Nossa Senhora dos Privilégios

Há um cântico a Nossa Senhora do Carmo em cujo estribilho se pede: “Carmelitis da privilegia” – aos carmelitas, dai privilégios. A correlação entre o privilégio e a devoção mariana sempre me encantou e me pareceu um elemento fundamental dessa devoção.

“Privilégio” é uma palavra de raiz latina que vem de privata lex – lei privada –, ou seja, a lei reservada a um indivíduo ou a um grupo e não a outros.

Maria Santíssima, como Mãe que é, não trata seus filhos de acordo com regras gerais. Embora estas existam, Ela sabe sempre abrir uma exceção, um privilégio, e cada filho de Nossa Senhora é um privilegiado por algum lado. Trata-se de procurarmos ter noção de qual é o privilégio que cabe a cada um de nós.

Essa noção, por vezes, é muito confusa: recebo alguma graça que me tocou mais profundamente a alma; anos depois, inesperadamente, vem outra, e mais adiante outra… Estudando o fio condutor dessas graças percebo haver um sentido que, analisado, faz-me compreender o privilégio pelo qual escapo da regra geral. Ali Nossa Senhora soube ter para comigo uma pena que não teve com ninguém. Para um outro, Ela terá outra coisa. Mas para mim concedeu aquilo, que me dá um fôlego, um ânimo como a mais ninguém. É o privilégio para mim.

Façamos nossa a bela oração dos carmelitas, dizendo: “Ó Maria, a esses vossos filhos, dai privilégios!”

Queremos ser anti-igualitários até no que diz respeito à vida espiritual, pois privilégio supõe desigualdade. Nossa Senhora das legítimas e harmônicas desigualdades é Nossa Senhora dos Privilégios.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 7/1/1977)

Um olhar que pode nos salvar

Nossa Senhora é chamada, muito a propósito, de Estrela Luminosíssima. Incontáveis astros reluzem no firmamento, porém Ela é o mais resplandecente de todos, ou seja, Maria é a mais luminosa das criaturas. E por que é simbolizada pela estrela?

Porque é durante a noite que cintilam as estrelas, e esta vida é para o católico uma noite, um vale de lágrimas, uma época de provação, de perigo e de apreensões.

Na eternidade teremos o dia, porém na vida terrena temos o escuro da madrugada. E nesta noite existe uma estrela que nos guia, que é a consolação de quem caminha nas trevas, olhando para o céu: Maria Santíssima, a mais fulgurante de todas as estrelas!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 24/8/1965)

Revista Dr Plinio 256 (Julho de 2019)

Nossa Senhora da Luz Profética

A luz profética é um discernimento por onde vemos, e como que apalpamos, as graças que Nossa Senhora nos concede, e cuja característica é fazer com que passem as inseguranças, os egoísmos, os subjetivismos, os langores. Enquanto essa luz brilha, tudo isso acaba.

É como o Sol: quando ele se põe, as aves noturnas, os bichos feios, os animais agressivos começam a se mover dentro da floresta. Quando o Sol se levanta, eles procuram suas tocas, seus ninhos, buracos e somem. Esse sol é a luz profética.

Nossa Senhora da Luz Profética é Maria Santíssima enquanto resplandecente dessa luz, de um modo inenarrável! Ela, de vez em quando, obtém para nós raios dessa luz para nos fazer completamente outros.

Nada no mundo vale tanto quanto esta luz. Com ela tudo se resolve; sem ela, tudo fica difícil.

Nossa Senhora nos dá a entender o seguinte: “Meus filhos, essa é uma luz que vem do Céu, é a luz do meu Reino. Peçam-na, acreditem nela e deixem-se transformar por ela”.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/9/1974)

O celeste rosto de Maria

Quantas vezes o reflexo de um castelo nas águas de um lago é mais belo que o próprio edifício!

Ao caminhar sobre o Mar de Tiberíades, Jesus refletiu-Se nas águas. Entretanto, Ele era mais belo do que o reflexo.

Sem dúvida, isto seria verdade em quaisquer águas do mundo: do Danúbio, do Sena, do Tejo, do Guadalquivir, do Reno, da Baía da Guanabara, e de tantos lugares magníficos da Terra.

Mas o que seria verdade em todos os mares da Terra, não o era apenas num “mar”, maior do que todos eles, entretanto, tão menos extenso: Maria. Porque quando Nosso Senhor olhava para sua Mãe Santíssima, coisas que só Ela compreendia n’Ele se refletiam no semblante d’Ela. E quem olhasse para o celeste rosto de Maria teria como que uma porta de acesso de ouro, para compreender os mistérios da Sagrada Face de Jesus!

Em Maria, só em Maria, mas plenamente em Maria, alguém olhando veria algo que Jesus só manifestava a Ela e àqueles que sabem procurá-Lo n’Ela.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 27/9/1980)

Mãe do Perpétuo Socorro

Como onipotente Soberana de todo o universo, por vontade de Deus, Nossa Senhora tem o poder de nos auxiliar e quer inesgotavelmente nos socorrer em todas as nossas necessidades. Logo, se pedirmos, Ela nos socorrerá.

Para o êxito de nosso apostolado, para o êxito de nossa vida interior, precisamos, a cada passo, da proteção de Nossa Senhora. E Ela a todo momento está disposta a nos conferir os auxílios mais inesperados, mais súbitos, mais espetaculares.

Ela é a Mãe do Perpétuo Socorro. E o perpétuo socorro é um amparo, é um ato de misericórdia, é um ato de piedade perpétuo, quer dizer, ininterrupto, que não se detém nunca, que não cessa nunca, que não se suspende nunca. Nunca significa em nenhum minuto, em nenhum lugar, em nenhum caso: por pior que seja a situação de quem A invoque, a Mãe de misericórdia o socorrerá.

Por isso, quanto mais nossas almas estiverem tentadas,  tanto mais devemos rogar à Santíssima Virgem. Ela é a Rainha de toda a criação e pode, quando queira e onde queira, derrotar fragorosamente o espírito das trevas, impondo a sua própria soberania.

A fim de nos incutir confiança nas horas das tentações, e de nos fazer compreender que a estas pode suceder a qualquer instante uma singular e aprazível consolação, Maria pratica fulgurantes ações em favor das almas, contra Satanás. Assim, estejamos certos de que o demônio mais insistente, mais persistente, mais renitente, nada é para aquele que invoca o incansável auxílio da Mãe do Perpétuo Socorro.

Plinio Corrêa de Oliveira

Lírio entre os espinhos

No Pequeno Ofício da Imaculada Conceição há o seguinte responsório: “Como o lírio entre os espinhos, assim é a minha predileta entre os filhos de Adão”.

Estas palavras podem ser aplicadas também a uma porção de coisas boas que, em nossas vidas, restam no meio dos espinhos, os quais temos que aturar para podermos nos deleitar com o perfume de um lírio.

Existe, por detrás, uma verdade enternecedora: Nossa Senhora quer que tenhamos pena daqueles que representam os espinhos em torno do lírio d’Ela. E tendo paciência com eles, sabendo perdoar até o estapafúrdio, sendo inalteravelmente os mesmos, nós transformamos os espinhos em lírio.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 12/2/1988)

Luz brilhantíssima da Igreja nascente

Dr. Plinio salienta o papel da Santíssima Virgem enquanto Medianeira de todas as graças, nas etapas iniciais da vida da Igreja.

 

Comentaremos trechos de um livro sobre Nossa Senhora(1) , o qual contém pensamentos muito piedosos e bonitos, próprios a intensificar nossa devoção à Santíssima Virgem.

É um tanto difícil, conhecendo nós as poucas palavras de Nossa Senhora referidas no Evangelho, formarmos inteiramente ideia, do que possa ter sido a mentalidade e o espírito dEla.

Naturalmente, o mais poderoso dos meios que temos para retraçar o perfil moral de Nossa Senhora é compará-La com Seu Divino Filho.

Mas Nosso Senhor é tão alto — Ele é Divino — que, mesmo se referindo à Mãe dEle, a comparação tem qualquer coisa pela qual não se ajusta bem. Aliás, toda comparação claudica, e essa especialmente.

Então, somos obrigados a procurar outras formas para conhecer algo do espírito de Maria e do conteúdo de Seu Imaculado Coração. Um dos meios bonitos consiste em estudar a vida de São João Batista.

Porque São João Batista foi santificado no seio de Santa Isabel pela palavra de Maria Santíssima comunicando ao Precursor, misteriosamente, o espírito dEla. E tudo quanto São João Batista fez em sua vida decorreu dessa graça inicial a qual, pelos rogos dEla, foi constantemente intensificada, até chegar ao auge, quando ele morreu.

E São João Batista, enquanto asceta austero, pregador do Cordeiro de Deus que viria, herói que enfrenta Herodes e morre como mártir sublime de grandeza e de serenidade, é uma das facetas do espírito de Nossa Senhora.

Outra faceta muito bonita, é a seguinte: Nossa Senhora é a Sede da Sabedoria; portanto, nEla está contida toda a sabedoria que vem de Deus para depois ser concedida  aos homens.

E como tal — a respeito disso pouco se fala — estando a Virgem Maria presente entre os Apóstolos, é impossível que estes tenham trabalhado, ensinado a respeito de Nosso Senhor Jesus Cristo sem consultá-La. E que os evangelistas tenham escrito os Evangelhos, sem recorrerem freqüentemente a Ela porque o espírito dos Evangelhos é o próprio espírito de Nossa Senhora.

Essa relação da Virgem Maria com a pregação da Igreja nascente, e mais especialmente com o Evangelho, fica expressa em termos bonitos por este trecho do livro:

“Nossa Senhora foi o oráculo vivo que São Pedro consultou nas suas principais dificuldades.”

São Pedro, o primeiro Papa, o chefe da Igreja.

“A estrela que São Paulo não cessou de olhar para se dirigir em suas numerosas e perigosas navegações.”

Naturalmente, refere-se às navegações, em sentido figurativo.

“Nada se fez senão de acordo com o conselho e a direção de Nossa Senhora.”

Temos então uma linda visualização: a Igreja nascente, com todos aqueles lances maravilhosos, foi inspirada e dirigida por Nossa Senhora.

É verdade que São Pedro era o Papa e detinha o poder sobre a Igreja. Porém, estava ele completamente submisso a Nossa Senhora e, em São Pedro, era a Santíssima Virgem que dirigia os demais Apóstolos.

“Então Ela verdadeiramente preencheu a significação de seu nome simbólico.”

O autor apresenta uma linda interpretação do nome de Nossa Senhora, como Sede da Sabedoria —o foco da ortodoxia e da boa doutrina — que me pareceu muito bonita.

Pois, diz São Boaventura, o nome de Maria pode traduzir se por essas palavras:

Maria é aquela que é iluminada por cima e espalha, por todo lugar, e em todas as direções, a luz. Quer dizer, é verdadeiramente a medianeira da luz. Toda a sabedoria e toda a luz que vem de Deus, passam por Ela e através dEla, como Medianeira, se difundem por todos os homens.

Então, quem quiser receber a sabedoria, e progredir nessa virtude, deve recorrer a Nossa Senhora que é, por definição, pelo mesmo conteúdo de seu nome, um foco de luz celeste que se espalha pela humanidade inteira.

O autor argumenta muito bem: era possível haver entre os Apóstolos este foco, sem que ele não os iluminasse? Tudo quanto os Apóstolos fizeram e os evangelistas escreveram não era senão a luz que procede desse foco!

Então, estudar a Virgem Maria como inspiradora da mentalidade, do espírito dos Apóstolos e evangelistas, aos quais forneceu as informações para pregarem e escreverem é uma coisa que nos faz entrever cenas maravilhosas.

Imaginemos a Mãe de Deus, tendo ao seu lado São Paulo, São Pedro, São João Evangelista, contando, explicando, interpretando, ajudando-os a ver melhor tais e tais fatos da vida de Nosso Senhor, pondo em realce este, aquele outro fato, sendo, portanto, o aroma do bom espírito perfumando a Igreja inteira!

Compreendemos assim o papel de Nossa Senhora presente e visível na Igreja nascente, o que é uma coisa verdadeiramente maravilhosa.

Continua o autor:

“Se os evangelistas quiseram recolher os principais fatos da vida de Jesus e seus ensinamentos mais importantes a fim de nos transmitir os seus escritos autênticos, eles recorreram a Maria.

“Foi a Ela que eles pediram os esclarecimentos necessários sobre a Encarnação.”

De fato, a quem pedir informações e esclarecimentos sobre a Encarnação, a não ser a Ela?

“Pois, disse o Cardeal Hugo, Ela fez de seu coração o tesouro das palavras e das ações de Seu Filho, a fim de os comunicar em seguida aos escritores sagrados.”

Mais uma vez se apresenta esta ideia: Nossa Senhora é o vaso que recolheu todos os ensinamentos de Nosso Senhor os quais foram distribuídos para os Apóstolos e à Igreja desde seu nascedouro até hoje. Não só, portanto, no que está escrito, mas, em importantíssima parte, na Tradição da Igreja.

“Nenhuma criatura, diz Santo Agostinho, jamais possuiu um conhecimento das coisas divinas e do que se relaciona com a salvação, igual à Virgem bendita. Ela mereceu de ser a mestra dos apóstolos e é Ela que ensinou aos evangelistas os mistérios da vida de Jesus”.

É um santo que escreveu isso. Vejamos agora o que afirma um grande autor espiritual, o abade Rupert:

“E os outros, é verdade, diz o abade Rupert, podem ser chamados Doutores. Mas Maria é muito mais do que isso, Maria é a Mestra dos Doutores. É a Doutora dos Doutores.”

Vemos assim o esplendor da alma santíssima de Nossa Senhora, bem como o papel da ortodoxia e da sabedoria em Sua santidade. Não é um papel colateral como a “heresia branca(2)” imagina, mas fundamental. Aí temos um vislumbre que nos pode ajudar a aumentar nosso amor a Maria Santíssima. 

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 11/7/67).

 

1) Por não ter sido feita a devida anotação quando Dr. Plinio pronunciou esta conferência, desconhecemos o nome do autor e o título do livro citado.

2) Expressão metafórica criada por Dr. Plinio para designar a mentalidade sentimental que se manifesta na piedade, na cultura, na arte, etc. As pessoas por ela afetadas se tornam moles, medíocres, pouco propensas à fortaleza, assim como a tudo que signifique esplendor.

Maria fons

No hino “Flos virginum”, Nossa Senhora é chamada “Maria fons”. Ora, como se deve entender esta invocação? Em que sentido Ela é fonte?

Nossa Senhora é simbolizada por uma fonte encontrada por alguém que está vagueando pelo deserto, com sede.

Quer dizer, Ela é a fonte na qual podemos nos dessedentar.

Mas fonte de quê? Ela é a fonte de todas as graças, pois estas nos vêm de Nosso Senhor Jesus Cristo através d’Ela.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/8/1965)

“Que as vossas cogitações sejam as minhas”

Ó Mãe indizivelmente grande, ó Rainha inexprimivelmente doce e acessível, ó arco-íris que reúne numa síntese incomparável os dois aspectos da grandeza, isto é, a superioridade e a dadivosidade: suplico-Vos me ajudeis a observar, a analisar, a compreender e a enlevar-me com vossa grandeza. Concedei-me que, pela meditação da vossa grandeza, as vossas cogitações e vias sejam as vias e as cogitações [deste filho]. Atendei a essa súplica, ó Coração Régio, Sapiencial e Imaculado de Maria. Amém.

(Oração composta por Dr. Plinio, na década de 60)

“Dos que me destes, não perdi nenhum”

Nos momentos de provação e angústia, lembremo-nos de que Nossa Senhora, por disposição divina, se acha junto a cada um de seus filhos provados, ajudando-o a lutar e a vencer as dificuldades. De tal sorte que dia virá em que Ela, afetuosa, amorosa e pacientemente deitará um olhar misericordioso sobre todo o seu rebanho de devotos e repetirá a Nosso Senhor Jesus Cristo essas palavras magníficas que o próprio Redentor pronunciou: “Dou-vos graças meu Deus, porque de todos os que Vós me destes, não perdi nenhum!” (Jo 17, 12)

Na verdade, Maria Santíssima nos acompanhará pelos extravios, pelas infidelidades, prostrações e conspurcações, pelos olvidos, pelas ingratidões, por toda a poeira e por toda a lama do caminho: mas, a todos e a cada um, em determinado momento, Ela dirá infalivelmente a palavra que o poderá salvar.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 26/4/1974)