Admiração: nossa estrela de Belém

O substrato mais profundo da retidão de alma é o gosto de admirar.

O homem que passa a vida procurando admirar, amar e servir a virtude e a santidade encontra nisto o seu prazer e a sua alegria. Assim, ele sente mais deleite em estar numa choupana ou num leprosário conversando com um verdadeiro santo, do que em habitar num lugar esplendoroso, em meio aos pecadores.

A admiração nos guia e faz intuir o nosso caminho, dando-nos a capacidade de esperar, com calma, diante das desventuras mais pasmosas, porque a admiração é a nossa estrela de Belém.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 18/6/1986 e 10/7/1994)

Nunca abandonar a oração!

Deus não ouve a prece do pecador” — é a desalentadora justificativa que uma pessoa provada poderia alegar para não seguir a máxima de Santo Afonso de Ligório, segundo a qual jamais devemos deixar de rezar. Em outro destacado trecho de seus comentários ao livro “A oração, grande meio da salvação”, Dr. Plinio nos ensina como vencer esse perigoso escolho na vida espiritual.

No espírito de muitos católicos se encontra subjacente uma séria objeção quanto à eficácia da oração do pecador. Não há mistério no fato de Deus atender as súplicas de uma alma reta, posto estar Ele em boas relações com os justos. Compreende-se que uma pessoa poderosa, mantendo bom  relacionamento com outra que lhe é inferior, seja propensa a satisfazer os pedidos dessa última.

O mistério, porém, começa a aparecer quando se trata das preces do pecador, pois este simplesmente não merece ser atendido: seja por se achar em estado de pecado mortal, ou porque, inconstante na vida espiritual, várias vezes se mostra infiel e não costuma corresponder bem à graça. Então, por que Deus há de atender às orações dele?

Dúvida corroborada pela Sagrada Escritura?

Claro, o problema se põe de forma mais aguda se considerarmos a fealdade do pecado mortal, o horror que Deus tem a essa falta grave e a quem a comete, impondo-se a pergunta: como alguém nesse estado esperará a benevolência divina em seu favor? Pode-se compreender facilmente que Deus, por um ato de sua vontade, queira acolher os rogos do pecador.

Mais difícil é, porém, compreender que o pecador possa ter a certeza de que o Senhor queira ouvir sua oração.

A posição razoável de um pecador diante de Deus pareceria ser esta: “Eu O ofendi, e não sei o que Ele fará, já que de vez em quando Ele atende alguns pecadores. Então, vou jogar também a minha ficha na roleta e tentar a sorte rezando alguma coisa. Deus me será propício, conforme esteja ou não de boas. Cabe a mim reconhecer a prerrogativa d’Ele de não me atender, pois eu pequei. O contrário seria afirmar que o pecador tem o direito de ser escutado por Deus, e não sei em que se basearia esse direito numa pessoa em estado de pecado mortal”. Para corroborar essa incerteza,  lemos frases terríveis da Escritura, mencionadas por Santo Afonso de Ligório.

Primeiro, uma do Evangelho de São João: “Deus não ouve o pecador” (Jo 9,31). Outra, mais séria, em Isaías: “Quando estenderdes as vossas mãos, apartarei de vós os meus olhos; e quando   multiplicardes as vossas orações, Eu não as atenderei” (Is 1,15). E do livro dos Macabeus: “Este celerado orava ao Senhor do qual não há de alcançar misericórdia” (Mac 9,13).

Ora, ao ler essas frases, a conclusão parece ser a seguinte: “Se estou em estado de pecado mortal, sou um celerado que reza para Deus e não alcançará misericórdia”. A muitas almas o problema se põe nestes termos pavorosos, e é assim que o devemos tratar nessa exposição.

Deus não desampara o que deseja se salvar

Com base em São Tomás e em outros Doutores, Santo Afonso de Ligório — ele mesmo um Doutor de grande autoridade — interpreta as frases da Escritura acima citadas. É verdade, diz ele, que Deus não ouve o pecador, porém quando se trata do faltoso que pede algo necessário para a realização do seu pecado. A situação é diferente se imaginarmos um pecador que deseje se emendar, mas tem apenas uma veleidade de se salvar… A partir desse ponto inicial, ele fará umas orações para mudar de vida, marcadas por veleidades.

Apesar de todos os pecados, infidelidades, ingratidões e imperfeições, se no ponto inicial ele tiver esse anseio orientado para a salvação, ainda que débil, a oração será atendida porque agrada a Deus.

É preciso analisar bem qual é o alvo da oração, para poder classificá-la. Aprofundando sua explicação, Santo Afonso de Ligório continua: quem está rezando para se salvar, ainda que faça uma oração tíbia, pode estar certo de que Deus não o abandonou, pois sua súplica só pode ter sido inspirada por Ele. Por pior que seja a pessoa, se ela faz um pedido tão meritório é porque em alguma fímbria de sua alma existe esse anelo de ser boa. Se está desejando, é porque em certo sentido vê a Deus e, portanto, Ele não a abandonou.

Com muito acerto, salienta Santo Afonso que Deus não nos dá desejos inúteis. Sabemos pela Fé ser impossível alguém pedir a própria salvação e santificação sem uma inspiração divina. Ora, seria burlesco da parte de Deus inspirar tal pedido, se de antemão Ele resolveu não atender nem santificar aquele que o faz. É impossível, Deus não age assim.

Basta, portanto, ao pecador ter um remoto, longínquo vislumbre de vontade de se santificar e rezar nessa intenção, para estar seguro de que Deus o atenderá. Quanto mais rezar, mais dons do Céu obterá. Havendo uma longa perseverança, ele acabará recebendo de Deus graças extraordinárias e se salvará.

A questão é não deixar de rezar. Santo Afonso de Ligório emprega uma imagem que eu gostaria de transformar em quadro, se soubesse pintar: um abismo sobre o mar, com todos os horrores imagináveis e uma pessoa suspensa por um fio, acima do precipício. Esse fio é a oração. Enquanto ele permanece ligado, há esperanças; caso contrário, a pessoa pode ter certeza de estar se  isolando e se distanciando de Deus.

Nessa ordem de idéias, há outra consideração mais profunda. Até mesmo quem pára de rezar é comparável ao arbusto partido e à mecha que ainda fumega. Assim, enquanto a pessoa viver, Deus lhe concede a graça de querer rezar. Se ela corresponder, o resto vem por si, pois a Providência a auxilia.

Na verdade, tudo se cifra em nunca parar de pedir a própria salvação e santificação.

E fazê-lo com importunidade. Como já vimos em anterior exposição, Santo Afonso de Ligório insiste nesse ponto: Deus quer ser importunado pelas nossas preces, que Lhe serão tanto mais agradáveis quanto mais persistentes. O homem que reza dessa forma pode esperar muito de Nosso Senhor.

Aquele que, por desconfiança da bondade divina ou por qualquer outra razão (como negligência ou preguiça) não puxa a corda da importunidade, pode não ser atendido conforme deseja.

O regime da misericórdia e o da justiça

Desenvolvendo agora mais um aspecto da nossa pergunta inicial, importa saber porque Deus age razoavelmente  atendendo à oração do pecador.

A resposta se filia a outra questão muito simples: por que Deus, depois do primeiro pecado mortal, não tira a vida do pecador, mas permite-lhe passar por um período de provas? Para determinar a solução do problema, devemos recorrer a uma ordem de considerações que diz respeito à diferença entre o ato de vontade do anjo e o do homem.

São Tomás de Aquino explica que a vontade angélica, por natureza, adere ao objeto apetecido, de maneira inamovível, ao passo que a humana o faz de modo movível. Assim, uma vez tendo se decidido por algo, o anjo não volta atrás. Donde, cometido o primeiro pecado, é natural que o anjo fosse precipitado no inferno.

Com o homem, porém, em virtude da natureza variável de seu ato de vontade, não se dá o mesmo. Deus benignamente contemporiza com ele, proporcionando-lhe outras oportunidades, porque conserva em relação ao homem uma solicitude e um amor — por assim dizer — suspensos pelo pecado, mas não destruídos na sua raiz.

Agindo dessa sorte, Deus é como um pai que não se decide a expulsar de casa o filho que lhe dá muitos dissabores. Poderá até castigar o rebento ruim, mas se não o rechaça, é porque conserva intactos uma certa raiz de boa vontade para com ele, e um certo lado por onde ele ama o filho, pois há uma probabilidade de este se converter.

Sim, Nosso Senhor mantém de pé esse ato de amor em relação a todos  os homens vivos neste mundo, e está disposto, a todo momento, a torná-lo efetivo, por pouco que nos voltemos para Ele.

Entretanto, esse regime cessa no momento da morte: a misericórdia termina e começa a hora da justiça. Enquanto isto não acontece, estamos no regime e na era da clemência. Deus Nosso Senhor ampara o homem, e é razoável que o faça.

Então, não será árduo entender que, na economia normal da Providência, toda pessoa possui razões para ter confiança, estando viva. A ideia do indivíduo abandonado, que nem sequer rezando obtém o que pede, é de fundo calvinista. A noção de um destino que se realiza independentemente da vontade humana, não é católica e deve ser banida do nosso subconsciente.

Se estamos vivos corporalmente, temos a possibilidade de readquirir a vida da alma. Em conseqüência, sempre vemos aberta diante de nós a porta da esperança. E ainda que pecador, o homem pode confiar na sua conversão e emenda, com a alegria de se saber vivendo no regime de um Deus bom, que o ouvirá tão logo se volte para Ele.

A confiança, condição para vencer o desespero Essa disposição de alma se faz mais necessária nesta época em que a vida espiritual está mudando sob o signo do desespero. À medida que a existência moderna, com seus horrores, torna-se mais difícil para todo o mundo, as pessoas vão tendo cada vez mais atitudes próximas ao desespero, e vai se multiplicando o número de homens com uma espécie de tendência natural malévola de desconfiança em relação a Deus. Não querem contas com Ele: “Deus é um e eu sou outro. Eu me arranjo por mim, não tenho pacto de amor nem de amizade com Deus. Ponha-se Ele do seu lado como entender; eu vou me arranjar por mim”.

Almas assim têm quase uma espécie de raiva da misericórdia de Deus, a ponto de, às vezes, até não gostarem que outros rezem por elas, pois  não desejam sequer se servir de um guincho para sair de seus problemas espirituais.

Quantos desses espíritos rebarbativos ainda acreditarão na misericórdia, quando chegar o momento de a justiça divina se manifestar? E quantos terão confiança na bondade de Deus, de modo a suportar todos os sofrimentos com a convicção de que, no fim, tudo acabará dando certo? Tenho a impressão de que só os confiantes poderão atravessar essa época de caos e desespero. Quem não confiar, enfrentará muita dificuldade, devido a esse pessimismo espiritual decorrente de um pessimismo em relação à vida temporal.

Nesse sentido, recordo-me de um fato que se deu comigo há certo tempo, e que me causou não pequena impressão. Ao sair da faculdade em que dera aula, tomei um táxi de volta para casa e disse ao chauffeur (pessoa, aliás, inteligente): “Vamos para a Rua Alagoas, 350”. Ele respondeu: “Já sei”. Quando indiquei o melhor caminho a tomar, ele me atalhou: “Já seeei, já seeei…”

Fiquei quieto. Ele continuou: “Eu não prestei atenção em quem entrou no automóvel, mas o reconheci pela voz, porque eu fui pegar o senhor em tal noite de Natal, na Rua Alagoas, 350. Levei-o para assistir à Missa do Galo nas Perdizes. Além disso, o senhor vai muito a uma casa da Rua Martim Francisco, de onde, às vezes, eu o conduzo para a sua residência. Era um chauffeur de um ponto das vizinhanças. Para ser amável, fingi que também o reconhecia, e lhe perguntei-lhe:

— Como é que você vai?
— Eu vou mal! Sou diabético. Era tratado por um ótimo médico, mas ele morreu e não me cuidei mais. Agora como de tudo, sem me preocupar com regimes.— Não faça isso, é um absurdo!
— O que vai acontecer?
— Você vai morrer!
— Esta vida é tão horrível… Deixa eu morrer de uma vez. Eu como à vontade.

Com essas palavras ele queria dizer: “A vida é tão horrorosa, que o único prazer que tenho é a gastronomia. Então é melhor aproveitar este deleitezinho e depois morrer, do que continuar vivendo”.

Para assustá-lo, disse-lhe que isso era contra a caridade que se deve ter para consigo mesmo. Não adiantou.

— Você ficará cego! — insisti. Conheço casos de diabéticos que acabaram perdendo a visão.

Ele aí se assustou e resolveu consultar outro bom especialista.

Premunir-se contra o pessimismo por meio da oração

O estado de espírito desse chauffeur é bem característico e freqüente nessa época contemporânea: “Vivo para gozar. Enquanto houver um pouquinho de prazer na vida, quero devorá-lo. Suprimido esse pouquinho, já não me interessa viver. Contudo, se há possibilidade de eu ficar cego e a minha existência piorar, então to tomo providências, porque senão seria uma tragédia.” Ora, hoje em dia as almas precisam se premunir muito contra esse pessimismo, compreendendo bem que, apesar de todas as aparências em contrário e dos horrores em que  estamos, Deus é bom, e a vida  terrena pode dar certo, pelo menos na perspectiva do Céu. E se ela tem  sentido em ordem à bem-aventurança eterna, não é preciso mais nada, pois o Céu explica tudo.

Assim, devemos viver com alegria e coragem. Mas, essas disposições não se alcançam sem a oração. Se  não houver a prece perseverante, insistente, confiante, dando-nos sempre esperança,  ficamos entregues às catástrofes interiores, crises nervosas, pavores, psicoses… Este é, realmente, um dos pontos mais importantes a serem meditados no ensinamento de Santo Afonso de Ligório.

O obelisco do Vaticano

Sobre diversos monumentos da Cristandade, o dedo de Deus como que pousou e os revestiu de charme. Diversas vezes, o charme que neles notamos não é senão a própria manifestação da graça divina. Isso transparece de modo mais admirável, a meu ver, no obelisco da Praça de São Pedro. Posto na areia do deserto ou perto de uma pirâmide, na entrada de um templo ou ao lado da esfinge de Gizeh, ele não causaria a impressão que nos causa junto à Basílica do Vaticano. Perto daquele obelisco, minha alma sente uma reverência à pessoa do Papa, ao trono do Príncipe dos Apóstolos.

O Vigário de Cristo é o obelisco da Igreja Católica. O lema dos cartuxos “stat Crux dum volvitur orbis” (“a Cruz permanece firme enquanto o mundo gira”) bem poderia estar inscrito na base do obelisco, porque é a sensação que ele transmite: a de um centro em torno do qual a Terra gira, mas que fica imóvel. É a Igreja infalível, eterna, representada pelo Sumo Pontífice. Está tudo dito.

Plinio Corrêa de Oliveira

Como nas Bodas de Caná

Coração Sapiencial e Imaculado de Maria, se considero minhas insuficiências e infidelidades, tenho todos os motivos para estremecer.

Mas me refugio na vossa misericórdia como a criança faltosa nos braços de sua mãe.

Eu me ofereço todo a Vós para que leveis a cabo em mim a obra que eu mesmo jamais conseguiria executar. Fazei de mim um perfeito escravo vosso.

Aceitai, ó Mãe dulcíssima, minhas fraquezas e até as minhas faltas, e obtende que umas e outras se transmudem em virtudes como obtivestes que a água se mudasse em vinho nas Bodas de Caná.

Oh, minha Mãe, aqui está um filho pecador, infiel e ingrato. Mas dizei uma só palavra e se operará a mudança fundamental que fará de mim um verdadeiro filho vosso. Assim seja.

(Composta em 14/1/1968)

Plinio Corrêa de Oliveira

Expressão do glorioso triunfo de Cristo

Notre-Dame de Paris. Diante dela, às vezes emudecemos de admiração. A catedral é bela em cada um de seus pormenores. Se considerarmos os três portais do primeiro pavimento do edifício, vemos lindíssimos arcos ogivais, profundos, indicando bem a espessura das paredes. Em cada portal, ao longo de toda a espessura, de um lado e de outro, aparecem esculpidos episódios da História Sagrada. Na parte de cima, uma fileira de imagens de reis do Antigo Testamento.

Para se ter ideia de como a catedral é esplêndida nos seus vários pormenores, imaginemos que não existisse a parte superior, acima das imagens dos monarcas. Ainda seria um bonito monumento. Ou pensemos num edifício formado pela grande ogiva central, pelas duas laterais e as menores que estão em cima, constituindo uma espécie de colunatas de esguias, delicadas e entrelaçadas ogivas: sem dúvida comporiam uma belíssima fachada lateral de qualquer igreja.

Imaginemos, ainda, cada uma das pontas de torre transformada num oratório e posta no solo. Seria lindo! Na catedral, aparecem como três belezas superpostas. Mas o tato francês, o tal “charme mais belo que a beleza”, os fez sentir que, isolados, algo ficaria faltando. Então, atrás ergue-se uma cúpula e, no alto desta, uma flecha. A famosa flecha de Notre-Dame que confere o arremate, o toque de leveza, de graça, de grandeza, às torres que não foram acabadas.

Com efeito, no projeto original essas torres elevar-se-iam mais alto. Porém, o estilo gótico esmoreceu sob o sopro da Renascença e do Humanismo. Em conseqüência, as torres de Notre-Dame ficaram limitadas ao tamanho que têm hoje, embora repletas de encanto e de beleza.

A meu ver, uma muito agradável impressão que se tem ao contemplar a catedral resulta do contraste entre a altura e a largura. Ela é esguia, muito mais alta do que larga, mas não pode ser chamada de um edifício frágil. Graciosa, leve, possui entretanto um quê de fortaleza, absolutamente incontestável, falando-nos da plenitude do espírito da Idade Média: hierático, sacral, hierárquico, ordenado, todo voltado para o que há de mais alto, em que a maior seriedade se compagina bem com a graça mais suave e com a delicadeza mais extrema. Tal se nota, por exemplo, nas colunas e nos vitrais.

Numa palavra, os mais belos aspectos da alma católica aparecem a todo propósito, em todos os ângulos da catedral.

E eu me pergunto: é ou não verdade que, ao nos maravilharmos com Notre-Dame, temos também a impressão de que cenas desenroladas ali ainda permanecem vivas? E que, do alto do lugar onde está entronizada, a imagem de Nossa Senhora — cuja cabeça tem como auréola a própria rosácea central — sorri para os seus filhos que transitam pela praça?

Sim, um sorriso que manifesta o contentamento da Virgem Santíssima com uma Cristandade que, afinal, era e ainda é o reino do Filho d’Ela. E, de fato, há qualquer coisa da glória da Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo no ar triunfal da Catedral de Notre-Dame de Paris.

(Extraído de conferência em 11/1/1989)

Onde o Arcanjo um dia pousou…

O Tibre, o velho rio Tibre, corre suavemente por uma das mais pitorescas zonas da Cidade Eterna. Em suas águas tranquilas, deixa refletir os arcos de uma robusta ponte e a silhueta de uma construção monumental, conferindo particular beleza a esse cenário romano.

A ponte, de linhas fortes e traçado muito lógico, foi feita para resistir às vicissitudes e desgastes dos séculos. Nas margens onde ela toca cresce uma vegetação nascida ao léu, com um certo espontâneo e desordenado que a tornam ainda mais atraente. Ao longo de suas balaustradas se erguem, em intervalos regulares, imagens de santos e de anjos, diante das quais os fiéis costumam rezar, enquanto se dirigem para aquele grande edifício que se espelha no Tibre. Esses peregrinos vão visitar o Castelo Sant’Angelo.

Os antigos imperadores romanos, pagãos, tinham o hábito de preparar monumentos nos quais deveriam ser enterrados. Por suas características arquitetônicas, esses mausoléus procuravam imortalizar o César ali sepultado.

Mais que um túmulo, era uma glorificação à memória do homem que, por tempo maior ou menor, governara os destinos de Roma e de seus vastos domínios. Um desses perpetuados foi o imperador Adriano, cujos restos mortais descansariam para sempre no monumento que ele mandou construir, próximo às plácidas águas tiberinas.

Na época imperial chamava-se “Mole Adriana”, nome bastante adequado se considerarmos tratar-se de um edifício de grandes e sólidas proporções. De diâmetro colossal, ele impressiona pelo sério, pelo compacto, pelo imenso. É uma afirmação do poder quantitativo, qualitativo e ordenativo de Roma, bem como de seu incontestável domínio sobre extensa parcela do mundo.

Porém, com o passar dos séculos, os ossos desse Adriano se desfizeram e dele nada sobrou. A história não o celebra, apenas o registra, porque ainda permaneceu de pé seu imponente mausoléu.

E metida a cidade de Roma nas contínuas guerrilhas e guerras da Idade Média, esse túmulo começou a ser utilizado para finalidades diversas, transformando-se numa importante fortaleza. Seu papel defensivo pode ser notado até hoje, por quem visita a sede do Papado e a Basílica de São Pedro. Visto de fora o Palácio do Vaticano, nota-se em determinado ponto um corredor todo coberto, construído sobre arcadas que, mais adiante, atravessam o Tibre e se emendam na antiga Mole Adriana, agora Castelo Sant’Angelo. De maneira que, sentindo-se ameaçado, o Sumo Pontífice podia facilmente escapar por esse corredor e se refugiar entre os robustos muros do velho monumento. Era a suprema defesa do Vigário de Cristo.

Cessados os períodos de convulsões e saques a que se expunha a Cidade Eterna, o Castelo Sant’Angelo passou a ser outro lugar de descanso e recolhimento, à disposição do Papa.

E assim, como tantas outras construções de passadas eras, esse monumento de um imperador pagão foi incorporado às tradições e aos valores cristãos, tornando-se mais um símbolo das grandezas da Igreja.

No alto desse gigantesco castelo paira, sobranceira e protetora, a imagem de São Miguel Arcanjo. Ela é quem deu o novo nome ao antigo túmulo imperial.

Narram as crônicas que, durante a Idade Média, devastadora epidemia se alastrou por Roma, ceifando incontáveis vidas.

Compadecido e angustiado diante de tanta calamidade, o Soberano Pontífice ordenou que se fizessem procissões em toda a cidade, a fim de se alcançar dos Céus o fim daquele inclemente flagelo.

E suas preces foram atendidas. Pouco depois, como sinal da misericórdia divina, viu-se o gladífero Arcanjo pairar sobre a Mole Adriana, numa atitude de quem conjurava a peste.

Roma voltou à vida. E, desde então, a glória de um imperador em pó transformou-se em escabelo para o Príncipe da Milícia Celeste…

 

Vagalhões da vida

Quando uma alma tem a sensação de ser amada por Deus, os piores vagalhões da vida não atingem o seu tabernáculo interior. Em meio às maiores angústias e agonias, ela permanece calma e reconfortada, convicta de que não a abandona a benevolência divina.

Essa segurança é parecida com a do rochedo batido pelo mar. Em vagas sucessivas e furiosas, as ondas se arrebentam de encontro a ele. O rochedo não se move. E quando o mar se retira, ele está ali, intacto, sabendo que foi inútil o furor de todos os vagalhões.

O olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo

Se numa noite sem luar contemplarmos com espírito de Fé o céu estrelado, ele produzirá grande efeito sobre nós. E nos fará lembrar algo infinitamente superior: o olhar do Redentor, no qual há galáxias de santidade, de virtudes que pousam sobre nós como uma abóbada protetora.

Quando a pessoa se porta ordenadamente face à ordem do universo, pelo fato de seu próprio senso do ser procurar o maravilhoso nas coisas que constituem o universo que ela procura conhecer, tende ela a ver muito mais os aspectos espirituais do que os materiais nas criaturas que a circundam.

O sentido da vida terrena

Então, no exemplo tantas vezes utilizado da criança que busca o maravilhoso na teteia dourada, vermelha, azul, verde, etc., à medida que a criança vai se desenvolvendo, se ela tem, por exemplo, uma boa mãe, quando esta lhe oferece sorrindo a teteia, em certo momento, ela percebe estar querendo mais bem à mãe do que à teteia. Porque tomando contato, ao mesmo tempo, com dois seres excelentes — um relacionado mais diretamente ao corpo, como a teteia; outro dizendo respeito à alma, que é o carinho da mãe —, por aspirar ao mais maravilhoso, a criança deseja o carinho da mãe.

Ai da mãe que não tem com a criança esse carinho, e que não a ajude a sobrepor esse valor moral ao material! Porque essa é a missão de uma mãe, e ela tem obrigação de cumpri-la.

Mas ai também dos familiares que não criam em torno de seus pequenos um ambiente robusto, suculento e benfazejo de manifestação de qualidades do espírito, no qual a criança vá entendendo desde logo que esse convívio de alma é o fundamental da ordem do universo!

Este é um ponto muito importante, porque as criaturas de uma ordem mais elevada têm uma função normativa e orientadora em relação a todas as inferiores. E os espíritos são o que há de mais alto no universo. Conhecendo-os e estando voltados para eles, conhecemos melhor o que está abaixo.

Então, ser sensível às almas e querer encontrar para si uma ambientação, na qual o nosso senso do ser, do maravilhoso, nosso senso católico se sintam como o navio que atracou no cais e ali está na serenidade, longe das tormentas, este é o sentido da vida terrena.

O ambiente da Igreja do Sagrado Coração de Jesus

A alma encontra este sentido superior da existência quando é tocada pela graça a propósito de Nosso Senhor Jesus Cristo, de Nossa Senhora e de toda a ordem celeste propriamente dita. Quer dizer, ela “vê” espíritos — sobretudo um valor de alma —, almas de uma categoria, de uma beleza, de uma maravilha tais que ela fica compreendendo ser este o verdadeiro ponto em torno do qual tudo gravita, longe ou fora do qual tudo gira errado, e que a vida está em compreender e desejar isto, ou seja, mais especificamente, o Sagrado Coração de Jesus e o Imaculado Coração de Maria.

As descrições que tenho feito do Sagrado Coração de Jesus, como deve ser visto, amado, dão inteira e linearmente isto. Ele é divinamente superior a qualquer consideração, por um lado. Por outro lado, na sua superioridade, Ele habita em nós mais do que nós mesmos. Ao mesmo tempo em que está no alto de um Céu inatingível por nós, Ele habita no fundo de cada um de nós e tem a possibilidade de tomar contato conosco, fazendo estremecerem cordas de nossas almas que não sabíamos existirem. Assim é Ele!

Para minha sensibilidade — não digo nem um pouco que seja uma coisa obrigatória —, o ambiente da Igreja do Sagrado Coração de Jesus traz isso. Existem na Europa milhares de igrejas de um valor artístico incomparavelmente maior do que o dela, mas há uma coisa qualquer nessa igreja por onde, estando lá, tenho a impressão de que os seus divinos olhos estão pousando sobre mim naquele momento, e me delicio em sentir-me visto e envolvido pela serenidade afetiva, doce e cheia de sabedoria de Nosso Senhor, mas ao mesmo tempo pelo império d’Ele, segundo o qual Jesus aceita quem for assim e rejeita quem não o for. E o pior que pode haver é ser rejeitado por Ele.

Mais alvos do que a neve

Tudo isso junto, formando um panorama que paira por cima. A sensação de grandeza que se tem, às vezes, quando se olha para o céu muito estrelado não é nada em comparação com essa impressão dos olhos de Nosso Senhor Jesus Cristo — que eu imagino castanhos quase claros — pousando sobre nós, olhando-nos a fundo, e nos fazendo entrar nessas imensidades de serenidade, de força e de tudo o mais que há n’Ele, e que são verdadeiramente incomparáveis!

Para quem não tenha haurido isso tão fundamente na alma que, a bem dizer, quase nem precise ir à Igreja do Coração de Jesus, aconselho irem, e procurarem rezar ali, impregnar-se daquilo, porque há qualquer coisa ali que não é propriamente o olhar de Nosso Senhor para São Pedro, mas é um olhar d’Ele. Nessa igreja, todos os mistérios da devoção ao Sagrado Coração de Jesus e ao Imaculado Coração de Maria vêm à tona.

Por exemplo, quanto nós gostaríamos de nos ver fisicamente olhados por Ele! Tenho a impressão de que “asperges me hyssopo et mundabor, lavabis me et super nivem dealbabor”(1); o olhar de Nosso Senhor lavar-me-ia completamente, e eu ficaria mais alvo do que a neve!

Ali, diante do olhar d’Ele, eu diria: “Anima Christi, sanctifica me!” Eu estaria tendo o que desejo, o ideal de minha vida! Aquele olhar meio interrogativo, ligeiramente reprobatório, enormemente amoroso, envolvente e, para dizer mais, encomiástico, no seguinte sentido: não há barreiras, venha; elogio é isto!

E tocando, não o grosso bordão dos sinos de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas o sino leve e alegre de Nossa Senhora, a alegria do perdão. Ela põe junto dessa seriedade infinita de Nosso Senhor Jesus Cristo uma nota qualquer de louçania que fala em perdão, em esperança, em alegria, que a completa admiravelmente. Tudo isso está e tem fundamento n’Ele, mas Nosso Senhor é grande demais para, num olhar só, podermos abarcá-Lo. Então, olha-se para Maria Santíssima, e Ela diz: “Meu filho!” Porque ao cabo de algum tempo aquela imensidade nos faz sentir tão pequenos, tão pequenos, tão pequenos, “petit vermisseau et misérable pécheur”(2), que se tem vontade de dizer: “Senhor, não me esmagues de tanto me amar!” Mas entra Ela e dá um repouso, uma distensão, está feito tudo na perfeição.

Portanto, não é que exista n’Ela e não n’Ele; mas é alguma coisa que existe n’Ele e, através d’Ela, se explicita melhor.

Conhecimento por conaturalidade

Esses estados de alma constituem o afeto que devemos procurar na vida. Não tendo esse afeto, não adianta nada, porque nenhuma forma de afeto é autêntica sem isso.

Por exemplo, se alguém me informar: “Fulano de tal quer muito bem a você porque foi educado com você desde pequeno…”, diz-me pouco, porque se nossas almas são diferentes nesse ponto, o que fazer?

Entretanto, alguém que eu tenha conhecido, procedente de Chandernagor, em quem, olhando, percebo esse estado de alma no fundo, minha vontade é de abraçá-lo e dizer:
“Meu irmão ou — conforme a idade — meu filho, há quanto tempo nos esperávamos! Há quanto tempo nos pressentíamos!”

Eu falava há pouco do céu estrelado. Ele produz efeito muito grande, não tem dúvida. Mas se eu, ao contemplar esse céu estrelado, lembrar-me do olhar de Nosso Senhor Jesus Cristo pousando sobre mim, é algo infinitamente superior ao céu estrelado, mas que tem certa analogia, cujo analogado primário é o Céu, a partir do qual, na imensidade de suas virtudes e qualidades, Ele olha para mim. Há n’Ele galáxias de santidade, de virtudes que pousam sobre minha cabeça como uma abóbada protetora!

A partir daí vem o desejo da boa amizade segundo Deus, amar o próximo como a si mesmo por amor de Deus, podendo dar origem a um relacionamento humano que, com tal plenitude, creio eu, talvez não tenha sido tão frequente na própria Idade Média.

Suponho que se a Idade Média tivesse continuado, o Sagrado Coração de Jesus teria revelado essa devoção de qualquer forma. A grande maravilha d’Ele foi perdoar as rupturas da Idade Média e, apesar disso, chamar para essa devoção.

Infelizmente, essa devoção, de modo geral, foi muito rejeitada ou aceita de uma maneira sentimental, completamente errada.

Quando me refiro à sensibilidade em relação ao ambiente da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, às graças, etc., entendo a sensibilidade reta, pela qual o homem tem um conhecimento por conaturalidade.

Em geral, quando se fala de conhecimento, tem-se em vista somente o racional — tão nobre, elevado, digno —, entretanto, julgo necessário frisar o conhecimento adquirido pela sensibilidade para entender que nesse conjunto — razão e sensibilidade — encontra-se a cognição completa. O querer bem é, portanto, ver e entender outrem assim, por conaturalidade.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 6/2/1986)

1) Do latim: Asperge-me com o hissopo e serei purificado, lava-me e ficarei mais alvo do que a neve.
2) Do francês: vermezinho e miserável pecador.

Prece na aridez

Eu assisti a muitas festas de ano-novo em outros tempos, em que cada pessoa manifestava, na intimidade de uma roda de parentes e amigos, suas esperanças para o ano vindouro. Um esperava fazer um bom negócio, outro planejava uma viagem à Europa, etc. Assim, a passagem do ano era repleta de presságios favoráveis.

Hoje quase ninguém ousa fazer prognósticos para o ano que se inicia. Tem-se medo de falar no futuro, entra-se no novo ano como quem ingressa numa sala de operação.

Com efeito, vivemos dias de confusão, cheios de enigmas pesados e terríveis, dias de incerteza em que só uma coisa deve ser certa: é a deliberação de cada vez mais sermos de Nossa Senhora,  sempre mais unidos a Ela e dispostos a lutar por Ela. Porque a grande pergunta que domina todas as incógnitas do mundo contemporâneo é: Como está a luta entre o reino do demônio e o Reino de Maria?

Ao dirigir-me a almas animadas pela mesma Fé Católica, pela mesma devoção a Nossa Senhora, pelo mesmo desejo ardente do advento do Reino de Maria, derrota dos inimigos da Santa Madre Igreja e exaltação, ou seja, glorificação da Santíssima Virgem e do Reinado d’Ela, tenho certeza de que a Mãe de Misericórdia, voltada a nos proteger e favorecer, como a todos os homens, e que não ama nada no mundo tanto quanto a Santa Igreja Católica Apostólica Romana – à qual consagramos a nossa vida e em defesa da qual estamos dispostos a dar todos os instantes de nossa existência – do alto do Céu sorri para todos esses seus filhos que se colocam a seus pés e suplicam as mesmas graças junto ao Sapiencial e Imaculado Coração d’Ela.

Certo de que Nossa Senhora também atenderá este meu pedido, imploro, com a alma genuflexa, que Ela nos aproxime e nos torne cada vez mais d’Ela.

Se no fim deste ano que agora se abre, apesar de todas as dificuldades e tropeços, nós pudermos dizer que estamos caminhando para o ano seguinte com passo decidido e sempre mais unidos à Rainha das Vitórias, estaremos vencendo. A grande vitória é pertencer a Ela inteiramente.

Há uma frase na Liturgia da Igreja que pode ser aplicada a Maria Santíssima: “Deus, cui servire regnare est”(1). Ó Maria, servir-Vos é reinar. Nós queremos para nós esta forma de realeza: servir a Maria completa e ilimitadamente, até a hora em que Ela nos acolha no Céu(2).

1) Do latim: Ó Deus, servir-Vos é reinar.
2) Extraído, com adaptações, de conferências de 1/1/1988 e 26/12/1989.

A eternidade numa mudança de ano…

Ao transpor os portais de um novo ano, sente-se, como que, o roçar da eternidade. De fato, é mais um período de nossas vidas  que fica para trás, a respeito do qual devemos fazer um  exame de  consciência, pedindo a Nossa Senhora que cubra  com seu manto o que nele não foi belo.

 

Esta é a última reunião de sábado à noite de 1988, pois no próximo sábado teremos o Santo Natal. Os portais de um ano, trezentos e sessenta e cinco dias, se escoam e os portais de outro ano se abrem. O passado se encerra e fica um ano para trás; o futuro se abre e temos um ano pela frente.

A eternidade é bela, mas só podemos calcular sua pulcritude por meio de algumas comparações. Fomos criados dentro do tempo e, por causa disso, só compreendemos as coisas em função do tempo.

Fomos criados na matéria, temos um corpo material. Vivemos dentro deste globo. Como nós, que estamos imersos no tempo, podemos calcular o esplendor da eternidade? Os homens não se sentem tão atraídos pelo Céu quanto deveriam, porque têm dificuldade em imaginar como será a eternidade.

Sentir o roçar da eternidade

Se dissermos para uma pessoa: “Você vai para a eternidade, deixará as aflições do tempo e gozará as glórias da eternidade” — há o Purgatório; quem sabe o que lá sucederá, e por quanto tempo? —, ela poderá se perguntar: “Mas como é essa eternidade? Fica tudo parado? O que lá acontece?”

Para se ter ideia do que é a eternidade e da sua beleza, deve-se considerar o seguinte: o tempo vale muito menos do que a eternidade, porque aquele é próprio para nós mortais e a eternidade é própria para os imortais, que nunca perecerão. Então, basta estarmos ligados à morte para entendermos que o tempo seja muito menos belo do que a eternidade. Porque a morte, a qual não deixa de ter sua beleza, é muito menos bela do que a vida. Então, para compreendermos a eternidade, temos que entender a beleza do tempo.

Esta mudança de ano, na qual estamos, é uma dessas situações em que se sente o roçar da eternidade, pois um ano de nossas vidas se encerra.

Se um homem, por exemplo, que viveu muito tempo numa cidade, muda-se para uma localidade noutro extremo do país, adota outra profissão, tem outras relações, ele passa para um mundo diferente; uma etapa de sua existência se encerra e outra se abre. Para esse homem isto tem muita significação, porque tudo o que se passou fica como um bloco na vida dele, o qual, no interior de sua alma, só ele mesmo conhece.

Os fatos externos de sua existência os outros poderão conhecer. Se for um personagem célebre, os historiadores escreverão sobre o que ele disse ou fez, o que fizeram contra e a favor dele. Quem poderá escrever o que se passou em sua mente? Ora, a essência da vida de um homem é o que se passa em sua alma, a qual é fechada para todo mundo. E ninguém conhece essas coisas, a não ser Deus e aqueles a quem Ele resolver revelar.

No dia do Juízo Final tudo será revelado de forma estupenda

Isto será revelado aos olhos de todos os homens, no dia do Juízo Final, quando tudo o que se passou em nós de interno e externo, referente à nossa santificação, aos nossos pecados, Deus vai revelar e julgar. Todos os homens que houve, há e haverá até o fim do mundo, salvos ou precitos, assistirão a isso. Uns já garantiram o Céu e terão ressuscitado pouco antes de o Filho de Deus vir para julgar os vivos e os mortos. Outros foram condenados ao Inferno.

O Purgatório estará vazio, porque todos que nele estiverem irão para o Céu e não para o Inferno. Os que já estão no Inferno ressuscitaram num corpo que vai aumentar o tormento deles. E não só a História dos homens, mas das nações, das civilizações, das culturas, das instituições, tudo vai ser revelado de forma estupenda.

E o Juízo não será demorado, como se poderia pensar, porque para as pessoas que estão nesse estado o tempo não conta. Podemos ter ideia do que será sua rapidez pelo seguinte: há vários depoimentos de pessoas que passaram por risco de morte e contam que, em determinado momento, toda a sua vida lhes passou diante do espírito. Ora, se toda a existência se mostra em minutos, compreendemos como as coisas podem ser comprimidas sem tirar nada. Nesse lance estupendo, sem sentirmos cansaço — nem sei se se pode falar de tempo, nesse momento em que todos estão entrando para a eternidade —, veremos tudo e cada um será mandado para o seu lugar, para onde a justiça divina o encaminhou.

Nas épocas e nas situações em que vemos o tempo passar, percebemos também a beleza do tempo. Quer dizer, quando uma coisa existe, está funcionando, nota-se sua beleza ou feiura. E quando, por exemplo, uma instituição deixa de funcionar e cai no passado, a partir deste ela é vista numa perspectiva especial, e podem-se notar belezas e aspectos que quando ela estava viva não se percebiam.

Uma almofadazinha para prender alfinetes

Estou me lembrando de um caso que minha mãe me contou uns vinte anos antes de morrer. Ela já estava idosa, e, certa vez, foi sozinha visitar uma amiga que se tinha mudado havia pouco para perto de sua casa. A amiga, que a recebeu muito bem, tinha móveis bastante bons e na sala de visita de sua residência havia uma vitrine com objetos curiosos, antigos. Ela disse a minha mãe:

— Lucilia, você quer ver uns objetos interessantes que eu tenho na vitrine?

Minha mãe olhou os objetos, achou tudo muito interessante. Havia grande liberdade entre ambas e mamãe perguntou-lhe:

— Tudo que está na sua vitrine é tão fino, tão bonito, mas eu não compreendo por que você guarda entre esses objetos uma almofadazinha.

No fim do Império e no começo da República, as senhoras, além de outros trabalhos domésticos, costuravam e usavam uma almofadazinha para prender alfinetes.

A amiga respondeu:

— Isso é uma verdadeira raridade histórica, e eu vou lhe contar.

Então, ela narrou o seguinte fato:

Um passado que aparece com toda a sua beleza

Essa senhora era muito monarquista e tinha uma amiga que era esposa de Campos Sales, ex-presidente da República do Brasil, a qual lhe contou que, devido à proclamação da República, a família do Imperador foi exilada, tendo levado consigo os objetos que puderam, mas deixando muita coisa no palácio imperial. Logo depois, algumas senhoras tiveram curiosidade em visitar tal palácio, que estava sendo dirigido por autoridades da República. Obtiveram licença facilmente, porque eram casadas com líderes republicanos que exerciam o poder.

O palácio estava fechado, silencioso, ainda ornado com flores já murchas. Ninguém tinha lá entrado, ninguém havia movido nada. Sobre uma mesa, um chapéu atirado por alguém que entrara no palácio pouco antes da proclamação da República e ali o deixara… Era um sinal de coisa ainda viva.

Elas foram olhando tudo aquilo, e a esposa de Campos Sales, bem como as outras que lá estavam, começaram a ter uma espécie de sentimento de tristeza, que provocava um aperto na garganta. E, quando chegaram ao quarto de dormir da Imperatriz, viram objetos de uma mãe de família que não pudera mexer em nada, por ter saído correndo. Foi uma tristeza tão pungente que não conversavam mais entre elas; apenas olhavam…

Esta senhora viu aquele passado num todo, cujas portas eram fechadas pelo presente. Tudo aquilo estava afundado no passado, deixou de ser, como que empurrado para o não ser. Ela observou tudo o que se perdia, se desfazia. E, considerando o desastre daquela família, mandada embora depois de governar durante tanto tempo o Brasil, ficou com tanta tristeza e pena que quis guardar uma recordação daquilo.

Mas todos os objetos eram de valor, e ela não poderia levar nenhum deles. Como havia sido encontrado aquele travesseirinho que a Imperatriz usava, e era uma coisa sem nenhum valor monetário, a esposa de Campos Sales jeitosamente o apanhou e o levou para sua casa, para nunca mais se esquecer da Imperatriz.

O curioso foi que essa senhora continuou republicana, porém via agora o Império perdido nas brumas e na grandeza de todo um passado que formava um bloco, saído de dentro das escórias do presente e aparecia com toda a sua beleza. Assim, o passado surgia iluminado por uma luz nova e, por causa disso, ela tomava aquele objetozinho e o levava como uma espécie de relíquia.

Quando estava para morrer, ela chamou essa amiga monarquista, contou-lhe o fato e disse-lhe:

— Vou dar-lhe este objeto de presente, porque das minhas amigas você é a única capaz de compreender o que isto significa. Guarde consigo, porque é uma grande recordação.

Pelo eco, vejo que todos os que se encontram neste auditório entendem perfeitamente o que isto quer dizer.

No Museu Histórico do Rio de Janeiro eu vi um quadro que simbolizava bem isso.

O baile da Ilha Fiscal

Alguns dias antes da proclamação da República no Brasil, uma esquadra de guerra chilena, que estava fazendo um percurso mundial, ancorou no Rio de Janeiro, e a Marinha brasileira lhe ofereceu um baile. Estava sendo inaugurado nessa ocasião, numa ilha junto à cidade do Rio, chamada Ilha Fiscal, um prediozinho neogótico, e nesse local o baile seria realizado.

Mas para se chegar até lá era preciso tomar um barco. O Imperador, já velho, foi de barco até a ilha, e no momento de passar para a terra firme, devido à flutuação do mar, perdeu um pouco o equilíbrio e quase caiu. Seguraram-no, e ele então disse:

— A Monarquia escorrega, mas não cai.

Falou como gracejo, e entrou para o baile. Durante este, começaram a chegar denúncias de que estava sendo tramada uma rebelião republicana. Contaram-me — não li isso em nenhum livro — que o comandante da esquadra chilena mandou oferecer suas forças ao Imperador a fim de mantê-lo no trono; se este quisesse, a esquadra bombardearia o Rio de Janeiro. Mas o Imperador declarou que não queria que a capital dele fosse bombardeada por estrangeiros, para ele permanecer no trono. E foi proclamada a República.

O quadro existente no Museu Histórico do Rio de Janeiro, de um bom pintor nacional — se não me engano, Benedito Calixto —, apresenta o baile da Ilha Fiscal, com o prédio reluzente, cheio de pessoas. No céu, um duplo movimento. Numas nuvens brancas vem, representando a República que entra, uma mulher com uma túnica, barrete vermelho na cabeça, acompanhada de umas figuras mitológicas. De outro lado – é para isso que eu queria chamar a atenção dos presentes – o céu se abre e, se não me equivoco, anjos vão levando a coroa, o cetro e outras insígnias: é a Monarquia que se vai embora… Então, a República baixa para a terra, e a Monarquia é um passado que se encerra como um bloco e vai sendo conduzido para o céu. Quer dizer, o passado aparece embelezado, visto no seu conjunto como uma coisa digna de penetrar na eternidade.

É bonito o movimento pelo qual uma coisa se encerra, forma um bloco e sobe para o julgamento de Deus. Também é bonito o movimento de algo novo que entra e inicia na História outra caminhada. Como se deve saborear a vida, o tempo, conhecendo nas etapas da vida de cada um aquilo que acabou, subiu para um julgamento, e o que vai começar! Fazer uma ideia de conjunto desse tempo que foi e deitar um olhar para o tempo que vem.

Então, se é bonito o tempo, como será bonita a eternidade!

O rochedo que divide as águas

Fecha-se um ano para a nossa vida. Todo ano é uma etapa. Pergunta-se: que ideia de conjunto fazer dessa etapa?

As reuniões de sábado à noite constituem uma parte dentro dessa etapa; com exceção do período em que eu estive na Europa, tive a alegria de encontrá-los aqui todos os sábados. Farei uma reflexão rápida a respeito disso.

Todos nós tivemos luta. E a luta foi a nossa grande característica. Por quê?

Imaginemos um rochedo num curso de água; ele recebe a investida contínua das águas e permanece de pé. O que foi esse ano para o rochedo? Foi luta! O curso das águas sempre lhe foi contrário, mas o rochedo continuamente as dividiu e meteu em reboliço a camada de água que passava perto dele. Assustou os peixes que passavam; algum peixe esmagou-se contra a mole insensível e fria dele, e foi depois seguindo morto, água abaixo.

O que se passa na massa líquida de um rio ninguém sabe. Mas uma coisa é certa: a água que bateu no rochedo não fica como era antes.

A existência do rochedo foi luta. Assim fomos nós, graças a Deus, em 1988. E foram, portanto, os que estão neste auditório, que formam comigo um só todo; foram na jovem e na juveníssima idade de alguns dos presentes.

Ter-se-ia a ilusão: “Não! Na juventude só há saúde e não há luta!”

Abrir o caminho nas águas revoltas da Revolução

Que bobagem! Já fui jovem e cheguei a ter lutas tão árduas, que eu tinha inveja dos velhos. Eu pensava: “Estou vendo diante de mim um velho que não faz nada, oscilando na sua cadeira de balanço. Como eu daria de presente a minha juventude para acabar com a minha luta, poder refestelar-me e balançar! Mas abrir o meu caminho nas águas revoltas da Revolução que vêm em sentido oposto; deitar o meu peso num ponto, ficar nele, criar condições para que outros se agarrem a mim e não se deixem levar pelas águas, que luta, que batalha!”

Porque todo homem tem, entre outros, um instinto chamado de sociabilidade, que nos leva a querer conviver com os outros. Deus disse no Paraíso Terrestre que não era bom para o homem que este ficasse só; por isso Ele criou Eva. Devido ao instinto de sociabilidade, o homem tem necessidade de estar com outros. E quanto mais amplo o convívio, maior o bem-estar, a satisfação que tem o homem.

Esse convívio, para corresponder ao instinto de sociabilidade, não se satisfaz só porque é um convívio, mas porque nele se encontra uma harmonia de alma. Se há desarmonia, antes só que mal-acompanhado — diz um provérbio.

Suponhamos que um homem esteja navegando sozinho num barco e pense várias vezes: “Como seria bom que eu tivesse um companheiro.” Aproxima-se outro barco e lhe dizem:

— Você quer ter um companheiro muito cacete que só diz bobagens ou blasfêmias?

— Não! Fico sozinho! Por mais terrível que seja a solidão, antes só que mal- acompanhado.

Para quem tem a Fé católica, apostólica, romana, como nós temos, a vida é uma solidão em todos os ambientes em que encontramos a heterogeneidade, o desacordo, a incompreensão, a fricção, às vezes descortesias, esquivamentos e até agressões, não físicas, mas pelo menos agressões morais. E para a pessoa suportar isto, a vida é terrível.

Viver isolado é grande sofrimento

Lembro-me de que certa ocasião li o resumo de um romance, escrito por um francês que fazia previsão do fim da Igreja Católica. Então, descrevia o último católico da Terra. Era um homem que vivia num isolamento completo, porque ninguém o entendia, ninguém queria saber nada dele. Esse homem tinha os meios com que satisfazer materialmente as suas necessidades, vivia no meio dos outros, mas era um estranho para todo mundo. No momento em que exalou o último suspiro, morreu com ele o último membro da Igreja Católica.

A hipótese é uma blasfêmia, porque Nosso Senhor prometeu que as portas do inferno não prevaleceriam contra a Igreja. Mas, a história faz sentir bem o isolamento tremendo de um de nós, se vivesse sozinho, mantendo-se fiel.

Imaginemos que um de nós receba a ordem de ir morar na Birmânia para lá fundar uma sede de nosso Movimento. Vai para aquele país e trabalha para a fundação, dizendo às pessoas que se trata de uma enorme organização também existente noutros lugares.

De repente, ele recebe um telegrama afirmando que as sedes de nosso Movimento foram fechadas em todos os lugares do mundo. A pessoa não terá mais contato com ninguém de nossa Associação, mas apenas com birmaneses; não há dinheiro para voltar a seu país de origem. A Birmânia é pagã. Ele precisa morar sozinho e escolhe o único lugar onde se pode viver só: à beira-mar… Pelo menos, o mar conversa com ele.

De noite, após o jantar, as ocupações do dia terminaram, ele vai para o terraço da casa, que fica perto das ondas, e ouve o som do mar. As ondas vão e voltam. Tudo sempre diferente, porém, no fundo, tudo sempre repetido. Olha para aquilo e pensa: “Esse murmúrio perpétuo das ondas é o murmúrio da minha solidão; estou isolado, que coisa terrível!”

Os que estão neste auditório são salvos disso exatamente pelo nosso Movimento, porque ele constitui em torno de nós um ambiente onde encontramos concórdia, simpatia, consonância, a sociabilidade. Pondo o pé fora do portão desta sede, encontramos o contrário.

Mas daqui de dentro sentimos a nossa solidão coletiva. Nosso Movimento é como a pedra colocada dentro do rio: as águas passam e a pedra fica; e vai marcando a história das águas do rio.

O Sol sempre está iluminando alguma das sedes de nosso Movimento

Apesar da hostilidade dos ambientes de fora, nós lutamos de tal maneira que trazemos gente de dentro da multidão para vir participar do nosso isolamento.

E ingressam em nosso Movimento pessoas das mais diversas nações. A respeito de Carlos V, Imperador do Sacro Império Romano Alemão e Rei da Espanha, foi dito: o Sol não se punha nos seus domínios. Ele era senhor de um império tão vasto que abrangia as nações de língua alemã, uma parte da Itália, Países Baixos, a Espanha, e depois todo o mundo ibero-americano. De maneira que quando numa parte do império dele o Sol estava se pondo, do outro lado do seu império o Sol começava a renascer.

Assim, também, com nosso Movimento.

Hoje há alguma coisa mudada na história do Sol: nunca deixa de iluminar uma sede nossa. Se se pudesse dizer, afirmar-se-ia que há algo novo na história do Céu: ele nunca mais deixará de contemplar — pelo menos enquanto nossa Associação existir — um filho dele que está lutando e rezando nesta Terra.

E um pensamento que os aqui presentes poderiam cultivar na hora de dormir seria este: na outra parte da Terra há um membro de nosso Movimento que está acordando. Como seria bonito se, antes de conciliar o sono, rezassem a Nossa Senhora uma rápida jaculatória por esse irmão distante e, às vezes, desconhecido!

A jaculatória poderia ser “Regina Apostolorum, ora pro nobis”. Somos apóstolos, vamos rezar por aquele que está acordando, para que seu despertar seja tonificante; por aquele que está dormindo, a fim de que seu sono seja bom; pelo que já está agindo, para que sua ação seja reta, trabalhando a fim de trazer gente para nosso Movimento.

Pedir a Nossa Senhora, antes de tudo, a perseverança

Durante este ano, os que estão aqui fizeram um esforço ativo e excelente de recrutamento, arrancaram muitos jovens ao mundo, introduzindo-os no jardim santo de nossa Associação. Mas o mundo continuou a bombardear esse jardim com suas seduções, atrações, mentiras, promessas. E não foram poucos os que passaram um tempo limitado nesse jardim, e depois saíram.

Há este fato preponderante na história individual de cada um dos presentes e na história do querido conjunto dos enjolras(1) de nosso Movimento: atraíram muitos, vários saíram, mas os que ficaram permaneceram porque trabalharam na fixação deles.

Mais ainda, os que estão aqui também foram bombardeados. Pela graça de Nossa Senhora, não saíram. Que coisa bonita! Os anos passam e estão no solo sagrado de nossa Associação.

Na minha velha idade, o que peço a Nossa Senhora? Antes de tudo, perseverança, perseverança, perseverança! Tudo quanto fiz de bom e merece continuar, que continue e se desenvolva.

Poder-se-ia fazer nessa ocasião uma prece muito bonita que está no “Te Deum”: “Dignare, Domine, die ­isto sine peccato nos custodire — Dignai-vos, Senhor, guardar-nos sem pecado neste dia”. Nós poderíamos dizer: “Dignare, Domina, anno ­isto sine peccato nos custodire”. Nossa Senhora, Nossa Mãe, levai-nos até a outra ponta do ano sem a menor poeira de um pecado.

Exame de consciência compungido e alegre

Neste ano que se encerra, que tentações cada um dos aqui presentes enfrentou? Que provações internas teve? Quantas vezes venceu essas provações internas, ou não as venceu? O que foi a vida interior de cada um? A resposta cada um saberá dar.

Se Deus quiser, todos transporão este ano rezando, com as mãos postas. E o coração está posto tão alto quanto no ano passado? Ou menos alto? Não o sei… Cada um dos presentes o pode saber.

Que bela pergunta ao encerrar o ano: “Meu Deus, como estou?” Devemos fazer um exame de consciência ao mesmo tempo compungido e festivo. Porque quando um homem faz um exame de saúde e vê que está são, ele se alegra. Mas quando percebe que está doente, fica apreensivo; porém, se ao mesmo tempo lhe informam: “Fulano, aqui nesta cidade há um médico que cura essa doença, porque tem um remédio ótimo”, ele se alegra. Não é a alegria da saúde, mas a alegria da saúde que ele vai recuperar. E se lhe dizem: “Não é o médico que vai curá-lo, mas a melhor das mães, com o melhor dos remédios, e com o sorriso d’Ela”, ele quase dirá: “Valeu a pena ter estado doente”. Essa mãe é Nossa Senhora.

E se o balanço do ponto de vista interior não foi positivo para nós, tenhamos ânimo e ânimo redobrado, porque Maria Santíssima é Mãe de Misericórdia. Digamos a Nossa Senhora: “Minha Mãe, está passando o ano. Uma etapa se encerrou. Pousai vosso manto sobre aquilo que não é belo em minha alma. Olhai para o que é belo, olhai para o vosso Coração. E dai-me de vosso Coração novas belezas de alma para o ano que vem.” Assim, transporemos com ânimo este ano, e abriremos 1989 com a chave de ouro, chave com duas voltas, cujos nomes são: Confiança e Devoção a Maria. É o que de todo o coração lhes desejo.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência  de 17/12/1988)

 

1) Palavra afetuosa utilizada por Dr. Plinio para designar seus jovens discípulos, surgidos aproximadamente a partir de 1970. Havia neles acentuado grau de debilidade, se comparados com aqueles que os antecederam, os da “geração nova” (cf. “Dr. Plinio” número 81, p. 17).