Santo Estêvão, Rei Apostólico

Assim como cada indivíduo, também o Estado deve praticar os Dez Mandamentos. Ele existe, antes de tudo, para servir à Igreja e favorecer o Reino de Deus. Esse princípio foi praticado eximiamente por Santo Estevão, e constitui o fundo das concepções políticas de Dr. Plinio.

Santo Henrique, Imperador do Sacro Império Romano Alemão, se interessou pela conversão do povo húngaro, e destinou para isso a sua irmã Gisela, cujo casamento ele promoveu com o rei pagão daquele povo. Pela ação de Santo Henrique, da Rainha Gisela e de pregadores santos que foram para a Hungria, foi possível converter o rei, e com a conversão dele se tornou mais fácil a conversão dos húngaros. Este rei foi Santo Estêvão.

O enorme império dos maometanos

A Hungria passou a ser um baluarte da Cristandade no Ocidente. Nação de um papel muito importante, porque o que são hoje os comunistas para a Cristandade de nossos dias, para a Cristandade até começo do século XVIII — certamente desde o século VII até o século XVIII, portanto, mais de mil anos — foram os maometanos.

Estes, que eram na sua maioria árabes, também conseguiram trazer para seus erros os turcos. Os maometanos ocupavam a metade do litoral mediterrâneo. Além de todo o Norte da África, chegaram a conquistar durante algum tempo quase toda a Espanha, parte da França até Poitiers e grande parte de Portugal. Posteriormente, no Oriente Próximo, eles ocuparam os Lugares Santos, tomaram Constantinopla e algumas zonas territoriais adjacentes, chegaram até a Albânia, a qual, ainda hoje, é mais ou menos maometana. Isso formava, então, um império enorme.

O Mediterrâneo, considerado naquele tempo o centro do mundo — Mediterrâneo, “no meio da Terra” —, estava dividido, portanto, em dois blocos: um grande bloco católico, que tomava todas as nações da Europa, também a Espanha depois que ela foi reconquistada; e o maometano, que abrangia o Norte da África, regiões da Ásia e uma parte dos Bálcãs. Os dois blocos estavam numa contínua guerra de caráter religioso, numa constante fricção.

E os pontos de ataque mais frequentes foram, nos dois extremos de Europa: a Península Ibérica, onde está a Espanha e Portugal e, de outro lado, a Hungria. Os maometanos subiam em hordas, a partir de Constantinopla, e o intuito deles era de chegar à Hungria, depois até a Áustria, tomar Viena e posteriormente descer à Itália para ocupar a Sé de São Pedro.

O Imperador Bajazet, que foi talvez o mais famoso dos chefes maometanos, dizia que ele queria fazer o seu cavalo comer no altar de São Pedro, como numa manjedoura. E os povos que aguentavam, do lado do Ocidente, a invasão maometana eram o espanhol e o português, que se tornaram famosos por causa de seu heroísmo.

Um povo-baluarte

Não focalizamos bastante o papel que tinham nesse ponto os húngaros. Estes, precisamente, suportavam a pressão maometana, para defender o Ocidente na Europa oriental, do outro lado do alicate, ou da tenaz maometana. E com batalhas heroicas, guerras, santos lutando do lado deles, com milagres, etc., algo que pode legitimamente ser comparado, nos seus pontos altos, ao heroísmo dos espanhóis e portugueses contra os maometanos.

A conquista desse povo-baluarte, ao qual a Europa deveu em grande parte a sua integridade contra as investidas maometanas, e que também soube resistir muito bem ao protestantismo — a Hungria era uma nação de fortíssima maioria católica, apenas uma parte dela passou para o protestantismo —, a conversão dos húngaros teve, portanto, uma série de consequências para a História do Ocidente, para a História da Cristandade.

Tudo começou com a conversão de Santo Estêvão e se consolidou com o reinado de Santo Américo, filho de Santo Estêvão e educado por ele.

Tudo quanto diz respeito e esses primórdios da Cristandade na Hungria nos deve interessar profundamente. Então, comentarei uma ficha(1) que nos fala do modo pelo qual Santo Estêvão instruiu seu filho, Santo Américo, na arte de governar.

”Ninguém deverá aspirar à realeza se não for católico fiel”

Santo Estêvão deixou para seu filho, Santo Américo, uma instrução em dez artigos, sobre a maneira de bem governar.

Esses dez artigos são como que florões que deviam ornamentar a coroa real. O primeiro desses florões é o seguinte. Diz Santo Estêvão:

Como ninguém deverá aspirar à realeza se não for católico fiel, demos o primeiro lugar das nossas instruções à nossa santa Fé. Recomendo-vos, antes de tudo, meu querido filho, se quiserdes ilustrar a coroa real, professar com tanta firmeza a Fé católica que possais servir de modelo aos súditos, e fazer com que todos os filhos e ministros da Igreja vos reconheçam como verdadeiro cristão. Pois aquele que professa uma falsa crença, ou que, professando a verdadeira, não a pratica em suas obras, esse não reinará com glória nem participará do Reino eterno. Porém, se conservardes o escudo da Fé, tereis o capacete e o elmo da salvação. Com essas armas podereis combater legitimamente os inimigos visíveis e invisíveis, pois disse o Apóstolo: “Só será coroado aquele que combater legitimamente.” É esta a Fé a que me refiro — relembra o Símbolo de Santo Atanásio.

Se, pois, alguém sob o vosso domínio procurar dividir, diminuir ou aumentar essa Trindade Santa, ficai ciente de que é filho da heresia e não filho da Santa Igreja. Evitai, pois, seja alimentá-lo, seja defendê-lo, sob pena de parecerdes seu amigo e querer favorecê-lo, pois as pessoas dessa espécie contaminam os filhos da Santa Fé; sobretudo perderiam e corromperiam miseravelmente esse novo povo da Santa Igreja. Velai, acima de tudo, para que tal não aconteça.

Primeira tarefa do rei: ser bom católico

Santo Estêvão se refere a um Credo chamado “Símbolo de Santo Atanásio”, que se conserva até hoje na Igreja, contendo as principais verdades da Fé. Ele, então, deixa ao filho esse Credo e diz que contém a verdadeira Fé católica. Se alguém quiser acrescentar ou tirar algo desse Credo, seja maldito. Porque o acréscimo não será feito pela Igreja, mas por uma iniciativa puramente individual e contra o espírito da Esposa de Cristo. A sua redução é uma mutilação da obra da Igreja.

Só quem pertence verdadeiramente à Igreja merece apoio do rei. Aquele que não é filho da Igreja, que não aceita o Credo católico, não deve ser apoiado pelo monarca; o rei não deve nem alimentá-lo, nem ajudá-lo em nada, mas sim isolá-lo e isolar-se dele, porque o herege contamina aquele que tem Fé. E seria uma tristeza que esse reino novo, nascido há pouco da Fé católica, se contaminasse com a heresia.

E Santo Estêvão acrescenta que a primeira tarefa do rei é ser bom católico. A finalidade do reino é de ser um reino católico. E por causa disso o monarca, por cima de tudo, há de dar provas de que ele é um bom católico, respeitar os ministros do Altíssimo, amar o povo de Deus; ele deve ser o chefe deste povo de Deus na luta.

Se for bom católico, continua Santo Estêvão, então ele terá glória como rei. Se for mau católico, não terá esta glória e vai acabar se perdendo, porque só tem salvação aquele que adota a verdadeira Fé católica.

Procurar antes de tudo o Reino de Deus e sua justiça

Esse princípio é muito verdadeiro. Os países, como os indivíduos, têm obrigação de crer em Deus, servi-Lo e amá-Lo sobre todas as coisas. Um país é comparável a um indivíduo, pois constitui o que se chama uma pessoa jurídica. Essa pessoa tem as mesmas obrigações do indivíduo. Um país, coletivamente, o Estado, tem a obrigação de conhecer e professar a Fé católica. E assim como cada um de nós tem por principal missão nesta vida praticar a Fé e propagá-la, o Estado tem como primordial missão ser instrumento da Igreja para a difusão da Fé católica.

Antes de cuidar de finanças, boa administração, diplomacia, exércitos, ou de qualquer outra coisa, o Estado deve tratar de, dentro de suas próprias fronteiras, servir a Igreja Católica, favorecer a influência dela por todos os meios que estejam ao alcance do poder temporal; e perseguir os inimigos da Igreja, ajudar os amigos dela, fazer com que todos os instrumentos do poder público sejam utilizáveis pela Igreja para influenciar o país.

Se o Estado fizer isso, alcançará todas as outras coisas, pois se aplica a ele o mesmo que Nosso Senhor Jesus Cristo disse aos indivíduos: “Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e sua justiça e todas estas coisas vos serão dadas por acréscimo.”

Quer dizer, se em algum lugar um rei faz todo o possível para servir a Igreja, ele terá realizado o resto; possuirá bons súditos e será amado por eles. O bom súdito é corajoso, leal, bom pagador de impostos, ordeiro, trabalhador, tem grandeza de alma, amor ao maravilhoso, idealismo, entusiasmo pelo sublime, produz uma grande cultura, uma grande civilização. A questão é ser bom católico.

Se, pelo contrário, não é bom católico, não produz nada que preste.

A verdadeira felicidade está muito mais nos bens da alma do que nos do corpo. E abaixo da virtude, o primeiro bem da alma é o equilíbrio mental. A prosperidade de quem não é católico, com desequilíbrios, maluqueiras, crimes, não é verdadeira prosperidade. É preciso procurar o Reino de Deus e sua justiça, e todas as coisas serão dadas de acréscimo.

Santo Estêvão e Santo Américo foram profundamente venerados pelos húngaros de todos os tempos que se seguiram a eles.

Santo Estêvão recebeu uma coroa enviada pelo Papa, e que até hoje se venera na Hungria como sendo o símbolo do poder. E, com a coroa, foi outorgado pelo Sumo Pontífice a Santo Estêvão o título de Rex Apostolicus — Rei Apostólico —, porque ele tinha feito um tão magnífico apostolado, a Hungria estava de tal maneira como uma ponta-de-lança apostólica voltada para as nações bárbaras, a fim de convertê-las e jugulá-las, que mereceu este título. E com um privilégio que nenhum rei da Terra tinha: em toda parte onde ele fosse, podia ser precedido por um dignatário que levava diante dele a Cruz de Cristo. E era tão elevado esse título de Rei Apostólico, que os imperadores da Áustria, até o último deles, que também eram reis da Hungria, se chamavam “Vossa Majestade Imperial Apostólica”, porque o Rei Apostólico era o Rei da Hungria.

O Estado existe para favorecer a Igreja

O que é melhor para um rei: ter esse prestígio ou uma polícia supermoderna, com espias, com escutas, etc.? É evidente que esse prestígio vale mais do que todas as polícias. Significa dominar as almas, influenciar pelos corações. E quem destrói um poder espiritual? Ninguém.

Dou uma prova lindíssima disso: houve um rei que, na Boêmia, teve o papel de Santo Estêvão na Hungria; foi São Venceslau. Até hoje a estátua de São Venceslau está no centro de Praga e não houve comunista que ousasse abatê-la. Os comunistas acabaram com tudo, fecharam as igrejas, e até prenderam o clero. Na estátua de São Venceslau ninguém tocou. E até hoje, quando há movimentos de protesto contra o regime comunista, a estátua de São Venceslau amanhece cheia de flores. É a marca deixada num povo por um rei que procurou antes de tudo o Reino de Deus e sua justiça, e, por isso, todas as coisas lhe foram dadas por acréscimo.

Quem me analisar encontrará no fundo de minhas concepções políticas esta ideia, esta doutrina católica de que o Estado existe, antes de tudo, para servir a Igreja e favorecer o Reino de Deus; e, quando ele realiza esta missão, torna-se grande em todos os sentidos e debaixo de todos os pontos de vista.

(Extraído de conferência de 17/1/1970)

1) Não possuímos referências bibliográficas da obra citada.
2) Mt 6, 33.

Ensino imparcial da História: TRIUNFO DA IGREJA

A Carta Apostólica “Annum Ingressi”, diz Dr. Plinio, é a chave de cúpula de uma brilhante série de documentos redigidos pelo Papa Leão XIII, para mostrar o papel benéfico e insubstituível da Igreja Católica no desenvolvimento da civilização e na promoção do verdadeiro progresso. Dentro da série estamos publicando, ele continua a comentar o pensamento do Pontífice.

Conforme vimos, os documentos publicados por Leão XIII sobre os mais diversos temas constituíam um conjunto que visava ao mesmo fim: esclarecer e alertar, na tormenta, o povo fiel.

As Encíclicas sobre doutrinas sociais, sobre a família, sobre o poder político não são senão episódios de uma só e grande reação em face das “opiniões perversas”. E de tal maneira esses documentos se entrelaçam uns com os outros, que os maiores condensam muitas vezes, e genialmente desenvolvem, ensinamentos para os quais as Encíclicas anteriores já haviam preparado os espíritos, tocando ex professo ou incidentemente o mesmo assunto. Ele nolo diz, aliás, expressamente quanto a mais de uma delas.

Numa série tão concatenada, o último documento, feito por um autor que, como vimos, não ignorava estar prestes a transpor as “portas da eternidade”, tem evidentemente o caráter de remate, o papel de chave de cúpula, a importância de um complemento final e supremo, de uma mensagem extrema na qual se resume, e chega à sua mais nítida e sintética expressão, tudo quanto de mais essencial fora anteriormente ensinado.

A história de Leão XIII, a análise de seus documentos, a própria história do século em que ele viveu e no qual sua figura alcançou projeção mundial, não podem abstrair do estudo da “Annum ingressi”.

O estudo da História não pode ser “desinteressado”

Essa Carta Apostólica, que constitui importante trabalho histórico — pois é como que a síntese de uma fase crucial da História da Igreja, escrita por ela mesma —, apresenta para a historiografia católica e, a este título, também para a historiografia em geral, um interesse inegável. Pois ela nos faz conhecer o pensamento do grande Papa sobre a missão da História, bem como sobre o “tratamento ” do fato histórico com os recursos de uma sã filosofia e de uma teologia ortodoxa.

O pensamento de Leão XIII se nos apresenta bem definido nesse documento: a História não pode ser “desinteressada ”, isto é, o historiador deve ser imparcial na pesquisa da verdade histórica, mas uma vez tendo-a encontrado, pode e deve tomar partido por ela. No caso concreto, o historiador imparcial, bem informado e capaz, verá na História uma justificação da Igreja. Cabe-lhe dar testemunho deste fato.

E mais: como a Igreja é uma sociedade viva, que age e luta no presente; como o testemunho da História é elemento essencial para o êxito ou o insucesso desta luta; o historiador está no seu direito quando se empenha especialmente em desfazer o falso testemunho de uma História mentirosa.

A História apologética, assim entendida, não é um subproduto da História, e muito menos uma caricatura.

É, pelo contrário, História genuína e excelente, voltada para a realização de uma de suas mais altas missões. Se o Papa coloca, no ápice da grandiosa construção doutrinária, um documento histórico-apologético, um de seus objetivos expressos é exatamente “reabastecer de Fé e coragem” as almas que, opressas pelas “graves provações da Igreja”, poderão “recobrar alento”.

A História tem também outro fim, que é dos principais para Leão XIII: buscar nos fatos do passado uma explicação do presente, que sirva para a solução dos problemas atuais (veremos depois que Leão XIII aponta outra utilidade para a História: proporcionar elementos para fundadas conjecturas do futuro). Com efeito, se Leão XIII se propõe demonstrar na “Annum ingressi”, com argumentos históricos, a grande lei que nela enuncia, fá-lo para “assinalar os remédios” aos males de seu tempo: História “Magistra Vitae” — a História é a mestra da vida, diziam os antigos.

Muitas vezes o ensino da História é preconceituoso Aliás, nessa Carta Apostólica, Leão XIII outra coisa não faz senão pôr em prática os conselhos que, em outros documentos famosos sobre a História, ele deu aos historiadores católicos.

Referimo-nos em especial ao Breve Saepenumero Considerantes (“Consideramos freqüentemente”), de 18 de agosto de 1883, documento famoso, pelo qual Leão XIII franqueou os arquivos do Vaticano ao estudo dos historiadores.

É interessante ver como a “Annum ingressi” constitui um modelo de trabalho histórico feito segundo o espírito desse Breve.

Começa o Breve por lamentar “a força e perfídia” com que os adversários da Religião procuram tirar proveito da História para “tornar suspeitos e odiosos a Igreja e o Papado ”. Dá ele um apanhado da historiografia anticatólica, desde os “Centuriadores de Magdeburgo” (Alemanha) até nossos dias¹.

Ora, esta historiografia “invadiu até as escolas”, onde “freqüentemente se dão às crianças, para as instruir, livros cheios de erros”. No ensino superior, o estudo da História é aproveitado para “construir teorias baseadas em preconceitos temerários, o mais das vezes em desacordo flagrante com a Revelação divina”, o que enche a “chamada Filosofia da História” de “densas trevas”.

Em suma, “sem descer a pormenores, o plano geral do ensino histórico tem por fim tornar suspeita a Igreja e odiosos os Papas, bem como persuadir, sobretudo a multidão, de que o governo pontifício é um obstáculo à prosperidade e grandeza da Itália”. Leão XIII manifesta aqui uma preocupação muito acentuada com a História da Itália, país no qual a investida anticlerical estava em seu clímax. Não obstante, o panorama descrito se aplicava, mutatis mutandis, ao mundo inteiro.

Nesse Breve fica, assim, caracterizada em termos impressionantes a ofensiva desenvolvida contra a Igreja no campo histórico: “Hoje mais do que nunca”, assevera Leão XIII, “a arte do historiador parece ser uma conspiração contra a verdade”. O Pontífice emprega, a este propósito, expressões que insistem muito sobre a má-fé da historiografia anticatólica.

História anticatólica, eivada de erros e de injustiças

O Papa fala de “injustos ataques contra a honra e dignidade da Sé Apostólica”, “mutilações e hábeis omissões sobre o que constitui os maiores lances da História, a fim de dissimular, pelo silêncio, os fatos mais gloriosos e gestos memoráveis, enquanto se redobravam esforços para de pôr em evidência e exagerar” o que, no passado da Igreja, poderia ter sido “menos prudente ou menos irrepreensível”; “malevolência e calúnias” contra o poder temporal dos Papas; “mentiras que audaciosamente se esgueiram nas volumosas compilações e nos delgados panfletos ”, na imprensa e no teatro; quando a própria evidência dos fatos não permitia que se voltassem contra a Igreja “todos os negrumes da calúnia”, narravam-se os fatos de maneira a subestimar tanto quanto possível a glória dos Papas, “à força de atenuações e dissimulação”.

Pouco depois, Leão XIII denuncia os livros escolares “cheios de mentiras”, a “perversidade e leviandade” de certos professores; mostra que nas escolas superiores as teorias contrárias à Revelação eram elaboradas “com o único intuito de dissimular e ocultar o que as instituições cristãs tinham de mais salutar”.

Com isto chegavam a “inconseqüências e absurdos”. Quanto ao “plano de ensino da História tendente a tornar a Igreja suspeita, os Papas odiosos, e persuadir a multidão de que o governo pontifício era um obstáculo à gradeza da Itália”, “nada se pode afirmar que mais revolte a verdade”, diz Leão XIII; isto é “mentir violentamente sobre fatos evidentes e notórios.

Enganar conscientemente a outrem, com intuito criminoso, é por maldade envenenar a História”.

Quanto aos efeitos deletérios dessa ação anticristã, que dissemina uma História “escravizada ao espírito de partido”, o Breve os enumera com precisão e força².

O dever dos historiadores católicos

Tudo isto convida, a um nobre esforço de História apologética, “homens probos e versados neste gênero de estudos, que se consagrem a escrever a História de maneira que esta seja o espelho da sinceridade e da verdade”.³

A História apologética não é, pois, uma História feita com retoques fraudulentos, para servir às conveniências de uma causa. É proba, honesta, veraz, científica, inflexivelmente subordinada ao tríplice ditame de toda História digna desse nome: “não mentir, não temer dizer a verdade, não ceder ao desejo de lisonjear, ou de hostilizar”.

Se se pode falar de uma História apologética segundo a mente de Leão XIII, é simplesmente no sentido de uma História tão autêntica e científica como outra qualquer, mas que escolhe por temas os assuntos em que a História falsa procura guerrear a Igreja.

Quando falamos de História científica aludimos tão-somente a uma História feita segundo os bons métodos, e com o auxílio dos recursos científicos hodiernos. Os historiadores católicos devem ter em conta que “nada do que o engenho dos modernos inventou é alheio ao objeto de seus trabalhos” — escreveu Leão XIII noutro de seus documentos.

Além de ser obra rigorosamente imparcial, uma obra dessa categoria presta alto serviço à causa da religião e da sociedade, bem se vê. Tarefa digna de particulares “eruditos e adestrados na arte de escrever a História” – “historia scribendi arte” 6.

Tão nobre que constitui para a própria Igreja um direito e um dever: “já que o inimigo busca na História suas armas principais, cumpre que a Igreja combata em paridade de condições, e redobre seus esforços para repelir o assalto com valentia maior onde ele é mais violento”7.

E foi essencialmente com este intuito que Leão XIII franqueou “os depósitos literários” do Vaticano aos estudiosos. Tanto é legítima e gloriosa atarefa de uma História apologética bem entendida.

E, com efeito, não teria sentido o papel dos estudos bíblicos indispensáveis à Igreja para que ela exerça seu ministério num ambiente cultural cada vez ais trabalhado pela crítica científica, se não se reconhecesse francamente a liceidade de uma História apologética.

Na mente de Leão XIII, não só tais estudos bíblicoapologéticos eram cientificamente lícitos, mas da maior importância. Consagrou-lhes uma Encíclica que ficou famosa (Providentissimus Deus, de 18 de novembro de 1893), mas instituiu ainda a Comissão dos Estudos Bíblicos, para “assegurar a manutenção integral da verdade cristã e promover os estudos da Sagrada Escritura”8 e lhe pôs à disposição “uma parte de nossa Biblioteca Vaticana”, na qual prometia instalar, para uso da Comissão, abundante coleção de manuscritos e de volumes de todas as épocas, tratando de questões bíblicas.9

O apelo de Leão XIII deu origem a toda uma série de trabalhos históricos de orientação católica, que figuram com honra na bibliografia de nossos dias.

1 Saepenumero Considerantes II,2,a,b,c,d. Os chamados“centuriadores de Magdeburgo”, teólogos protestantes, escreveram no século XVI uma história da Igreja, de caráter fortemente anticatólico, com argumentos inconsistentes, distorções da verdade e muitos documentos falsos. Sua tese era de que a Igreja Católica havia sido infiel à primitiva Igreja cristã, tinha destruído a brilhante antiguidade grecoromana e jogado o mundo no obscurantismo, fanatismo e miséria da Idade Média. Felizmente, o Renascimento havia recuperado os valores do mundo antigo.
2 Saepenumero Considerantes IV,a,b.
3 Saepenumero Considerantes IV,b.
4 Saepenumero Considerantes IV,d.
5 Carta Apostólica Vigilantiae Studéique Memores, 30/10/1902.
6 Saepenumero Considerantes V.
7 Saepenumero Considerantes IV,i.
8 Vigilantia Studéique Memores, op. cit.
9 Ibid. Leão XIII apela nesta Carta Apostólica aos “católicos
mais favorecidos com bens de fortuna” para enriquecer
ainda mais este depósito. Na biblioteca do Vaticano, que o
próprio Pontífice expandiu pela aquisição da biblioteca
Borghese, bem como no arquivo do Vaticano, hauriram os
documentos para seus trabalhos, historiadores do valor do
Cardeal Hergenröther, do dominicano Deniffle, do
Cardeal Ehrle, do Barão Luís de Pastor e do Padre
Duchesne.

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 52 (Julho de 2002)

Desponsórios com a beleza

Quando voltamos nossos olhos para o passado e consideramos certos momentos áureos da Cristandade, não nos é difícil compreender como a boa harmonia entre o espiritual e o temporal, entre o religioso e o social constitui a perfeita ambientação para a existência da Civilização Cristã.

Numa atmosfera assim formada, nascem costumes, tradições e instituições abençoadas pela Providência Divina, e cujas belezas, em que pese o volver dos séculos, ainda perduram na lembrança dos homens.

Um exemplo? Fins da Idade Média. Uma cidade à beira-mar, cercada de lagunas, recortada por canais. Durante o dia, as fachadas de seus edifícios góticos admiram-se a si mesmas, refletidas no imenso e irrequieto espelho de suas águas. Pela noite, as luzes que escapam dos interiores apalaciados se confundem com as cintilações das muitas lanternas acesas em pontas de estacas que se cravam no fundo do mar… É Veneza, a feérica! A célebre Rainha do Adriático tinha uma forma de governo peculiar.

Não era dirigida por monarquias hereditárias. A República Sereníssima de Veneza tinha por soberanos os chamados doges, que eram eleitos e ocupavam o cargo por um período determinado. Ora, essa instituição doganal é uma das jóias preciosas da História da humanidade. Em torno dela nasceram e desabrocharam diversas maravilhas que não existiriam se aqueles homens desistissem de ser doges, se quisessem ser reis ou príncipes como os de outros povos. Porém, como assumiam a sua qualidade especial de dirigentes, a bênção ligada àquela instituição prevalecia e se estendia sobre toda a sociedade veneziana.

A começar pelo próprio Palácio dos Doges, edifício magnífico como símbolo do poder público e da grandeza de um povo, com seus amplos salões ricamente decorados, suas paredes recobertas de tapeçarias e pinturas lavradas por mestres famosos, e com sua arquitetura externa que é um verdadeiro e quase insuperável requinte do estilo gótico.

Mas o doge era também o protagonista de um costume em que se pode perceber de modo particular a mencionada harmonia entre o espiritual e o temporal. Trata-se dos desponsórios de Veneza com o mar.

De longe se vê a movimentação na Praça de São Marcos, os sinos do Campanile dobram festivamente, a multidão se acotovela e vai abrindo passagem para o cortejo do doge que, após ouvir a Missa solene, deixa a Catedral com o seu séquito, cercado de toda pompa e esplendor.

De longe se vêem miríades de gôndolas dirigindo-se para o meio do
Adriático, com músicos tocando composições de Vivaldi, pessoas cantando e festejando. A melodia se faz ouvir cada vez mais perto, o som das vozes e cantigas torna-se mais intenso.

Dali a pouco esse cortejo de pequenas embarcações estaciona no mar alto, enquanto as águas continuam a ser remexidas pelas batidas pesadas dos remos de uma imensa nau que surge logo atrás. É o famoso Bucentauro, todo esculpido e todo folheado a ouro, todo elegante com suas tape çarias pendentes do tombadilho, trazendo a figura majestosa do doge em trajes de gala, revestido do barrete frígio, acompanhado do famoso Conselho dos Dez, dos altos membros do Clero, das damas e cavalheiros da aristocracia veneziana.

As batidas nas águas se tornam mais suaves, os remos se levantam. Expectativa geral. Então, de um escrínio precioso o doge retira um anel ainda mais rico e o lança ao fundo do mar. A música recobra intensidade,
ecoam vivas e aplausos, bandeiras e bandeirolas se agitam: estava afirmado, uma vez mais, o poder de Veneza sobre o Adriático e o Mediterrâneo.

Os remos do Bucentauro feriam novamente as águas e o barco imponente retornava para a Praça de São Marcos, entre músicas de violinos e os brados da população que aclamava o seu governante. A festa prosseguiria no Palácio dos Doges, nas luxuosas residências, nas praças e canais venezianos, até que se extinguissem os últimos ecos dos violinos, até que se emudecessem as vozes envolvidas na noite da velha e sereníssima República.

Quando, tempos depois, o advento das grandes navegações abaloua supremacia marítima e comercial de Veneza, esta se deu conta de uma outra realidade: perdera o império dos mares, mas ganhara o império da beleza.

Ela aproveitara o tempo de sua opulência para se encher de palácios, de obras-primas imortais, para fazer-se umas das cidades mais lindas e talvez a mais original de todo o universo. E no momento em que decaía comercialmente, as nações insaciáveis das maravilhas dela começaram a visitá-la, a freqüentar a feérica moribunda que ia expirando. E todos lhe traziam o tributo de sua admiração: o mundo inteiro ali se encantava e ali bastava, não querendo que Veneza morresse!

Então Veneza compreendeu que, continuando a vida de luxo, a vida de festa, a vida de arte, ela prolongava sua própria existência. Ela tinha uma beleza imorredoura.

Sim, mais do que casar-se com o mar, a venturosa Rainha do Adriático desposara-se com o pulchrum…

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 64 (Julho de 2003)

São Pedro Julião Eymard e o amor apaixonado à Eucaristia

“Para a glória de Deus é preciso ter uma paixão que nos domine a vida e produza os frutos necessários e desejados por Nosso Senhor. O amor só triunfa quando é em nós uma paixão vital, e esta deve ser ardentíssima em relação à Eucaristia. Pois, o que é o amor, senão o exagero?”

Fervorosas palavras de amor eucarístico, brotadas dos lábios deste novo Elias que foi São Pedro Julião Eymard, fundador dos Sacramentinos. Com o fogo de sua alma interpela ele — num texto arrebatador comentado por Dr. Plinio — os “espíritos fortes” e “equilibrados” de sua época… e da nossa.

Um santo do qual se poderia afirmar ser uma espécie de nova edição do Profeta Elias, pelo fogo de sua alma, é São Pedro Julião Eymard, fundador dos Sacramentinos. Celebrado pela Igreja no dia 2 de agosto, dele temos os seguintes dados biográficos:
Nascido em 1881 na cidade de La Mure-d’Isére, foi artesão antes de entrar no Seminário maior. Sua família era pobre, e o pai de Pedro Julião opunha-se à vocação sacerdotal do filho. Uma primeira tentativa de chegar ao presbiterato redundou num fracasso devido a uma grave enfermidade. Sem desanimar, algum tempo depois entraria no Seminário de Grenoble, sendo ordenado sacerdote dessa diocese em 20 de julho de 1834, aos 23 anos de idade.
O jansenismo que impregnava o mundo religioso da época, considerava o ser humano como pecador e indigno diante de um Deus transcendente e perfeito. O Padre Eymard, como seminarista e jovem sacerdote foi influenciado por essa espiritualidade de reparação e teve de lutar ao longo de toda a sua vida para encontrar da perfeição interior que o poderia tornar capaz de oferecer a Deus o dom de sua pessoa.

Religioso marista e fundador dos sacramentinos

Terá sido, provavelmente, essa procura da perfeição espiritual, aliada ao desejo de realizar importantes coisas por Deus, que o conduziram à vida religiosa. Em 20 de agosto de 1839 o Pe. Eymard tornou-se membro da Congregação Marista, fazendo profissão dos votos de pobreza, castidade e obediência.
Excelente educador de jovens, São Pedro Julião Eymard distinguiu-se na congregação dos maristas como exímio organizador de associações leigas, formador devotado e um requisitado pregador, alcançando particular êxito em suas homilias sobre a devoção eucarística.
Seu intenso amor ao Santíssimo Sacramento, aliás, motivou-o a escrever uma regra eucarística para a Ordem Terceira de Maria, da qual era o diretor. O Superior Geral não a julgou conveniente, mas a idéia de tal regra estava já inscrita no espírito e no coração do Pe. Eymard.
Fascinado cada vez mais pela espiritualidade eucarística e convencido de sua necessidade para a salvação das almas, retirou-se, sem dificuldades, dos Maristas em 1856 e fundou diversas congregações: a dos Padres do Santíssimo Sacramento, das Servas do Santíssimo Sacramento, dos Padres da Adoração e a Pia União de leigos do Santíssimo Sacramento.

Dom de si mesmo

O Pe. Eymard passou pouco a pouco de uma espiritualidade de reparação para uma piedade centrada no amor de Cristo. Três anos antes de sua morte, fez um retiro em Roma onde se viu inteiramente subjugado pela força do amor de Deus em sua alma, sentindo que tão ardente caridade tomava posse inteira de sua pessoa.
Aos 57 anos, após ter adorado fervorosamente seu Senhor sob o véu das espécies eucarísticas, foi enfim chamado a vê-Lo na plenitude da luz eterna. Era o dia 1º de agosto de 1868.
Canonizado em 1962, as relíquias de São Pedro Julião Eymard são veneradas na Capela de Corpus Christi, da Congregação dos Padres do Santíssimo Sacramento, em Paris.

Virtude abrasadora

Trata-se, portanto, do fundador de uma ordem com uma finalidade admirável: a adoração perpétua ao Santíssimo Sacramento. Ou seja, nas igrejas dos Sacramentinos, Nosso Senhor, sob a espécie eucarística, acha-se exposto continuamente à adoração dos fiéis, que afluem para render o tributo de sua devoção a Ele, seja durante o dia, seja nas horas silenciosas da noite. Assim, nas grandes e nas pequenas cidades, o Sagrado Coração de Jesus é venerado pelo menos por uma alma que ali está, ajoelhada diante d’Ele e Lhe fazendo companhia.
Pois essa inestimável devoção é fruto da piedade eucarística de São Pedro Julião Eymard. Foi, na verdade, um homem de virtude abrasadora, e suas eloqüentes palavras sobre o amor sem limites que devemos render a Jesus Sacramentado constituem páginas maravilhosas da espiritualidade católica, dignas de serem analisadas.

O amor: que é, senão o exagero?

Afirma ele:
A Eucaristia é a mais nobre inspiração do nosso coração. Amemo-la, pois, apaixonadamente. Dizem: mas é exagero tudo isso. Mas o que é o amor senão o exagero? Exagerar é ultrapassar além. Pois bem, o amor deve exagerar. Quem se limita ao que é absolutamente de seu dever, não ama. Nosso amor para ser uma paixão, deve sofrer a lei das paixões humanas. Falo das paixões honestas, naturalmente boas, pois as paixões são indiferentes em si mesmas. Nós as tornamos más, quando as dirigimos para o mal, mas só de nós depende utilizá-las para o bem.
Sem uma paixão nada se alcança. A vida carece de objetivo, arrasta-se numa vida inútil.
Nesta passagem, São Pedro Julião Eymard vai de encontro a uma concepção talvez generalizada no seu tempo, segundo a qual a verdade é uma posição responsável e adulta diante dos fatos, e exige a ausência de paixão. Ou seja, somente depois de se libertar de qualquer paixão é que o homem se torna capaz de ver, julgar e agir de modo acertado.
Ora, ele sustenta que há paixões más e boas. Estas últimas, impulsionadas pelo bem, devem conduzir a alma ao extremo do amor a Deus. Então diz: “O que é o amor senão exagerar?”. O santo não afirma que a paixão é necessariamente um exagero, e sim que o amor, continuamente, vai além do que o ambiente no tempo dele qualificava de exagero. Portanto, este exagero deve ser entendido como que entre aspas: “O que é amar, senão fazer o que vocês entendem como exagero?”
Seria, então, uma espécie de choque de São Pedro Julião Eymard contra essa lei do desapaixonamento, comum para o espírito dos seus contemporâneos.

O homem desapaixonado é um mutilado

E continua:
Pois bem, na ordem da salvação é preciso também ter uma paixão que nos domina a vida, e a faça produzir para a glória de Deus todos os frutos que o Senhor espera.
Faço notar o categórico dessa afirmação. Para que nos salvemos, é uma condição que tenhamos esse amor apaixonado. E ele corrobora, ademais, a sua tese de que para a glória de Deus é preciso ter uma paixão que nos domine a vida e produza os frutos necessários e desejados por Nosso Senhor. Portanto, essa produtividade total resulta da colaboração da paixão com as outras faculdades da alma. Isto é eminentemente humano.Os chineses da última época da monarquia tinham um hábito terrível de cortar as pontas dos pés para se equilibrarem nos seus diminutos tamancos. É algo assustador. Pois bem, ainda mais chocante é cortar uma faculdade da alma e viver sem ela. O homem desapaixonado é um mutilado.

Palavras a serem gravadas com fogo na alma

A seguir, ele escreve:
Amai tal virtude, tal verdade, tal mistério apaixonadamente! Devotai vossas vidas, consagrai vossos pensamentos e trabalhos. Sem isso nada alcançareis jamais. Sereis apenas um assalariado e nunca uns heróis! Todo pensamento que não se termina em uma paixão, que não acaba por tornar-se uma paixão, nada de grande produzirá jamais.
O amor não transfere a ninguém as suas obrigações. O amor tudo faz por si mesmo, é a sua glória.
São afirmações esplêndidas, repassadas de veracidade. De fato, quando um católico não tem essa paixão, torna-se medíocre, preguiçoso, inerte. Desapaixonado, não produz coisa alguma. Pelo contrário, se for movido pela boa paixão, mesmo sem tempo, aceita trabalhos e obrigações, produzindo maravilhas.
Para o homem sem paixão, todo tempo é pouco para nada fazer; enquanto o homem com paixão transforma qualquer minuto numa eternidade.
Palavras de São Pedro Julião Eymard:
Ai de nós, se o amor de Jesus no Santíssimo Sacramento não nos conquistar o coração. Jesus estará vencido. Nossa ingratidão será maior que sua bondade, nossa malícia mais poderosa que sua caridade. Oh, não, meu Salvador, vossa caridade me oprime, me atormenta e me constrange.
Trata-se de um dito apaixonadíssimo, mas uma tomada de atitude lúcida, diante da realidade da frágil natureza humana decaída pelo pecado. Esta, a meu ver, seria uma frase a ser gravada com fogo nos corações, pelos rogos de Maria Santíssima, para fomentar neles esse necessário e ardente amor eucarístico.

Amor apaixonado ao Santíssimo Sacramento

Continua:
Nosso Senhor quer estabelecer em nós o amor apaixonado por Ele. Toda virtude, todo pensamento que não acaba por tornar-se uma paixão, nada de grande produzirá jamais. Não é amor a afeição de uma criatura. Ela ama por instinto, porque se sente amada. O amor só triunfa quando é em nós uma paixão vital. Sem isso podem produzir-se atos isolados de amor, mais ou menos freqüentes, mas a vida não é tomada, não é dada.
Ora, enquanto não tivermos por Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento um amor apaixonado, nada teremos feito.
Ele insiste na idéia do amor infrutífero, se não for movido pela paixão boa.
Parece-me interessante observar o profundo vínculo entre essa expressão de amor a Nosso Senhor Jesus Cristo sacramentado, nos lábios de São Pedro Julião Eymard, e a manifestação igualmente fervorosa de devoção à Santíssima Virgem, pregada por São Luís Grignion de Montfort. Os dois são movidos pelo mesmo estado temperamental, a mesma paixão, a mesma piedade. A Oração Abrasada, composta por São ­Luís Grignion, transmite sentimentos análogos aos que nos colhem ao lermos esse texto do santo fundador dos Sacramentinos.
Essa relação estreita entre as duas devoções é algo magnífico. Ambas se baseiam em pensamentos que continuamente nos apaixonam. Assim como São Luís Grignion de Montfort desejava uma devoção ardente a Nossa Senhora, São Pedro Julião quer uma piedade apaixonada para com a Sagrada Eucaristia. Isto é fogo! Isto é uma alma eucarística, uma alma mariana.

Não temer de ser arrastado pelo amor de Jesus Eucarístico

E São Pedro Julião Eymard vai mais longe. Diz:
Tende um amor apaixonado pela Eucaristia, amai Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento com todo ardor que se ama no mundo, mas por motivos sobrenaturais. Para consegui-lo, começareis por colocar vosso espírito sobre a influência desta paixão, alimentai em vós o espírito de Fé, e persuadi-vos da verdade da Eucaristia, da verdade do amor que Nosso Senhor nela vos testemunha. Tende uma grande idéia, uma contemplação arrebatada do amor e da presença de Nosso Senhor. Assim dareis a vosso amor o fogo que alimentará a chama, o vosso amor será então constante.
Vede Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento, vede o seu amor, e que esse pensamento vos domine, vos arrebate. Por quê? Porque Nosso Senhor se abre a ponto de sempre se dar, sem jamais fatigar-se.
Considerai os santos. Seu amor os transporta, abrasa, faz sofrer, é um fogo que os consome, despende suas forças e acaba por lhes causar a morte. Morte feliz. Mas se não chegarmos todos a este ponto, ao menos podemos amar apaixonadamente Nosso Senhor, deixando que nos domine por seu amor. Há pessoas que amam até a loucura os pais, os amigos, e não sabem amar o bom Deus. O que se faz com a criatura, é o que se deve fazer com Deus. Somente ao Bom Deus é preciso amá-Lo sem medida, cada vez mais.
No juízo não serão tanto os nossos pecados que nos aterrorizarão, e nos serão censurados. Estão irrevogavelmente perdoados. Mas Nosso Senhor nos censurará por seu amor: ‘Criaturas, vós não fizestes de mim a felicidade de vossa vida?! Vós me amastes bastante para não me ofender mortalmente, mas não para viver de Mim?!’. Mas, poderíamos dizer: somos então obrigados a amar assim? Bem sei que o preceito de amar assim não se acha escrito. Não há necessidade. Nada o diz, tudo o clama! A lei está em nosso coração!
Sim, o que me aterroriza é que os cristãos pensarão de boa vontade seriamente em todos os mistérios, e votar-se-ão ao culto de algum santo, e não a Nosso Senhor no Santíssimo Sacramento. Por quê? Ah, porque não se pode considerar atentamente o Santíssimo Sacramento sem dizer: é preciso que eu O ame, que vá visitá-Lo, não posso deixá-Lo sozinho, Ele me ama demais!
É um texto tão magnífico que as palavras nos fogem para comentá-lo. Comove-nos, cumula-nos de admiração e fervor. São Pedro Julião se exprime com a paixão que ele prega e recomenda. A lei desse amor está inscrita no seu próprio coração e ele a quer transmitir aos homens.
A par disso, oferece uma explicação ao mesmo tempo teológica e psicológica da razão pela qual algumas almas não se entregam como deveriam a essa devoção extrema: evitam de ir aos pés do Santíssimo Sacramento porque O sabem por demais envolvente e arrebatador. Receiam que Ele as atraia e as arraste por seu amor. Então, como que contornam essa situação ao praticarem outros atos de piedade, dando-se ao culto exclusivo desse e daquele santo, em vez de praticar a perfeita adoração ao Coração Eucarístico de Jesus.
Essas são almas que temem o exagero, contentam-se com algo menor porque temem que a graça as convide para a virtude apaixonada.

Pedir a Nossa Senhora o fervor eucarístico d’Ela

Cumpre concluir, então, que esses extraordinários pensamentos de São Pedro Julião Eymard devem produzir efeitos concretos em nossos corações, alimentando neles esse amor ardoroso à Sagrada Eucaristia.
Procuremos refletir nessas considerações antes da Comunhão, não nos esquecendo de que Maria Santíssima é também medianeira na nossa devoção eucarística. Todas essas verdades consignadas no texto que acabamos de contemplar pulsavam no Coração Sapiencial e Imaculado d’Ela, com uma intensidade perto da qual o ardor de São Pedro Julião não é senão uma fagulha.
Imaginemos Nossa Senhora no recinto onde seu Filho celebrou a primeira Missa e operou pela primeira vez na História a transubstanciação: como descrever os fulgores de amor e adoração que, naquele instante, inundaram a alma da Mãe de Deus? A caridade de todos os anjos reunidos empalideceria diante desse fervor.
Pois então peçamos a Ela que nos conceda, por sua insondável misericórdia, algo do incomparável fogo eucarístico que A consumia.

Nossa Senhora das Neves

É próprio de Maria Santíssima violar todas as regras de distância que há entre o Céu e a Terra e aparecer a um Papa. Como também é próprio a Ela indicar o lugar para algo maravilhoso, escolhendo para isso a neve, que representa o refrigério no meio do calor.

No verão horroroso de Roma, aparece um lugar coberto de neve. Ali Nossa Senhora quer que se construa uma igreja em seu louvor.

Este é bem o papel de Nossa Senhora em nossa vida: a neve em meio ao calor de nossas batalhas, provações e sofrimentos.

Em meio à poeira desta vida, a Santíssima Virgem é a neve alvíssima, imaculada, que refrigera e nos dá um antegozo do Céu.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 5/8/1965)

O inestimável tesouro da oração

o dia 1º de agosto a liturgia católica festeja Santo Afonso Maria de Ligório, Fundador dos Padres Redentoristas, Doutor da Igreja e autor de renomadas obras sobre moral, muitas voltadas  especialmente para a orientação de Confessores. Entre as que dedicou ao comum dos fiéis, há uma admirável — “A Oração, o grande meio da salvação” —, apreciada de modo particular por Dr.  Plinio, que, nos idos de 1957, acerca dela teceu diversos e luminosos comentários.

 

Ao tratar da oração, Santo Afonso de Ligório não o faz à maneira de um teólogo que ensinará a respeito dela tudo quanto é possível. Ele escreve como diretor de consciências, mostrando o precioso proveito a se tirar da oração na vida espiritual.

Acompanhando seu ensinamento, vemo-lo constantemente em face de uma determinada situação espiritual, não enunciada, mas que devemos conhecer com toda a clareza. É o que poderíamos  chamar o encalhe.

Com efeito, na vida de piedade existe o encalhe e, depois, o desencalhe. Sabe-se bem o que significa encalhar. Por exemplo, um automóvel encalha quando encontra qualquer obstáculo que o  impede de andar, ou  quando sofre algum tipo de avaria interna, falta de combustível, etc.

A idolatria na Antiguidade, um “encalhe”

Inúmeras almas encalham na vida espiritual, em qualquer estágio dela, às vezes de um modo completo, e até aparentemente irremediável. O mais prodigioso exemplo de encalhe espiritual  verificou-se, a meu ver, com a idolatria nos povos antigos.

O célebre pregador francês Bossuet, ao se referir à situação do mundo naquele período, invectiva a crença idólatra como um defeito grosseiro e um erro evidente praticado por aquelas populações.  Os antigos estavam profundamente aferrados a esse erro, não obstante possuírem muitos deles uma inteligência privilegiada, como os gregos e os romanos.

Não que a razão humana não fosse bastante forte para perceber o erro da idolatria. Prova-o as diversas vozes discordantes dela, entre as quais Sócrates, Aristóteles e Platão. Contudo, esses três  homens, dos mais inteligentes de todos os tempos, falando para um povo também dos mais sábios do mundo, renunciaram a abolir esse mal, por considerar que o povo estava encalhado na  idolatria.

Isso é o que notamos no encalhe da vida espiritual: há todas as possibilidades para se ver o erro em que se caiu, mas as pessoas estão enraigadas no apego a ele. Não existem argumentos nem  recursos que obtenham resultados, por causa de um ponto encalhado.

Em contrapartida, o cristianismo é o exemplo do maior desencalhe da História. Depois da vinda de Nosso Senhor, homens menos inteligentes, dirigindo-se a povos por vezes menos favorecidos no tocante à inteligência, lograram vencer com facilidade a idolatria. De modo repentino, porque entrou um fator novo diferente de todos os anteriores, eles desencalharam.

Temos então, na idolatria e no cristianismo, casos coletivos de encalhe e desencalhe. Características do “encalhe” espiritual O que propriamente caracteriza um encalhado na vida espiritual é o fato  de ele se recusar a sair do erro em que se encontra preso. Alguém pode ter um defeito, mas se empenha na atitude de o deixar, acatando os conselhos que lhe dão nesse sentido.

Este inidvíduo não deve ser tido como um encalhado.

Pelo contrário, a vítima do encalhe é aquela que toma em relação ao seu defeito um apego tal que não quer abrir mão dele, apesar de todas as admoestações e orientações que receba. Esse defeito  não será, necessariamente, um pecado mortal. É uma falta venial ou uma mera imperfeição. Mas, à medida que a pessoa não quer renunciar àquele ponto, ela estagna. Por isso a vida espiritual é  semelhante a uma montanha em cuja encosta se pode encalhar, a qualquer altura. Há quem pare num ponto muito elevado dela. Não raro, quanto maior a altitude alcançada, tanto menor a  bagatela pela qual se fica preso.

Dir-se-ia existir uma espécie de enfermidade das alturas, pois o indivíduo que não se deixou encalhar por medo de leões, detém-se por causa de uma borboleta. É uma forma de vertigem na vida espiritual, um tremendo complexo contra o qual é preciso se defender com dez mil cuidados.

Às vezes, uma pessoa que renunciou a tudo julga-se muito engraçada e se toma de apego pelos gracejos que prodigaliza. Noutros casos, o homem se apega ao que não tem. Por exemplo, um grande jurista com mania de ser poeta, tem pouco ou nenhum apego por seu saber jurídico, mas vive com receios de que não o reconheçam como autor de versos inspirados.Nasce daí a vaidade, vem o
encalhe…

O salutar e valioso remédio da oração

Posto, então, diante desse problema que se apresenta na vida espiritual de incontáveis almas, Santo Afonso faz uma afirmação bem característica no começo do seu livro, indicando um elemento  para a sua solução. Escreve  ele: Vejo que os cristãos pouco  cuidam de empregar este grande meio de salvação [que é a oração]. E, o que ainda mais me aflige…. é ver que os pregadores e  confessores tampouco recomendam a oração a seus ouvintes e penitentes. E mesmo os livros espirituais que hoje em dia correm pelas mãos dos fiéis não tratam suficientemente desse assunto,  quando é certo que todos os pregadores e confessores e todos os livros outra coisa não deveriam incutir, com mais empenho e afinco, do que a necessidade de orar. Ensinam eles às almas tantos  meios de se conservar na graça de Deus, como fugir das ocasiões, frequentar os sacramentos, resistir às tentações, ouvir a palavra de Deus, meditar as máximas eternas e outros meios. Todos eles  são certamente utilíssimos, mas, digo eu, de que valem as prédicas, as meditações e todos os outros meios aconselhados pelos mestres espirituais, se falta a oração, quando é certo que o Senhor diz  não conceder graças senão a quem pedir? “Petite et accipietis: Pedi e recebereis”.

Sem a oração (falando segundo a providência ordinária) serão inúteis todas as meditações que se fazem, todos os propósitos e todas as promessas. Se não orarmos, seremos sempre infiéis a todas  as luzes d’Ele recebidas e a todas as nossas promessas. (…) Eu quisera, caro leitor, antes de tudo  que vou escrever aqui, explicar este meu sentimento, para que agradeçais ao Senhor, o qual, por  meio deste meu livrinho, dá a graça de fazer a oração com maior entendimento e conhecimento deste grande meio de salvação que temos, pois todos os que se salvam, falando dos adultos,  ordinariamente se salvam por este único meio.¹

A oração é, portanto, o mais seguro caminho que nos conduz à salvação. E o primeiro fundamento para compreendermos este valor da oração, no plano da Providência, é considerar como Deus  deseja ser, Ele mesmo, o nosso Cireneu. Com efeito, Nosso Senhor Jesus  Cristo aceitou sofrimentos superabundantes para nos salvar na Cruz.

Mas, Ele quis dar ao homem a possibilidade de se associar a esses padecimentos, completando o que era necessário por meio do sacrifício de cada um. É o papel da expiação que forma o tesouro  da Igreja, Corpo místico de Cristo. Assim, se Deus quis que fôssemos os cireneus d’Ele, também quer ser o nosso divino Cireneu.

Ele não é, portanto, um estranho na nossa vida. Ele, fonte de toda a consolação, quer entrar em nossa existência pessoal, tomando parte nela a pedido nosso, ajudando-nos, tanto em nossas  necessidades espirituais quanto nas terrenas. Seria mesmo compreensível que alguém fizesse uma imagem de um homem carregando a cruz, auxiliado por Nosso Senhor, como outro Simão  Cireneu.

Sim, Ele é um Cireneu que nunca nos abandona. E se nalgum momento deixa a Cruz pesar em nossos ombros, é para nosso bem, a fim de que alcancemos méritos e frutos para o Céu. Devemos,  pois, nos compenetrar dessa confortadora verdade: Deus é o nosso Cireneu infinitamente afável, infinitamente misericordioso, disposto a nos socorrer e amparar sempre. Para isso, basta o nosso  pedido, ou seja, a nossa oração.

Preparar o espírito, antes da oração

E como fazer para adquirir o valioso hábito da oração? Antes de rezarmos é preciso preparar o espírito, colocando-o diante das verdades que fazem com que nossa prece tenha alimento, do  contrário será completamente mecanizada. Então, um ponto de nosso exame de consciência seria preguntar se preparamos o nosso espírito para a oração, considerando os motivos pelos quais se reza bem. Por exemplo, tendo presente que Deus sabe como nos modificar e tem a força para fazê-lo.

Que Ele nos transformará, desde que peçamos. E que a condição para o nosso pedido ser atendido é a importunidade, virtude evangélica tão recomendada por Nosso Senhor:  Se algum de vós tiver um amigo, e for ter com ele à meia-noite e lhe disser: Amigo, empresta-me três pães, porque um meu amigo acaba de chegar à minha casa de viagem e não tenho nada  que lhe dar; e ele, respondendo lá de dentro, disser: Não me sejas importuno, a porta já está fechada, os meus filhos estão deitados comigo; não me posso levantar para te dar coisa alguma.

Se o outro perseverar em bater, digo-vos que, ainda que ele se não levantasse a dar-lhos, por ser amigo, certamente pela sua importunação se levantará e lhe dará quantos pães precisar (Lc 11,5-8).

Esta é a imagem d’Ele mesmo, querendo ser importunado e pedindo de nós, não o que alguns dizem: “reze pouco, mas reze bem”, mas o contrário: “reze como puder e reze muito, seja maçante,  reclame, e se Deus demorar em atender, peça ainda mais, porque Ele acabará atendendo com uma generosidade maior!”

Ora, se eu, antes de rezar, lembro-me bem que Nosso Senhor quer e sabe como me curar, e que a condição é ser importuno, eu preciso pedir muito. E fazê-lo por meio de Nossa Senhora, pois  através d’Ela realmente obtemos tudo.

Deus deseja nos fazer o bem

Além disso, é muito proveitoso tomarmos os trechos do Evangelho a respeito da oração — Nosso Senhor a ela se refere inúmeras vezes — e analisá- los sob o seguinte ponto de vista: o desejo de  Deus de nos fazer bem. O próprio fato de Nosso Senhor nos ensinar a rezar o Padre Nosso é a prova de que Ele nos quer conceder tudo quanto está dito ali. Senão, seria da parte de Deus uma  aberrante contradição.

Imaginemos um rei que dissesse: — Plinio, se você quiser obter graças de mim, reze de acordo com esta fórmula…  Se eu não fizer uso dela, o rei poderá ficar zangado comigo e pensar: “Esse homem me está tomando como palhaço, porque se eu lhe forneço um modo de obter aquilo que ele quer, deve admitir que darei mesmo, se ele pedir.” A parábola do Bom Pastor encerra um  tocante ensinamento a esse respeito: a ovelha está toda emaranhada, numa posição em que não pode se mexer mais. E o Bom Pastor toma a iniciativa de tirá-la da má situação na qual se encontra.

É bem a imagem de Deus, pegando a alma escangalhada, arrebentada, colhendo-a e conduzindo-a. O Bom Samaritano também faz isso com o homem que está à beira da estrada todo ferido. Ele  pára e o socorre. Pois de igual maneira procede Deus conosco. Estarei eu, então, fazendo a minha meditação do Evangelho orientada neste sentido? Não é o caso de incluir este ponto no meu exame de consciência? Por outro lado, cumpre lembrar  que, ao atender as nossas orações, Deus nos faz um imenso favor. Mas, Ele faz também uma ação que O glorifica  e, portanto, temos toda a razão de achar que, movido pelo amor de Si mesmo, Ele encontrará motivos para nos ser favorável.

Importa pedir sempre, e pedir muito

Seguindo a linha de seu ensinamento, Santo Afonso cita alguns trechos interessantes do Evangelho que provam a necessidade de pedirmos para  recebermos. O primeiro é uma promessa de Nosso Senhor, exposta em São João (16, 24): “Pedi e recebereis”. Noutro passo: “Pedireis tudo o que quiserdes e ser-vos-á concedido” (Jo 15, 7). Num terceiro se afirma: “Todo o que pede recebe, e o que busca acha” (Lc 11, 10). E ainda: “Se pedirdes a meu Pai alguma coisa em meu nome, Ele vo-la dará” (Jo 16, 24).

Santo Afonso insiste para que vejamos a estrutura dessas frases e a natureza de suas promessas.  “Pedi e recebereis”. É uma verdadeira condicional. Devemos pedir, do contrário não recebemos. É  como  quem diz: “preencha a condição, e eu faço”. E não está escrito que apenas o homem bom, justo, casto ou puro recebe o que pede, mas simplesmente: “quem pede, recebe”! É difícil haver afirmação mais incisiva que esta. “Pedireis tudo o que quiserdes e ser-vos-á dado”. Excetuando os pedidos que não forem para o nosso bem, tudo quanto rogarmos, ser-nosá concedido. Que  palavras poderiam ser usadas para afirmar isto com mais clareza?

Portanto, a promessa está formulada de um modo límpido e preciso. O mal está em não nos convencermos  disto, não sabendo manejar a oração como deveríamos. Ademais, Nosso Senhor não  especifica o pedido. Portanto, podemos solicitar tudo o que quisermos, até mesmo os bens materiais, desde que estes não ofendam a Deus. E se o pedido não convier, Ele não dará o que rogamos, porém nos compensará com algo melhor. Dessa maneira, acabaremos  alcançando o que desejamos.

Nesses dias difíceis em que vivemos, semeados de problemas, tenho certeza de que se rezássemos jaculatórias para cada necessidade, mesmo temporal, implorando a Nossa Senhora que nos  facilite isto, que nos simplifique aquilo, etc., conseguiríamos muitas coisas. Com o desgaste que as dificuldades da vida moderna causa nos temperamentos, e os problemas que podem acarretar  para a vida espiritual, esse gênero de pedido é altamente recomendável.

Tanto mais quanto a linguagem de Nosso Senhor é claríssima. As mesmas regras do Evangelho em virtude das quais acreditamos que, tendo Ele dito “isto é meu corpo”, opera-se a transubstanciação quando o sacerdote consagra as espécies, levam-nos também a crer que tendo Ele dito: “Pedi e recebereis”, de fato receberemos, se pedirmos.

Outra frase típica nesse sentido: “Todo o que pede, recebe; e o que busca, acha”. Ora, eu sou um que pede; logo, recebo. Eu sou um que busca; logo, acho. Naturalmente pode demorar, levar mais  tempo ou menos, mas a promessa de Nosso Senhor permanece imutável. Às vezes, no nosso apostolado precisamos de algo que não temos, e desanimamos. Peçamos! Rogando, obteremos. E se  não for o que necessitamos, será algo melhor. Nunca se perde por pedir.

Como a vida seria mais fácil e mais suave se nos compenetrássemos desse valor da oração! Ela é, verdadeiramente, um cetro posto em nossas mãos. A bem dizer, governamos os acontecimentos  com a prece humilde e persistente. Se nós não tomamos a sério estes ensinamentos, por falta de espírito de fé, privamos de tesouros inestimáveis a Igreja.

A via régia da vida espiritual

Consideremos, ainda, esta outra promessa de Nosso Senhor: “Em verdade, em verdade vos digo, se pedirdes a meu Pai alguma coisa em Meu nome, Ele vo-la dará” (Jo 16, 23). Santo Agostinho diz que a expressão “em verdade, em verdade” é uma espécie de juramento. De tal maneira quis Nosso Senhor acentuar o sentido exato das suas palavras, que chegou a usar esta frase: “Em verdade, em verdade Eu vos digo…”. Ou seja, “Eu vos juro: se pedirdes a meu Pai alguma coisa em meu nome, Ele vo-la dará”.

Assim, dificilmente haverá melhor oração do que esta: “Padre Eterno, em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo eu vos peço: lembrai-Vos das promessas de vosso Filho e concedei-me essa graça de  que necessito”.

Compreende-se que talvez não seja fácil nos compenetrarmos deste inestimável valor da oração, e de nos colocarmos nesta perspectiva. Nosso Senhor, a Sabedoria infinita, compreende essa nossa  deficiência melhor do que nós mesmos. A prova está na insistência d’Ele, pois encontramos inúmeras promessas do gênero nas Sagradas Escrituras. Ele sabe não terem os homens muita  propensão para se humilharem e pedir com perseverança. Diversas razões os desviam dessa atitude tão necessária: o desejo de fazerem as coisas pessoalmente, de escalar o Céu por seu esforço  próprio e não pela graça de Deus; por não quererem acreditar nos juramentos e nas misericórdias de Nosso Senhor em nosso benefício, enfim, por misérias de toda ordem.

Mas, note-se bem, é este o principal ponto de batalha da vida espiritual. Se a pessoa de fato pedir a graça de se compenetrar das verdades acima consideradas — e é preciso implorar essa graça, não  basta fazermos um exercício mental de compenetração — Nossa Senhora nos alcançará tudo. Quanto a isto não se pode ter dúvidas. Esta é a via régia da vida espiritual.

Plinio Corrêa de Oliveira

São Pedro Julião Eymard

São Pedro Julião Eymard foi um homem de uma virtude abrasadora, uma espécie de nova edição do Profeta Elias, pelo fogo de sua alma.

O católico ideal é um católico de fogo. E o sacerdote só é verdadeiramente digno deste título quando possui uma alma de fogo. Por isso, os bons sacerdotes são os que têm almas de fogo, como São Pedro Julião Eymard. O sacerdote deve ser aquele que puxa todos para a frente, que está na primeira fila.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 4/4/1993 e 2/8/1995)

São Pedro Julião Eymard

São Pedro Julião Eymard, glorioso fundador da Congregação dos sacramentinos, foi em tudo um sacerdote digno desse nome. Varão com alma de fogo, levava até o fim suas santas aspirações,  convicções e princípios. Soube compreender que, revestido da unção sacerdotal, tinha de estar na primeira fila, no primeiro lugar, atraindo e levando todos para a frente, para a perfeição nas vias  do bem. Por isso recomendava a seus fiéis:

“Na ordem da salvação, é preciso ter também uma paixão que nos domine a vida e a faça produzir, para a glória de Deus, todos os frutos que o Senhor espera. Amai tal virtude, tal verdade, tal  mistério apaixonadamente. Devotai-lhe a vossa vida, consagrai-lhe os vossos pensamentos e trabalhos; sem isso, nada alcançareis jamais. Sereis apenas um assalariado, nunca um herói. Dizem: “É  exagero tudo isso”. Mas, que é o amor, senão exagero?  Exagerar é ultrapassar a lei. Pois bem, o amor deve exagerar!”

[São Pedro Julião Eymard, O Santíssimo Sacramento]

Ornato e simplicidade

As igrejas do Brasil colonial eram bonitas, nobres e muito dignas. Manifestavam o contraste entre a intensa ornamentação e a simplicidade, causando aos olhos uma impressão agradável.

A diferença entre York(1) e Olinda é manifesta. É quase um pouco desconcertante! Mas a igreja de Olinda, construída no século XVII, tem isso de agradável: sente-se melhor a doçura e a suavidade do “à vontade” do matagal brasileiro. Ela emerge toda branquinha, muito aprazível, desta abundância de verde, que no fundo é provavelmente o mato. A localização, portanto, é muito bonita.

Não é fácil fazer um comentário sobre esta igreja, porque todos nós conhecemos uma porção de igrejas parecidas com ela. Nunca se copiam, são sempre diferentes, mas o mais possível iguais. O que comentar a este respeito?

Atmosfera de grandeza

Ela possui duas torres. No corpo central alguma coisa é vagamente à maneira de um triângulo, com três janelas. E, por assim dizer, em cada andar da torre uma janela também. A fachada muito cuidada, mas a parte lateral da igreja meio lambida e sem nenhum ornato por fora; em geral, as igrejas deste estilo são muito bonitas por dentro. Não tem mais nada para comentar, exceto isto: há uma certa cor local, um certo ambiente de brasilidade, sobre o qual chamo a atenção para dois pontos.

Quando consideramos este edifício, temos a impressão de algo que, em comparação com a Catedral de York, é muito primitivo; e notamos que a igreja é bonitinha. Entretanto, fica por detrás uma atmosfera de grandeza que talvez não saibamos definir, e que julgo resultar da conjunção muito discreta de dois elementos: todo esse verde dessas árvores dá uma ideia da enorme fecundidade do solo, e de um país com uma natureza rica, generosa, dir-se-ia quase agressiva. A produção jorra de dentro do solo!

Percebe-se que ninguém trabalhou muito para que isso fosse assim… Qualquer grão que se joga na terra já disputa com outros o espaço vital, e lá vai germinando e crescendo, como uma promessa enorme de uma grandeza vindoura!

Por outro lado, vemos no fundo o mar imenso, de um colorido lindíssimo! Nesse ponto não percebo que esteja picotado por nenhuma ilha, por nenhum recife, por nada: é o mar, o mar, o mar! Duas grandezas juntas: vastidão e a ideia de grandeza.

O tempo pode adornar e proporcionar certa dignidade

A Igreja de Nossa Senhora das Neves, no convento de São Francisco, em Olinda, é a construção mais antiga dos franciscanos no Brasil.

Há algo de imponderável aqui, ao menos para meu gosto, e que dá muito sabor a isto. Se essas telhas fossem todas vermelhinhas e novinhas, isto não perderia algo? Observem que é uma telharia velha e manchada. O que tem isto que, se fosse novinho, perderia? Se esta torre tivesse sido recentemente caiada, mas de tal maneira que desse ilusão de uma torrezinha novazinha em folha, não perderia também? O que há de beleza em uma coisa, quando sobre ela passa o tempo, para que, em última análise, o tempo a adorne, até mesmo quando ela fique estragada?

Vejam, por exemplo, essas pedras da torre. Em alguns lugares tem-se impressão que o tempo manchou, as intempéries mancharam. Calores de arrebentar, chuvas violentas, frescor nunca, pedra trabalhada, corroída, torrada pelo sol, mas íntegra! Percebe-se que o tempo passou sobre ela e lhe deu uma doçura, uma dignidade, um ar assim pensativo do ancião ou da anciã que está na cadeira de balanço, pensando e dizendo: “Fugite irreparabile tempus! Como eu, quando era jovem, não gostava disso! Mas o tempo fugiu mesmo…” Tem sua poesia.

Como poesia tem, a meu ver, esse tufo de palmeira que está embaixo.

Orações, sacrifícios, tentações, vitórias

As palmeiras são muito bonitas e não impedem que se veja esta espécie de portal, de uma linha um pouco fantasiosa, mas elegante e bonito, que esta aí. Não se pode ter uma ideia inteira dele. Quanto à fachada do convento, pode-se dizer que qualquer casa de fazenda do interior tem exatamente isto. É uma residência de fazendeiro antigo, com janela de guilhotina: três janelas embaixo, três janelas em cima. Dir-se-ia uma caixa, na qual alguém recortou à tesoura as janelas, e está feito o plano da casa.

Alguém dirá: “Apreciação severa!”

Não. Ela é feita para que nós compreendamos o que é o sabor das antigas eras. Como nós sabemos que aqui não residiu uma família, mas há bastante tempo mora uma Ordem Religiosa — que durante muitos séculos foi uma Ordem recolhida, de pobreza, impregnada pela doçura do Poverello —, podemos imaginar a continuidade, a sucessão de frades que se revezavam ao longo das décadas nesse convento, sempre servindo, sempre rezando, sempre trabalhando, sempre afastados das coisas da Terra. E começa-se a pensar: “Através de cada uma dessas janelas, que mundo de orações, que mundo de sacrifícios…” Não nos iludamos: que mundo de tentações, que mundo de vitórias, que mundo de ação de graças, que provações, que doenças, que preocupações!

Aí está a expressão que se desprende desse edifício.

A palmeira aristocrática e as plantinhas completam-se

Consideremos a Igreja de Nossa Senhora dos Prazeres dos Montes Guararapes. O nome diz tudo! Nós não temos que acrescentar nada.

A fotografia situa num ângulo muito agradável e muito poético a igreja. Mas precisamos reconhecer que ela quase teve mais a preocupação de dar a moldura verde da igreja, do que a igreja propriamente dita. A moldura é muito agradável.

Eu nunca estive lá, mas tenho a impressão que embaixo deve haver um valo e um cursozinho de água qualquer ali. O elemento indispensável da paisagem brasileira, e sobretudo da paisagem nordestina, está presente: as palmeiras.

Chamo a atenção particularmente para aquela palmeira esguia, tendo no alto um mundo de folhas que o vento está sacudindo em todas as direções. Isso nos dá um pouquinho a ideia da hierarquia na criação botânica.

Há plantinhas mais comuns do que estas que se veem ali? Tenho a impressão de que, desde quando o mundo foi criado, há plantas destas. Como elas são vulgarzinhas, comunzinhas, apagadas em comparação com a palmeira aristocrática, esguia que ostenta as suas folhas como se fossem um brasão!

É inegável que, batidas pelo sol, consideradas no seu conjunto, estas plantinhas dão uma ideia de pujança, de fertilidade, de variedade, de grandeza, são indispensáveis para o panorama! Se imaginássemos que houvesse só palmeiras aqui, como o panorama seria nada! Se não houvesse palmeiras, mas só estas plantinhas, não havia panorama!

Assim são os grandes e os pequenos na Terra: completam-se aos pés de Deus. Como o mundo seria árido e sem graça se só existissem grandes! Como ele é vulgar quando só há pequenos! Pequenos e grandes conjugados dão a ordem que Deus quis.

Fato concreto é este: se alguém me sugerisse abater tudo isto, fazer um gramado lindo nas duas margens desse córrego, passar asfalto por debaixo do córrego para ficar bonito, eu diria: “Você não entendeu nada! Deixe assim, e acabou se!”

Lembrando as batalhas dos Guararapes

Em frente à Igreja de Nossa Senhora dos Guararapes vemos o clássico Cruzeiro. A igreja tem uma nota que não é de qualquer igreja do tempo colonial. Nessa época, as igrejas, com certa frequência, visam ao horizontal, não ao esguio, ao alto. Esta tem isto, que é para mim um grande mérito: ela visa ao esguio, ao alto!

Notem que ela é um pouco estreita em comparação com sua altura. As janelas dela também são de uma altura um pouco maior do que o comum, e um pouco desproporcionadas, mas no sentido louvável da palavra, em relação à altura de cada janela. E aquele ornato central, também todo ele se volta especialmente para o alto. Dir-se-ia que há uma sede do esguio, do ascético, do voltado para o Céu e para as realidades de além desta Terra, que aposta corrida com as duas palmeiras que se veem do outro lado, e que não conseguem ter a altura da igreja.

No chão, é preciso bem reconhecer que não existe apenas a mãe natureza, mas existe o “pai relaxamento”. É uma tristeza, mas é assim.

O todo esguio da igreja é mais propício a lembrar as batalhas dos Guararapes, a ascese, os heróis, a luta religiosa, etc., do que se fosse uma igreja atarracada e mais dada para as comodidades dos grandes domingos tranquilos.

Vejam que belo ladrilho reveste as torres! Ladrilho, uma arte dos portugueses – dos espanhóis também. Em Portugal especialmente atingiu uma beleza excepcional, e esses ladrilhos vinham de Portugal. Mas no Brasil também se começou a fazer ladrilhos, por vezes bem bonitos. Os jogos de cores desse ladrilho, sobretudo, me parecem muito agradáveis.

Observem o desenho. Parece uma coroa, e no alto tendo uma espécie de coroazinha. E coroando tudo isto, a Santa Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Altaneira, ascética e com senhorio

Considerem também o arvoredo e a ideia de pujança da natureza que se tem aí. É o velho convento beneditino, muito simpático, respeitável, antigo da cidade de Olinda. Mas este é mais dado ao horizontal.

A Igreja São Pedro dos Clérigos, antiga catedral de Recife, levou o esguio até onde se podia levar. Agrada-me muito a arquitetura dela: é altaneira, ascética, tem senhorio…

A Igreja de São Cosme e Damião está precisando muito de uma renovação, pois se encontra muito mal tratada. Aqui o tempo fugiu muito irreparavelmente! Ela é venerável, mas para ser bela precisava de uns retoques!

Não há muito comentário a fazer sobre o interior da Igreja de São Pedro dos Clérigos. Vemos que o esguio e o esbelto ali se mantêm. Notem como a parte equivalente ao presbitério é profunda, alta e esguia. E toda a igreja é muito alta. Poder-se-ia dizer que tem três andares. O restante corresponde à configuração bonita, nobre, muito digna das igrejas antigas do Brasil.

Contraste entre o entalhado e o liso

Também conheço o Mosteiro de São Bento, em Olinda. Vemos aí o contraste que a arquitetura desse tempo às vezes explorava de modo muito feliz, entre o altar todo muito carregado e a simplicidade das paredes caiadas. Depois, estalas de novo muito carregadas. E esta justaposição do extremamente carregado e do extremamente simples causa para os olhos uma impressão agradável. Essa impressão é visada e atingida pelo artista que fez isto!

Está primorosamente conservada. Chão muito limpo, muito bem arranjado, e tudo muito bem adornado.

Chamo a atenção para a beleza dessas cômodas, com enormes gavetas de ambos os lados, para guardar paramentos, e que toma toda a parede. Provavelmente tomam as quatro paredes da sacristia. Quadros muito interessantes, encaixados na própria “boiserie”, e não só acima das cômodas, mas no teto, como é o estilo.

Vê-se um quadro no teto. Deve haver mais de um quadro, ao longo da imensa sala.

 Uma mesa esguia, elegante se deixa ver ali, e um grande candelabro. Realmente uma bela peça.

Um púlpito. Os púlpitos naquele tempo ficavam bem altos e muito mais para o centro da igreja. Porque, como não havia esses aparelhos de som, o pregador tinha que ficar o mais alto possível para a sua voz alcançar de modo cômodo, ou relativamente cômodo, todo o edifício sagrado. Mas o púlpito alto dava outra majestade ao pregador, que ficava pairando nas nuvens, por assim dizer, para pregar o seu sermão.

O púlpito é todo muito trabalhado, revestido de ouro e com uma parede por detrás, caiada e extremamente lisa. Podemos sentir aqui melhor, talvez, o agrado do contraste entre esses dois elementos: o entalhado e o liso.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 22/5/1985)

 

1) Referência aos comentários à Catedral de York. Ver Revista Dr. Plinio n. 161, p. 32-35.

 

Modelo de santidade

Nossa Senhora é para nós o exemplo perfeito de santidade. Ou seja, se nos modelarmos inteiramente segundo Ela, alcançaremos a completa semelhança com Nosso Senhor Jesus Cristo. Se A tomarmos como ideal, acreditarmos na eficácia da devoção a Ela, e tudo fizermos em estreita união com Maria, a Ela nos assemelharemos.

Assim, devemos pedir a Nossa Senhora, com todo o empenho, a graça de uma profunda compreensão de suas altíssimas virtudes, as quais havemos de imitar. E que Ela nos faça participar, em grau sempre crescente, da sua insondável fortaleza. Maria é a Virgem forte e combativa, a Virgem intransigente e absolutamente inflexível diante do demônio, do mundo e da carne. Supliquemos a Ela essa intransigência, antes de tudo contra o que há de mal em nosso interior; em segundo lugar, contra o que há de mal fora de nós — tendo em vista nossa própria santificação.

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 76 (Julho de 2004)