São Simão Stock recebe a libré de Nossa Senhora

No momento em que tudo parecia perdido para a Ordem do Carmo, Maria Santíssima aparece a São Simão Stock e lhe concede o Escapulário, assegurando, assim, o florescimento e desenvolvimento da Ordem no Ocidente, e sua continuidade até os nossos dias.

 

Hoje é festa de São Simão Stock, confessor. Ele era da mais alta nobreza da Inglaterra, e foi Prior Geral da Ordem do Carmo. Recebeu o Santo Escapulário das mãos de Nossa Senhora, como sinal da predileção d’Ela pela Ordem. Deu o primeiro grande impulso à vida contemplativa carmelitana. Século XIII.

Ponte desde os primórdios da devoção mariana até o fim do mundo

A respeito de São Simão Stock e da Ordem do Carmo, é preciso termos bem em mente a importância da obra deste santo numa linha muito alta das coisas, para compreendermos bem quão grata nos deve ser a festa que hoje se comemora.

Tendo o Profeta Elias fundado os antecedentes da Ordem do Carmo, esta representou o primeiro filão da devoção marial no mundo. Elias simboliza o extremo da devoção a Nossa Senhora e lutará, no fim do mundo, contra o Anticristo e contra os últimos inimigos de Nosso Senhor. E constitui, portanto, uma espécie de ponte, desde o início da devoção a Maria Santíssima, séculos antes d’Ela ter nascido, até a luta contra os últimos inimigos de Nossa Senhora, que estarão acabando com o Reino de Maria, e contra os quais vai lutar precisamente Santo Elias.

Compreende-se, portanto, a importância dessa ponte que se estabelece desde os primórdios da devoção mariana até o fim do mundo, e dessa continuidade, para o espírito contrarrevolucionário e para a verdadeira piedade marial.

Ordem do Carmo transformada em destroços

Consideremos a emergência diante da qual São Simão Stock foi levado a realizar o seu apostolado.

Tinha havido as invasões dos sarracenos, e a Ordem do Carmo, que existia no Oriente, estava perseguida, enxotada e muitos religiosos passaram a viver no Ocidente.

Mas no Ocidente eles não se aclimatavam. Havia indiferença para com eles, não se compreendia o que eram, e estavam meio dispersos. São Simão Stock era o Geral deles, mas não exercia uma autoridade efetiva sobre uma Ordem propriamente constituída; podemos dizer que a Ordem do Carmo estava transformada em destroços que boiavam sobre um mar revolto, e não era mais um navio, com uma estrutura jurídica coesa e uniforme, capaz de conservar um espírito, de promovê-lo e transmiti-lo à posteridade.

E foi nessa situação que ele, rezando a Nossa Senhora com muita devoção, pediu que Ela não deixasse morrer a Ordem do Carmo.

No auge dessa aflição em que se encontrava o santo, a Mãe de Deus lhe apareceu e deu-lhe o Escapulário do Carmo. Não é propriamente esse bentinho que se usa comumente, mas aquele escapulário grande, à maneira de uma libré, que se colocava sobre a túnica.

Tratava-se de uma época em que ainda se usava muito a túnica, como traje civil comum. E os homens que pertenciam a alguém vestiam, por cima de sua túnica, uma espécie de túnica menor — com a forma do atual escapulário do Carmo — a qual indicava, pela cor e por outras características, o senhor a quem aquele homem servia. Portanto, a Virgem Santíssima indicou aquela veste como libré d’Ela, que os carmelitas deveriam portar sobre a batina.

Depois dessa intervenção de Nossa Senhora, a Ordem do Carmo começou a florescer e a se desenvolver extraordinariamente no Ocidente. E para falar apenas em três frutos desta Ordem, citemos Santa Teresa de Ávila, São João da Cruz e Santa Teresinha do Menino Jesus. Quer dizer, três sóis no firmamento da Igreja.

Lição de confiança

Entretanto, mais do que isso — e não hesito em afirmar que é mais —, assegurou a continuidade da Ordem até os nossos dias. Foi, portanto, uma missão enorme que esse santo cumpriu.

Ele foi o traço de união entre a vida ocidental e a vida oriental da Ordem. E no momento em que, nessa espécie de istmo entre esses dois continentes históricos, a Ordem se adelgaçava a ponto de parecer sumir, precisamente nesse momento, Maria Santíssima intervém para salvar e dar muito mais do que havia antes. A Ordem teve, no Ocidente, uma prosperidade muito maior do que tivera no Oriente.

Nas obras que Nossa Senhora ama, as coisas podem chegar a ponto de se despedaçarem, se estraçalharem quase completamente. Tudo parece perdido, mas é o momento que Ela reserva para intervir.

As grandes intervenções de Deus são precedidas por uma fase onde tudo parece destruído, para ficar inteiramente claro que nenhum socorro humano adianta de nada. Depois de provado que tudo quanto era humano fracassou, na hora da desolação e do caos, Deus intervém, por meio de Nossa Senhora, e salva a situação. Foi o que se deu com a história da Ordem do Carmo. Ou seja, uma lição de confiança magnífica dada para todos os carmelitas no decurso dos séculos.

Vamos, então, nos recomendar hoje a São Simão Stock.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/5/1966)

 

O início de uma epopeia!

Reunidos em torno de Nossa Senhora no Cenáculo, Apóstolos e Discípulos são tomados de ardor quando, de súbito, o Espírito Santo desce e os ilumina. A partir de então, tudo mudaria em suas vidas.

 

Depois da morte de Jesus, os Apóstolos passaram alguns dias meio estonteados. Porém, permaneceram no Cenáculo aos pés de Nossa Senhora, e com isto foram recobrando as graças que mesmo as almas mais infiéis readquirem ao se porem junto à Virgem Maria.

Quando Nosso Senhor apareceu-lhes após a Ressurreição, houve uma espécie de processo de conversão, ao longo do qual o Redentor apareceu-lhes várias vezes, tornando evidente o seu triunfo e patente o seu caráter divino.

O ápice glorioso e definitivo deste período de ascensão — durante o qual foram como que se quebrando as crostas que havia na alma dos Apóstolos e Discípulos — foi o dia de Pentecostes, quando estavam reunidos, em recolhimento e oração muito elevada, no Cenáculo. Nossa Senhora presidia a reunião; junto a Ela estava São Pedro, o Príncipe dos Apóstolos, bem como todos os demais Apóstolos, aqueles que por excelência são o sal da terra e a luz do mundo.

Sob a forma de chamas, desce o Espírito Santo

Cada vez mais o Espírito Santo agia sobre eles de um modo profundo, e a oração tornava-se mais elevada; em determinado momento, produziu-se um enorme estrondo e o Paráclito entrou naquela sala, sob a forma de chamas. Uma grande chama pousou sobre Maria Santíssima e depois se dividiu em várias outras sobre os Apóstolos.

Eles saem do Cenáculo e começam a pregar, produzindo um verdadeiro acontecimento na cidade. Encontram-se de tal maneira entusiasmados com o fogo do Espírito Santo, tão alegres, contentes, com tanta força, que muitos pensam estarem eles embriagados.

É o que a linguagem da liturgia chama de “a casta embriaguez do Espírito Santo”: um entusiasmo que não vem da intemperança, mas de uma plenitude da temperança, que faz com que a alma, inteiramente senhora de si e dominada por Deus, profira palavras tão sublimes e diga coisas tão extraordinárias, com tanto fogo, que muitas dessas coisas nem são adequadamente captadas pelos outros. Mas são coisas que arrebatam a todo mundo. Começa, então, a expansão da Igreja com uma plenitude do Espírito Santo, que nunca a abandonará.

A plenitude do Espírito Santo penetra na Igreja Católica

Desde aquele momento, onde houver autênticos católicos haverá uma presença do Divino Espírito Santo que se faz sentir pela infalibilidade da doutrina, pela continuidade da santidade, pelo vigor apostólico, e por um certo ambiente indefinível que é a alegria da alma do católico, por onde sabe-se que a Igreja Católica é a única verdadeira, eternamente a Igreja verdadeira, independente de provas ou de apologéticas.

Quantas vezes, entrando em alguma igreja, temos de repente uma sensação sobrenatural de recolhimento, enlevo, que nos leva a dizer: “Esta é a verdadeira Igreja! O que não for isto é erro, mentira e impostura. A ela quero me dar inteiramente!”

Essa sensação é uma centelha do fogo de Pentecostes, desta permanência definida e definitiva do Espírito Santo entre os verdadeiros fiéis.

Em Pentecostes, o início de uma epopeia…

Durante sua vida, Nosso Senhor fundou a Igreja. Mas, quando Ele morreu, ela era ainda como um edifício inacabado.

Morrendo na Cruz, Jesus regou a Igreja com seu Divino Sangue. Até então, ela era como uma planta que apenas começara a germinar, a se desenvolver, mas que não tinha dado ainda nem frutos nem flores. Com a descida do Espírito Santo, os frutos e as flores aparecem, e a Igreja começa a se mostrar com a sua força e sua beleza definitivas. A partir desse momento, com alguns Apóstolos que se dispersam, se inicia a grande epopeia da Igreja Católica.

Alguns permanecem no Oriente Médio, outros vão pregando nas mais variadas regiões da Terra; uns fracassam, outros têm êxito. Os que têm êxito fundam a Cristandade, a qual se eleva acima de todas as nações da Terra e a domina.

A obra de Nosso Senhor Jesus Cristo adquiriu em Pentecostes a sua plenitude, pois até então os Apóstolos não viam, não entendiam, não agiam bem; com Pentecostes, de repente, tudo mudou.

Essa graça lhes veio por meio de Nossa Senhora. O fogo pousou sobre a cabeça d’Ela para depois se dispersar sobre todos os outros, a fim de dar a entender que a Virgem Maria é a Medianeira de todas as graças, tudo nos vem por meio d’Ela.

Desejo de um novo Pentecostes

Pentecostes, só houve um e não existirá outro até o fim do mundo. Mas poderá haver fatos análogos a Pentecostes. Quer dizer, aqueles que se juntam a Nossa Senhora para rezar, em determinado momento podem ser visitados por uma graça súbita, extraordinária. E mesmo os mais opacos, os mais tíbios e os mais transviados podem, de repente, ficar cheios da embriaguez do Divino Espírito Santo.

Nós estamos numa época em que cada vez mais o espírito das trevas progride, avança e parece dominar tudo. Não seria lógico, simétrico, razoável e proporcional que, no momento onde o Espírito Santo parecesse completamente enxotado da Terra, Ele de repente voltasse? E voltasse com um grande estrondo e todas as coisas começassem a se modificar? Seria uma coisa concebível.

Quem sabe se o “Grand Retour” que nós esperamos terá essa forma? Quem sabe se um acontecimento, um fato, uma graça nos mudará a todos num instante e, afinal de contas, seremos aquilo que devemos ser?

Aos pés de Nossa Senhora se recebe o Espírito Santo

É bom termos em mente a noção de que, aos pés de Nossa Senhora, se recebe o Divino Espírito Santo; e quem obtém o Divino Espírito Santo possui a própria fonte de todas as graças, e assim se converte completamente. Portanto, pedindo em união com Maria obteremos repentinamente a graça que tanto penamos para conseguir, mas por nossa maldade não correspondemos suficientemente e ficamos na nossa cegueira. Exatamente como os Apóstolos, que lutaram algum tanto para ter essa graça, mas corresponderam de um modo incompleto e ficaram no estado em que sabemos.

Devemos apresentar, por meio de Nossa Senhora, esta oração a Nosso Senhor Jesus Cristo: “Enviai para este mundo revolucionário, corrupto, transviado, cego, abobado, o Divino Espírito Santo, e todas as coisas serão como que novamente criadas; tudo reflorescerá. E Vós, meu Deus, tereis renovado a face da Terra.”

Peçamos a Nossa Senhora que Ela obtenha para nós o Divino Espírito Santo, e assim tomaremos uma nova vida. É isso que, com confiança, com espírito fiel, precisamos pedir no dia de Pentecostes. Tenho certeza de que essa oração será atendida. Porque, se é verdade que para quem bate se abre, para quem pede se dá, isto é sobretudo aplicável à oração na qual rogamos o Divino Espírito Santo.

O que, acima de tudo, Nossa Senhora quer nos conceder é o bom espírito, do qual o Espírito Santo é a fonte. Todas as outras graças são colaterais. 

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 20/5/1972)

 

Visita de Nossa Senhora a sua prima Santa Isabel

Ao entoar o seu Magnificat, Nossa Senhora se alegra pelo fato de Deus, tendo considerado a sua pequenez, querer exaltá-La, estabelecendo com Ela uma gloriosa relação. “Engrandeceu-me, e nisto agiu santamente Aquele que é poderoso, pois o me ter feito grande redundará em benefício e obra de misericórdia para todas as gerações, em todas as épocas da História” — é o pensamento que A inspirava.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 27/9/1990)

Invencível esperança na misericórdia de Maria

Evocando o momento em que, pela primeira vez, sentiu-se amparado pela misericórdia de Nossa Senhora, Dr. Plinio nos convida a nutrirmos uma ilimitada e constante confiança na bondade de Maria Santíssima, “em todas as ocasiões, em todas as circunstâncias e de todos os modos”.

 

Como já tive oportunidade de comentar, quando menino, estudando no Colégio São Luís, certa ocasião procedi mal. Eu atravessava, talvez, a pior época de minha vida, e estava descontente comigo mesmo. Ora, aconteceu-me de, por essa época, receber nota 6 em uma disciplina e, inconformado, no boletim escrevi sobre ela um “10”.

Julgava ser objeto de merecido castigo

Ao saber do fato, mamãe — sempre muito afetiva, mas também firme —, por mais que quisesse minha companhia, me disse:

— Se ficar provado que você não merecia a nota que escreveu, inabilmente, com seu próprio punho no boletim, mandarei você para o Caraça.

Tratava-se de um colégio muito bom de Minas Gerais, com regime de internato, mas cuja fama em São Paulo, por razões que ignoro, era a de uma penitenciária de crianças. Naturalmente, a ideia de ir para lá causava-me horror.

Afinal, verificou-se que um funcionário do colégio havia se enganado ao passar as notas no boletim, e que eu havia tirado 10, como constava no livro apropriado. Antes de se comprovar o fato, porém, passei por grande apuro. Como, a propósito de outras questões, eu também havia procedido mal, julguei-me objeto de merecido castigo.

Angustiado olhar para a imagem de Maria Auxiliadora

Sob o peso dessa apreensão, fui assistir à Missa dominical na Igreja do Sagrado Coração de Jesus, grande edifício que, juntamente com o liceu dos salesianos, ocupa um quarteirão inteiro. Por coincidência, realizava-se naquela hora a celebração dedicada aos estudantes do liceu. Só estes enchiam o templo. Formados em fileiras, entoavam cânticos religiosos, e qualquer outra pessoa que estivesse ocupando algum lugar nos bancos devia ceder-lhe a eles. Foi o que aconteceu comigo. Tive de me deslocar para o fundo da igreja e, não encontrando espaço na nave central, fui para a lateral, à direita de quem olha para o altar, fazendo face à imagem de Nossa Senhora Auxiliadora.

Deu-se início à Missa. O contraste entre a situação daqueles meninos cantando, felizes, e meu apuro, era penoso. Em certo momento, olhei para a imagem e pedi a Nossa Senhora que me ajudasse. Pareceu-me, então, que os traços de seu rosto se moviam, e ela sorria para mim, afagava-me, como se dela partisse uma promessa de que tudo se arranjaria. Não se tratava de um milagre, mas de uma impressão.

“Pela primeira vez senti o sabor da Salve Rainha”

Durante esse fato eu rezava a Salve Rainha, prece conhecida por mim, mas que nunca me havia chamado especialmente a atenção. Não sabendo bem o latim, eu a recitava em português. Ora, no idioma latino, “salve” significa uma saudação. Contudo, eu entendia que tal palavra estivesse relacionada com “salvação”. Eu dizia, portanto, “Salve Rainha, Mãe de misericórdia”, no sentido de “Salvai-me Rainha”! Seja como for, naquela hora de aflição senti o sabor dessa oração pela primeira vez na vida.

Lembro-me de que ao dizer “Mãe de misericórdia”, eu pensava: “Mamãe é tão boa, mas eu não diria dela que é mãe de misericórdia. Nossa Senhora, sim, o é. E, por mais que mamãe me queira bem, sei que Nossa Senhora me quer insondavelmente mais. Com Ela, conseguirei safar-me dessa situação”.

Ponto por ponto, uma prece consoladora

Ao dizer: “Vida, doçura e esperança nossa, salve!”, vinha-me à mente: “É isso mesmo! Vida é com Ela, porque nos livra de apuros como este, e de precipícios nos quais nem nossa mãe pode nos escorar. É a doçura d’Ela que nessa apreensão me atende”.

“Esperança… Minha esperança é Nossa Senhora, porque, se Ela não olhar para mim, estou perdido.”

E o pensamento me voltava: “Já que sois assim, salvai-me! pois estou arrasado”.

“A Vós bradamos, os degredados filhos de Eva”. Eu não sabia exatamente o significado de “degredados filhos de Eva”, mas entendia que tal expressão indicava uma situação muito infeliz, como aquela na qual me encontrava. “Estou nessa dificuldade sem saída”, pensava eu. “Esta é a oração para resolver o meu caso”.

“A Vós suspiramos, gemendo e chorando…” Veja! Eu inteiro sou um gemido. “… Nesse vale de lágrimas”. É isso! Estou nadando nas minhas próprias lágrimas.

“Eia, pois, advogada nossa…” Maria Santíssima não vai me julgar. Deus é o Juiz; Ela é minha advogada, que me defende em qualquer situação. Sinto que, se Ela estiver do meu lado, sou atendido.

“Esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”. Eu olhava para a imagem e tinha a impressão de que sorria para mim. Tranquilizava-me essa ideia: “Ela me acompanha do Céu, com seus olhos de Mãe misericordiosa. Isso vai dar certo!”

“E depois deste desterro, mostrai-nos Jesus, bendito fruto do vosso ventre. Quer dizer, após sair dessa difícil circunstância, no fim da vida verei Jesus. Realmente! Esta oração foi feita para mim”.

A partir daquele momento, minha devoção a Nossa Senhora se tornou mais fervorosa. E com o passar do tempo, pelo favor d’Ela, continuou a crescer.

Nunca deixemos de confiar n’Aquela que é nossa esperança

Baseado nesse meu exemplo pessoal, seja-me permitido ressaltar a necessidade de nutrirmos uma confiança sem limites e constante na bondade de Maria Santíssima, em todas as ocasiões, em todas as circunstâncias e de todos os modos, dizendo a Ela: “Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve!”

Ela é a nossa vida, porque, não fosse sua insondável misericórdia para conosco, estaríamos mortos. É nossa doçura, pois tudo quanto existe de doce em nossa existência nos vem pelo intermédio d’Ela. E a suavidade de Nossa Senhora para com seus filhos, ainda mesmo quando fracos e infiéis, é incomparável. Todas as formas materiais de doçura — a do mel, do açúcar, da brisa, ou a própria doçura dos corações maternos — não são senão pálida imagem dessa doçura das doçuras que vem a ser o Imaculado Coração de Maria, inundado da suavidade infinita de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Maria, vida, doçura, esperança nossa, salve. Esperemos sempre na intercessão d’Ela por nós, na sua misericórdia para conosco, com uma esperança invencível, pois quem possui tal Mãe, que de tal maneira induz os seus filhos a olharem para Ela, nunca pode deixar de esperar no seu maternal auxílio.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências em 6/5/1968 e 21/7/1990)

 

Profeta Jeremias: Um varão de dores

O Profeta Jeremias foi aquele que mais chorou a queda de Jerusalém e, profeticamente, a Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. Neste sentido, é um dos profetas mais cheios de tristeza e  de lamentações. Foi o profeta das lágrimas que melhor profetizou o pranto e a dor do Redentor e de sua Mãe Santíssima.

Não há profeta que possa ser tomado a sério se não for um varão de dores. Ele tem que sofrer, mas não como os outros, porque precisa ser um ponto de atração e de concentração das dores. Estas  confluem nele, e ele deve recebê-las e abraçá-las como Nosso Senhor abraçou a sua Cruz. O Profeta Jeremias abraçou esse sofrimento imenso para, de fato, realizar os desígnios da Providência.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 11/8/1967 e 16/9/1967)
Revista Dr Plinio 254 (Maio de 2019)

São Matias – Apóstolo da fidelidade

Houve um rombo no Colégio Apostólico, o mais doloroso da História: um Apóstolo traiu. O lugar ficava vazio e era preciso alguém que, por suas virtudes, reparasse junto à justiça divina o mal feito por Judas, tivesse de admirável tudo quanto Judas teve de abominável e fosse, portanto, um anti-Judas.

São Matias nos aparece, assim, como sendo o Apóstolo da fidelidade, do desapego, da honestidade, da lealdade. Talvez só no Juízo Final saberemos alguma coisa de sua vida. Então conheceremos como esse homem bem-amado de Deus e de Nossa Senhora realizou a tremenda missão de ser aquele que, pela luz de sua virtude, apagaria a mancha de Judas na História da Igreja.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 23/2/1966)

São Matias, Apóstolo Modelo de fidelidade, honestidade e desapego

Não obstante a breve referência que dele se faz no texto sagrado, a figura do Apóstolo São Matias sugere a Dr. Plinio o perfil de um “varão bem-amado de Deus”, suscitado pela Providência para, com o exemplo de suas virtudes, apagar a mancha que o discípulo traidor deixara na história da Igreja.

 

Como se sabe, São Matias foi escolhido por meio de um sorteio, para substituir Judas Iscariotes no colégio apostólico. Sobre ele podemos ler alguns comentários, primeiramente em Dom Guéranger, abade de Solesmes. Escreve este:

Pouco se sabe sobre São Matias. Somente que foi escolhido, após a Ascensão do Senhor, para substituir o traidor Judas Iscariotes. De acordo com uma antiga tradição grega, pregou o Evangelho na Capadócia e nas costas do Mar Cáspio e foi martirizado na atual Etiópia.

Alguns traços de sua doutrina foram conservados por São Clemente de Alexandria, entre eles uma sentença que parece ter sido característica desse apóstolo em sua pregação:“É preciso combater a carne e servir-se dela sem deleitá-la com culpáveis satisfações. Quanto à alma, devemos desenvolvê-la pela fé e pela inteligência”.

“Dom de Deus”

Outra biografia assim nos apresenta a pessoa e a vida do jovem Apóstolo:

Matias é nome freqüente entre os judeus e quer dizer “dom de Deus”. É o apóstolo que recebeu o dom do grande privilégio de ser agregado aos doze, tomando o lugar vago deixado pela deserção de Judas Iscariotes. Sua eleição foi mediante sorteio, após a Ascensão do Senhor, pela proposta de Simão Pedro, que em poucas palavras fixou os três requisitos para o ministério apostólico: pertencer aos que seguiam Jesus desde o começo, ser chamado e enviado: “É necessário, pois, que, destes homens que nos acompanharam durante todo o tempo em que o Senhor Jesus viveu no meio de nós, a começar pelo batismo de João até o dia em que nos foi arrebatado, haja um que se torne conosco testemunha de sua ressurreição”.

Espectador da vida e obra de Jesus

Matias esteve, portanto, constantemente próximo de Jesus desde o início até o fim de sua vida pública. Testemunha de Cristo e mais precisamente da sua ressurreição, pois a ressurreição do Salvador é a própria razão de ser do cristianismo. Matias, portanto, viveu com os onze o milagre da Páscoa e poderá com todo o direito anunciar Cristo ao mundo, como espectador da vida e da obra de Jesus “desde o batismo de João”.

Também as segunda e terceira condições — ser divinamente chamado e enviado — estão claramente expressas pela oração do colégio apostólico: “Senhor, tu que conheces o coração de todos, mostra qual destes dois escolhestes”.

A eleição de Matias por sorteio pode nos causar espanto. Tirar a sorte para conhecer a vontade divina é método muito conhecido na Sagrada Escritura. A própria divisão da Terra Prometida foi mediante sorteio, e os Apóstolos julgaram oportuna a conformidade com esse costume. Entre os dois candidatos propostos pela comunidade cristã — José, filho de Sabá, cognominado o Justo, e Matias — a escolha caiu sobre o último. O novo Apóstolo, cujo nome brilha na Escritura somente no instante da eleição, viveu com os onze a fulgurante experiência de Pentecostes antes de se encaminhar, como os outros, pelo mundo afora a anunciar “a glória do Senhor”.

Nada se sabe de suas atividades apostólicas, nem se morreu mártir ou de morte natural, pois as narrações a seu respeito pertencem aos escritos apócrifos. À tradição da morte por decapitação com machado se liga o seu patrocínio especial aos açougueiros e carpinteiros(1).

Atraente e intuída personalidade

Essas curtas descrições nos levam a  imaginar o que poderia ter sido a pessoa e a vida de São Matias. Quem era ele, afinal?

A narração do Evangelho, em geral sucinta, nos revela diversas personalidades, das quais o texto diz muito pouco, mas, pela natureza da missão delas, nos é dado delinear o perfil que tinham. Então, a respeito delas, adivinha-se algo que é quase mais saboroso em sua intuição do que nos traços biográficos propriamente ditos.

Tal se verifica, por exemplo, com a figura de São José. Deste só conhecemos a missão que lhe foi confiada e a correção com que a desempenhou. Entretanto, a respeito da sua personalidade, na letra sagrada, há apenas a afirmação de que era um varão justo. Nada mais. Ora, há mil coisas que se pode adivinhar dele, pelo simples fato de ter sido esposo condigno de Nossa Senhora, escolhido pela Providência, com a conseqüente paridade em relação à esposa que o perfeito casamento exige. Portanto, de São José compreendemos coisas indizíveis, embora não o revele a narração evangélica.

Aquele que apagou a mancha deixada pelo traidor

Imaginemos, então, quem foi São Matias.

Uma imensa lacuna se produzira no colégio apostólico. E o mais doloroso da história de todos os tempos: essa lacuna foi causada por um apóstolo traidor, que prevaricou a troco de dinheiro. O lugar dele ficou vazio, e era preciso alguém que, por suas reconhecidas virtudes, reparasse perante a justiça Divina o mal praticado por Judas Iscariotes. Necessário se fazia que o escolhido fosse um “anti-Judas”, alguém excelente na linha em que aquele foi péssimo, um homem que se demonstrasse admirável em tudo quanto Judas se mostrou abominável e execrável.

Assim, através dessas características, nos aparece São Matias, o discípulo da fidelidade e do desapego, o apóstolo da honestidade e da lealdade.

Um comentário a respeito dessa sentença que lhe atribuem: “É preciso combater a carne e servir-se dela sem deleitá-la com culpáveis satisfações. Quanto à alma, devemos desenvolvê-la pela fé e pela inteligência”. Por bela que seja, essa afirmação não rompe inteiramente o silêncio que pesa sobre São Matias. De maneira que, acredito, somente no Juízo Final provavelmente saberemos algo sobre a vida dele. Então conheceremos como terá sido de fato esse varão bem-amado de Deus, que realizou a extraordinária missão de ser aquele que, pela luz de sua virtude, apagaria a mancha de Judas na história da Igreja.

 

(Extraído de conferência em 23/2/1966)

 

1) Um santo para cada dia, Editora Paulus, 406 páginas.

Diante de Fátima, duas famílias de almas

Ante as afirmações, de uma grandeza apocalíptica, feitas por Nossa Senhora aos três pastorinhos de Fátima em 1917, o mundo vai se dividindo cada vez mais em duas famílias de almas. Uma considera que a humanidade é presa de um feixe de erros e iniquidades, as quais começaram na esfera religiosa e cultural com o humanismo, a Renascença e a Pseudo-Reforma protestante. Tais erros se agravaram com o iluminismo e o racionalismo, culminando na esfera política com a Revolução Francesa. Do terreno político passaram para o campo social e econômico, no século XIX, com o socialismo utópico e o socialismo dito científico.

Com o advento do comunismo na Rússia, toda essa congérie de erros passou a ter um começo de transposição, incipiente, mas maciça, para a ordem concreta dos fatos, nascendo daí o império comunista, desde o coração da Alemanha até o Vietnã, e cuja unidade é indiscutível. Ao mesmo tempo, sobretudo a partir da Grande Guerra, a moralidade se pôs a declinar com rapidez espantosa no Ocidente, preparando-o para a capitulação ante o comunismo, o qual é a mais audaciosa expressão doutrinária e institucional da  amoralidade. Para incontáveis almas de todos os estados, condições de vida e nações, que adotam este modo de pensar, a mensagem de Fátima é tudo quanto há de mais coerente com a Doutrina  Católica e com a realidade dos fatos.

Há também outra família de almas para a qual os problemas do mundo contemporâneo pouca ou nenhuma relação têm com a impiedade e a imoralidade. Nascem eles exclusivamente de  equívocos involuntários resultantes de carências econômicas, e que uma boa difusão doutrinária e um conhecimento objetivo da realidade podem dissipar. Com o auxílio da ciência e da técnica a  crise da humanidade se resolverá. Não havendo, como nota tônica das catástrofes e dos perigos em meio aos quais nos debatemos, o fator culpa, a noção de um castigo universal se torna  incompreensível.

Entre essas famílias de almas há muitas gamas. À medida que qualquer das correntes intermediárias se aproxima de um polo ou de outro, para ela se vai tornando compreensível ou  incompreensível a mensagem da Santíssima Virgem. Fátima se encontra, pois, neste sentido, como um verdadeiro divisor de águas das mentalidades contemporâneas.

Dar-se-ão os acontecimentos previstos em Fátima, e ainda não realizados até aqui? Em princípio, não há como duvidar. Pois o fato de uma parte das profecias já se haver realizado com  impressionante precisão prova o caráter sobrenatural delas.

Sobreleva notar que, na Cova da Iria, Nossa Senhora formulou duas condições, ambas indispensáveis para que se desviassem os castigos com que Ela nos ameaçava: a consagração da Rússia ao  seu Coração Puríssimo e a divulgação da prática da Comunhão reparadora dos cinco primeiros sábados.

Há ainda outra condição, implícita na mensagem, mas também indispensável: a vitória do mundo sobre as mil formas de impiedade e de impureza que o vêm dominando. Tudo indica que esta  vitória não foi alcançada e, pelo contrário, nos aproximamos cada vez mais do paroxismo nesta matéria. E à medida que caminhamos para esse paroxismo, mais provável se vai tornando que  rumemos para a efetivação dos castigos.

A não serem vistas as coisas assim, a mensagem de Fátima seria absurda. Pois, se Nossa Senhora afirmou em 1917 que os pecados do mundo haviam chegado a tal cúmulo que clamavam pelo  castigo de Deus, não pareceria lógico que esses pecados continuassem a crescer, o mundo se recusasse obstinadamente e até o fim a ouvir o que lhe foi dito em Fátima, e o castigo não viesse.

Desde que não se operou no orbe a imensa transformação espiritual pedida na Cova da Iria, vamos cada vez mais caminhando para o abismo, e aquela transformação se vai tornando sempre mais  improvável(*).

 

* Cf. Bifurcação do mundo, em Última hora, 4/6/1982.

SANTOS JACINTA E FRANCISCO, modelos de aceitação do sofrimento

Vinte de fevereiro, dia da morte de Jacinta Marto, foi a data escolhida pelo Papa João Paulo II para que a Igreja celebrasse a festa da jovem pastora de Fátima e do seu irmão, Francisco, aos quais Nossa Senhora apareceu em 1917. Ao recordar essa piedosíssima morte, Dr. Plinio teceu valiosos comentários sobre o papel do sofrimento na existência humana.

Como se sabe, dos três videntes, dois morreram pouco depois das aparições, conforme a promessa da Santíssima Virgem: Francisco e Jacinta. Ambos deviam ir para o Céu. Antes disso, porém, haveriam de cumprir nesta Terra duas missões diferentes. A de Jacinta era rezar e sofrer pela conversão dos pecadores, enquanto a de Francisco consistia numa reparação ante a tristeza de Nosso Senhor e de Nossa Senhora pelos pecados do mundo, que tinham motivado a mensagem de Fátima.

A importância do sofrimento humano nas grandes obras de Deus

A missão de Jacinta nos revela a necessidade de vítimas expiatórias que contribuíssem com a sua dor e o sacrifício de sua vida — as duas crianças morreram em circunstâncias  extraordinariamente difíceis e dolorosas — para que as palavras de Nossa Senhora encontrassem terreno fértil nos corações dos homens, dando todos os frutos por Ela desejados.

Compreende-se, pois, como esse apostolado do sofrimento é verdadeiramente insubstituível, e como abre os caminhos para a Igreja. Todas as grandes obras de Deus, máxime as que tratam da salvação das almas, em geral se fazem com a participação de outras almas que lutaram, sofreram e rezaram para que essas obras de fato se realizassem. Sempre é preciso a participação do  sofrimento humano.

Sem ele, nada de grande se faz.

Certa vez, um talentoso pintor expôs um de seus quadros que retratava Nosso Senhor como Bom Pastor batendo à porta de uma choupana. A pintura, tocante e piedosa, atraía muitas atenções. Em determinado momento, um visitante julgou notar um defeito no quadro, e disse ao artista: “O senhor cometeu um erro de execução, pois a porta dessa cabana não tem fechadura”. Sorrindo, o pintor lhe respondeu: “É verdade. Isto, porém, não foi um erro. Esta porta simboliza a porta do coração humano, onde Nosso Senhor vem bater. Ela não possui fechadura no lado de fora, mas somente no de dentro, para significar que há certos tipos de abertura de alma onde ninguém consegue intervir: ou a alma toma a iniciativa de se abrir, ou permanecerá fechada”.

Ora, o modo de se obter que as almas fechadas se abram é exatamente por meio da oração, dos sacrifícios e das dores que a Providência dispõe em nossas vidas. É por meio do carregar  amorosamente a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, compreendendo que assim se cumpre a superior vontade divina. Essas são as almas decisivas na História, e que levam a cabo as grandes obras
de Deus.

Claro está que não se trata de um sofrer meramente passivo, mas também de um sofrer ativo. O que significa muitas vezes tomar a iniciativa da luta, rompendo  com aqueles que prejudicam nossa alma.

Significa arrostar a opinião dos outros, aceitando ser posto em situações difíceis e contrafeitas. Significa, enfim todo o sofrimento da batalha mais intrépida, mais ousada e mais repleta de determinação. Tudo isso é sofrer, e até sofrer por excelência.

O contrário do mito do “happy end”

Não nos esqueçamos, porém, de que, se todas as formas de sacrifícios são agradáveis a Nossa Senhora, o que mais deseja Ela receber dos homens é virtude. Acima dos sofrimentos, Lhe compraz oferecermos a Ela a retidão e a pureza de nossa alma. Se quisermos de fato pesar nas deliberações da Providência, devemos apresentar a Ela almas contritas e humilhadas, almas que se tornem pequenas diante de Deus, renunciando a toda forma de orgulho, vanglória e vaidade, para se mostrarem diante d’Ele como realmente são. Reconhecendo a sua própria impotência, pelas vias naturais, para corrigir os seus defeitos; e, portanto, implorando o auxílio de Maria, para que Ela por nós interceda e nos alcance a tão esperada conversão.

E isto exatamente nos é dito pelo sacrifício de Jacinta. Devemos, portanto, pedir a ela que nos obtenha de Nossa Senhora esse senso de sofrimento, indispensável para que qualquer católico seja verdadeiramente um fiel generoso e dedicado.

Essa aceitação da cruz é contrária ao mito do homem moderno, que se reflete na mentalidade do “happy end”, segundo a qual tudo é alegria, tudo é luz, e o padecimento é uma espécie de bicho de  sete cabeças irrompendo estouvadamente na vida das pessoas.

A verdade é outra: uma existência sem cruzes, pouco vale. São Luís Grignion de Montfort chega mesmo a afirmar que, vendo-se alguém poupado pelos sofrimentos, deve — após judiciosa  orientação de seu diretor espiritual — pedi-los a Deus, fazer romarias e rezar com empenho nessa intenção, pois sua salvação eterna pode estar correndo um risco não pequeno.

Mais do que nunca, a necessidade de sacrifícios

Análogas considerações poderiam ser feitas a propósito da missão de Francisco, isto é, a de reparar os Sacratíssimos Corações de Jesus e de Maria pelos pecados e ofensas contra Eles cometidos na face da Terra.

Ora, de 1917 até nossos dias, a maré montante dos pecados não fez senão crescer de modo incomensurável: pecados individuais, pecados públicos, pecados das nações, pecados das instituições, etc.

Tal constatação nos obriga a concluir que, se a ofensa cresceu, a reparação também se faz mais necessária e mais intensa no que ela tem de mais excelente, ou seja, alimentar em nossas almas a indignação pelos ultrajes que são feitos ao Coração Imaculado de Maria; acrisolar nosso desejo de sermos instrumentos de Nossa Senhora para a implantação de seu Reino sobre a Terra.

Devemos pedir ao Francisco que nos obtenha esse espírito, esse ardoroso anelo de assim reparar o Coração Imaculado de Maria e, por meio d’Ele, o Coração Sagrado de Jesus.

Plinio Corrêa de Oliveira

 

Frescor de alma na espera

Durante uma longa espera de algo que se deseja muito, por vezes ocorre o seguinte: primeiro, um susto por não ter recebido; depois a vontade aumenta e não só se vence o espanto, mas o desejo se multiplica pelo desejo, a ponto de se tornar abrasado. Quando não se recebe ainda, a situação passa além de todo meridiano e fica-se com uma vontade por assim dizer trans sonora que canta diante de Nossa Senhora continuamente a súplica daqueles que emudeceram de tanto querer.

Neste caso estão aqueles que há muitas décadas anseiam pela realização das promessas de Fátima. Só se pode encontrar um paralelo para isso: é dos homens que vão esperar a vinda de Nosso Senhor no fim do mundo, dos quais está dito que se esses dias não fossem abreviados, nem eles perseverariam.Esses sofrerão tanto com a espera que, segundo alguns intérpretes das Sagradas Escrituras,serão poupados da morte, tal o tormento deles e tal o desejo de Deus de glorificá-los por terem passado por um sofrimento equivalente à morte.

Nós passamos propriamente pela prova da espera porque se tivéssemos, de um momento para outro,a declaração de que o desejo será realizado em tal data, nós exultaríamos e reverdejaríamos. Porém, Nossa Senhora não nos comunica isso.

Para a espera ser assim premiada é preciso que seja perfeita. E a espera perfeita não é apenas a que chega até o dia da realização da promessa, mas sim aquela na qual a alma arde mais ou menos como a sarça ardente vista por Moisés, a qual o fogo queimava sem destruir.

É preciso que a alma seja queimada pelo desejo da vinda dos acontecimentos e pelo tormento da espera, sem perder com isso nada de seu verdor, de sua indestrutível juventude. Espere com o frescor de alma do primeiro momento, de maneira que as sucessivas desilusões não crestem a alma.

Como fazer para que a espera não nos creste a alma? Ser incondicional com Deus no modo de esperar.

Há dois modos de se colocar diante da eventual proximidade do cumprimento das promessas. Um é o de quem diz: “Virá, e eu não tolero a ideia de que não venha logo”. Neste caso, se não vier, a alma cresta um pouco.

Outro é: “Virá, e é provável que seja em breve, certeza não tenho. Porém, de Deus tolero tudo, porque Ele é meu Senhor. Ele e minha Mãe celeste dispõem de mim como quiserem. Se dispuserem outra delonga, eu a bendirei e andarei com paz nas sombras da demora, certo de estar fazendo a divina vontade”.

Assim o frescor da alma até se revigora, por ser o fruto da obediência incondicional.

Contudo, se alguém receia já não ter conservado esse frescor de alma, poderá dirigir a Deus esta oração:

“Meu Deus, não aceitei de Vós o caminho que passava pela inteira obediência. Deixai-me ao menos aceitar a via que passa pela punição justa. Adoro vossa infinita perfeição enquanto tendo me castigado, pois eu merecia. Mas Vós me destes por Advogada a Mãe de Misericórdia. A Ela eu suplico que tenha pena de mim, ‘desencrespe’ minha alma e a restaure.”

Com isso poderemos nos revigorar, pois para os que tiverem qualquer grão de esperança haverá sempre uma enorme possibilidade de salvação.

Peçamos a Nossa Senhora que nos dê esse grau de esperança flexível e íntegra que nunca se cansa nem se cresta; essa contrição perfeita que adora o castigo, a intransigência e a repulsa de Deus, mas recorre confiante à Mãe de Misericórdia