos e fez a confissão de seus pecados. Mediante uma ordem dele, um deles celebrou a Missa e deu a ele a Comunhão. Depois de ter comungado, o Papa disse: “Fazei silêncio, porque parece que eu vou dormir”. Inclinando a cabeça, adormeceu, com uma calma indescritível, para acordar no Céu.

Assim, diante do altar de São Pedro, no dia 19 de abril do ano da graça de 1054, faleceu o Santo Pontífice Leão IX.

Entre aqueles que o assistiam na hora de sua morte estava Hildebrando, que era a uma vez seu inspirador e secretário, e mais tarde viria a ser seu sucessor com o nome de São Gregório VII. Imagine ter como secretário um santo, o qual, a meu ver, foi “o Papa”, não comparando a santidade, mas sim a missão, e o papel na História da Igreja.

Que sublimidade, maravilha e grandeza devia ter aquela cena na qual um santo contempla outro expirar, onde São Gregório VII, ainda moço, permanece ao lado de São Leão IX, rezando até a hora em que a alma dele se desprende do corpo e sobe ao Céu!

A contemplação de fatos como este, e o deliciar-se com o perfume das virtudes de um tal santo, constitui um descanso da vida de todos os dias. Assim sendo, resta-nos pedir a São Leão IX que, do alto do Céu, reze e interceda por nós.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 29/10/1974)

1) Não possuímos referência da ficha utilizada por Dr. Plinio nessa ocasião.

Anunciação

As palavras da saudação angélica nos revelam Nossa Senhora como o Vaso de Eleição, o receptáculo sagrado no qual Deus depositara todas as perfeições e excelências de que uma simples criatura era capaz de conter.

Imensa na ordem da virtude e da santidade, cheia de graça, bendita entre todas as mulheres, com quem o Senhor estabelecera maravilhosa união: em seu imaculado seio fez-se carne o Verbo de Deus.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 25/9/1990)

Um “fiat!” que ecoou na História

Na festa da Anunciação do Senhor, em 25 de março, Dr. Plinio medita a narração evangélica, as cogitações de Maria diante da saudação do Anjo, as alegrias d’Ela na vida privada de Jesus, suas perplexidades durante a Paixão, e, sobretudo, sua submissão à vontade de Deus.

No linguajar comum do homem hodierno, certos conceitos como os de esplendor, pompa e glória, tendem a se confundir com a ideia de riqueza e a reduzir-se, em última  análise, a uma questão econômica. Ora, a Anunciação ocorreu numa casa pobre, mas foi um episódio esplendoroso, pois nele deu-se a conhecer o nascimento milagroso de  um Menino, o qual reinaria no trono de David e teria o império sobre toda a Terra nos séculos futuros.

As cogitações de Nossa Senhora sobre o mistério que Lhe era anunciado

A interrogação de Nossa Senhora — “Se Eu não conheço varão, como dar-se-á isso?” — nos leva ao seguinte pensamento: ou Ela havia recebido de Deus a revelação de que  seria sempre virgem, ou, pelo menos,  sentira profundamente na alma o convite para a virgindade perpétua e não restava a menor dúvida de que este chamado vinha de  Deus.

Estava implícito em suas palavras esta reflexão: “Sei que para conciliar essas atitudes aparentemente contraditórias de Deus — que me inspira a virgindade, porém me quer  como mãe do Salvador —, acontecerá uma maravilha, porque Ele nunca se contradiz”.

O Evangelho narra que Ela cogitava sobre o que seria essa saudação. Maria não colocava em dúvida que aquele Anjo viesse realmente da parte de Deus, pois o tratou como um emissário do Altíssimo. Mas a cogitação d’Ela incidia sobre o mistério existente na saudação: como explicar que seu Filho pudesse ter todo aquele poder que Lhe era  anunciado?

Como descendente de David, Nossa Senhora sabia que o Filho d’Ela nascido também o seria. Tinha ciência de que São José, seu esposo, era da mesma estirpe real, e que,  embora o Menino não nascesse dele, seria descendente do Rei-Profeta segundo a lei.

Há uma bonita expressão usada pelos teólogos: “Caro Christi, caro Mariae” — a carne de Cristo é a carne de Maria. Ou seja, d’Ela Jesus herdou a carne e o sangue do grande  monarca de Israel.

Ao se ler a narração evangélica, fica- se com a forte impressão de que  Nossa Senhora cogitava notadamente sobre o significado das palavras “lhe dará o trono de David”, e  sobre a natureza do reino que seria outorgado a seu Filho. Daí sua interrogação: tratava-se do nascimento do Messias, cuja vinda Ela tanto ansiava?

A resposta do Anjo começa por dizer: “Não temas, ó Maria!” Ela tinha, portanto, um certo temor. Como se explica que, concebida sem pecado original, e isenta de qualquer imperfeição moral, Ela pudesse ter medo de um Anjo?

A presença de um espírito angélico, e sobretudo a de um Arcanjo, é algo de tal densidade que deixa perplexo o ser humano. Era natural que Maria sentisse todo o peso da  presença do mensageiro celeste. Porém, não foi o Anjo que Lhe causou temor, mas a comunicação da impressionante missão que a Ela cabia, pois na sua humildade teve  receio de não corresponder de modo perfeito aos sublimes desígnios de Deus.

Mas a explicação do Anjo: “Tu encontraste graça diante de Deus”, inundou- A de tranqüilidade e paz. Os exegetas afirmam que no momento em que Ela proferiu o “Ecce ancilla Domini”, o Espírito Santo concebeu Nosso Senhor no claustro imaculado  da Santíssima Virgem.

Assim, aquele diálogo, tão simples mas tão belo, teve como esplendorosa conseqüência a Encarnação do Verbo.

A vida e as cogitações de Nossa Senhora em Nazaré

Nossa Senhora guardou as promessas do Anjo no interior de sua alma, e ao ver o Menino Jesus, segundo expressões do próprio Evangelho, crescer em sabedoria, idade e  graça diante de Deus e dos homens, naturalmente pensava na missão que Lhe estava reservada.

Sabendo que seu Filho era Deus, Nossa Senhora julgava explicável que Ele obtivesse os êxitos mais retumbantes e extraordinários. E terá Ela pensado, ao ver Jesus se tornar  moço, que em certo momento Ele sairia da casa paterna para dar cumprimento à sua missão?

Porém, essa hora ainda demoraria a chegar. Durante trinta anos, Ele quis viver apenas com Ela e São José. Ao que tudo indica, o chefe da Sagrada Família faleceu antes de Nosso Senhor começar sua vida pública.

A tradição nos atesta que Nossa Senhora e Jesus estavam presentes à cabeceira de São José no momento de ele exalar seu derradeiro suspiro: razão pela qual, o grande Patriarca é também o padroeiro da boa morte.

Como gostaríamos de assistir essa cena! Um leito pobre, Nossa Senhora de um lado, e de outro, Nosso Senhor, atraindo para Si a atenção de Maria e a do moribundo, aos  quais dirigia sublimes palavras de conforto. Nossa Senhora, com sua insondável solicitude, servia a São José, orando por ele e também o consolando…

Que revoada de Anjos! Em certo momento, as sombras da morte se tornam mais próximas. São José começa a notar que aquele convívio, para ele até certo ponto um Céu, iria cessar. Mas, de outro lado, sabia que lhe aguardava uma gratíssima missão: chegando ao Limbo dos Patriarcas, anunciaria que o Messias se tinha encarnado no seio da  Virgem Maria. Provavelmente, só com a menção dos nomes de Jesus e de Maria aquele lugar inteiro se teria iluminado…

Após a morte de São José, Nossa Senhora terá pensado a respeito de Jesus: “Quando começará Ele sua vida pública, e cessará nosso convívio? Com quem ficarei? Que  notícias terei d’Ele? Quando terá início o seu Reino? Assistirei a implantação dele, estando ainda na Terra ou já no Céu? “Inúmeras vezes, conversando com Ele, notei que  sua fisionomia foi se tornando mais tristonha. E na medida em que a tristeza pode ser comparada a uma sombra, foi se tornando sombria. Ele me tem falado de um imenso  sacrifício que deve padecer.

“Sei que é a morte de Cruz, à qual se referem as Escrituras, e que Ele mesmo já me anunciou. Vejo-me, de um lado, cercada de esplendor, e de outro, da perspectiva do  fracasso tenebroso.”

Passam-se os dias, os meses e os anos… Trinta anos viveu Jesus sob o mesmo teto com Ela, adornando sua alma com maravilhas cada vez maiores.

Um dia — pode-se conjeturar — Ele se aproxima d’Ela e, com veneração e carinho ainda mais intensos, envolvendo-A com o olhar, Lhe diz: “Minha Mãe, chegou o  momento!” Talvez tivesse dito isso com um sorriso cheio de saudades, mas saudades antecipadas, cheias de sorriso. Era a missão d’Ele que ia começar e desfecharia na sua glória.

Ele sabia que, essencialmente, caminharia em direção à Cruz. Mas nesse percurso recrutaria os Apóstolos, os discípulos e todos os elementos da Igreja nascente. Pregaria  durante três anos sua maravilhosa doutrina, praticaria milagres que haveriam de impressionar e persuadir o mundo inteiro, fundaria a Igreja, instituiria os Sacramentos. E depois morreria…

O que Mãe e Filho se terão dito nessa despedida? Terá sido uma surpresa que durou um minuto? Ou Ele A avisou com um mês de antecedência? Nessa hipótese, para Nossa  Senhora esse mês terá parecido um minuto, porque Ela quisera uma despedida muito mais prolongada?

São maravilhas que nos serão reveladas no Céu, e diante das quais não teremos palavras para manifestar nossa veneração e adoração. Após Nosso Senhor ter iniciado sua  vida pública, Nossa Senhora é procurada pelas santas mulheres e se incorpora a essa família de almas cujos cuidados Jesus Lhe confia.

“Conversas” de Nossa Senhora com o Espírito Santo

Todas essas considerações nos parecem de extrema beleza. Porém, como são restritas diante de realidades ainda mais altas! Sabemos, por exemplo, que Nossa Senhora é a  Esposa do Divino Espírito Santo. Quantas graças a Terceira Pessoa da Santíssima Trinidade Lhe concedia, para que conhecesse e meditasse em tudo quanto acontecia? Quantas perguntas não terá feito ao Divino Consorte, dirigindo-se a Ele com as palavras: “Meu Rei, meu Senhor e meu Esposo”?

Se o relacionamento d’Ela com seu marido segundo a lei, São José, era tão bonito e tocante, como não terá sido com o Divino Espírito Santo? Por exemplo, no momento da  Encarnação, Ele se tornou Esposo d’Ela.

Ora, no ato dos desponsórios, o homem oferece à sua mulher um presente magnífico. Que dádiva extraordinária o Divino Espírito Santo terá concedido a Maria? Que graças?  Que esplendores? Tal escapa à nossa pobre imaginação…

Esperanças e apreensões de Nossa Senhora

Durante a vida pública, ao contemplar as pregações e milagres de Nosso Senhor, parecia a Nossa Senhora que a promessa da glória estava se realizando. Mas, de outro lado, com seu discernimento dos espíritos incomparável, Maria Santíssima percebia que Satanás rondava pelo ambiente, e sentia o ódio que ele incutia em algumas almas.

Pensemos noutra circunstância. Como diz São Tomás de Aquino em seu belíssimo hino eucarístico “Lauda Sion: In suprema nocte cenæ”, na última noite da ceia, véspera da Paixão, “recumbens cum fratribus”, estando sentado com os irmãos, que são os Apóstolos, Nosso Senhor celebrou a primeira Missa.

Provavelmente, Nossa Senhora se encontrava no Cenáculo, e recebeu também a Comunhão. Que maravilha não terá sido a Primeira Comunhão de Nossa Senhora! Mas, Ela ouviu igualmente a terrível profecia: “Um de vós há de Me trair”. Viu Judas sair de modo apressado do Cenáculo, com essa intenção.

O Evangelho narra a cena de modo tocante, com palavras que têm um caráter muito simbólico: “Fora, era noite…”

Ela viu Nosso Senhor sair em seguida. Talvez Ele tenha se despedido d’Ela. Ter-Lhe-á dito que era chegada sua hora, ou A deixou na dúvida? Ele e os discípulos se retiraram depois de  terem cantado um hino pascal, e penetraram naquela mesma noite, na qual ecoavam os passos de Judas.

O que terá acontecido com Nossa Senhora nos instantes seguintes? Provavelmente, o fundo de quadro da meditação d’Ela eram as promessas de triunfo recebidas na Anunciação. Porém, havia o preço da glória, não mencionado pelo Arcanjo naquele jubiloso encontro, e esse preço era a dor.

Pensemos, então, na Virgem Dolorosa, na hora mais terrível da Paixão, no meu entender o momento em que Nosso Senhor exclamou em altos brados: “Meu Pai, Meu Pai,  por que Me abandonastes?”

É um brado de sofrimento e de dilaceração, mas são também as palavras iniciais de um Salmo cujo triunfante tom final parece prenunciar a Ressurreição. Que sentimentos  terão ido na alma santíssima de Maria, ao ouvir esse clamor de Jesus?

Por outra parte, Ela vislumbrou, antes da morte d’Ele, o primeiro clarão de alegria, quando O ouviu dizer ao bom ladrão: “Hoje estarás comigo no Paraíso”. Essa afirmação  significava que Nosso Senhor nunca perdeu de vistas, mesmo em meio às dores mais lancinantes, que Ele estava assim abrindo para a humanidade as portas do Céu.

As promessas divinas se realizam em meio a aparentes desmentidos Das presentes reflexões nos é dado tirar uma conclusão que pode ser resumida em poucas palavras. Com a Anunciação, foi comunicada a Nossa Senhora, e através d’Ela a todo o gênero humano, a Encarnação do Verbo. Com o seu “Sim!”, o Verbo se fez carne e habitou entre nós.

No dia da Anunciação, a Palavra de Deus raiou num amanhecer de alma repleto de louçania, com promessas superlativas. Mas se as promessas de Deus suscitam as mais  alegres esperanças, elas soem passar também por aparentes e terríveis desmentidos. É o modo de agir da Providência.

Nesse sentido, a Anunciação foi também a proclamação de que a autêntica glória não consiste em não sofrer humilhações e derrotas, mas, sim, em lutar pela Verdade. A alma santíssima de Nossa Senhora, habituando-se às promessas, às alegrias e aos desmentidos, constitui para os católicos o sublime exemplo de submissão à vontade de  Deus, manifestada por Ela, de modo inigualável, no humilde “fiat” que ecoou por toda a sua vida.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

São João Nepomuceno Mártir do sigilo sacramental

O problema da Revolução e da Contra-Revolução estava no centro das cogitações de Dr. Plinio. Ao comentar a vida de São João Nepomuceno, que exprobou do púlpito a heresia dos hussitas, ele explica que João Huss e Wycliffe prepararam o campo para Lutero, o qual promoveu a primeira Revolução e arrastou um terço da população da Europa, devido à tibieza dos católicos.

Comentarei hoje uma ficha sobre a vida de São João Nepomuceno, presbítero e mártir.

São João nasceu em Nepomuk, Boêmia, em 1340.

Quando ele nasceu, viram-se luzes extraordinárias sobre sua casa. Quando era criança, a Santíssima Virgem curou-o de uma grave moléstia.

Ordenado sacerdote, dedicou-se à pregação com grande êxito. A cidade de Praga mudou com seus sermões, que eram ouvidos por uma imensa multidão.

Venceslau IV, Rei da Boêmia e Imperador da Alemanha, nomeou-o Preboste de Witchad e deu-lhe o título de Chanceler do Reino.

Mas São João tudo recusou, continuando simples cônego regular. Entretanto, a Imperatriz escolheu-o para seu confessor, e Venceslau o encarregou da distribuição de suas esmolas.

Mas este jovem príncipe perverteu-se, tornando-se tirano de seu povo. E como sua esposa passasse horas na igreja rezando por sua conversão, foi tomado por violento ciúme, chamando São João para que lhe relatasse as confissões da Imperatriz. E assim começou o longo calvário desse santo.

Foi mais de uma vez preso e submetido a tremendas torturas. Era sempre libertado, pois o Imperador temia uma revolta popular a favor do sacerdote.

Ameaçado de morte, nada o demovia. Finalmente, numa ocasião percebeu que seu fim estava próximo. Subindo ao púlpito, começou seu discurso pelas palavras do Evangelho: “Ainda um pouco de tempo e já não mais me vereis”. E predisse, então, claramente as devastações que a heresia de João Huss faria na Boêmia.

Depois quis rezar ainda uma vez aos pés de Nossa Senhora, cuja imagem, juntamente com a Fé cristã, fora trazida para a região por São Cirilo e São Metódio.

Nesse mesmo dia, voltando a Praga, foi preso e ameaçado. Como sua constância fosse a mesma, Venceslau esperou o cair da noite e mandou que o lançassem às águas do Rio Moldava.

Imediatamente, chamas apareceram sobre o rio e rodearam seu corpo. O povo acorreu para ver a maravilha e a Imperatriz mostrou-o ao Imperador que, apavorado, fechou-se em seus aposentos por vários dias.

São João Nepomuceno foi o especialíssimo protetor das mais ilustres famílias da Alemanha. São extraordinárias as graças obtidas por seu intermédio. Em agradecimento, os príncipes da Casa d’Áustria tudo fizeram para sua canonização, que foi obtida em 1729.

Em 1719 seu corpo fora encontrado intacto, como se tivesse sido lançado às águas naquela hora. Sua língua, sem corrupção alguma, era como de um homem vivo, atestando seu martírio como defensor do sigilo sacramental.

A heresia se propaga nos ambientes a ela receptivos

É uma lindíssima biografia. Para nos situarmos bem, temos que recordar um pouco as condições da Europa naquele tempo.

Aquelas paragens da Europa central foram sempre meio rebeldes à influência católica. A Boêmia, a Morávia, etc., eram terras onde a bruxaria, o ocultismo, as heresias de toda sorte nasciam a todo momento.

E exatamente nessa época, em que a Idade Média estava chegando ao seu apogeu — segundo alguns, até já havia iniciado seu declínio —, começou naquela zona a heresia de João Huss e Wycliffe, dois heresiarcas reputados precursores de Lutero.

Com efeito, as doutrinas deles apresentam uma semelhança extraordinária com as de Lutero. Explica-se essa semelhança por dois lados: em primeiro lugar, porque uma doutrina herética nunca é a pura criação do cérebro de um indivíduo. Mas sim, em grande parte — ao menos as doutrinas heréticas que alcançam êxito —, produto da elaboração de um ambiente.

O heresiarca produz uma doutrina da qual o ambiente está ávido. E é exatamente porque essa doutrina encontra ambiente receptivo, que ela consegue espalhar-se. O herege tonto elabora uma doutrina que o próprio ambiente não aceita; naturalmente é rejeitado, e ele não faz parte da História. Mas o herege esperto, que pretende levar muitas almas para o Inferno, prepara uma doutrina que ele percebe corresponder às más inclinações do ambiente onde ele vive; ao menos das pessoas más desse ambiente. Então, essa doutrina tem possibilidade de se propagar.

João Huss percebeu que o orgulho e a sensualidade inclinavam as almas naquelas zonas para uma determinada doutrina. Lutero, mais tarde, retomou as doutrinas de João Huss, já então na Alemanha — porque a situação de deterioração que se tinha produzido na Boêmia repetiu-se na Alemanha.

Mártir do sigilo da Confissão

São João Nepomuceno viveu exatamente nessa época em que a região dele estava passando do Catolicismo para a heresia de João Huss.

No começo, ele era muito bem visto pelo Rei da Boêmia que o apoiava, mas depois se deixou influenciar pelo ambiente mau e se deteriorou, se perverteu, passou a ser um mau homem.

A Rainha, que era uma boa pessoa e de quem São João era confessor por encargo do Rei, passava largas horas na igreja. E o Rei não queria acreditar que a piedade de sua esposa fosse a razão de suas longas ausências; ficou desconfiado de algum pecado, de algum adultério. Então, quis que o santo lhe contasse as confissões dela.

Ora, o sigilo do confessionário é sagrado, e nunca, por nenhum pretexto, um padre pode contar qualquer coisa ouvida em confissão.

Começa então a perseguição. O Rei tortura várias vezes o santo, que se recusa a contar qualquer coisa da confissão da Rainha. Então, o monarca resolve matar São João Nepomuceno.

O santo sente isso e, então, com uma premonição divina, um aviso de Deus, se prepara para a morte de modo tocante. Ele vai ao púlpito e emprega aquelas palavras de Nosso Senhor: “Ainda um pouco de tempo e o mundo não mais me verá; mas vós Me vereis, porque Eu vivo, e vós vivereis.”(1) Quer dizer, Nosso Senhor falava da Morte e da Ressurreição d’Ele. Dessa maneira São João Nepomuceno anunciou sua morte ao povo.

Depois, como todos os santos são grandes devotos de Nossa Senhora, ele foi a um lugar onde havia um santuário, para venerar a primeira imagem trazida para aquelas regiões por São Cirilo e São Metódio, que evangelizaram o mundo eslavo.

Ao retornar para sua cidade, o Imperador mandou capturá-lo e jogá-lo no rio Moldava. Produziu-se, então, um milagre: saíram chamas de dentro da água. Chamas belíssimas! E a Imperatriz chamou o esposo para ver aquele milagre, e reconhecer o crime que ele tinha cometido. O homem ficou muito perturbado, trancou-se dentro do quarto durante vários dias, não quis sair, mas o crime estava praticado.

Começou então a veneração pelo mártir João Nepomuceno. Naquela região seu nome ficou célebre, todo mundo começou a rezar a ele e os príncipes da Casa d’Áustria conseguiram da Santa Sé, mediante provas, que ele fosse canonizado alguns séculos depois, quando já era tido como santo por toda a região.

A heresia de João Huss e a de Lutero

Se compararmos essa história com a do protestantismo, veremos como as coisas se passaram de modo diferente.

Em regiões da Europa central, começa um movimento de deterioração. São João Nepomuceno é atingido por um soberano que é marcado por essa deterioração, a qual haveria de degenerar na heresia de João Huss. Mas que coisas diferentes se passaram por ocasião do protestantismo!

Na Boêmia há um santo que resiste; depois, esse santo é morto e faz um milagre. Existe um Rei, um Imperador, que fica comovido e até se recolhe no seu quarto durante alguns dias, abalado, portanto, com a orientação má que vinha seguindo. E há um povo que se entusiasma tanto com esse santo que, durante muito tempo, o soberano não pode assassiná-lo de medo da revolta popular. Para matá-lo, atiram-no dentro d’água durante a noite, temendo que o povo evitasse o assassinato. Cometido o crime, aparece um milagre.

Notamos o sentido contrário, na época do protestantismo. Não aparece o grande santo, a indignação popular não se produz, os mártires que a certa altura surgem não dão origem a milagres dessa natureza. Tudo ocorre de um modo menos brilhante, em que o sobrenatural aparece menos.

Como podemos explicar essa diferença? Dir-se-ia que era muito mais razoável que a Providência dispusesse favores extraordinários, quando a Cristandade estava mais necessitada. A heresia de Lutero tinha uma capacidade de expansão muito maior do que a heresia hussita, ao menos tudo leva a crer, porque a de João Huss foi esmagada e a de Lutero não foi.

Era o início da maior tragédia na História da Igreja, a expansão da Revolução religiosa pelo mundo.

Por que Deus parece abandonar sua Igreja?

Por que nessa ocasião Nossa Senhora não assistiu a Igreja com iguais milagres, com iguais maravilhas? Por que faltaram os homens providenciais? Por que, a partir do momento em que a Revolução eclodiu, os milagres e as manifestações do sobrenatural foram diminuindo? De outro lado, os grandes santos que aparecem vão rareando, e tem-se a impressão de um crepúsculo, de uma perda de força da Igreja, de uma potência em face da qual o inimigo faz o papel de um jovem, e a Igreja, que é eterna, divina, indestrutível, faz quase o papel de uma anciã.

Dir-se-ia que a Providência já não ama tanto a Igreja e não odeia tanto os maus. Qual é o fundo da explicação desses fatos?

Para quem considera as coisas à luz da Teologia da História, a explicação é muito simples: se os católicos daquele tempo fossem verdadeiramente católicos, se os que permaneceram fiéis à Fé católica a amassem como deveriam amar, essas coisas não aconteceriam.

Dois terços da Europa continuaram católicos, um terço ficou protestante. Se esses dois terços fossem constituídos de católicos fervorosos, o terço que ficou protestante não teria alcançado as vitórias que alcançou. E o protestantismo não poderia depois ter irradiado, se não os seus erros teológicos, pelo menos o seu espírito, sobre dois terços da Europa católica.

E como os católicos não reagiram contra as heresias como deveriam reagir, houve uma retração de graças da parte da Providência. E chegamos a esse paradoxo de que um erro parece tão forte e uma verdade parece tão débil.

A tibieza fecha as portas ao milagre

Mas é só isso?

A maldade dos inimigos da Igreja tem algo de comum com a tibieza dos filhos d’Ela. É a mesma raiz. Muitos católicos cedem habitualmente à mesma tentação. Cedem em graus diversos, de maneira diversa, mas a tentação é a mesma. E quando os filhos da Igreja são muito tíbios diante de um erro, os líderes desse erro em geral são péssimos. Por isso aquela época deu àquele erro uma adesão horrorosa.

Razão pela qual nós também nos encontramos numa situação em que o mal toma um vigor, uma pujança extraordinária. E a Providência não opera milagres, em parte para não jogar pérolas aos porcos, mas também porque o milagre não adiantaria.

Há muita gente que diante de um milagre não se converteria, absolutamente. Eles têm o estado de espírito que Nosso Senhor menciona naquela parábola do rico Epulão, o qual pede para voltar à Terra a fim de explicar a seus irmãos que eles não deveriam levar a má vida que ele levou, pois podiam ir para o Inferno; Deus, então, lhe diz: “Não adianta! Eles têm a Lei e os profetas e não se emendam.” E quem não se corrige com a Lei e os profetas, não se emenda com milagres também. Milagres não adiantariam.

Consideremos uma grande cidade de nossos dias, com uma população na qual a Fé já perdeu de tal maneira o terreno, que as pessoas verdadeiramente católicas constituem uma minoria. Se todos os habitantes dessa suposta cidade vissem o cadáver de um santo flutuando sobre as águas, das quais saíssem chamas, será que essa cidade fecharia seus lugares de perdição e faria penitência? Eu não acredito.

Um número muito pequeno de pessoas se impressionaria com isso, mas diria: “Ah, que curioso! Deve haver alguma explicação”. Mais nada!

No dia seguinte, por meio de um comunicado, os cientistas dão uma explicação, dizendo que foi jogada tal substância no rio, que formou um bolsão, etc. Pode sair qualquer coisa, porque quando querem negar o milagre, há explicação para tudo.

São esses estados de fechamento em que se põem certas civilizações, certos povos e que não têm solução.

Temos assim uma perspectiva na qual podemos encontrar a justificação para possíveis castigos que a Providência envie sobre a humanidade.

Isso é o que me ocorre dizer a respeito de São João Nepomuceno.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 17/5/1971)

1) Jo 14, 19.

O ápice da “história dos olhares”

Como terá sido a última troca de olhares entre Nosso Senhor e sua Mãe Santíssima? Imaginemos o afeto, o mundo de amor e de respeito, a veneração, o entendimento de almas recíproco que nessa hora transpareceu.

Este foi o momento culminante da “história dos olhares”.

Caso alguém tenha podido contemplar esses dois olhares, seria uma vantagem ficar cego em seguida. Pois, o que ver depois disso?

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 23/9/1972)

VIDA, DOÇURA E ESPERANÇA NOSSA

MARIA SANTÍSSIMA É, VERDADEIRAMENTE, NOSSA VIDA, DOÇURA E ESPERANÇA. SE ELA NÃO EXISTISSE, NÃO TERÍAMOS RAZÃO ALGUMA PARA ESPERAR NA MISERICÓRDIA DIVINA; NÃO TERÍAMOS NADA QUE JUSTIFICASSE QUALQUER ESPERANÇA NOSSA DO CÉU, OU QUALQUER ALEGRIA NA TERRA.

TUDO O QUE TORNA VIVÍVEL NOSSA EXISTÊNCIA É O CONJUNTO DE ESPERANÇAS QUE A INTERCESSÃO DE NOSSA SENHORA NOS AUTORIZA A TER. E POR ISSO MARIA É NOSSA VIDA. VIVEMOS POR ELA, E, SE NÃO FOSSE ELA, CAIRÍAMOS DESFALECIDOS. É NOSSA DOÇURA, PORQUE PERFEITAMENTE AFÁVEL,  DOCE, MISERICORDIOSA E CONDESCENDENTE PARA COM AQUELES QUE A INVOCAM.

A ESTA MÃE CLEMENTÍSSIMA DEVEMOS O FATO DE HAVER  SUAVIDADE EM NOSSA VIDA. ELA NOS OBTÉM A GRAÇA DIVINA E, PORTANTO, FORÇAS PARA A PRÁTICA DA VIRTUDE. ORA, A VIRTUDE É O QUE HÁ DE DOCE NO EXISTIR HUMANO. SEM ELA, NOSSA PASSAGEM POR ESTE MUNDO SERIA AMARGA E SINISTRA. E MARIA, AO NOS PROPORCIONAR A VIRTUDE,  CONFERE DOÇURA AO NOSSO COTIDIANO TERRENO.

ASSIM, A ELA DEVEMOS DIZER, CHEIOS DE FILIAL GRATIDÃO: “Ó MÃE BONÍSSIMA, POR CAUSA DE VÓS, NOSSA VIDA SE TORNA DOCE E SUPORTÁVEL. NOSSA VIDA SÓ É VIDA PORQUE SOIS NOSSA ESPERANÇA!”

O Santo Sudário

Relíquia das mais preciosas da Cristandade, o Santo Sudário nos emociona de modo particular, posto nos oferecer, praticamente, uma fotografia de Nosso Senhor Jesus  Cristo. Certo, ali está retratado o cadáver do Homem-Deus que passou por tormentos inenarráveis antes de morrer, e, portanto, encontra-se em algo desfigurado. Não  devemos imaginar que Jesus tenha sido em vida como O vemos no Sudário. Foi muito parecido com essa figura, ressalvadas as deformações da morte e, sobretudo, de um longo martírio.

Não obstante, podemos nos perguntar qual o alcance de contemplarmos essa Sagrada Face estampada de modo miraculoso no lençol que hoje é venerado em Turim. Sabemos que em todo homem a face é um símbolo da alma. Não raras vezes, uma imagem que oculta a verdade, pois temos o hábito de fazer fisionomias especiais para  encobrir nossos defeitos. Além disso, em virtude do pecado original e das nossas imperfeições morais, essa fisionomia, mesmo não intencionalmente, é ambígua, não exprimindo tudo quanto nos vai no espírito. De modo que uma pessoa menos avisada pode não perceber o autêntico valor da alma refletida no semblante de alguém.

Ora, tal não se verificava em relação a Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus e verdadeiro Homem. Como Homem, perfeitíssimo, o mais perfeito que jamais houve e haverá. Como Deus, a Perfeição. De sorte que a fisionomia d’Ele era de fato a expressão acabada de sua insondável santidade.

***

Contemplemos o Santo Sudário. Pela proporção entre o tamanho do rosto e o do corpo, percebe-se a grande estatura e a atitude majestosa de Jesus. Na face sagrada, em que permanecem as cicatrizes dos maus tratos recebidos, nota-se a extraordinária semelhança com as imagens existentes em nossas igrejas. A fisionomia, um tanto alongada, estirada, não reflete inteiramente o  normal daquele rosto divino que atraiu o olhar enlevado de multidões.

Aspecto curioso. Quando morreu, Nosso Senhor contava apenas 33 anos, mas para a ótica de homens de hoje Ele parece ali mais maduro, e com facilidade se Lhe daria 45.

Quer dizer, é a manifestação de uma maturidade absoluta, de uma decisão profunda, imensa, de alguém inteiramente cônscio de tudo quanto pensa, e senhor de um juízo  ponderado ao extremo. Homem de uma vontade forte e determinada: Ele sabe tudo quanto quer, Ele quer tudo quanto Lhe convém querer. Transmite-nos uma ideia de ordem completa, de uma varonilidade e um domínio de si perfeitos. Muito acima dessas qualidades, porém, admira-se n’Ele uma sacralidade extraordinária. Não nos é difícil perceber a suma responsabilidade desta figura e a segurança que tem das supremas excelências inerentes ao Verbo Encarnado. Admirando a sagrada fisionomia, vem-nos à  lembrança o episódio do Evangelho em que os algozes se apresentam para prender Nosso Senhor, perguntando se era Jesus Nazareno. E Ele respondeu: “Sou Eu!”. Ao ouvirem o som daquela voz divina, os malfeitores caíram com a face no chão. Tal eram a majestade e a segurança de Jesus.

Essa resposta — “Sou Eu!” — evoca, por sua vez, a definição de si mesmo dada por Deus a Moisés, quando apareceu no meio da sarça ardente. Perguntado pelo líder do povo eleito quem Ele era, Deus disse-lhe: “Eu sou Aquele que é”. Se afirmássemos que essa figura do Sudário se define assim: “Eu sou Aquele que é!”, tomaríamos como adequado e natural, porque ela exprime a posse de todo o absoluto, uma certeza de si por onde se vê que Ele é o padrão e a medida de todas as coisas, que julga como Rei e como Deus  a tudo e a todos, em função de si próprio.

Ao mesmo tempo, entrevemos o que poderia ter de divinamente suave e de afável no olhar desse Homem, assim como o que haveria de supremamente doce na linguagem e  no timbre de sua voz. É a coexistência de todas as virtudes, de todas as perfeições em todos os graus que possam caber na natureza, como reflexo da natureza divina ligada a  Ele pela união hipostática.

De outro lado, é interessante observar a severidade da expressão. Nosso Senhor morreu sob o maior tormento de que há notícia na História. Contemplamos essa fisionomia,  e vemos que Ele se acha como um Juiz diante de seus algozes. Escritos nesse semblante, de modo verdadeiramente divino, estão a rejeição, a censura, o desacordo e a  condenação àqueles que O mataram. Como quem diz: “Eu sou a Lei, sou o Juiz e sou a Vítima! E julgo a esses três títulos o crime que contra Mim foi praticado”. É majestoso! É admirável!

***

O que se destaca no Santo Sudário, no meu entender, é a soma e a conjugação inteiramente harmoniosa de todas as virtudes, semelhantes e opostas, num grau tão elevado  que nem a mente nem o olhar humanos logram alcançar. N’Ele temos, então, a força e a bondade; a mansidão e ao mesmo tempo a cólera divina; a placidez, bem como uma  capacidade de agir, de tomar iniciativas, que ofusca a qualquer um. E assim por diante, poderíamos enumerar todo o rol de virtudes e perfeições de que Nosso Senhor é o  adorável modelo.

Por outro lado, para se compreender tudo o que há de profundo e misterioso na fisionomia deste Varão divino, devemos atentar para o fato de que Ele está repleto das mais  subidas cogitações, nas quais vive de modo permanente e estável; assim como  para o fato de que Ele é a via posta para os homens de todos os séculos: quem se encontra de  acordo com Ele, está certo; em desacordo, está errado.

“As minhas cogitações não são as vossas, e as minhas vias não são as vossas”, disse Ele… E disse também, de si mesmo: “Eu sou o caminho, a verdade, a vida”. Há nisto um mistério que é o próprio do absoluto. Vendo-O, tem-se a impressão de que essa prodigiosa auto segurança se comunica em todo o ser d’Ele, de uma maneira indizível, com a  natureza divina, com a Santíssima Trindade, e que a sua atenção está ao mesmo tempo posta nos segredos de Deus e nas atitudes dos homens, entre os quais Ele vive.

Cogitações e vias que procedem do Céu. N’Ele, tudo é sagrado, santo, perfeito, altíssimo. Se dissermos que é um poderoso monarca, O diminuímos; se grande orador, O  apequenamos. Todos os maiores títulos que possam ser atribuídos a uma pessoa, tornam-se minúsculos em paralelo com esse Homem-Deus. Ele é o Rei dos reis, o Senhor dos senhores. Nunca houve nem haverá filósofo que se Lhe iguale, nem oratória que se assemelhe à sua. Porque ninguém, jamais, debaixo de nenhum ponto de vista, poderá  ser comparado com esse Varão do Santo Sudário.

Plinio Corrêa de Oliveira

São José, esposo de Maria e pai adotivo de Jesus

Eleita pela Santíssima Trindade para ser a Mãe Admirável do Verbo Encarnado, Nossa Senhora é a mais perfeita de todas as meras criaturas. Mesmo se considerássemos,  num só  conjunto, as excelências dos Anjos, dos Santos e dos homens que existiram, existem e existirão até o fim do mundo, não teríamos sequer uma pálida ideia das  celestes perfeições de Maria, que reluziram aos olhos de Deus desde o primeiro instante de sua Imaculada Conceição.

Para cumprir os eternos desígnios da Divina Providência no tocante à Redenção da humanidade, foi preciso que, em determinado momento, essa criatura excelsa contraísse legítimo matrimônio. Assim poderia Ela, sem detrimento de sua reputação, conceber miraculosamente e dar à luz o Filho do Altíssimo.

O único homem à altura de Jesus e Maria

Ora, entre esposo e esposa deve haver certa proporcionalidade: não pode um ser por demais superior ao outro. Era necessário, portanto, surgir um homem que, por seu amor a Deus, por sua justiça, pureza, sabedoria, enfim, por todas as  suas qualidades, estivesse à altura daquela augusta Esposa. Mais ainda. É também conveniente que o pai seja proporcionado ao filho. Por isso, era preciso que esse mesmo  varão, com toda a dignidade, arcasse com a honra de ser o pai adotivo do Verbo feito carne.

E houve um único homem criado para essa sublime missão, um homem cuja alma recebeu do Pai Eterno todos os adornos e predicados que o colocassem inteiramente à  altura de seu chamado. Esse homem, entre todos escolhido por estar na proporção de Nossa Senhora e de Nosso Senhor Jesus Cristo, foi São José.

A ele coube essa glória, esse píncaro inimaginável de ser esposo da Virgem-Mãe e pai legal do Menino Jesus. Como legítimo consorte de Nossa Senhora, possuía São José  plenos direitos sobre o Fruto das imaculadas entranhas d’Ela, embora este Fruto houvesse sido engendrado pelo Espírito Santo. Quer dizer, sem contar a própria maternidade divina, não se pode conceber vocação mais extraordinária! É uma grandeza inconcebível.

Pensemos, por exemplo, nos momentos em que São José trouxe em seus braços o Menino Jesus, ou naqueles em que ele O viu praticar os atos da vida comum na santa casa  de Nazaré, ou ainda nas horas em que O contemplou imerso nos colóquios com o Padre Eterno…

Consideremos quão puros deviam ser seus lábios, e quão insondável a sua humildade para conversar com o Divino Infante, responder às perguntas d’Ele ou Lhe dar um  conselho, quando solicitado. Um simples ser humano, formado e plasmado pelas mãos do Criador, ensinando a Deus!

Pensemos, ainda, no trato repassado de elevação e respeito entre São José e Nossa Senhora, quando Ela se ajoelhava diante dele para o servir. Ele vê aquela Criatura, que é o  Céu dos Céus, inclinada à sua frente, e aceita seus préstimos. Como se tal não bastasse, a Esposa também se aconselha com ele, troca opiniões e acata suas ordens.

Numa palavra, ele era o homem que tinha bastante sabedoria e pureza para governar a Deus e a Virgem Maria. Então se compreende quão inimaginável é a grandeza de São José!

Excelências de príncipe e operário

Para se traçar o verdadeiro perfil moral do chefe da Sagrada Família, seria preciso saber interpretar a Divina Face do Santo Sudário de  Turim e, à maneira de suposição, deduzir algo da personalidade de quem foi o educador daquele semblante que ali está, e o esposo da Mãe d’Ele.

Casado com Aquela que é chamada de o “Espelho da Justiça”, pai adotivo do “Leão de Judá”, São José devia ser um modelo de fisionomia sapiencial, de castidade e de força.

Um homem firme, cheio de inteligência e critério, capaz de tomar conta do Segredo de Deus. Uma alma de fogo, ardente, contemplativa, mas também impregnada de carinho.

Descendia da mais augusta dinastia que já houve no mundo, isto é, a de David. Segundo São Pedro Julião Eymard, Fundador da Congregação dos Padres Sacramentinos, os  judeus reconheciam em São José o homem com direito ao trono real, caso a monarquia legítima fosse restaurada na Terra Santa. Direito este que Nosso Senhor Jesus Cristo herdou de seu pai legal, e por isso foi aclamado como “o filho de David”, quando entrou em Jerusalém. Ou seja, não era um descendente qualquer do Rei Profeta, mas o  primogênito pretendente ao trono. E São José era o varão por meio de quem esta dignidade se transferiu para o próprio Filho de Deus.

Quis a Providência nobilitar a classe operária, fazendo com que o pai adotivo de Jesus fosse também trabalhador manual, exercendo o ofício de carpinteiro. Desse modo, São  José reunia em si os dois extremos da escala social na harmonia interior da santidade e da pessoa dele. Estava no ápice como príncipe da Casa de David, mas era um príncipe empobrecido, que tirava do seu labor artesanal o sustento da Sagrada Família.

Como operário, soube ser humilde e tributar o devido respeito aos que lhe eram superiores. Como príncipe, conhecia também a missão de que estava imbuído, e a cumpriu  de forma magnífica, contribuindo para a preservação, defesa e glorificação terrena de Nosso Senhor Jesus Cristo. Em suas mãos confiara o Padre Eterno esse Tesouro, o  maior que jamais houve e haverá na História do universo! E tais mãos só podiam ser as de um autêntico chefe e dirigente, um homem de grande prudência e de profundo  discernimento, bem como de elevado afeto, para cercar da meiguice adorativa e veneradora necessária o Filho de Deus humanado. Ao mesmo tempo, um homem pronto  para enfrentar, com perspicácia e firmeza, qualquer dificuldade que se lhe apresentasse: fossem as de índole espiritual e interior, fossem as originadas pelas perseguições dos adversários de Nosso Senhor.

O herói da confiança

Consideremos, por exemplo, a tremenda provação que sobre ele se abateu, logo no início de seu matrimônio com Maria Santíssima. No Antigo  Testamento, a maior ventura que podia almejar um judeu era a de ser contado entre os ancestrais do Messias. Em vista disso, a imensa maioria do povo eleito procurava contrair matrimônio e ter filhos, não sendo raro considerar-se a esterilidade como um sinal de desprezo e opróbrio.

Mas, São José, movido pela graça, não quisera se casar, a fim de conservar a virgindade. Levava ele sua tranquila vida de homem casto e puro, quando, inesperadamente,  recebe uma convocação: todos os descendentes diretos de David deviam comparecer diante de uma Virgem chamada Maria, a fim de se poder escolher um marido para Ela.

Obediente, São José se apresenta ao lado de seus parentes, confiando na voz da graça que o fizera abraçar a virgindade. No seu íntimo, alimentava a certeza de que o  escolhido seria outro.

Como naquele tempo se viajava com o apoio de um bordão, todos se apresentaram com o seu. O sacerdote encarregado da cerimônia determinou: aquele em cujo bastão desabrochar uma flor, este será o eleito para se unir a Maria.

São José olha para seu cajado… e nele vê aparecer uma flor! Evanesceram de súbito todos os seus anseios de virgindade. Como será agora? Ele confia. É um milagre que o obriga a se casar com Maria. Entretanto, no fundo de sua alma, quer continuar virgem! Sereno e corajoso, aceita a disposição divina.

Entra em confabulação com a jovem e descobre que Ela também fizera voto de virgindade. A dificuldade parecia estar resolvida: ambos se manteriam intactos. Que  felicidade! Seus anelos permaneciam vivos. Com o passar dos dias, ele percebe a incomparável riqueza de alma dessa Virgem que foi posta no seu lar. Pensa: “Protegê-La-ei magnificamente. Aqui estou para defendê- La no esplendor de sua personalidade contra toda espécie de ataques.”

Em determinado momento, porém, o impensável acontece: ele nota que a Virgem está à espera de um Filho. No espírito de São José se estabelece a perplexidade. Ele não  podia entender o que se passava, depois de tantos milagres… O florescimento do bordão, o encanto com que os dois se comunicaram o recíproco desejo da perpétua  virgindade, a alegria de alma que então sentiram: “É claro! Deus nos colocou no mesmo caminho. Ele prometeu e está cumprindo a promessa!”

Mas, agora, o incompreensível… São José passa por uma inenarrável provação, e Nossa Senhora também, uma vez que Ela percebia em toda a medida o sofrimento de seu  esposo. Angústia tanto mais intensa quanto ele sabia ser impossível uma traição da parte d’Aquela Virgem incomparável. Ora, pela lei judaica, se uma esposa prevaricasse, o  marido tinha a obrigação de expulsá-la do seu lar.

Mas São José tinha a certeza de que Maria não havia cometido nenhum pecado. Não querendo tomar uma atitude injusta em relação a essa Virgem tão santa, e não sendo  capaz de encobrir  aquela situação irremediável, São José resolve deixar despercebido a casa de Nazaré. Antes da longa jornada que o esperava, resolveu descansar para  reparar suas forças. Na madrugada seguinte ele partiria, levando simplesmente seu bordão, um pouco de comida e o fardo de uma grande incógnita, mais pesada que o  Monte Everest: Como se passou isto? Meu Deus, meu Deus…eu confio na vossa promessa!

Apesar da aflição, tinha a alma tão confiante e tão serena que adormeceu. E, ao dormir, sonhou. No sonho teve esta recompensa: Deus lhe comunicou que aquela Criança  formada no claustro virginal de Maria era o  Verbo Encarnado, Filho do Divino Espírito Santo.

Quando São José despertou, a paz reinava na sua alma. E Nossa Senhora, ao ver o semblante luminoso de seu esposo, soube que a provação dele havia cessado. Porque foi  um herói da confiança, São José recebeu a maior e mais extraordinária missão que um homem teve na Terra. Ele era o consorte da Virgem Mãe, d’Aquela que daria à luz o  Homem-Deus e Redentor do mundo. Nisto florescia a promessa de virgindade que lhe fora feita. Tudo se cumprira além do inimaginável.

Cavaleiro-modelo na proteção do Rei dos Reis

Entretanto, as dificuldades não haviam abandonado as sendas pelas quais caminharia São José. Basta recordar, por exemplo, as recusas de que foi objeto nas estalagens de  Belém, quando procurava abrigo para Nossa Senhora, na iminência do nascimento do Menino-Deus. Ou então a fuga para o Egito.

“Fuga para o Egito”… Quatro palavras que a nós, homens do século XX, parecem banais: toma-se um avião e em pouco tempo se vai de Jerusalém ao Egito. Não era assim no  empo em que São José, recebendo o aviso de que o cruel Herodes procurava matar o recém-nascido Rei dos judeus, foi obrigado a tomar a Mãe e o Menino e com eles partir para a terra dos faraós.

Uma viagem incerta, longa, através de desertos onde se ocultavam toda sorte de perigos: das feras famintas aos ladrões e salteadores, capazes de não só roubar e matar,  como também de levar os viajantes em cativeiro, a fim de comercializá-los nos mercados de escravos. E São José, com seu coração de fogo, sua previdência e força varonil, enfrentou todos esses obstáculos, levando Nossa Senhora sobre um burriquinho e, ao colo d’Ela, o Menino Jesus, o Deus que quis ser fraco nos braços e nas mãos do glorioso patriarca.

Costuma-se apreciar e louvar, com justiça, a vocação de Godofredo de Bouillon, o vitorioso guerreiro que, na Primeira Cruzada, comandou as tropas católicas na nascido Rei dos judeus, foi obrigado a tomar a Mãe e o Menino e com eles partir para a terra dos faraós.

Uma viagem incerta, longa, através de desertos onde se ocultavam toda sorte de perigos: das feras famintas aos ladrões e salteadores, capazes de não só roubar e matar, como também de levar os viajantes em cativeiro, a fim de comercializá-los nos mercados de escravos. E São José, com seu coração de fogo, sua previdência e força varonil, enfrentou todos esses obstáculos, levando Nossa Senhora sobre um burriquinho e, ao colo d’Ela, o Menino Jesus, o Deus que quis ser fraco nos braços e nas mãos do glorioso Patriarca.

Costuma-se apreciar e louvar, com justiça, a vocação de Godofredo de Bouillon, o vitorioso guerreiro que, na Primeira Cruzada, comandou as tropas católicas na conquista de Jerusalém. É uma linda proeza! Ele é o cruzado por excelência.

Porém, muito mais do que retomar o Santo Sepulcro é defender o próprio Nosso Senhor Jesus Cristo! E disso São José foi gloriosamente encarregado, tornando-se o  cavaleiro-modelo na proteção do Rei dos Reis e Senhor  dos Senhores.

Na coorte dos Santos, o primeiro abaixo de Nossa Senhora

Ao lado de todas as glórias que se acumularam sobre ele, São José recebeu, já nesta Terra, um prêmio inestimável: é o patrono da boa morte. Com efeito, dir-se-ia que ele teve um passamento de causar inveja, pois faleceu entre os braços de Nossa Senhora e os de Nosso Senhor, que o  cercaram de todo o carinho e consolação na sua última hora. Não se pode imaginar morte mais perfeita, com Eles ali, fisicamente presentes. De um lado, Nosso Senhor  cumulava seu pai adotivo de graças cada vez maiores, à medida que a alma de São José continuava a se santificar nos derradeiros transes da agonia. De outro, Nossa Senhora lhe sorria com respeito, e procurava aumentar-lhe a confiança:
— Meu esposo! Lembre-se de que tudo se cumprirá.

Coragem! vamos para a frente!

Em determinado momento, São José exala o último suspiro, e o Limbo se abre para a alma dele. Ali ficaria ele até o instante, entre todos bendito, em que a alma santíssima   de Jesus, que morrera crucificado, desceu ao encontro daqueles eleitos, a fim de colocar um jubiloso termo na sua grande espera. Alguns — Adão e Eva, por exemplo — lá se  achavam desde os primórdios da humanidade, aguardando durante milênios o Redentor que os levaria para a eterna bem-aventurança.

E o Messias veio. Podemos bem imaginar que toda a coorte do Limbo se reuniu em torno de São José para receber o Salvador. E que Este, tão logo ali se mostrou, resplandecente de glória, tendo perdoado e redimido o gênero humano, manifestou-se de modo especial a São José, como que exclamando: “Oh! meu pai!”

Era o ápice do cumprimento de todas as promessas, a perfeita realização de um chamado que passou por indizíveis perplexidades e incomparáveis glórias. E São José,  esposo de Maria Virgem, pai adotivo de Jesus, declarado Patrono da Igreja, ocupa no Céu um lugar tão eminente que recebe o culto de proto dulia. Ou seja, abaixo de Nossa  Senhora — a qual merece a devoção de hiperdulia — é ele o primeiro a ser venerado na extensa hierarquia dos Santos.

Grandiosa recompensa à qual fez jus esse varão que praticou em grau elevadíssimo a virtude da confiança.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

São José

Em geral, as pinturas e esculturas que representam a Fuga para o Egito mostram Nossa Senhora montada num burrico, trazendo aos braços, com uma imensidade de carinho, cuidado e respeito, o Menino Jesus. À frente ou ao lado d’Eles, caminha São José.

Sendo o membro mais forte da Sagrada Família, competem-lhe, explicavelmente, os maiores incômodos e cansaços da viagem. Fadiga que o castíssimo esposo de Maria  aceitava com sublime disposição de alma, pois sabia que devia cercar Nossa Senhora de todo o conforto possível: era Ela quem levava o adorável pequeno peso, aquele corpo divino que um dia seria suspenso nos braços implacáveis da Cruz…