Santa Helena, Imperatriz

Para Dr. Plinio, não se pode deixar de reconhecer “com muita alegria” o trabalho realizado pela Imperatriz Santa Helena, cuja boa presença junto a seu filho, o Imperador Constantino, não só o converteu como o fez conceder a liberdade à Santa Igreja Católica. E além de estar na origem da irradiação do cristianismo, a partir de Roma, por todo o Ocidente, devemos a Santa Helena esse inestimável presente: a descoberta da verdadeira Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Celebra-se no dia 18 de agosto a festa de Santa Helena, Imperatriz e viúva, mãe de Constantino Magno. A ela se deve a invenção, isto é, a descoberta da verdadeira Cruz na qual Nosso Senhor Jesus Cristo foi crucificado.

Benéfica e salutar influência materna

Em vez de considerar este ou aquele aspecto da vida de Santa Helena, gostaria de ressaltar a impressão que o todo de sua personalidade nos comunica. Nesse sentido, eu diria que se trata de uma santa cuja importância para o panorama da Igreja redunda, não apenas do fato de ter sido imperatriz, mas também porque teve sobre Constantino uma evidente e salutar influência.

Quer dizer, temos Constantino, o primeiro imperador que faz uma promessa de dar livre curso ao culto católico no Ocidente, caso se visse auxiliado por Nosso Senhor Jesus Cristo na batalha de Ponte Mílvia. Ele recebe a célebre visão do “in hoc signo vinces” — “com este sinal vencereis” —, portanto uma confirmação do socorro divino, conquista a vitória e cumpre sua promessa. Com o Edito de Milão ele concede liberdade à Igreja Católica, e a partir daí começaria a ruir o paganismo sobre o qual o estado se assentava.

Diante desse acontecimento de fundamental importância para a Cristandade, não se pode deixar de reconhecer a materna e católica influência de Santa Helena sobre o filho. Quando nos lembramos de Santa Mônica rezando por Santo Agostinho e obtendo do Céu a conversão dele, ou quando recordamos o papel de Santa Clotilde junto a seu esposo, Clóvis, trazendo-o igualmente para o seio da Igreja Católica e, com ele, o povo franco, é difícil não pensar que Santa Helena impressionou a fundo Constantino, e que a atitude dele foi motivada, em grande medida, pela ascendência da mãe.

Na raiz da ordem social e temporal católica

Ora, se, católicos que somos, desejamos de toda a alma uma restauração da ordem social e temporal católica como a que vigorou nos dias áureos da Civilização Cristã, não podemos deixar de reconhecer, com muita alegria, o trabalho feito por Santa Helena com esse objetivo: não só fazer cessar as perseguições à Igreja no império romano pagão, mas também fazer com que o imperador começasse a edificar uma ordem temporal católica, prólogo da plenitude de catolicidade que alcançaria o Estado medieval.

Início este, diga-se, por vários lados verdadeiramente glorioso. Pela liberdade franqueada à Igreja, pelo fim dos cultos pagãos, e por esse ideal de unidade social católica que desabrocharia nos esplendores da Cristandade européia, os quais perdurariam ao longo de séculos.

Portanto, pela sua oração, pelo exemplo de suas virtudes, Santa Helena esteve na raiz de uma série de realizações gloriosas, de idéias grandiosas, de princípios que repercutiriam mesmo após o ocaso do Sacro Império Romano Alemão, até os nossos dias. Razão pela qual nos é particularmente cara a devoção a essa grande santa.

Oração que conduz à ação eficaz

Chamo a atenção para esse ponto acima mencionado: as orações de Santa Helena. É necessário compreender aqui o equilibrado do papel dessa oração.

Com efeito, seria equivocado imaginar que, uma vez recitadas as preces, não adianta fazer coisa alguma. Basta rezar e deixar as realizações concretas ao beneplácito da Providência. Às vezes, quando as vicissitudes o impõem, não se pode pretender outra coisa. Porém, é apropriado esperar que a oração nos mova à ação que realiza o fim almejado. E desse teor foram as preces de Santa Helena.

Enquanto a mãe rezava, o filho lutava e agia. Constantino, protegido pelo socorro do céu, levando no seu lábaro o emblema de Nosso Senhor Jesus Cristo, combateu e alcançou a vitória. Em seguida, agiu vigorosamente, com a força temporal do Estado, para libertar a Igreja e extinguir os restos do paganismo.

Creio ver nessa circunstância o equilíbrio perfeito entre oração e ação. Santa Helena reza, e sua oração é acompanhada certamente de atitudes e palavras evangelizadoras junto ao filho, e este cuida dos meios materiais para concretizar aquilo que, sem dúvida, sua mãe desejava realizar. A oração é a razão mais fecunda do desencadear dos fatos; os fatos produzem os frutos da prece atendida.

Aquela que tirou das entranhas da terra o Santo Lenho

Cumpre considerar, ainda, este outro e não menos belo florão na vida de Santa Helena: foi ela que encontrou a verdadeira Cruz, um acontecimento cercado de milagres e dádivas especiais de Deus.

É o Santo Lenho do qual se espalharam relíquias para serem veneradas pelos fiéis do mundo inteiro.

Que glória para essa mulher ter sido, ao mesmo tempo, a mãe do primeiro imperador cristão e aquela que tirou das entranhas da terra a verdadeira Cruz, com todos os benefícios espirituais oriundos dessa descoberta!

Então admiramos ainda mais o vulto dessa Santa, conhecemos melhor a estatura dessa alma, um grande tipo de mulher que vive só para Nosso Senhor. Matrona de espírito elevado e de horizonte largo, compreendendo as coisas a partir dos seus aspectos mais sublimes e de maior alcance. E que, por causa dessa envergadura espiritual, transforma um Império e dá ao mundo o presente imensamente grandioso da verdadeira Cruz de Cristo.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 18/8/1964)

"Vi, decidi e entrei!”

Analisem a fisionomia do Santo Ezequiel Moreno Díaz. É um rosto inteiramente distendido, sem a menor contração. Porém, não é a distensão comum do homem que dorme. Há algo  nesse modo de estar distendido que corresponde àquela espécie de distensão que os irresolutos não possuem. Estes têm a distensão da moleza.

Nele vemos a distensão das grandes resoluções tomadas, do homem que resolveu tudo e entrou rijo no caminho por onde tinha de entrar e disse: “Eu vi, decidi e entrei. Agora vamos até o fim!”

As dúvidas ficaram para trás e todos os sacrifícios que esse caminho trouxesse consigo, de algum modo ele os mediu, aceitou e pediu a Nossa Senhora que o ajudasse a não recuar.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 14/11/1980)

Santa Helena, Imperatriz Alma elevada e de horizonte largo

Para Dr. Plinio, não se pode deixar de reconhecer “com muita alegria” o trabalho realizado pela Imperatriz Santa Helena, cuja boa presença junto a seu filho, o Imperador Constantino, não só o converteu como o fez conceder a liberdade à Santa Igreja Católica. E além de estar na origem da irradiação do cristianismo, a partir de Roma, por todo o Ocidente, devemos a Santa Helena esse inestimável presente: a descoberta da verdadeira Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

 

Celebra-se no dia 18 de agosto a festa de Santa Helena, Imperatriz e viúva, mãe de Constantino Magno. A ela se deve a invenção, isto é, a descoberta da verdadeira Cruz na qual Nosso Senhor Jesus Cristo foi crucificado.

Benéfica e salutar influência materna

Em vez de considerar este ou aquele aspecto da vida de Santa Helena, gostaria de ressaltar a impressão que o todo de sua personalidade nos comunica. Nesse sentido, eu diria que se trata de uma santa cuja importância para o panorama da Igreja redunda, não apenas do fato de ter sido imperatriz, mas também porque teve sobre Constantino uma evidente e salutar influência.

Quer dizer, temos Constantino, o primeiro imperador que faz uma promessa de dar livre curso ao culto católico no Ocidente, caso se visse auxiliado por Nosso Senhor Jesus Cristo na batalha de Ponte Mílvia. Ele recebe a célebre visão do “in hoc signo vinces” — “com este sinal vencereis” —, portanto uma confirmação do socorro divino, conquista a vitória e cumpre sua promessa. Com o Edito de Milão ele concede liberdade à Igreja Católica, e a partir daí começaria a ruir o paganismo sobre o qual o estado se assentava.

Diante desse acontecimento de fundamental importância para a Cristandade, não se pode deixar de reconhecer a materna e católica influência de Santa Helena sobre o filho. Quando nos lembramos de Santa Mônica rezando por Santo Agostinho e obtendo do Céu a conversão dele, ou quando recordamos o papel de Santa Clotilde junto a seu esposo, Clóvis, trazendo-o igualmente para o seio da Igreja Católica e, com ele, o povo franco, é difícil não pensar que Santa Helena impressionou a fundo Constantino, e que a atitude dele foi motivada, em grande medida, pela ascendência da mãe.

Na raiz da ordem social e temporal católica

Ora, se, católicos que somos, desejamos de toda a alma uma restauração da ordem social e temporal católica como a que vigorou nos dias áureos da Civilização Cristã, não podemos deixar de reconhecer, com muita alegria, o trabalho feito por Santa Helena com esse objetivo: não só fazer cessar as perseguições à Igreja no império romano pagão, mas também fazer com que o imperador começasse a edificar uma ordem temporal católica, prólogo da plenitude de catolicidade que alcançaria o Estado medieval.

Início este, diga-se, por vários lados verdadeiramente glorioso. Pela liberdade franqueada à Igreja, pelo fim dos cultos pagãos, e por esse ideal de unidade social católica que desabrocharia nos esplendores da Cristandade européia, os quais perdurariam ao longo de séculos.

Portanto, pela sua oração, pelo exemplo de suas virtudes, Santa Helena esteve na raiz de uma série de realizações gloriosas, de idéias grandiosas, de princípios que repercutiriam mesmo após o ocaso do Sacro Império Romano Alemão, até os nossos dias. Razão pela qual nos é particularmente cara a devoção a essa grande santa.

Oração que conduz à ação eficaz

Chamo a atenção para esse ponto acima mencionado: as orações de Santa Helena. É necessário compreender aqui o equilibrado do papel dessa oração.

Com efeito, seria equivocado imaginar que, uma vez recitadas as preces, não adianta fazer coisa alguma. Basta rezar e deixar as realizações concretas ao beneplácito da Providência. Às vezes, quando as vicissitudes o impõem, não se pode pretender outra coisa. Porém, é apropriado esperar que a oração nos mova à ação que realiza o fim almejado. E desse teor foram as preces de Santa Helena.

Enquanto a mãe rezava, o filho lutava e agia. Constantino, protegido pelo socorro do Céu, levando no seu lábaro o emblema de Nosso Senhor Jesus Cristo, combateu e alcançou a vitória. Em seguida, agiu vigorosamente, com a força temporal do Estado, para libertar a Igreja e extinguir os restos do paganismo.

 Creio ver nessa circunstância o equilíbrio perfeito entre oração e ação. Santa Helena reza, e sua oração é acompanhada certamente de atitudes e palavras evangelizadoras junto ao filho, e este cuida dos meios materiais para concretizar aquilo que, sem dúvida, sua mãe desejava realizar. A oração é a razão mais fecunda do desencadear dos fatos; os fatos produzem os frutos da prece atendida.

Aquela que tirou das entranhas da terra o Santo Lenho

Cumpre considerar, ainda, este outro e não menos belo florão na vida de Santa Helena: foi ela que encontrou a verdadeira Cruz, um acontecimento cercado de milagres e dádivas especiais de Deus. É o Santo Lenho do qual se espalharam relíquias para serem veneradas pelos fiéis do mundo inteiro.

Que glória para essa mulher ter sido, ao mesmo tempo, a mãe do primeiro imperador cristão e aquela que tirou das entranhas da terra a verdadeira Cruz, com todos os benefícios espirituais oriundos dessa descoberta!

Então admiramos ainda mais o vulto dessa Santa, conhecemos melhor a estatura dessa alma, um grande tipo de mulher que vive só para Nosso Senhor. Matrona de espírito elevado e de horizonte largo, compreendendo as coisas a partir dos seus aspectos mais sublimes e de maior alcance. E que, por causa dessa envergadura espiritual, transforma um Império e dá ao mundo o presente imensamente grandioso da verdadeira Cruz de Cristo. v

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 18/8/1964)

 

O maravilhoso na vida de Santa Clara de Montefalco

Muito maiores que as belezas do universo material são aquelas existentes nas almas dos Santos. A vida de Santa Clara de Montefalco está repleta de maravilhas. De tal modo ela amou a Cruz do Redentor que, após sua morte, em seu coração foram encontrados símbolos de instrumentos usados na Paixão de Nosso Senhor: cravos, coroa de espinhos, lança, açoite, esponja, coluna; e até mesmo três pequenas esferas representando a Santíssima Trindade.

Vamos considerar uma ficha a respeito da vida de Santa Clara de Montefalco.

Admirável virgindade

Santa Clara de Montefalco nasceu no ano de 1268 em Montefalco, cida-de da Úmbria, na Itália, e morreu em 1308. Ela conservou, durante toda sua vida, um grande ardor na oração. Na idade de cinco anos, compreendendo os perigos da vida no mundo, ela pediu a sua irmã, Joana, para admiti-la na pequena comunidade que essa irmã Joana dirigia, e que seguia as regras da Ordem Terceira de São Francisco. E a irmã só atendeu a esses pedidos ao cabo de um ano.

Uma vez, na idade de nove anos, ela deixou, ao dormir, seu pequeno pé nu sair da cama. A sua irmã Joana, que observou, a repreendeu, e lhe disse que isso não era conveniente a uma virgem. A pequena Clara teve tanto pesar que, depois disso, ela sempre envolvia muito estreitamente seus pés, antes de dormir.

Mais tarde, ela não permitiu nem sequer às religiosas de tocá-la com a mão. Ela recomendava às suas filhas nunca descobrir seu próprio corpo, mesmo na obscuridade. Ela observava isso tão estritamente para si mesma, que nunca quis mostrar ao médico nenhuma parte de seu corpo sem um véu.

Ela dizia também que as virgens não devem ter familiaridade nem com homens, nem com mulheres casadas, porque essa integridade perfeita dá a imortalidade ao corpo, que embalsamado pela flor da virgindade é preservado, assim, de toda corrupção.

Com a morte de sua irmã, Joana, ela foi eleita abadessa, e preencheu esse cargo com tanta prudência que jamais o demônio pôde alcançar êxito em enganá-la, por qualquer artifício que fosse. Como ele tinha observado que ela era muito assídua na contemplação da Paixão de Jesus Cristo, apareceu-lhe uma vez sob a forma de um crucifixo, com o corpo completamente descoberto a fim de despertar nela, por essa via, pensamentos ignóbeis. Mas a virgem reconheceu a arma escondida do adversário e deu risada. O demônio, furioso, desapareceu.

Deus lhe deu uma tal inteligência das coisas divinas que ela ousou combater uma heresia de seu tempo, participando de discussões, onde ela convenceu publicamente um de seus adeptos de mentira e de dissimulação.

Ela conhecia o pensamento oculto das pessoas e, por vezes, tinha o dom de profecia.

Nosso Senhor Jesus Cristo, Ele mesmo, veio uma vez lhe dar a Comunhão.

Após a morte, seu corpo permaneceu incorrupto

Ela teve, certo dia, um ligeiro movimento de impaciência em relação a uma irmã, que lhe assegurava que, apesar de seus esforços, não encontrava nenhuma suavidade na oração.

Não foi necessário mais do que isso para que ela fosse imediatamente privada, ela mesma, de toda consolação, acabrunhada de penas interiores. A noite de alma em que ela foi mergulhada não durou uma semana, nem um mês, mas onze anos inteiros. Depois dessa noite espiritual, o Divino Sol inundou sua alma com sua imortal claridade, e ela se viu elevada por uma concatenação de êxtases, parecendo pertencer mais ao Céu do que à Terra. Nesse estado ela ouvia o concerto dos Anjos, via o Menino Jesus na manjedoura do pobre estábulo de Belém, os Magos ajoelhados para adorar o Menino Jesus.

Certo dia, ela ouviu essas palavras dos lábios de Nosso Senhor:
— Venha Clara, venha! Tua vinda me será agradável.
— Senhor — respondeu ela — eu desejaria me dissolver para me unir a Vós.
— É preciso esperar mais um pouco, minha filha. Teu dia não chegou — respondeu o Senhor.

Uma outra vez o Senhor lhe apareceu na figura de um peregrino, carregando uma cruz sobre os ombros, e lhe disse:

— Minha filha, procurando o que poderia te oferecer de mais agradável a teu coração, me pareceu que minha Cruz seria a coisa que mais te conviria. Recebe-a, oscula-a e dá-me teu coração, a fim de que possas morrer para a Cruz, sobre a Cruz.

Ela morreu no ano de Nosso Senhor de 1308, no dia seguinte da Assunção, na idade de quarenta anos. Seu corpo foi enterrado em seu mosteiro, onde repousa ainda hoje. Conservado inteiro, e com a carnatura flexível como se acabasse de ser sepultado ontem, seu corpo é branco como o alabastro. Sua completa conservação foi constatada de novo sob o pontificado de Pio IX, de feliz memória.

Em seu coração, os instrumentos da Paixão

A santa alma de Clara, deixando seu corpo, nele fixou sinais evidentes de sua glória. E como as irmãs conhecessem sua terna devoção para com a Paixão, e tinham ouvido Clara dizer várias vezes, antes de sua morte, que ela carregava Jesus Cristo crucificado em seu coração, elas foram tomadas de desejo de se inteirarem exatamente desse fato, antes de confiar seu corpo à terra. Decidiram, portanto, fazer a autópsia e examinar o mistério de seu corpo; constataram, antes de tudo, que seu coração estava muito inchado e tinha o tamanho da cabeça de uma criança pequena. Demais, uma região estava completamente dura.

Segundo os médicos, é impossível a uma criatura humana viver nesse estado. Abriram o seu coração e nele encontraram, naturalmente em ponto pequeno, os instrumentos da Paixão. Uma irmã dividiu o coração em duas partes, e sua mão foi tão feliz que nenhum dos instrumentos da Paixão que ali estavam foi atingido. As irmãs, profundamente surpresas e felizes, deram graças a Deus pelo fato.

Na parte direita apareceu marcada a imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo, preso à Cruz, mais ou menos da grossura do polegar. Nosso Senhor tinha os braços estendidos, a cabeça inclinada à direita, avançando um pouco sobre os ombros. O flanco direito era lívido com a chaga aberta e sangrando. Em torno dos rins havia um tecido manchado de sangue. Havia também, nessa parte do coração, três nervos aos quais estavam presos três pregos duros e pontudos, um deles notavelmente maior que os outros. Por cima dos pregos, um nervo cor de ferro, terminado em ponta dura. Essa ponta era aguda, penetrava como ferro, e representava a lança com a qual Longinos tinha transfixado o flanco do Salvador.

Enfim, na mesma parte do coração, estava ainda uma bola de nervos menores, representando a esponja com a qual o fel e vinagre foram tornados presentes a Nosso Senhor. Na parte esquerda se encontravam os açoites: eram cinco nervos entrelaçados com muitos nós e reunidos por um cabo comum. Depois do açoite se encontrava um nervo maior, representando a coluna da flagelação, cercada por nervos sangrando, figurando as cordas com as quais o Senhor foi ligado. Por cima da coluna, a coroa de espinhos, formada por nervos entrelaçados como espinhos duros e pontudos. Todas essas insígnias, ainda que formadas de carne, eram duras como os instrumentos reais da Paixão de Nosso Senhor.

Quando as religiosas viram todas essas maravilhas e consideraram uma a uma com respeito e admiração, elas informaram — na ausência do Bispo de Spoleto — ao seu vigário Béranger, que fez um exame minucioso e pôde se inteirar da realidade do que acaba de ser dito. Ele espantou-se, sobretudo com o fato de que esses instrumentos, separados do coração, tinham toma-do consistência pela dureza da madeira e da pedra. Várias dessas insígnias foram postas nas mãos do Papa João XXII, quando ele fez o exame da vida de Clara, para a beatificação.

Símbolo da Santíssima Trindade

As irmãs recolheram o sangue que corria do coração, quando ele foi aberto e o puseram em uma ampola de vidro.

O sangue difundiu, nesse momento, um odor suave. Ele permaneceu coagulado até hoje. E quando uma tempestade grave ameaça a Igreja, vê-se que esse sangue se agita e se põe em ebulição, o que significa a cólera de Deus.

A região endurecida foi aberta igualmente e examinada pelos médicos. Ali encontraram três pequenas esferas, cor de cinza e manchadas de vermelho; eram todas as três da mesma grossura e do mesmo peso, duras como sílex, e colocadas em forma de triângulo. Elas representavam manifestamente o mistério da Santíssima Trindade; eram absolutamente iguais umas às outras em tudo. O que causa maior admiração é que cada uma dessas bolas era exatamente do mesmo peso que as outras duas.

Isso é mais notável, porque parece uma contradição: pondo numa balança de duas conchas as três bolas, cada vez que se punha uma bola separada, ela pesava tanto quanto as outras duas. Isso é altamente teológico, porque é outro modo de exprimir que as três Pessoas da Santíssima Trindade são tão iguais entre si, que não se pode dizer que duas valham mais do que uma. O que é o auge, o suprassumo da igualdade.

E ao ser colocada numa das conchas da balança uma das bolas e, na outra, uma pedra ou qualquer objeto de peso igual, e que se acrescentasse as outras duas esferas na balança, onde já havia uma, a balança permanecia imóvel como na primeira operação.

Sem dúvida, um verdadeiro milagre.

Era um sinal manifesto da Santíssima Trindade; una quanto à essência, diversa quanto às Pessoas. Uma das três bolas partiu-se por si mesma no momento em que a França, maculada pela heresia de Calvino, causou tantos males à Igreja.

Santa Clara de Montefalco foi canonizada por Leão XIII, no dia 8 de dezembro de 1881.

O universo é repleto de maravilhas

Trata-se de uma vida toda ela feita para causar certo arrepio no homem contemporâneo. Enquanto estava lendo, olhei meus ouvintes com os olhos do espírito, quer dizer, com o conhecimento que tenho do homem de nossos dias, e me pareceu que, para além da ficha que eu lia, sentia no ar algumas vozes se levantarem dentro de alguns — que quero crer não tenham dado consentimento a essas vozes — dizendo interiormente o seguinte:

“Mas como pode ser uma coisa dessas? Como é possível tanta maravilha, uma em cima da outra? Isso deve ser inventado, porque uma maravilha, vá lá; duas maravilhas, vá lá; mas cinquenta maravilhas acumulando-se uma em cima da outra sobre essa freira! Manifestamente, tantas maravilhas juntas não pode ser.”

Eis a curteza de vistas a que o positivismo leva o homem contemporâneo. A mania de só tomar em consideração a realidade concreta, e a ideia de que a maravilha é algo excepcional; que o normal das coisas é que elas não sejam maravilhosas, e que já é puxado aceitar uma maravilha; é duro demais aceitar duas, ou três, ou cinco…

Precisamos compreender até que ponto essa ideia é absurda.

O universo que nos cerca é cheio de maravilhas. Cada estrela é uma maravilha. Olhem para o céu: quantas estrelas percebemos? Deus, que fez tantas maravilhas, realizou ainda maiores para ilustrar a alma de alguns Santos. Tudo quanto existe foi criado para a santificação do homem.

Ora, para santificar os homens, terá Deus feito maravilhas maiores do que os Santos, que eram objeto de todas essas maravilhas? Quer dizer, o meio foi melhor do que o fim? O poder, a sabedoria e a bondade de Deus foram mais extraordinários nos instrumentos do que na realização da meta deles?

Num mundo opaco, horrendo, trágico, conspurcado e abandonado…

Tornando mais clara a argumentação:

Tudo quanto existe no universo visível foi criado para a santificação do homem. Não tem outra razão de ser. Portanto, estrelas e todas as outras maravilhas são belas a fim de que o homem tenha uma ideia da perfeição e da beleza divinas, para que assim santifiquem os homens. Logo, tudo isso não é senão um meio para a santificação. O meio tendo sido tão maravilhoso, o fim precisa ser muito mais maravilhoso, porque seria um absurdo Deus fazer o meio mais belo do que o fim. O meio é sempre inferior ao fim.

Se é assim, Ele há de ter posto nas almas dos Santos maravilhas incomparavelmente maiores e mais numerosas do que as que vemos em torno de nós. Portanto, é muita mesquinharia de espírito, lendo uma vida de Santo, dizer: “Deus não há de ter feito tanta maravilha para uma só pessoa.”

Pois se Ele fez tantas maravilhas para a pessoa ficar santa, não faria maiores ainda no realizar a santidade dessa pessoa, que é o ponto terminal da operação d’Ele? Quem pode pôr isso em dúvida? Que um ateu duvide, compreende-se. Mas que um católico ponha isso em dúvida é o auge do irracional.

Isso nos leva a uma outra consideração, a meu ver muito importante. Eu a formulo da seguinte maneira:

Devemos compreender que é por causa desse mundo revolucionário, dos pecados que temos cometido, do castigo divino em relação a esse mundo, que Deus se ausenta dele e deixa–o como está: opaco, horrendo, trágico, conspurcado e abandonado. Esse é o mundo do qual se retirou o amor de Deus, e que está entregue à sua cólera.

Então, não se notam hoje as maravilhas de outrora. Mas antigamente, quando as maravilhas de Deus apareciam num mundo a quem Ele amava e que amava a Deus, isso tudo tinha qualquer coisa de paradisíaco e a Providência era muito mais larga com sua generosidade, com sua bondade, do que é nos dias de hoje, em relação aos filhos da Revolução.

De maneira que devemos ter o espírito pronto para a seguinte ideia: É verdade que na atual ordem da Providência, a maravilha, o milagre é uma exceção. Mas não é algo tão raro quanto se pensa. Ademais, coisas maravilhosas não claramente milagrosas são muito mais frequentes do que se pensa. É questão apenas de se ter uma alma sedenta de maravilhas, crendo que estas podem ser numerosas e que Deus as multiplica ao longo de nossos passos. Pedindo-as e desejando-as muito, o Altíssimo fará as maravilhas em nós também. Sermos sedentos de maravilhas, maravilháveis, tornará maravilhosas as nossas almas. E Deus poderá fazer também por nós coisas que Ele realizou por Santa Clara de Montefalco.

…Nossa Senhora fará maravilhas ainda maiores

Assim nós devemos abrir os horizontes de nossas almas enormemente; e tomar outra envergadura; ter o espírito completamente voltado para uma outra dimensão, outro sistema de medir as coisas. E compreender que rezando, pedindo, esperando, desejando, nós poderemos receber incomparavelmente mais do que aquilo que conseguiríamos imaginar.

De algum modo nosso Movimento é isso. Eu estou lhes narrando, aos sábados, a história de nosso Movimento, e verificamos que ocorreram coisas as quais no começo da estacada se reputavam impossíveis. Estão feitas. Se o impossível está realizado, não há limite para o impossível. A partir do momento em que esta sineta colocada sobre minha mesa, por si mesma, se suspenda cinco centímetros, é igualmente fácil que ela chegue até a Lua. O primeiro ponto é ela levantar os cinco centímetros. Mas se há um poder sobrenatural que a ergue cinco centímetros, para esse poder não é nada levantá-la acima de todas as coisas da Terra; e não é nada levá-la até a Lua, ou a qualquer outro astro. A questão é levantar os cinco primeiros centímetros.

Nossa Senhora levantou os “cinco primeiros centímetros” na história de nosso Movimento. E é preciso reconhecer que nós fizemos força em sentido contrário…

Essa é talvez a maior das maravilhas: a aeronave subiu com muita gente dentro chorando de saudades da Terra, e olhando pela janelinha, dizendo adeus para círculos mundanos, pulando para ver se a aeronave não subia. A aeronave subiu cinco centímetros. Se nós aproveitarmos bem lições como essa, o que há de maravilhoso na vida de Santa Clara de Montefalco, então compreenderemos bem quanto é de esperar que Maria Santíssima faça ainda mais maravilhas muito maiores. Essa é a lição que a vida de Santa Clara de Montefalco nos traz.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 7/12/1973)

São Bernado

O aparecimento de São Bernardo na história foi como um esplendoroso nascer de sol. Ele é um dos sóis da Ordem Beneditina, é um dos sóis da Igreja Católica, é um dos sóis de toda a devoção mariana. É, por excelência, o homem da penitência e da mortificação. Homem que se transformou numa tocha ardente, numa chama de fogo deambulando pela Cristandade, purificando todas as  coisas pela sua eloquência e seu espírito repassado de indomável fervor. Homem da polêmica, que enfrentou e venceu em luta estrênua os maiores adversários do catolicismo no seu tempo.

Ao mesmo tempo, é o varão dulcíssimo, o “Doctor Melifluus” — Doutor com palavras doces como o mel  — , que soube como ninguém louvar a bondade e a misericórdia insondáveis de Nossa Senhora. D’Ela falou com tanta unção e arrebatamento, que pode ser considerado o literato, o poeta de Maria Santíssima na Igreja do Ocidente.

Plinio Corrêa de Oliveira

Assunção de Nossa Senhora

Quando ascendeu ao Céu, Maria pôde contemplar os coros angélicos e a multidão de bem-aventurados que A receberam em festa. Considerações de Dr. Plinio manifestando seu encanto com a Assunção de Nossa Senhora

Devoção às alegrias de Nossa Senhora

Era costume entre os antigos reportar-se às alegrias da Santíssima Virgem. Essa era uma devoção bastante difundida, a ponto de um dos santuários marianos mais famosos do Brasil, o de Guararapes, em Pernambuco, ser dedicado a Nossa Senhora dos Prazeres.

Na vida de Nossa Senhora notamos inúmeros movimentos de alegria. O mais insigne deles é evidentemente o Magnificat.

Porém, nenhuma das alegrias que a Santíssima Virgem teve nesta vida foi tão grande quanto à da sua Assunção.

Após a dormitio(1), Maria ressuscitou no apogeu de seu estado físico, mas também no auge de sua vida espiritual, pois a maturidade do corpo e a maturidade da alma se relacionam.

No dia de sua Assunção, Nossa Senhora estava na plenitude da santidade. Sua alma santíssima, que não deixou de progredir um minuto sequer durante toda a sua existência terrena, tinha chegado ao clímax. A Virgem Maria chegara à suprema perfeição. Possuía incomparável beleza de alma, pois estava repleta de virtude; seu amor a Deus atingira o apogeu. Essa santidade transluzia em toda a sua pessoa e Lhe dava uma beleza incomparável.

Entrada de Maria no Céu

Podemos imaginar sua alegria, sabendo que, a partir daquele momento, entraria no Céu com corpo e alma. Passaria por um cortejo incontável de Anjos, que prestariam a Ela homenagens como nunca nenhuma rainha deste mundo, nem de longe, recebeu. E Ela compreendia a natureza de cada Anjo, sua luz primordial(2), a graça recebida por cada um, seu amor a Deus, e o amor de Deus para com cada um deles. Maria Santíssima tinha o conhecimento perfeito da hiperdulia que as miríades de Anjos Lhe prestariam. E Ela, tendo uma alegria completa por cada um desses louvores, sabia que os merecia, porque tinha sido a Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e seu espelho fidelíssimo.

Imaginemos que um Anjo da guarda aparecesse para um de nós e dissesse: “Meu filho dileto, você é extraordinário! Sobre você pousam todas as minhas complacências. Você é inteiramente digno de minha benevolência.” Esta pessoa teria grande tentação de vaidade. Um elogio desses, feito por uma natureza angélica, imensamente maior do que a nossa, é algo inebriante…

Sendo mera criatura humana, Nossa Senhora estava recebendo o amor entusiástico de todos os Anjos, e a corte que durante milhares de anos tinha esperado sua Rainha ficou transformada em algo lindíssimo, porque Ela estava chegando. A beleza do mundo angélico não atingira toda a formosura para a qual fora criado, porque era preciso que uma criatura humana o governasse. Nossa Senhora coroava com uma perfeição altíssima a beleza do Céu.

Certamente, Ela deve ter se encontrado com as almas santas que tinham subido ao Céu após a morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, e sem dúvida encontrou-se com São José, com quem permutou uma saudação cheia de respeito e afeto sobre a qual nem sequer podemos ter idéia. Como deverá ter sido a alegria da alma de São José ao rever Nossa Senhora?

Beleza do transluzimento da santidade em Nossa Senhora

Maria Santíssima crescia continuamente em graça e santidade, por isso, quando chegou a hora de sua morte, Ela era muito mais santa do que quando São José morreu. Quando ele A viu ressurrecta, repleta de toda a santidade que deveria atingir segundo os planos de Deus — e que de fato Ela atingiu —, notou que a santidade transluzia em toda a sua pessoa com uma beleza incomparável. Com que veneração São José, afinal, via Nossa Senhora em corpo e alma, cujo esplendor era ainda maior do que Ela possuía na Terra!

São Joaquim e Santa Ana, sendo pais de Nossa Senhora, devem certamente ter tido o privilégio de assistirem, a partir de um lugar de destaque o ingresso d’Ela no Céu. Sabemos que os pais têm uma propensão natural por seus filhos, sobretudo quando são excelentes pais. Afinal, era justo que, tendo dado Maria Santíssima ao gênero humano, assistissem de um lugar especial a sua entrada no Céu.

Adão e Eva, os primeiros pais do gênero humano, deveriam estar ali presentes. Depois de verem tantas desgraças causadas por seu pecado, puderam contemplar o remédio concedido por Deus para solucionar esse pecado, fazendo nascer Nosso Senhor Jesus Cristo e glorificando de tal maneira a Mãe Imaculada do Redentor.

Podemos ainda imaginar o desfile maravilhoso das almas eleitas e dos Anjos que A receberam no Céu, por assim dizer gradualmente, num como que desfile esplêndido, cantando hinos de glória. E, afinal, todo o paraíso celeste pondo-se a cantar, enquanto Ela sobe até o trono da Santíssima Trindade.

Por fim, a Assunção chega ao seu auge: a coroação de Nossa Senhora como Rainha dos Anjos e dos Santos, do Céu e da Terra, pela Santíssima Trindade. Houve então uma verdadeira festa no Céu. Não é uma hipérbole, mas uma festa autêntica, em termos e modos que não podemos imaginar. Foi o mais alto grau de alegria que possa haver. Ela foi coroada por ser Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, Filha do Padre Eterno e Esposa do Divino Espírito Santo.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 15/8/1966 e 1/11/1975)

1) A morte d’Ela foi tão leve que se compara a uma dormição.
2) Dr. Plinio assim designava o conjunto de virtudes ou atributos divinos que cada Anjo, ou cada alma, é especialmente chamado a conhecer e amar.

 

Assumpta est Maria, gaudent angeli!

Quando ascendeu ao Céu, Maria pôde contemplar os coros angélicos e a multidão de bem-aventurados que A receberam em festa. Considerações de Dr. Plinio manifestando seu encanto com a Assunção de Nossa Senhora

 

Devoção às alegrias de Nossa Senhora

Era costume entre os antigos reportar-se às alegrias da Santíssima Virgem. Essa era uma devoção bastante difundida, a ponto de um dos santuários marianos mais famosos do Brasil, o de Guararapes, em Pernambuco, ser dedicado a Nossa Senhora dos Prazeres.

Na vida de Nossa Senhora notamos inúmeros movimentos de alegria. O mais insigne deles é evidentemente o Magnificat.

Porém, nenhuma das alegrias que a Santíssima Virgem teve nesta vida foi tão grande quanto à da sua Assunção.

Após a “dormitio”(1), Maria ressuscitou no apogeu de seu estado físico, mas também no auge de sua vida espiritual, pois a maturidade do corpo e a maturidade da alma se relacionam.

No dia de sua Assunção, Nossa Senhora estava na plenitude da santidade. Sua alma santíssima, que não deixou de progredir um minuto sequer durante toda a sua existência terrena, tinha chegado ao clímax. A Virgem Maria chegara à suprema perfeição. Possuía incomparável beleza de alma, pois estava repleta de virtude; seu amor a Deus atingira o apogeu. Essa santidade transluzia em toda a sua pessoa e Lhe dava uma beleza incomparável.

Entrada de Maria no Céu

Podemos imaginar sua alegria, sabendo que, a partir daquele momento, entraria no Céu com corpo e alma. Passaria por um cortejo incontável de Anjos, que prestariam a Ela homenagens como nunca nenhuma rainha deste mundo, nem de longe, recebeu. E Ela compreendia a natureza de cada Anjo, sua luz primordial(2), a graça recebida por cada um, seu amor a Deus, e o amor de Deus para com cada um deles. Maria Santíssima tinha o conhecimento perfeito da hiperdulia que as miríades de Anjos Lhe prestariam. E Ela, tendo uma alegria completa por cada um desses louvores, sabia que os merecia, porque tinha sido a Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e seu espelho fidelíssimo.

Imaginemos que um Anjo da guarda aparecesse para um de nós e dissesse: “Meu filho dileto, você é extraordinário! Sobre você pousam todas as minhas complacências. Você é inteiramente digno de minha benevolência.” Esta pessoa teria grande tentação de vaidade. Um elogio desses, feito por uma natureza angélica, imensamente maior do que a nossa, é algo inebriante…

Sendo mera criatura humana, Nossa Senhora estava recebendo o amor entusiástico de todos os Anjos, e a corte que durante milhares de anos tinha esperado sua Rainha ficou transformada em algo lindíssimo, porque Ela estava chegando. A beleza do mundo angélico não atingira toda a formosura para a qual fora criado, porque era preciso que uma criatura humana o governasse. Nossa Senhora coroava com uma perfeição altíssima a beleza do Céu.

Certamente, Ela deve ter se encontrado com as almas santas que tinham subido ao Céu após a morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, e sem dúvida encontrou-se com São José, com quem permutou uma saudação cheia de respeito e afeto sobre a qual nem sequer podemos ter ideia. Como deverá ter sido a alegria da alma de São José ao rever Nossa Senhora?

Beleza do transluzimento da santidade em Nossa Senhora

Maria Santíssima crescia continuamente em graça e santidade, por isso, quando chegou a hora de sua morte, Ela era muito mais santa do que quando São José morreu. Quando ele A viu ressurrecta, repleta de toda a santidade que deveria atingir segundo os planos de Deus — e que de fato Ela atingiu —, notou que a santidade transluzia em toda a sua pessoa com uma beleza incomparável. Com que veneração São José, afinal, via Nossa Senhora em corpo e alma, cujo esplendor era ainda maior do que Ela possuía na Terra!

São Joaquim e Santa Ana, sendo pais de Nossa Senhora, devem certamente ter tido o privilégio de assistirem, a partir de um lugar de destaque o ingresso d’Ela no Céu. Sabemos que os pais têm uma propensão natural por seus filhos, sobretudo quando são excelentes pais. Afinal, era justo que, tendo dado Maria Santíssima ao gênero humano, assistissem de um lugar especial a sua entrada no Céu.

Adão e Eva, os primeiros pais do gênero humano, deveriam estar ali presentes. Depois de verem tantas desgraças causadas por seu pecado, puderam contemplar o remédio concedido por Deus para solucionar esse pecado, fazendo nascer Nosso Senhor Jesus Cristo e glorificando de tal maneira a Mãe Imaculada do Redentor.

Podemos ainda imaginar o desfile maravilhoso das almas eleitas e dos Anjos que A receberam no Céu, por assim dizer gradualmente, num como que desfile esplêndido, cantando hinos de glória. E, afinal, todo o paraíso celeste pondo-se a cantar, enquanto Ela sobe até o trono da Santíssima Trindade.

Por fim, a Assunção chega ao seu auge: a coroação de Nossa Senhora como Rainha dos Anjos e dos Santos, do Céu e da Terra, pela Santíssima Trindade. Houve então uma verdadeira festa no Céu. Não é uma hipérbole, mas uma festa autêntica, em termos e modos que não podemos imaginar. Foi o mais alto grau de alegria que possa haver. Ela foi coroada por ser Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, Filha do Padre Eterno e Esposa do Divino Espírito Santo.

 

(Extraído de conferências de 15/8/1966 e 1/11/1975)

 

1) A morte d’Ela foi tão leve que se compara a uma dormição.

2) Dr. Plinio assim designava o conjunto de virtudes ou atributos divinos que cada Anjo, ou cada alma, é especialmente chamado a conhecer e amar.

A Assunção e o maternal legado da Virgem Maria

Ao concluir seu Evangelho, São João afirma que se fossem narrados todos os feitos do Salvador, “nem o mundo inteiro poderia conter os livros que seria preciso escrever”(1).

Não obstante a beleza e profundidade desta afirmação, quem de nós leu os Evangelhos sem se lamentar, nesta ou naquela passagem, da ausência de certos detalhes que julgávamos indispensáveis à nossa piedade?

Se isso ocorre com as narrativas evangélicas, o que dizer, então, dos episódios que, por misteriosos desígnios de Deus, nem sequer foram mencionados nas páginas sagradas?

Tal se dá com a Assunção da Santíssima Virgem, cujos esplendores ocultam-se misteriosamente sob o véu do silêncio, rompido apenas pela Tradição e pela elucubração teológica, entretanto suficientemente eloquentes para fundamentar tão augusta verdade. Com efeito, a força da Tradição, que Dr. Plinio relaciona intimamente a Maria nesta edição(2), afirma-se de modo incontestável no dogma da Assunção de Nossa Senhora ao Céu.

Como os Evangelistas, também a proclamação deste dogma mariano não fornece detalhes… Contudo, isso favorece a ação do Espírito Santo em nossas almas, permitindo-nos imaginar piedosamente aquilo que a Revelação e o Magistério não explicitaram.

Para Dr. Plinio(3), a Assunção começa com a manifestação de todas as glórias que havia em Nossa Senhora, como ocorrera com seu Divino Filho no Tabor, causando nos presentes exclamações de admiração.

Ao mesmo tempo, no auge dessa “mariofania”, todos devem ter experimentado uma tal intimidade e união com Ela, vendo-A “tão meiga, tão afagante, tão tonificante, tão reparadora e tão mãe, que se sentiam como ajoelhados junto a Ela, recebendo suas carícias, ‘embebidos’ d’Ela, como um papel pode estar impregnado de perfumado azeite”.

Em determinado momento, “começam os ares a se mover, e os ventos como que a tomar forma e flutuar de modo singular; definem-se figuras angélicas e o céu se revela sucessivamente povoado de Anjos a cantar. Nossa Senhora, atingindo o auge de esplendor indescritível, torna pálidos os puros espíritos, entretanto tão majestosos!

“Chega a hora da despedida… A Virgem Maria começa a mover-se, olhando um a um com afeto, na tentativa de transpor a distância física que aumenta a cada instante. Os Anjos cantam celestialmente e, por fim, Nossa Senhora desaparece no céu. Os cânticos angélicos fazem-se ouvir por mais alguns instantes para consolar os homens, mas depois vão desaparecendo também gradualmente.”

Restava à humanidade enlevada, a doce lembrança desse augusto momento, perpetuada ao longo dos séculos pela Tradição e por um certo imponderável, maternal legado da Santíssima Virgem que permitirá sempre, a qualquer fiel verdadeiramente sincero, reconstituir e reconhecer a face inteira da Igreja(4).

Plinio Corrêa de Oliveira

1) Jo 21, 24.
2) Ver seção “Reflexões teológicas”, número 185 da Revista Dr Plinio, p. 22-25.
3) Citações adaptadas, extraídas de conferência de 15/8/1980.
4) Cf. “Reflexões teológicas”, no número 185 da Revista Dr Plinio, p. 25.

São Cura d’Ars

A um erudito advogado que retornava de sua visita à cidade francesa de Ars, perguntaram o que mais o havia interessado naquele povoado. “Vi Deus num homem”, respondeu o profissional das leis aos seus atônitos interlocutores. De fato, ele conhecera São João Maria Vianney, em cuja alma luminosa e perfeita se podia contemplar um magnífico reflexo da infinita santidade divina.

Muitos se convertiam apenas o observando a pregar no púlpito, de longe, admirando-lhe os gestos e a atitude, sem sequer conseguir ouvi-lo. Imbuído e compenetrado das doutrinas que ensinava, as pessoas tinham a sensação de um como que contato vivo com as verdades das quais ele era arauto.

O Cura d’Ars pertence a essa categoria de homens a quem Deus confere a missão de tornar de algum modo translúcido o sobrenatural. De sorte que, perto deles, sentimos o que os Apóstolos  experimentaram no Tabor, junto a Nosso Senhor Jesus Cristo.

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 77 (Agosto de 2004)

Espelho fidelíssimo de Jesus

Nossa Senhora devia conhecer o dia de sua Assunção, porque Ela estava na plenitude de sua santidade. Sua vida espiritual, que não deixara um instante de progredir de um modo admirável durante toda a sua existência, tinha chegado àquele clímax em que Ela possuía a perfeição perfeitíssima, a beleza belíssima, a virtude virtuosíssima, que tinha chegado, portanto, ao apogeu dos apogeus, e seu amor de Deus nunca fora maior do que naquele momento. Ela então sabia que, imediatamente depois de ressuscitada, seria elevada ao Céu.

Imaginem o estado de espírito de Maria Santíssima ao saber que, a partir daquele instante, iria gozar da visão beatífica, que Ela passaria por um cortejo infindo de Anjos dos quais receberia as maiores homenagens possíveis; e tendo uma ciência perfeita da hiperdulia dos milhões e milhões de espíritos celestes, todos se dirigindo a Ela e aclamando-A com o maior amor, o maior respeito, a maior veneração!

Ao tomar conhecimento de cada louvor, a Santíssima Virgem sentia um amor e um gáudio completos, ciente de que esses louvores eram merecidos, porque Ela tinha sido a Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e o espelho fidelíssimo de seu Divino Filho.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 15/8/1966)