Santo Afonso Maria de Ligório um modelo de perseverança

Quando contemplamos um céu estrelado, extasiamo-nos com as miríades de astros a cintilarem nas etéreas vastidões. Entretanto, outra constelação há, ainda mais bela e reluzente que a fixada no firmamento: são os Santos da Igreja Católica, fulgurantes exemplos para todos os fiéis . Um desses grandes luminares do cristianismo é Santo Afonso Maria de Ligório, cuja vida edificante e heróica Dr. Plinio aqui faz brilhar aos nossos olhos.

No dia 1º de agosto se comemora a festa de Santo Afonso Maria de Ligório, Bispo, Confessor e Doutor da Igreja. Fundador da Congregação do Santíssimo Redentor, é o tratadista por excelência da moral católica, e se destacou por sua profunda devoção a Nossa Senhora, em louvor da qual escreveu uma de suas mais belas obras, as Glórias de Maria. Dele temos essa síntese biográfica, escrita por Dom Guéranger:

Afonso Maria de Ligório nasceu de pais nobres, em Nápoles, a 27 de setembro de 1696. Sua juventude foi piedosa, estudiosa e caritativa. Aos 17 anos ele era doutor em direito civil e canônico. E começava pouco depois uma brilhante carreira de advogado. Mas nem seu sucesso, nem as instâncias de seu pai, que o queria casado, o impediram de deixar o mundo. Diante do altar de Nossa Senhora, fez o voto de se tornar sacerdote. Ordenado padre em 1726, consagrou-se à pregação. Em 1729, uma epidemia permitiu-lhe que se dedicasse aos doentes em Nápoles. Pouco depois retirou-se, com companheiros, a Santa Maria dos Montes, e com eles se preparou para a evangelização dos campos.

Em 1732, estabeleceu a Congregação do Santíssimo Redentor, que lhe deveria acarretar numerosas dificuldades e perseguições. Mas enfim os postulantes afluíram e o instituto se expandiu rapidamente. Em 1762 foi nomeado Bispo de Santa Ágata dos Godos, perto de Nápoles. Empreendeu ato contínuo a visita à sua diocese, pregando em todas as paróquias e reformando o clero. Ele continuava a dirigir seu Instituto e o das religiosas que tinha fundado para servir de apoio, por sua oração contemplativa, a seus filhos missionários.

Em 1765, demitiu-se do ministério episcopal e voltou a viver entre seus filhos. Dentro em pouco uma cisão se produziu no Instituto dos Redentoristas, e Santo Afonso se viu expulso de sua própria família religiosa. A provação foi muito grande, mas ele não perdeu a coragem e predisse mesmo que a unidade se restabeleceria depois de sua morte. Às suas doenças se acrescentaram sofrimentos morais que lhe causaram longas crises de escrúpulos e diversas tentações. Porém, seu amor a Deus não fez senão crescer.

Enfim, no dia 1º de agosto de 1787, entregou sua alma ao Senhor, na hora em que os sinos tocavam o Ângelus. Gregório XVI o inscreveu no catálogo dos Santos em 1839, e Pio IX o declarou Doutor da Igreja.

No meio de uma situação eminente, o túnel escuro

Pela descrição acima, percebe-se que a trajetória terrena de Santo Afonso teve um determinado momento comparável a um túnel escuro, por onde ele foi obrigado a passar. Não se trata de uma provação ou sofrimento, mas de uma espécie de desengano pelo qual tudo quanto ele podia humanamente considerar como dando significado à sua vida, parecia ruir. Ele se tornava privado de qualquer dom, vantagem ou bem que não fosse a pura graça de Deus, atuando de um modo provavelmente insensível no interior de sua alma.

Era um advogado brilhante, dotado de invulgar inteligência, nascido de família nobre, que abandonou uma situação humana auspiciosa e capaz de lhe favorecer a carreira e as ambições, para se dedicar apenas ao sacerdócio. Num passo seguinte, constitui uma congregação religiosa. Esse instituto floresce, e seu fundador se torna um homem bem visto pela Santa Sé. Escreve ótimos livros, difundidos por toda a Europa, e é aclamado como um mestre de grande peso na vida intelectual católica de seu tempo. Pouco depois é elevado ao episcopado.

Sem dúvida, uma situação eminente, com todos os aspectos de uma vocação bem sucedida: como padre, se fez religioso; como religioso, fundador e superior geral; além disso, com a honra do episcopado, percebendo que o bom odor de sua doutrina perfumava a Europa inteira. Dir-se-ia, pois, que os anseios pelos quais se ordenara haviam se realizado, e a sua vida tinha atingido o objetivo desejado pela Providência. Nesse apogeu, ele poderia morrer e dizer a Deus, parafraseando São Paulo: “Combati o bom combate, dai-me agora o prêmio de vossa glória!”

Ora, no momento em que tudo isso parecia alcançado, uma catástrofe. Bispo resignatário, doutor e moralista, superior geral da congregação religiosa que fundara, Santo Afonso é dela expulso por causa de intrigas, mal entendidos e informações erradas. Imagine-se o que representa para um fundador, ser despedido de sua instituição pela Santa Sé, vendo-se de um momento para outro sem recursos e sem meios de subsistência!

Destino das almas amadas pela Providência

Acrescente-se a esse revés outra provação: começam a lhe atormentar as doenças, que o acometeram até fim da vida. Entre elas, uma febre reumática que o paralisou por certo tempo e lhe afetou a posição do pescoço, impedindo o de permanecer ereto. Passou a viver com a cabeça inclinada, atitude esta refletida em alguns retratos que dele fizeram. Além das enfermidades, sobrevieram escrúpulos, tentações fortíssimas, inclusive contra a pureza e contra a Fé. Tudo se acumulando num homem alquebrado dessa forma.

Porém, era este exatamente o prêmio máximo para coroar a sua existência. Era a crucifixão depois de um longo apostolado e uma incansável ação em benefício do próximo.

Assim age, o mais das vezes, a Providência em relação às almas que Ela ama. São certas situações em que todos os infortúnios se congregam e há uma espécie de crepúsculo geral. Depois, a alma purificada, lavada pelo sofrimento, volta a gozar da graça de Deus. Então ela respira, sente-se outra, transformada.

Naturalmente, essa foi a última nota da santificação, o derradeiro esforço que Nosso Senhor exigiu de Santo Afonso de Ligório.

Lutas contra o jansenismo

Cumpre dizer que grande parte das perseguições sofridas por Santo Afonso foram motivadas pelo jansenismo que grassava no seu tempo, e ao qual ele se opunha com zelo e vigor intensos. A corrente jansenista, a pretexto de severidade, acabava inculcando os preceitos morais tão erradamente que a pessoa desanimava de se salvar, pois afinal de contas não podia cumprir aquela moral de fariseus, como eles a apresentavam.

O ponto mais desconcertante defendido pelo jansenismo dizia respeito à doutrina da predestinação. Segundo esta, o homem deveria cumprir aquela moral tremendamente severa, pairando sobre ele o olhar propenso à irritação e à vingança de um Deus, cuja santidade consistia apenas em estar à espera do pecado para infligir o castigo.

De outro lado, entretanto, afirmavam os jansenistas que o Céu e o inferno não são dados aos homens em razão de suas boas ou más obras, porque Deus predestina para este ou aquele quem entende. De maneira que a pessoa pode passar a vida inteira pecando e ir para o Céu, ou praticando bons atos e cair no inferno, conforme o desejo divino.

Ora, sendo assim, fácil é compreender como os homens perdiam completamente o alento para praticar a virtude e também o motivo para não cair no vício. Pois, em última análise, se eu acabo condenado embora passe a vida inteira realizando atos de virtude, em suma não sou livre de fazer ou não fazer algo, porque é Deus quem resolve e não eu. Então, para que me esforçar em levar uma vida santa?

No fundo, era uma pregação da imoralidade. Por causa disso, segundo muitos vislumbres históricos, os jansenistas tinham suas falsidades ocultas. Por exemplo, jejua-vam amiúde, mas eram grandes gastrônomos. E uma das omeletes reputadas por mais saborosas no tempo era chamada de La Janseniste, com a qual eles se regalavam escondidos durante seus “jejuns”.

Não bastassem esses desvios, os jansenistas atacavam ainda as devoções mais elevadas e recomendáveis como, por exemplo, o culto ao Sagrado Coração de Jesus. Conta-se mesmo o caso de certo Bispo de Pistoia, Scipione de’ Ricci, que mandou pintar em sua residência um quadro representando uma devota lançando ao fogo a estampa do Sagrado Coração de Jesus, como se fosse objeto supersticioso, enquanto ele, Ricci, segura a cruz e o cálice com a Eucaristia, símbolos da autêntica piedade (como a entendiam).

Essa recusa se explica pelo fato de a devoção ao Sagrado Coração de Jesus ser, de algum modo, o antijansenismo. Ela inculca a bondade, a misericórdia, a paciência do Salvador, e demonstra a verdade de que o homem, por meio de suas boas obras, pode agradar a Deus e alcançar a salvação. Manifesta, outrossim, que nosso Deus justo é repleto de amor, e não um tirano arbitrário, um implacável cobrador de impostos em relação à humanidade. Compreende-se, portanto, que em face dessa corrente jansenista Santo Afonso Maria de Ligório tenha tomado uma posição muito enérgica nas suas obras de moral. E que haja sofrido, em conseqüência, toda sorte de ataques e perseguições de seus oponentes, chegando ao auge dos reveses e infortúnios acima mencionados.

Lição de vida para os católicos

Devemos considerar nessa existência de Santo Afonso, laboriosa, semeada de provações mas coroada pelo triunfo da virtude, uma lição de confiança e de perseverança para todos nós. Nos piores momentos das tentações, nas dores e enfermidades, nas rudezas das perseguições, quando os seus mais próximos lhe infligiram cruéis dissabores, ele jamais desanimou, nunca flectiu no seu desejo de alcançar a santidade, crescendo em piedade e devoção à medida que avultavam os sofrimentos.

Vem a propósito recordar aqui um pequeno episódio do fim da vida dele, quando já não podia transitar por si próprio, sendo conduzido em cadeira de rodas por um irmão leigo redentorista. Então passeavam pelo convento, percorrendo os jardins e os pátios internos, enquanto fa-ziam suas orações. Mais de uma vez aconteceu de Santo Afonso perguntar ao seu companheiro:

— Irmão, já rezamos tal Mistério do Rosário?

O bom discípulo, igualmente alquebrado pela idade, não se recordava ao certo, e respondia:

— Sr. Bispo, não me lembro muito bem, mas acredi-to que sim. Em todo o caso, já rezamos tantos terços, que Nossa Senhora não se importará se não tivermos con-templado tal ou tal outro Mistério…

E Santo Afonso replicava:

— Oh! Meu caro Irmão, isso não! Se eu passar um dia sem recitar o Rosário completo, posso perder a minha alma!

Essa é a constância, a coragem, o ânimo perseverante de um Santo sobre o qual se abateram todas as tempestades. Ora, o que se deu com ele, pode suceder na vida de qualquer um de nós. Quantas vezes já não teremos passado por aflições e reveses semelhantes aos que ator-mentaram Santo Afonso?! E, não raro, trazendo consigo a impressão de um desabamento, de algo que ruiu por terra, de um caminho intransponível.

Entretanto, após um período curto ou longo de agruras, surge mais luz, mais amparo, outras vitórias, outras alegrias. E assim, com sucessões de túneis e de estradas largas, Nossa Senhora vai nos conduzindo para realizarmos os desígnios d’Ela e de seu Divino Filho a nosso respeito.

Imitemos, pois, Santo Afonso na sua perseverança, na sua confiança humilde e profunda, compreendendo que em nossa vida espiritual haveremos de nos deparar com túneis escuros, sem termos de nos aterrorizar com eles. Para além dessa escuridão, a Providência nos traça uma via ainda mais luminosa e mais bela que a anterior.

Essas são algumas reflexões que nos sugerem a extraordinária e edificante existência de Santo Afonso de Ligório.

Plinio Corrêa de Oliveira

São Germano de Auxèrre – Apóstolo da Gália, da Itália e Grã Bretanha

Ao comentar alguns significativos episódios da vida de São Germano de Auxèrre, Dr. Plinio analisa os diversos aspectos da manifestação da graça de Deus através dos tempos, como resposta d’Ele a uma receptividade mais generosa da parte dos homens — ontem, hoje e, sobretudo, no Reino de Maria, essa época vindoura que há de ser favorecida por uma especial refulgência dos dons  divinos.

 

A respeito de São Germano de Auxèrre, cuja festa se celebra em 31 de julho, temos a seguinte nota biográfica: “Nascido no século V, foi ele uma das figuras extraordinárias de bispos dos primeiros séculos da conversão da Europa. Antes de receber a vocação episcopal, tinha sido duque de Auxèrre e general das tropas dessa província; estudou letras e jurisprudência nas Gálias (região da qual  fazia parte a atual França) e em Roma. Casou-se com uma jovem tão nobre e tão rica quanto ele.

Santo de majestosa fisionomia

“Entretanto, o Bispo de Auxèrre, pressentindo sua morte, recebeu de Deus a revelação de que Germano deveria ser seu sucessor. Assim, pedindo permissão a seus superiores, convidou Germano  para ir à catedral e ali cortou-lhe os cabelos, revestiu-o com um traje especial que, segundo o costume da época, o distinguia como clérigo. Após algumas acerbas resistências, acabou assumindo o cargo. Como sacerdote e bispo, transformou-se completamente, sendo um exemplo para todos. Em obediência a uma ordem do Papa, partiu para a Grã-Bretanha a fim de combater o  pelagianismo.

Ao passar por Paris, discerniu no meio da multidão Santa Genoveva e profetizou o futuro da jovem.

“Sua vida decorreu em meio a milagres, realizando grandes trabalhos apostólicos. É conhecida  sua intervenção a favor dos bretões, tornando-os vitoriosos numa batalha contra os ingleses. Combateu tenazmente os adeptos de Pelágio. Certa ocasião, dirigindo-se a Ravena (Itália), logo após atravessar os Alpes, vestiu-se pobremente para não ser reconhecido.

Chegando a Milão, entrou na catedral num dia de festa, como anônimo. Porém, um possesso começou a gritar no meio dos fiéis: ‘Germano! Por que viestes nos procurar na Itália?! Contenta-te em  nos expulsar das Gálias e de nos ter vencido com tuas preces!’. Admirado, o povo acabou reconhecendo o Santo, pela majestade de sua fisionomia. “São Germano era muito estimado por São Pedro  Crisólogo e pela Imperatriz Gala Placídia, para a qual, certo dia, enviou um pedaço de pão numa bandeja de madeira. A soberana recebeu o presente cheia de respeito, mandou colocar a bandeja num relicário de ouro e guardou o pão a fim de utilizá-lo como remédio para suas enfermidades. Faleceu São Germano em 448, e o quarto onde seu corpo era velado regurgitava de  grandes personagens, que disputavam suas relíquias.”

Uma revelação e um corte de cabelo…

Por esses dados podemos notar uma constante a ser analisada: a diferença profunda entre o modo como as pessoas daquele tempo consideravam as coisas e como o fazem as de hoje. Havia, então, uma mescla de barbárie e espírito rudimentar com sentimentos, disposições de alma extraordinárias e intervenções sobrenaturais sublimes.

Germano era duque de Auxèrre, província situada na importante Borgonha. Atualmente, o título de duque é apenas honorífico, pelo qual alguém se distingue dos demais por um cartão de visita e  algumas atenções num salão. Mas naquele tempo significava possuir o governo vitalício e hereditário de um grande território, uma pessoa com quem o monarca deveria contar para exercer a realeza. O duque era um pequeno rei no local onde tinha seu ducado.

Ora, o bispo daquele lugar, Amator, prevendo sua morte próxima, recebeu a revelação para designar o duque Germano como seu sucessor. O prelado não duvidou da inspiração da graça divina,  mas sim de que o duque aceitasse.

Mandou então chamá-lo à catedral e ali cortou-lhe o cabelo. Como um homem repleto de senhorio, autoridade e poder permitiu que agissem dessa forma com ele? Importa salientar que naquela época os homens usavam cabelos até os ombros, ou mesmo caindo pelas costas. E a cabeleira longa não era apenas um sinal distintivo dos nobres, mas também um elemento de vaidade masculina. Daí o costume de cortá-lo, chamado de “tonsura”, quando se ingressava nas ordens sacras, simbolizando a renúncia aos hábitos mundanos.

Não sabemos como o bispo convenceu Germano a lhe permitir cortassem os cabelos. Porém, deve ter sido uma espécie de pressão moral: diante de todo o povo reunido, ele explicou qual era a  vontade de Deus. O duque, um tanto constrangido, não teve alternativa senão deixar que os aparassem.

Candura e profunda seriedade

E assim ele se tornou clérigo, o que resultava na sua destituição do ducado. Diante dessa perda de senhorio, Germano se julgou vítima de um golpe de Estado e se levantou em armas na defesa dos  seus direitos. Era um modo de ver as coisas inteiramente diverso do contemporâneo. Havia, então, uma certa candura aliada — e aí se sente os sabores espirituais da Idade Média nascente — a  uma profunda seriedade.

Se acontecesse algo semelhante a um indivíduo de hoje, ou seja, se lhe cortassem os cabelos para torná-lo clérigo, ele sairia da igreja e diria: “Isto é nulo, pois houve coação moral; continuo minha vida como antes e não me importo com as conseqüências. Sr. Bispo, adeus!” Em sentido oposto, o duque Germano se achou lesado de tal sorte, e todo o mundo o considerava tão comprometido por aquela cerimônia, que ele levantou tropas e fez uma revolução. Pode-se ver nisso um pouco de primitivismo, mas, de outro lado, uma intensa seriedade no dar verdadeiro valor ao significado  das coisas.

Esse bispo terá agido bem? Quanto a Germano, creio estava no direito de reagir. Porque se ele foi objeto de  uma coação moral — o corte de cabelo não sendo um sacramento, mas uma coisa delével — parece-me que ele poderia perfeitamente se libertar daquele modo. Porém, tocado pela graça, ele se converteu. Renunciou aos seus direitos de nobre, aceitou o episcopado e começou sua grande carreira de Santo.

Convém apreciar como é interessante o trabalho da graça. O bispo de fato havia recebido essa missão de Deus, mas o Criador quis dar ao duque uma graça fulgurante, de maneira que ele ficasse esmagado pelo convite.

Permitiu-lhe até que oferecesse resistência. Contudo, em certo momento realizou seu desígnio: deu-lhe novas graças e Germano acabou cedendo, tornando-se um herói da Fé. E dessa forma maravilhosa, um dos maiores bispos da história da França deu início ao seu pontificado.

“Onde está Germano?!”

Consideremos outro episódio da vida de São Germano que também traduz de modo eloquente o espírito daquela véspera de Idade Média. Como em todas as épocas, tinha então o demônio permissão de Deus para tentar os homens, embora possamos concebê-lo com uma ação maléfica não tão agressiva quanto seria nos séculos sucessivos, em virtude da decadência da Civilização Cristã. Assim, compreende-se o ocorrido com nosso Santo na Catedral de Milão. Um possesso gritou: “Germano, que fazes aqui? Tu não te contentas de nos ter expulso da Gália, e ainda vens à  Itália nos aborrecer?”

Esses rugidos devem ter induzido ao mal certas pessoas lá presentes. Mas, de outro lado, o demônio tinha licença para tentar alguns sob a condição de dizer coisas que, em última análise,  pudessem abrir os olhos de todos para as grandes qualidades de São Germano. Então, o povo começou a procurá-lo: “Onde está Germano? Onde está Germano?”. Ele, embora pobremente vestido, era o ex-duque de Auxèrre e conservara a fisionomia e porte ducais, aliados à nobreza pastoral. E foi reconhecido pela majestade de sua pessoa, sendo logo objeto de homenagens e reverências.

Matizes diversos na economia da graça

Por fim, constatemos o belo uso feito pela Imperatriz Gala Placídia do presente enviado a ela por São Germano, cujo gesto encerrava provavelmente um sentido simbólico. É notável o espírito de Fé que animava essa soberana. Ela toma o prato de madeira e o coloca num relicário de ouro, porque fora presenteado por um santo. Embora ele ainda não tivesse sido canonizado pela Igreja, a Imperatriz estava convencida da heroicidade de virtudes do bispo. E sendo notórias, sólidas, incontestáveis as provas dessa perfeição espiritual, ela guardou o pão para usá-lo como remédio em  suas doenças. E certamente esse alimento operou muitos milagres!

Tal atitude da parte da soberana indica outra intensidade da Fé, das bênçãos divinas, outro regime da graça de Deus para com os homens naquele período histórico. E nesse ponto cumpre fazer uma insistência. Não se trata de dar aqui à palavra “outro” o mesmo sentido da diferenciação entre o Antigo e o Novo Testamento. Quer isto dizer simplesmente que havia um matiz diverso entre a economia da graça naquele tempo e o existente nos dias de hoje.

Séculos mais tarde, na época medieval, a graça era generosa, abundante, triunfante. Atualmente, por ser tão mal recebida pelos homens, apesar de ser igualmente copiosa, o seu triunfo é mais  difícil… Assim, é-nos dado compreender algo sobre o Reino de Maria, no qual, em sua substância mais íntima e importante, haverá um mais amplo leque de manifestação da graça nas almas.

Quer dizer, após o triunfo do Imaculado Coração de Maria, anunciado em Fátima, Deus perdoará os pecados dos que se arrependerem, e — atendendo aos rogos de sua Mãe Santíssima — dará  início a esse novo tipo de manifestação, ao mesmo tempo em que da parte dos homens, purificados de suas faltas, haverá outra receptividade e reciprocidade para com os dons divinos.

Pedir um  perdão novo e uma nova graça

Portanto, a condição essencial para que venha uma futura e nova Idade Média, é um perdão que deve descer do Céu e mudar todas as coisas. Houve em determinado momento da História um  pecado instigado pelo inferno, que determinou a ruína da cristandade medieval e alterou tudo na Terra. Uma vez perdoado este pecado, começará o Reino de Maria, pelo favor e misericórdia de  Nossa Senhora.

Devemos, pois, por meio de São Germano de Auxèrre, implorar com insistência que nos venha do Céu uma graça nova, um perdão novo, e a Virgem Santíssima se digne de estabelecer com os  homens um teor de relações  baseado numa outra situação. Não se pense que simplesmente com a derrota da Revolução e dos adversários da Igreja Católica estaria tudo resolvido. É preciso esse  perdão, um fato de ordem sobrenatural que será o alicerce do Reino de Maria.

É necessário orar muito, porque os fenômenos sobrenaturais não podem ser produzidos pelo homem. Eles provêm de Deus, pela intercessão de Nossa Senhora. Quanto mais pesar sobre nós a  dureza da época em que vivemos, tanto mais nos cabe pedir a vinda desse perdão e dessa graça inéditos, para mudar cada um de nós e o mundo inteiro.

Seja, portanto, este convite a um espírito de oração mais fervoroso e constante, a conclusão desses comentários à edificante vida de São Germano de Auxèrre.

Plinio Corrêa de Oliveira

Santo Afonso Rodrigues – O carisma da boa conversa

A boa conversa é uma forma comunicativa do amor a Deus, à Santa Igreja, a Nossa Senhora, que extravasa do coração para a boca de quem fala.

m 31 de outubro comemora-se a festa de Santo Afonso Rodrigues, confessor. Sobre ele, Schamoni, em seu livro A verdadeira fisionomia dos Santos(1), dá as seguintes notas:

Porteiro de convento durante 45 anos

Santo Afonso Rodrigues nasceu no ano de 1531, em Segóvia. Era filho de um piedoso negociante.

Deve considerar-se como transcendental em sua vida a influência do Bem-aventurado Padre Fábio, que durante algum tempo viveu entre eles, assim como mais tarde o santo religioso Francisco de Vilanova.

Com a morte de seu pai, Santo Afonso passou a cuidar dos negócios familiares, porém a sua pouca habilidade levou os negócios à falência, ao mesmo tempo em que a morte arrebatava a sua esposa, seus filhos e sua mãe.

“Na desgraça — disse o Santo — vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida. Fizera, por causa do mundo, pouco caso de Deus e agora estava na iminência de perder-me eternamente. Ante mim vi a sublime grandeza de Deus, enquanto eu jazia no pó da minha própria miséria. Imaginei ser um segundo Davi, e um comovedor Miserere foi a expressão do meu estado de espírito.”

Dirigiu-se então à Companhia de Jesus e, depois de seis meses de noviciado, mandaram-no para o colégio de Monte Sion, em Palma de Mallorca, de cujo convento foi irmão porteiro durante quarenta e cinco anos.

Doutor de Mallorca

A confiança que sua conduta despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem, pedindo conselhos e ajuda em seus conflitos espirituais. Santo Afonso possuía em especial o dom da conversa espiritual. Seu próprio reitor concordou que nenhum tratado religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmão leigo. Atendia também os pedidos que lhe faziam através de numerosas correspondências. Por isto foi chamado o “Doutor de Mallorca”.

O Santo podia ter dado bons conselhos porque ele mesmo precisou suportar numerosas dificuldades íntimas e materiais e enfrentar duras batalhas.

“Sentia — comentou — cada vez com maior profundidade a grandeza do Senhor, enquanto se aguçava em mim a consciência da debilidade do meu ser. Graças a esta experiência, mergulhava no estado de absoluta inconsciência. Então só sabia amar.”

Três dias antes de sua morte, depois da sua última Comunhão, permaneceu iluminado e em êxtase.

“Que felicidade — escreveu uma testemunha ocular — despertava em nosso espírito ao contemplá-lo! E eram somente algumas migalhas da sua felicidade. Decidimos chamar um pintor para que fizesse um fiel retrato de Afonso.”

O Santo faleceu em 31 de Outubro de 1617.

Sua cadeira de porteiro tornou-se um trono de sabedoria

Esta é uma vida verdadeiramente magnífica porque traz três notas muito importantes.

A primeira delas costuma ser comentada a propósito da vida de Santo Afonso Rodrigues, e é digna de ser recordada: este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha, a todo o mundo, e conseguiu realizar este bem num posto humílimo. Ele era porteiro de um convento numa ilha que, naquele tempo, tinha comunicação difícil com o continente, e ficava muito mais isolada do que está hoje. Ali ele consumiu 45 anos de sua existência.

Pois bem, apesar de estar nesse recanto, o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha de Palma de Mallorca, depois pela Espanha, e mais tarde pelo mundo, com a figura venerável deste porteiro velho, acolhedor, afável, sempre ao alcance de todo mundo na portaria e, portanto, podendo ser consultado por todos os que quisessem, o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria. Todos iam lá vê-lo e ouvi-lo.

Vemos o que há de magnífico numa vida mesmo muito humilde como esta, quando é toda integrada e empregada no serviço de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Católica. Por quê? Porque a santidade, a sabedoria tem uma irradiação própria, que não é comparável a nada. Não é tão importante que o Santo esteja num lugar onde todos veem porque para atrair, quer o afeto, quer a admiração, em qualquer lugar onde ele esteja este afeto e esta admiração confluem. Basta que seja um Santo verdadeiro e autêntico, com uma santidade, como diziam os antigos, victa et non picta, quer dizer, verdadeira e não pintada.

Com essa consideração devemos fazer duas outras, que me parecem bem mais importantes.

Considerar a grandeza divina

O modo pelo qual este Santo foi chamado a contemplar a Deus Nosso Senhor fala muito à minha alma. Considerar a grandeza divina: Deus infinitamente grandioso, majestoso, sábio, transcendente a tudo, excelente, magnífico, sublime, radioso, absoluto em toda a sua essência, misterioso, insondável!

Quando percorremos com o olhar todas as coisas e as analisamos, acabamos descobrindo tal insuficiência, tal debilidade, que chegamos à seguinte conclusão: ou valem porque são um reflexo de Deus, ou não são absolutamente nada.

Chegou a me passar pela mente o que eu faria de minha vida se não cresse em Deus. Sentiria, ao cabo de algum tempo, uma insipidez, uma sensação de vazio… Por exemplo, diante de um belo objeto: Aqui está esta peça de ouro, está bem, mas o que importa? Custa muito? Sim, porém o que me interessa? Satisfaz as minhas necessidades? Suponhamos que sim. E do que me adianta satisfazer minhas necessidades? Prolongar esta vida para quê? Tudo isto não é nada!

Mas se eu tomo em consideração que isso tudo não é senão um véu por detrás do qual está o Ser absoluto, perfeito, eterno, sapientíssimo, sublime, transcendente, então encontro algo que é inteiramente superior a todos os homens, a mim, aos que me rodeiam, e no qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar. Afinal encontrei algo inteiramente digno de ser visto, amado, e de que a Ele eu me dedique completamente. E isto por causa da grandeza d’Ele. Porque Ele não é uma simples criatura concebida no pecado como eu, mas é o próprio Criador perfeitíssimo!

Agora a vida tomou sentido, a existência é alguma coisa! A grandeza de Deus me ergueu do pó e me deu o desejo das coisas infinitas.

Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza

Este homem, este Santo, na consideração da grandeza de Deus, subiu alto, e até o fim da vida dele se arrependia dos seus pecados, e desejava ir para o Céu a fim de conhecer essa infinita grandeza.

Confesso, francamente, que me é impossível pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha alma. Muitos morrem com medo de pensar na grandeza de Deus. Eu, pelo contrário, tenho a impressão de que, se Nossa Senhora me ajudar — e não duvido que me ajudará —, na hora da minha morte morrerei radioso, com a ideia de que, afinal de contas, vou encontrar a grandeza de Deus, vou me libertar do cárcere de todas as limitações, de todas as mesquinharias, de todas as pequenezes, de todas as contingências, para encontrar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande. Senhor meu, Pai meu, Rei meu, tão grande, que nem sequer, apesar da visão beatífica, poderei dispensar um intermediário junto a Ele.

Então eu terei a Nosso Senhor Jesus Cristo, o Verbo de Deus encarnado.

Uma forma de grandeza… quando se fala as palavras Jesus Cristo, todas as formas, todos os sons, todos os matizes de grandeza se concentram ali de um modo superlativo. E logo junto a Nosso Senhor Jesus Cristo, infinitamente abaixo d’Ele e incomensuravelmente acima de mim, Nossa Senhora, Rainha de uma majestade insondável.

Então, o que sou eu? Uma poeira, um grão de areia perdido no meio disto tudo. Pois bem, me enche a alma a ideia de que não sou senão um grão de areia, uma poeira, mas que existe aquilo, que eu vou para aquilo, que eu me reúno àquilo e aquilo me acolhe, me aceita, me envolve, e eu passo ali a eternidade inteira. Confesso que é nesta consideração que a minha alma se dilata.

Não será talvez assim para outras pessoas. Mas há várias moradas no Céu. Que a misericórdia me receba nessa morada, porque para ela eu sinto uma atração superlativa.

A via do silêncio e a da conversa

Parece-me haver outro aspecto que deve ser muito notado aqui, e é o seguinte:
Muitos autores espirituais falam do perigo das conversas e da vantagem que há em não conversar.

Lembro-me de que, quando o nosso Movimento estava no começo, tínhamos muita dificuldade com certos elementos do clero e do laicato católico que diziam: “Vocês conversam muito. Todas as noites reúnem-se para conversar! Não era muito melhor que vocês tomassem um serviço? Por exemplo, confeccionem envelopes para auxiliar alguma obra de caridade em favor dos mendigos, e que precisa mandar propaganda para milhares de pessoas. Cada um faça, por exemplo, cem envelopes por noite; isso é muito mais abençoado do que essas conversas.”

Eu era moço naquele tempo, não conhecia muitos pontos de doutrina e não sabia defender-me inteiramente; então tentava, laboriosamente, explicar que podia haver maior bem numa conversa do que numa obra de caridade material.

“Cuidado — replicavam eles —, as muitas palavras enredam o homem em vaidades e orgulhos tolos. Mais vale calar do que falar, porque o silêncio é ouro e o falar é prata. Muitos são os homens que nesta hora padecem o Inferno porque não retiveram a sua língua. Quantos estarão no Céu felizes a esta hora porque passaram pela Terra quietos!?”

É uma via para muitos, mas para muitos outros não é. Vemos em Santo Afonso Rodrigues um exemplo desta via de conversas abençoadas.

A conversa pode ser um meio de santificação

Há um eremita que me encanta: o Bem-aventurado Charbel Makhlouf(2). É uma maravilha de silêncio, e aquele silêncio me deslumbra! Mas uns devem falar e outros devem calar. Aparece nesta biografia de Santo Afonso a doutrina de que este homem tinha uma graça especial para conversar.

Portanto, a conversa pode ser uma graça e existe um carisma próprio a ela. E as conversas abençoadas são exatamente aquelas nas quais intervém este fator sobrenatural.

Há, entretanto, um carisma negativo, que não vem do Céu, para a “anticonversa”. Está-se numa roda onde se desenvolve uma conversação muito boa; de repente chega alguém, senta-se e não diz nada… A conversa morre. Creio que vários experimentaram isso, pois é de observação comum.

Qual é a razão deste fenômeno? É a ação de presença de uma pessoa que pensa em si.

Quando o indivíduo entra para uma roda onde a conversa vai alta, mas ele está pensando em si, carregando um ressentimento, uma preocupação, uma ambição, uma preguiça, e procura fazer com que a conversa tome a orientação deste seu pensamento em vez de seguir, ao sopro da graça, o tema dominante — ainda que ele seja tartamudo e diga uma palavra em cada dez minutos —, corta a bênção da conversa.

Qual é o carisma da boa conversa? É uma forma comunicativa do amor a Deus, à Santa Igreja, a Nossa Senhora, que extravasa do coração para a boca de quem fala.

Temos na vida de Santo Afonso, portanto, um ponto de nossa doutrina bem firmado: a conversa pode ser uma graça e, quando assim é, decorre em geral de um carisma que Nossa Senhora dá para fazer do convívio das almas um meio para que elas se santifiquem.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 30/10/1967)

1) Não dispomos dos dados bibliográficos da referida obra.
2) Canonizado em 9 de outubro de 1977.

Santo Inácio de Loyola – Alma repleta de lógica e enlevo

Desde os bancos do Colégio São Luís, onde tomou conhecimento da vida e obra de Santo Inácio de Loyola, nutriu Dr. Plinio grande devoção ao fundador da Companhia de Jesus, e uma entusiasmada admiração pela lógica e clareza adamantinas do autor dos “Exercícios Espirituais”. Veremos, pelas suas considerações transcritas a seguir, como estes e outros preciosos predicados da alma inaciana o encantavam.

 

Quando analisamos o modo de ser e de agir de Santo Inácio de Loyola, percebemos que o amor e o enlevo que ele tributava às instituições e aos ensinamentos da Igreja, redundavam em reflexos daquelas perfeições na sua própria alma, sem contudo empanar suas peculiaridades.

Tornando-se ainda mais Santo Inácio

Por exemplo, encantava-se com o modo de um Papa cuidar de uma fabulosa pluralidade de assuntos com inteira calma e sobranceria, conduzindo sem sobressaltos o orbe católico. Ora escrevendo uma bula pelo centenário de uma universidade ou de um estabelecimento católico famoso, autorizando a ereção de uma prelazia apostólica nas missões, resolvendo um delicado problema de relações com determinado país ou uma crise religiosa em tal outro, solucionando uma questão de corporações numa certa nação envolvendo problema moral bastante delicado, etc. — as mais variadas ações do Sumo Pontífice falavam de maneira intensa à alma de Santo Inácio.

Especialmente o enlevava discernir a ação do Espírito Santo, possante, sábia, serena, imensa, pairando sobre a Igreja e governando-a. Na medida que se enlevava, a obra do Espírito Paráclito se prolongava em Santo Inácio e algo dessa qualidade da Igreja passava a viver nele, tornando-o capaz de, até certo ponto, agir do mesmo modo. Dir-se-ia que uma força sobrenatural doravante o habitava, fazendo-o mais ele mesmo, porque sua vocação e seu carisma específico se enriqueciam.

Pode parecer um paradoxo que algo extrínseco passe a ser inerente a ele, orientando sua vida. Santo Inácio não se transformava num autômato?

A meu ver, dava-se o contrário. Ele se tornava mais Santo Inácio de Loyola.

A regra aplicada aos discípulos

E é interessante notar que o sucedido com Santo Inácio se verificava, guardadas as proporções, entre ele e seus discípulos. Ou seja, quando se lê a história da Companhia de Jesus, vê-se que o Fundador procurou formar a mentalidade de seus seguidores de acordo com o que hauriu da Igreja, encaminhando-os para a perfeição. E os jesuítas, por sua vez, procuravam se conformar a Santo Inácio, tendo não poucos alcançado de fato a heroicidade de virtudes. Lembremo-nos, por exemplo, de São Francisco Xavier, entre os primeiros e, posteriormente, São João Berchmans, São Luís Gonzaga, etc.

Tem-se a impressão, aliás, de que na Companhia de Jesus, mais do que nas outras ordens religiosas em relação aos respectivos fundadores, essa união e essa conformidade de alma manifestou-se sobremodo rigorosa e enfática, por razão compreensível. Na época em que Santo Inácio foi suscitado por Deus para impulsionar a Contra-Reforma, alguns aspectos da vida da Igreja pareciam de tal maneira alterados que, para se ter o perfeito conhecimento dela, era indispensável conhecer uma pessoa plenamente católica, e se estabelecer com esta um vínculo particular. Esta forma de contato pessoal era o meio de a Igreja manter sua influência sob o espírito dos fiéis.

E para os jesuítas que tinham Santo Inácio como modelo, a união com a Igreja se fazia através do influxo da pessoa do seu fundador, conhecida nas horas de enlevo com o auxílio da graça, e assimilada, no sentido próprio da palavra, pela meditação, ponderação, etc.

Portanto, para que um jesuíta do século XVI não se deixasse contaminar pelas idéias errôneas do tempo, deveria considerar os fatos através dos olhos de Santo Inácio.

Doutrina personificada

Por outro lado, cumpre admitir que é muito conveniente ao católico conhecer a doutrina personificada. Necessidade que também se explica facilmente.

Imaginemos alguém que estudasse um compêndio de Doutrina da Igreja, mas nunca tivesse visto um bom católico. Ele não teria uma perfeita noção da Santa Igreja. Agora suponhamos o contrário: ele conheceu um católico no sentido pleno do termo, mas ainda não estudou essa doutrina… Quase se poderia dizer: quem conheceu a pessoa do bom católico entendeu a Igreja mais do que quem analisou apenas sua doutrina.

Nesse sentido, figuremos uma conversa entre jesuítas a respeito dos escritos de Santo Inácio. Não deveriam eles estudar o texto inaciano como o faria um crítico qualquer, ou seja, excluindo o fator enlevo. Não. Antes, deveriam procurar discernir a mentalidade do seu fundador ao conceber aquelas linhas, e chegar a cogitações mais altas, como, por exemplo, considerar que a matriz daquele estilo existia na alma de Santo Inácio, com uma superabundância da qual aquele livro ou aquela oração era uma parcela.

Deveriam compreender que Santo Inácio era capaz de escrever a uma eminente autoridade eclesiástica, com um cunho enérgico e afirmativo, chamando-lhe a atenção por atitudes que causavam estranheza nos meios católicos fervorosos, bem como de usar de astúcias para resolver um grave problema, sem nada perder de sua seriedade, gravidade e firmeza.

Os jesuítas, se fiéis à sua vocação, tinham de admirar essas qualidades de seu fundador, conformar-se com elas, enlevar-se com o enlevo dele pela Igreja, e procurar ver a ação do Espírito Santo instruindo e conduzindo as atitudes do grande Santo Inácio de Loyola.

Encantos com os raciocínios do Mestre Costa

Não me esquivo de aduzir um exemplo pessoal, de quem — embora não sendo jesuíta — cedo sentiu-se enlevado com a lógica luminosa de Santo Inácio, e desejou adquiri-la para toda a vida.

Quando frequentei o Colégio São Luís, uma das matérias era lecionada por um jovem professor, ainda seminarista da Companhia de Jesus, ao qual chamávamos Mestre Costa (futuramente Pe. Costa). Ele desfiava seus raciocínios de caráter apologético, explicava isto, aquilo, aquilo outro, e me entusiasmava ver a coerência dos pensamentos dele: concatenados, determinados, caminhando a passos resolutos e direitos para a conclusão. Eram meus primeiros encantos com a lógica.

Eu percebia os movimentos do raciocínio no espírito do Mestre Costa, ágil, lúcido, forte, e me alegrava admirar uma alma, uma inteligência que se movia assim. Mais. Sentia um verdadeiro alívio no meu interior, como se algo longamente estagnado começasse a se mexer e a andar. Era uma espécie de libertação da minha presença habitual em ambientes poucos afeitos à lógica, pouco reflexivos, amantes das impressões: “acho que… talvez seja… parecer-me-ia que…”. Sem me dar conta, meu temperamento desejava outra postura de alma, pedia uma definição. Afirme! Abra o peito e tome a responsabilidade da conclusão: diga que é assim, e assunto encerrado.

Ora, no raciocinar do Mestre Costa havia isto: ele concluía. E de tal maneira que prendia o interlocutor na sua conclusão, sem possibilidades de fuga. Eu dizia para mim mesmo: “Um dia saberei também concluir, como o Mestre Costa!”

Meu encantamento era tanto maior quanto percebia que o professor chegava a conclusões com as quais muitos estavam em desacordo. Em geral, os pretensos “espíritos fortes”, homens bigodudos, vistosos, com aparência de mandões e que julgavam a época da Religião já ultrapassada. Pois o Mestre Costa começava a dispor sua argumentação, pensamento a pensamento, comprimindo e silenciando o seu oponente, para as delícias de minha alma.

Entusiasmo pela lógica inaciana

Mas, em meio às suas digressões, essa lógica brilhava de maneira particular ao fazer o elogio da Companhia de Jesus e de Santo Inácio. Com uma característica curiosa: quando se exaltava nas exposições, a ponta do seu nariz movia-se ligeiramente. Essa peculiaridade atraía muito minha atenção, e era notada de forma especial quando ele se referia ao fundador. Eu pensava:

“Está vendo? Esse homem é um brasileiro como eu, e hauriu as suas possibilidades mentais nesse mesmo Brasil em que estou. Se ele possui essa lógica dentro da alma, não a obteve da maré de relativismo que corroeu largamente a mentalidade atual, e sim de Santo Inácio, de quem ele é filho. O fundador dos jesuítas lhe concedeu essa dádiva.

“Ora, se eu admirar infatigavelmente Santo Inácio, quem sabe este me concederá, a mim também, um pouco dessa lógica ? Depende de eu ser muito puro, inteiramente puro, intransigentemente puro… Porque este espírito não é dado a quem não é casto. Se eu perseverar na prática da castidade, começará a nascer em mim uma lógica como a do Mestre Costa, como a de Santo Inácio de Loyola. Vamos para a frente! Meu entusiasmo está adquirido!”

 

Plinio Corrêa de Oliveira

 

Santo Inácio de Loyola – A coerência sem meios termos

Uma conversão assumida com extraordinário vigor de espírito, a santidade abraçada e levada às suas últimas conseqüências: na vida de Santo Inácio de Loyola a força de vontade e as atitudes extremas foram uma constante, e sua inflexível coerência constitui, no dizer de Dr. Plinio, a nota mais bela da existência do grande Fundador da Companhia de Jesus.

 

Santo Inácio de Loyola nasceu em 1491, na casa-torre dos senhores de Loyola, em Azpeitia, norte da Espanha. Era o décimo terceiro filho do casal e entrou aos l9 anos como pajem na corte do Rei Fernando V. Dotado de temperamento ardente e belicoso, a carreira das armas o seduziu. No cerco de Pamplona foi gravemente ferido na perna. Durante longa convalescença, por falta de livros de cavalaria, que o apaixonavam, deram-lhe para ler a Vida de Jesus Cristo e dos santos. Tal leitura foi para ele uma revelação. Compreendeu que  a Igreja também possuía sua milícia, a qual, sob ordens do representante de Cristo, luta para defender na Terra os interesses sagrados do Deus dos exércitos.

Cavaleiro de Cristo e da Igreja militante

Na célebre abadia de Montserrat, Inácio depõe a espada aos pés da Santíssima Virgem e sua alma generosa, outrora seduzida pela glória mundana, não mais aspira senão  pela maior glória do grande Rei que doravante servirá. Na noite da Encarnação, a 25 de Março, depois da confissão de suas faltas, fez a vigília de armas e pela Mãe de Jesus é armado cavaleiro de Cristo e da Igreja militante, sua esposa. Será em breve general da admirável Companhia de Jesus, suscitada pela Providência para combater o protestantismo, o jansenismo e o paganismo renascente. A fim de conservar em seus filhos a intensa vida interior que supõe a atividade militante à qual os destina, Santo Inácio lhes dá uma forte hierarquia e lhes ensina, em magistral tratado aprovado pela Igreja, seus Exercícios Espirituais que têm santificado milhares de almas.

Tudo para a maior glória de Deus

O lema que santo Inácio escolheu para sua milícia foram: “Ad Maiorem Dei Gloriam — Para a Maior Gloria de Deus”. Eis toda a sua santidade. E o fim da Criação, o fim da elevação do homem ao mundo sobrenatural, o fim dos preceitos do Evangelho em que almas generosas renunciam às coisas lícitas para se ocuparem mais livremente dos interesses de Deus e para lhe darem essa totalidade de glória acidental, cujo uso pelos homens, de coisas ilícitas, O havia privado. A 13 de julho de 1556 morre Santo Inácio, pronunciando o nome de Jesus. Sua Companhia, espalhada pelo mundo inteiro, contava então dez províncias e cem colégios.

Homem de decisões extremas

Sobre a vida de Santo Inácio de Loyola, cujos aspectos constituem um conjunto sobremodo arquitetônico e rico, poder-se-ia tecer inúmeros comentários. Entretanto, gostaria de ressaltar um lado que me parece ser a nota mais bela de sua existência, o ponto pelo qual ele brilhou especialmente no firmamento da Igreja.

Refiro-me à sua força de vontade e de decisão que o fazia tomar, em todas as suas atitudes, a posição mais extrema, mais aguda, aquela que chegava ao fim último, sem meios termos.

Tomemos em consideração, por exemplo, o conhecido episódio de sua perna quebrada no cerco de Pamplona. Não se pode conceber algo de mais tremendo do que um homem, então mundano e voltado para as honras terrenas, ao se ver na contingência de mancar para o resto da vida em virtude de um erro ortopédico, decidir mandar quebrar de novo o osso imperfeitamente consolidado para que a perna ficasse em ordem. E isto porque, pelos cânones da elegância naquele tempo, um fidalgo capenga seria malvisto na corte e teria sua carreira política e militar prejudicada.

Ora, Inácio de Loyola encarou de frente o futuro que essa deficiência lhe traçava. Pesou tudo em sua crueza: “Quero viver na corte, desejo seguir a carreira militar. Se eu ficar coxo de uma perna, não brilharei entre meus pares, não dançarei, não terei valor algum como soldado. Ora, devo lutar, devo luzir na corte. Se não me livrar dessa carência física, minha vida está rateada. Então, vamos quebrar de novo esta perna!”

Imaginemos agora um cirurgião munido dos instrumentos e métodos ortopédicos daquele tempo, desferindo pancadas sobre um osso mal jungido, rompendo-o e ligando-o de novo. O que isso significava de dolorido e dramático, só quem o sofreu pode saber!

Em seguida, os longos dias e as horas intermináveis de inércia num leito, aguardando a consolidação do osso e a recuperação dos movimentos da perna, seriam horrivelmente enfadonhos para aquele homem super-ativo, afeito a batalhas e grandes realizações.

Vê-se nessa atitude a decisão extrema do homem que mediu tudo e resolveu aceitar um sacrifício momentâneo em prol de seu futuro brilhante. Excluindo-se os motivos meramente mundanos que o levaram a essa situação, percebe-se naquele Inácio de Loyola o senso da preeminência do definitivo sobre o efêmero, uma fibra de alma para enfrentar tudo que fosse preciso e uma capacidade de olhar os problemas de frente que nos deixam admirados.

Santidade levada às últimas conseqüências

O mesmo vigor de espírito, a mesma força de decisão e de vontade ele empregará no momento de se converter e abraçar o chamado de Deus. Homem mundano e militar vaidoso, esquecido das coisas do Céu, sente-se tocado de modo irresistível pela graça e, como procedera em relação ao defeito físico, medita nas suas lacunas morais: “Tenho de encarar de frente as verdades eternas, o Céu, o inferno, a salvação ou a condenação. Recebi graças, compreendi como o ser autêntico católico significa dedicar-se ao serviço de Deus, a amá-Lo sobre todas as coisas nesta Terra e na eternidade. Não ser assim é procurar apenas a felicidade transitória do mundo, mas também o infortúnio e a injúria a Deus. Essa é a verdade, e tenho de encará-la.

“Devo tirar todas as conseqüências que daí pendem para mim, Inácio de Loyola, e estas consistem em seguir a voz da graça que me pede, à vista dessas considerações, uma completa mudança de vida, vivendo ao contrário do que até agora vivi, construindo para mim uma existência feita de abnegação, de humildade, mas, sobretudo, de coerência. Serei coerente até o fim na verdade que considerei e abracei por inteiro”.

E temos, assim, o programa de vida magnífico de Santo Inácio de Loyola. Ele não recuou diante de nada e empreendeu tudo quanto foi necessário para levar essa coerência até os últimos limites. Recordemos, por exemplo, o fato de ele se pôr como um mendigo, sujo e maltrapilho, pelas ruas de sua cidade, sendo reconhecido pelos seus antigos amigos fidalgos que o interpelavam com risos sarcásticos nos lábios:

— Sois vós, Inácio? O que aconteceu?

— Faço isto por amor a Deus e em reparação de meus pecados.

Os outros riam mais alto e se afastavam. Se nos colocarmos, cada um de nós, na pele de Santo Inácio em semelhante situação, numa rua de nossa cidade natal, poderemos talvez aquilatar o que essa atitude representava de vitória sobre o amor próprio e os apegos mundanos.

Pouco depois, ele funda a Companhia de Jesus, obra minúscula, constituída de meia dúzia de discípulos, com a intenção de deter a avalanche da reforma protestante pela Europa do século XVI. Santo Inácio decide realizar essa coisa extraordinária: uma ordem militar, no sentido mais elevado da palavra, para opor barreiras ao inimigo da Igreja.

Mais uma vez, é a eterna coerência levada às últimas conseqüências. Ele empreende a obra jesuítica, levanta diques à Revolução e, afinal de contas, consegue salvar e preservar vastos territórios do mundo católico.

Tratado da coerência humana

Esse espírito coerente levado até o fim, esse tratado da genuína coerência humana se acha expresso nos célebres Exercícios Espirituais escritos por Santo Inácio. Da primeira à derradeira linha, tudo neles não é senão o ver os problemas de frente, sem nenhuma mitigação covarde.

Poder-se-ia distinguir, nos Exercícios Espirituais, duas gamas de coerência levadas ao último ponto: uma, que é o pólo de todas as outras coerências, exprime-se pelo direito soberano de Deus, de Nosso Senhor Jesus Cristo e da Santa Igreja Católica, de serem amados sobre todas as coisas pelos homens; a segunda se traduz pela desconfiança a nosso próprio respeito, pela consideração da maldade de toda criatura humana concebida no pecado original, pela falta de lealdade que cada um tem para consigo mesmo e nossa desonestidade em assumirmos os bons propósitos — o que, tudo, deve ser visto igualmente de frente e até o fim.

Na junção dessas duas gamas de coerência temos uma obra característica da alma de Santo Inácio. Encontra-se ali uma super-coerência que só as almas autenticamente virginais possuem, e constitui para nós um indizível modelo de pureza de intenção, aliada à pureza do corpo.

Pedir a graça de sermos coerentes na santidade

Assim sendo, para concluir esses comentários, creio oportuno invocarmos a intercessão de Santo Inácio de Loyola, rogando a ele nos obtenha a graça de o imitarmos nessa sua extraordinária coerência. Que tenhamos, como ele, a coragem de vermos nossos defeitos de frente, por piores e desagradáveis que sejam, e, como ele, tenhamos a coerência sem meios termos para abraçar a verdade inteira, a virtude completa, o caminho da santidade levado até as últimas consequências.

Claro está, sem a graça divina nada alcançamos. Sem a infalível proteção de Maria Santíssima, dificilmente vencemos nossa maldade e nossas fraquezas. Porém, rezando e confiando nesse patrocínio de nossa Mãe celeste, nossas defecções e debilidades serão sobrepujadas e obteremos de Deus os dons necessários para correspondermos à plenitude do que Ele deseja de nós.

Pode mesmo parecer milagroso que alguém, considerando suas misérias, chegue ao grau de virtude de Santo Inácio de Loyola. Pois devemos pedir esse milagre da misericórdia divina, uma vez que a todos os homens são franqueadas as graças necessárias para alcançarem a perfeição.

Seja essa a nossa ardente súplica ao grande Santo Inácio de Loyola em sua festa.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 30/7/1966)

 

Santa Ana e São Joaquim

Expoentes da fidelidade a Deus no Antigo Testamento, São Joaquim e Sant’Ana ansiavam pela vinda do Messias prometido, desejando ardentemente estar entre os ancestrais do Salvador.

Porém, segundo uma piedosa crença, os anos passavam, eles envelheciam e não lhes nascia um filho que alimentasse suas esperanças.

Sabiam, no entanto, que as grandes esperas são o prelúdio dos grandes dons da Providência. Continuaram a confiar e não se viram desiludidos: eis que Sant’Ana concebe em avançada idade, e dá à luz Aquela que haveria de ser a Esposa do Espírito Santo e a Mãe do Verbo Encarnado.

São Joaquim e Sant’Ana, magníficos exemplos de quem, sabendo esperar e confiar, recebe o cêntuplo das promessas divinas!

Brado de guerra

São Tiago foi o Santo que exerceu grande atração na Idade Média, e o seu nome foi usado como brado de guerra pelos heróis da Reconquista espanhola.

Para uma alma combativa, nada mais bonito do que imaginar que, quando ela já não fizer parte do número dos vivos, sua memória ficará, não como um sinal de conciliação, mas como um brado  de guerra! E que os bravos, no momento de arriscarem tudo, até a própria vida, pela causa católica, terão nos lábios esse nome como um símbolo de luta e de vitória, a ponto de ser este o último  nome que muitos deles pronunciarão, cheios de entusiasmo, antes de se apresentarem à glória de Deus e ao sorriso de Maria.

Para muitos, este nome foi o de “Santiago!”

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 25/7/1967)

Santo Inácio de Loyola

O grande Santo Inácio, fundador da Companhia de Jesus, à qual se deve a primeira e talvez a mais gloriosa e mais eficaz das Contra-Revoluções, que é a Contra-Reforma, tornou-se famoso pelo seu espírito pugnaz, pela sua penetração política, sua psicologia finíssima e pela capacidade que possuía de pregar extraordinários exercícios espirituais.

Homem capaz de guardar segredo, de fazer no silêncio uma longa, complexa e subtil trama política, dotado de um espírito de autoridade invulgar, Santo Inácio exercia sobre os seus religiosos um mando total, que fez da Companhia de Jesus o próprio símbolo da obediência.

Entretanto, esse mando que Santo Inácio exercia sobre os outros, ele começou por praticar sobre si mesmo: é um homem que tem o completo domínio sobre si.

Ao contemplar sua fisionomia, tem-se a impressão de que se estourasse uma bomba nas proximidades, ele não se assustaria.

Se tivesse que pegar uma espada para combater, ele não mostraria sanha, mas deveria ser um combatente excelente. Entretanto, ele possuía não o hábito de esgrimir com a espada, mas sim com argumentos. E, por nobre que seja esgrimir com espadas, é mais nobre ainda esgrimir com argumentos.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 17/1/1986)

A confiança produz grandes acontecimentos

São Joaquim, esposo de Sant’Ana, provavelmente seria desprezado por não ter filhos, devido à esterilidade de sua esposa. Naquele tempo, isso constituía uma tristeza, pois o casal estéril estava privado de ser da ascendência do Messias.

Por meio deste sofrimento aceito com confiança, Deus preparava a vinda do Salvador, do qual São Joaquim foi o avô.

É assim que Deus prepara os grandes acontecimentos.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 15/8/1968)