Prêmio à altura do afeto

Mãe de Misericórdia, Nossa Senhora às vezes concede graças a pedido de quem não merece, como reza o “Lembrai-Vos”.

Mas, Ela é também Mãe de Justiça. E a todo bem realizado por seus filhos, com quanta alegria Ela os favorece com uma justa recompensa! Como se dissesse a cada um deles: “Meu filho, a ti não darei uma graça porque te perdôo, e sim porque te premio.

Que felicidade tu me proporcionas pelo fato de mereceres esse prêmio! Ei-lo, não à altura, mas muito maior do que teu mérito: à altura de meu maternal afeto…”

Auxiliadora onipotente

A Santíssima Virgem segura no braço esquerdo o Menino Jesus, e na mão direita um cetro. Isso quer indicar que, pelo poder que Ela tem sobre seu Divino Filho, possui a onipotência sobre todo o universo. E por essa razão tem o poder de nos auxiliar em tudo quanto necessitarmos. É uma auxiliadora onipotente.

Por outro lado, o semblante risonho e amável d’Ela nos fala da sua misericórdia.

Estão presentes, portanto, os dois fatores para confiarmos no auxílio de Maria Santíssima, que quer e pode socorrer-nos inesgotavelmente, em tudo. Logo, se pedirmos, Ela socorrerá.

Nossa Senhora Auxiliadora poder-se-ia chamar, debaixo de certo ponto de vista, Nossa Senhora dos Pedidos. Ela não nos auxilia só quando pedimos, mas sempre que o fazemos, Ela nos ajuda. Por causa disso, é invocada sob o título de “Auxílio dos Cristãos”.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 23/5/1968)

Poderoso auxílio em todas as dificuldades

Continuamente devemos recorrer a Nossa Senhora, especialmente quando passamos por dificuldades. Ela sempre nos acolhe, pois nunca se ouviu dizer que a Mãe de Deus tenha abandonado alguém que pede seu socorro. Entretanto, às vezes nossa prece demora em ser atendida; isso significa que Ela nos dará graças com extraordinária abundância.

 

Eu gostaria de dizer uma palavra mais especialmente quanto a Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos nas dificuldades da vida espiritual. Estas costumam ser de duas ordens. Umas dificuldades são as crises breves da vida espiritual, quando a pessoa se sente tentada e, portanto, hesitante ou abalada entre o bem e o mal, e com a possibilidade de ser arrojada no precipício do mal de um momento para o outro.

As dificuldades do tipo clássico

Essas são as dificuldades do tipo clássico, e quando falamos a respeito de dificuldade, naturalmente pensamos primeiro na do tipo clássico, quer dizer, no grande apuro da vida espiritual. Evidentemente Nossa Senhora é auxílio nessas circunstâncias. Não teria sentido Ela ser Auxílio dos Cristãos se não o fosse, sobretudo, para a vida espiritual, e é claro que o auxílio é principalmente para os mais necessitados. Então, para as pessoas que estão em crises agudas da vida espiritual e gravemente necessitadas, Maria Santíssima, na plenitude do termo, é o auxílio.

Sendo Ela Mãe de Misericórdia, seu auxílio não é dado apenas para uma pessoa que diga: “Eu vou perfeitamente bem na vida espiritual, estou muito tentado, porém não cedi em nada. Tenho direito ao vosso auxílio; vinde e auxiliai-me!” Mas também para aquele que se encontre numa situação pior, e de apuro muito mais grave, e reze: “Eu estou muito tentado, pequei, andei mal. Receio me embrutecer no pecado, de me habituar a ele, de não sair da vida de pecado, e tenho uma vontade imensa de me regenerar. Não mereço vosso auxílio, mas porque sois Auxiliadora de todos os cristãos, até dos mais miseráveis e não apenas dos cristãos bons,  então Vos peço: vinde auxiliar-me!”

Quer dizer, nessa visualização é a miséria da pessoa, o próprio fato de ela ter caído em pecado que é alegado diante de Nossa Senhora, como uma razão para obter o auxílio. É mais ou menos como quem se coloca diante da mãe e diz o seguinte: “Estou tão necessitado que até me aconteceu o pior. É verdade que foi por minha culpa. Pequei. E porque estou exatamente no sumo do desamparo, por ser um pecador, eu, enquanto abandonado, encontro no desamparo a razão pela qual primeiro devo pedir a vossa misericórdia.” Quer dizer, esta é uma consideração de fundo, que não fecha nunca as portas da esperança na vida espiritual, porque a Virgem Santíssima, sendo nossa Auxiliadora, é próprio,  inerente a Ela, é movimento profundo n’Ela, correspondente à sua missão, ao amor insondável que Ela tem a Deus, de nos auxiliar por esta forma.

Há aqui uma esperança, um recomeçar sem fim de novos propósitos de emenda, que deve ser o fundo de nossa vida espiritual.

Uma das crises da vida espiritual apresenta-se à maneira de alguém que, estando numa escada, encontra-se em perigo de cair em cima de uma fogueira: cai, não cai.

Os que se atolam em alguma etapa da vida espiritual

Existe um outro sistema de crise espiritual. É o da pessoa que está subindo uma escada e, no lugar onde deveria haver um patamar, tem o vazio, e mais adiante continuam outros degraus; de maneira que o indivíduo não sabe como faz para pular aquele vácuo. São as tais almas que atolam a alturas diferentes da vida espiritual.

Há uns que atolam, por exemplo, num estado assim: levam anos no meio-termo entre a virtude e o pecado, ora no estado de graça, ora fora do estado de graça, e ficam naquele pêndulo do Inferno para o Céu e do Céu para o Inferno.

Outros atolam numa espécie de mediocridade do estado de graça; não pecam mortalmente, mas cometem torrentes de pecados veniais — por exemplo, as tais mentirinhas ditas “inocentes” — à vontade.

Existem ainda aqueles que vencem as tais mentirinhas, mas se atolam numa outra coisa. Quem está nessa situação diz: “Combati todos os pecados que eu tinha — os leves e os graves —, e percebo que não estou valendo grande coisa. Há algo que falta, mas não sei o que é. Só sinto que eu, apesar de toda a profilaxia, não valho nada. Pior seria se eu não tivesse feito a profilaxia… Eu, antes, estava sujo; agora fiquei vazio. Mas, daí para diante, como encher isto? Também não sei.” E fica parado nesse estado.

Há outros que adquirem virtudes, progridem, e param já num certo grau de virtude, mas, de vez em quando, o carro encalha e não há meio de galgar o patamar de cima. O indivíduo fica assim um tempo enorme. Isso corresponde, em qualquer altura da escada, sempre a um ponto: é algo de que a pessoa deveria se desapegar e que, ao mesmo tempo, é a coisa mais clara e a mais confusa do mundo. Ela vê com toda a clareza que devia deixar aquilo, mas, concomitantemente, não vê de nenhum modo que é aquilo que ela precisaria abandonar.

A necessidade de uma graça extraordinária

E a Providência fica provando aquela pessoa até criar um momento em que haja um estalo em sua cabeça, o qual, em geral, representa uma graça grande que ela recebe, fazendo-a pensar: “Ah! Eu agora vejo, tem isto, aquilo e mais tal outra consequência. Estou compreendendo”. Então começa uma emenda, e ela vai mais um pouco para diante. Um, dois, três anos depois para de novo. Cada solução de um encalhe destes equivale verdadeiramente a uma espécie de conversão. E tanto é conversão — neste sentido da palavra — do indivíduo que deixa o zigue-zague entre o estado de pecado mortal e o estado de graça, como daquele que está vazio, embora não sujo, e sente a necessidade de se encher de virtudes que não possui.

Então, no caso de quem estacionou a certa altura da vida espiritual, é mais uma conversão neste sentido: é preciso uma graça extraordinária, como Nosso Senhor dava a um paralítico que, de repente, começava a andar. Essa graça precisa ser pedida, e ela representa o desapego de algo de muito claro e muito obscuro, ao qual a pessoa estava apegada.

É evidente que não podemos produzir essa graça por nosso próprio esforço, porque a graça é um dom criado e concedido por Deus, e não obtido por nós, mais ou menos como um isqueiro que tira de si mesmo a sua própria chama.

É preciso pedir que Maria Santíssima nos obtenha de Nosso Senhor essa graça. Portanto, nesses estados Nossa Senhora quer deixar bem clara a necessidade do sobrenatural.

Durante muito tempo, por nós mesmos, nada conseguimos. Pedimos para Ela e, de repente, obtemos. Quer dizer, Ela pode levar mais tempo ou menos para dar, mas quando Ela concede, o faz de uma vez, rapidamente, de um modo impressionante.

Esse tipo de graça, como a cura que Nosso Senhor realizava nos paralíticos, ao dizer a um homem “levanta-te e anda”, e ele saía caminhando, Nossa Senhora também nos obtém, enquanto Auxílio dos Cristãos, para circunstâncias extraordinárias, para casos que não se resolvem de outro modo.

Acho muito importante isto, porque conheço muitas almas boas que acabam desanimando na vida espiritual à força de rotina, de estagnação, petrificação e paralisação; ela se pergunta: “O que eu vou fazer daqui por diante?” Não se sabe.

Pedindo a Nossa Senhora, Ela nos dá o auxílio

Às vezes entra-se em alguma igreja e se vê certas beatas rezando. Tem-se a impressão de que podiam passar dois mil anos fazendo aquela oração, e não saíam daquele pouco de vida espiritual. Tudo direitinho, arranjadinho… Pode-se imaginar uma delas que, voltando para sua casa, ia ver um filho bêbado, ateu, cuidava dele; depois pegava uma imagenzinha de Nossa Senhora, fazia uma novenazinha, etc. Mas uma chama de uma virtude heroica, de algo de generoso, que convertesse, nada! E então, também nesse caso, desânimo, uma certa rotina, rodando no vácuo.

Por que às vezes se encontra um bom católico parado? Porque não lhe ensinaram que seu estado tem uma solução, um remédio, e que o fato dele não encontrar a solução é a prova de que Nossa Senhora quer mostrar-lhe que a solução é só Ela. Sem Maria Santíssima, ele de fato não vai para a frente, pois está apegado, entalou, enrascou em qualquer coisa.

Então, Nossa Senhora quer deixar bem claro que é preciso pedir-Lhe essa graça, e, pedindo, Ela dá; o sobrenatural resolve as dificuldades, é uma questão de espírito de Fé. Rogando empenhadamente, afincadamente, nós conseguimos.

O título de Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos é um incentivo para que nós peçamos, porque compreendemos que o próprio d’Ela é auxiliar. Então, se eu preciso de auxílio e encontro a Auxiliadora dos Cristãos, estou certo de ser atendido, porque o necessitado encontra seu alívio junto à auxiliadora. Se considerar que a auxiliadora é Mãe, terei certeza de ser atendido. Então, àqueles dentre nós que se encontram nesse estado, em qualquer estágio da vida espiritual, eu sugiro — não vou além de uma sugestão — que rezem apenas três Ave-Marias por dia, pedindo a Ela isto: que tenha a bondade, a condescendência, a misericórdia de intervir nesse estado, e intervenha logo para nos socorrer. Ou, então, uma oração como o “Lembrai-Vos” pode ser sumamente útil para isso.

Rezando essa prece, posso dizer: “Lembrai-Vos de que nunca se ouviu dizer que Vós abandonastes algum pecador. Ora, eu sou um pecador. Será que Vós ireis interromper dois mil anos de gloriosa assistência aos necessitados e abrir uma exceção para mim? Eu não acredito.” É uma linda expressão: “Lembrai-Vos”.

Uma simples medalhinha amassada

Quando nos lembramos de todo o rebotado que passou… E quanta coisa Nossa Senhora tem perdoado, de toda ordem, de todo jeito; uns judeus empedernidos como Ratisbonne(1), bêbados, sem-vergonhas, canalhas, gente de toda ordem que Ela converte. Dessa forma, posso pensar: “Nunca se ouviu dizer… Será que Vós permitireis que a primeira vez seja comigo? Não é possível!” Eu, então, crio alento e toco para a frente.

Eu li uma vez, num livro de vida espiritual, uma coisa muito bonita a respeito do auxílio de Nossa Senhora. Uma senhora, se não me engano da nobreza de Paris, possuía uma casa muito bem arranjada, em cuja sala de visitas havia um quadro com uma moldura bonita e, dentro, uma almofada de veludo e uma medalhinha muito comum, amassada. Um ou outro visitante que aparecia lá perguntava, às vezes, o que era aquele objeto inteiramente sem valor artístico, até estragado, no meio daquela sala tão faustosa e de tanto gosto. E a senhora contava o seguinte: “A essa medalhinha devo a vida e a conversão do meu filho. Ele era ateu, estava saindo de um mau lugar — ou bebendo, ou fazendo qualquer outra coisa má; enfim, se encontrava em estado de pecado — e houve um crime na rua; o projétil desviou-se e bateu no peito dele, chocando-se contra essa medalhinha”.

Sabemos como, em geral, as medalhas de Nossa Senhora são frágeis, ultra comerciais, de alumínio, etc.

E ela continuou: “O projétil está guardado junto com a medalha. Entortou e estragou a medalha, mas miraculosamente não matou meu filho. Ele teve um tal golpe, que se converteu. E este grande milagre merece bem que eu tenha estes objetos expostos aqui”.

Vemos, assim, a bondade de Nossa Senhora por um tipo que, sendo morto por um disparo, iria para o Inferno, pois estava ofendendo a Ela naquele momento. Para esse sujeito, Ela realiza um milagre esplêndido.

Então: “Lembrai-Vos de mim também que não estou fazendo uma coisa horrorosa, não estou pecando, mas vilmente encalhado, bestamente encalhado, e não há o que me desencalhe. Disto eu estou farto de saber e compreendo que só Vós me podeis desencalhar; fazei-me este favor, desencalhai-me!” É um pensamento que só pode nos alentar e ser um incentivo para nossa novena de Nossa Senhora Auxiliadora.

Tardando em nos atender, Maria Santíssima nos concede superiores benefícios

Quando consideramos os auxílios da Virgem Maria, vemos que é uma verdadeira graça o fato de Ela dignar-Se estabelecer conosco relações pelas quais atende pequenos pedidos, quase que diríamos pequenas intenções, como se fossem pequenos carinhos maternos da parte d’Ela. Sem dúvida, é uma graça que devemos reputar como muito preciosa.

Entretanto, não devemos nos espantar quando o auxílio de Nossa Senhora tarda. Muitas vezes Ela demora a atender exatamente nas grandes graças, que Ela quer que peçamos muito.

Em geral, em toda a vida de uma pessoa muito devota de Maria Santíssima, assim como existem as graças que Ela dá logo, há também umas duas, três, quatro ou cinco que Ela concede demorando enormemente, e essas são as almas que Nossa Senhora mais ama, pelas quais, dentro de um rosário de graças facilmente concedidas, Ela coloca algumas muito difíceis. E em geral as graças que Ela ama mais são as de caráter espiritual. Às vezes, é uma graça de caráter temporal cujo retardamento vai ter um sentido espiritual.

Contaram-me o caso de uma senhora protestante, convertida à Religião Católica, a qual tinha muita vontade de ser devota de Nossa Senhora. Leu São Luís Maria Grignion de Montfort, convenceu-se de ser aquela a verdadeira devoção, mas não conseguia ter uma devoção que não fosse puramente teórica em relação à Santíssima Virgem.

Ela passou dez anos rezando todos os dias afincadamente, para ter uma devoção viva a Nossa Senhora. Ao cabo desse tempo, ela a obteve de modo supereminente.

Quer dizer, há certos retardamentos da providência de Nossa Senhora, enquanto Auxílio dos Cristãos, em que Ela concede mais tardando do que dando logo. E isso em parte porque se Maria Santíssima atendesse todos os nossos pedidos imediatamente, a Terra se transformava num paraíso e os sofrimentos desapareciam. Ora, umas das maiores graças que Nossa Senhora nos dá são as cruzes, os sofrimentos. E muitas vezes Ela tarda para nos dar a graça e o mérito do sofrimento.

É preciso também acrescentar que algumas vezes a Santíssima Virgem tarda para provar a nossa Fé, quer dizer, para nos desenvolvermos na Fé e na confiança; e depois Ela nos dá essas graças de modo supereminente.

Por isso, se há alguma alma que esteja esperando muito tempo para receber uma graça, ela não deve considerar isso como uma recusa de Nossa Senhora, mas como uma promessa de que, se pedir muito, essa graça lhe será dada com uma abundância extraordinária.

Na novena de Nossa Senhora Auxiliadora, que, enquanto Auxiliadora, é dadivosa e distribuidora de graças, devemos pedir que, assim como Ela tem pena das almas do Purgatório e abrevia seus tormentos, na medida em que convenha às nossas almas, condescenda em abreviar também essas grandes demoras, e nos dê aquilo que nós queremos, sobretudo para a nossa vida espiritual.

 

(Extraído de conferências de 21/5/1964,
 17/5/1966 e 18/5/1966)

1) Afonso Tobias Ratisbonne, convertido milagrosamente à Religião Católica ao presenciar uma aparição de Nossa Senhora. Ver Revista Dr. Plinio, n. 46, p. 6-9; n. 94, p. 24-29.

 

Visitação de Nossa Senhora a Prima Isabel

Episódio sumamente rico em importantes aplicações para nossa vida espiritual, a Visitação de Nossa Senhora nos mostra como Santa Isabel, prima da futura Mãe de Deus, teve um conhecimento imediato de que o Messias se achava ali presente, encarnado no seio puríssimo de Maria. Ela o soube, não só por uma inspiração da graça, mas também por uma espécie de sentimento, de percepção do divino, excelentes, que a fizeram discernir a presença de Jesus.

Essa percepção, esse sentimento, cada católico deveria ter — em grau proporcionado — para amar todas as coisas que sejam segundo Deus, e para rejeitar aquelas que Lhe são contrárias.

Auxiliadora na defesa da Fé

A invocação de Nossa Senhora Auxiliadora lembra-nos, antes de tudo, a sua ação em defesa da Fé Católica.

 

A invocação de Nossa Senhora Auxiliadora dos Cristãos foi introduzida na Ladainha Lauretana por São Pio V, em comemoração à vitória alcançada contra os turcos, em Lepanto. A festa foi instituída por Pio VII em ação de graças por sua volta a Roma depois de ter sido preso por Napoleão.

Auxiliadora sobretudo na dilatação da Fé

Sobre a devoção a Nossa Senhora Auxiliadora, temos aqui uma ficha tirada da “Vida e Obra de D. Bosco”(1).

Os companheiros de D. Bosco notaram que desde o ano de 1860, ele começou a chamar e invocar a Santíssima Virgem com o título de Maria Auxiliadora, “Maria Auxilium Christianorum”. Ele era devotíssimo — e o foi sempre — da Imaculada Conceição. Todas as suas grandes obras começaram num dia 8 de dezembro. Agora, unia sempre os dois títulos dizendo: Maria Imaculada Auxiliadora. Era que em novos sonhos a Virgem lhe havia ordenado que este devia ser o distintivo da congregação.

Num dia de dezembro de 1862, diante de um grupo de meninos que jogava disse:

— Vede aquele lado do pátio? Ali vamos construir uma igreja magnífica à Mãe de Deus. Como devemos chamá-la? Chamá-la-emos Maria Auxiliadora. Até agora temos celebrado com solenidade e pompa a festa da Imaculada Conceição, e continuaremos a fazer o mesmo. Mas, além disso, a mesma Virgem Santíssima quer que a honremos com o título e a invocação de Auxiliadora. Os tempos que correm são tão tristes e temos verdadeira necessidade de que a Santíssima Virgem nos ajude a conservar e defender a fé cristã como em Lepanto, como em Viena, como em Savona e Roma. Ela o quer e aqui virão multidões imensas implorar o auxílio onipotente da Virgem Santíssima.

Alguém objetou:

— Mas isto custará muito dinheiro.

Respondeu D. Bosco:

— A Virgem é quem paga. Ela quer sua igreja, e é natural que pense em pagar seus gastos. Mas para isto temos que merecer.

Nossa Senhora, enquanto auxiliadora, gloria-Se de dar aos cristãos toda espécie de auxílio, tanto nas necessidades espirituais quanto nas materiais, desde que esteja de acordo com a vontade de Deus e seja em benefício de nossa alma. A questão é pedir. Quando se pede com afinco se obtém. E se não obtemos aquilo que pedimos, obtemos qualquer outra coisa muito melhor.

Entretanto, vemos que D. Bosco entendia Nossa Senhora como Auxílio dos Cristãos principalmente para a defesa da Fé e para a luta em prol da Causa Católica. Ele fala dessa necessidade lembrando Lepanto, o grande cerco de Viena contra os turcos, Savona e as complicações de Pio VII com Napoleão.

Devemos, então, invocar Nossa Senhora Auxiliadora e pedir sua intercessão muito frequentemente em nosso apostolado, nas situações difíceis, que vão andando de um modo lento, casos complicados de alma, etc.

Ela é Auxiliadora dos cristãos na dilatação da Fé, na luta pela Fé. E as coisas difíceis que empreendemos pela Fé devemos pedir a Nossa Senhora que nos ajude a levar a cabo

Auxílio nas grandes e pequenas coisas

  1. Chautard(2) condena o erro das pessoas que pensam: “Deixe que Deus me ajude nas circunstâncias excepcionais, que nas situações comuns eu me arranjo sem Ele”. Isso é errado; devemos contar com o auxílio de Deus e de Maria Santíssima em todas as circunstâncias, inclusive nas muito pequenas. Naturalmente, esta necessidade cresce nas situações importantes e nas mais improváveis.

Há uma invocação a Santa Rita de Cássia, que eu gosto muito: “Santa Rita dos impossíveis”. Outra forma de nos referirmos a Nossa Senhora Auxiliadora seria “Nossa Senhora dos Impossíveis”, que obtém aquilo que humanamente falando é impossível, sem saída. Isso Ela obtém, sobretudo, em ordem à vitória da Igreja e à salvação das almas.

Certas revelações particulares nos falam dos últimos tempos e nos apresentam Nossa Senhora como auxiliadora. Haverá um determinado momento em que certo pugilo católico estará completamente perdido. E então um chefe invocará São Miguel Arcanjo que, por ordem de Nossa Senhora, virá auxiliar os católicos, ganhará a batalha, cairá o poderio do demônio e nascerá o Reino de Maria.

Devemos ter isto em mente: é a Santíssima Virgem quem auxilia, intervém. A todo momento devemos pedir a Ela esse auxílio. Recomendo esta intenção para ser muito ardentemente visada no dia da Festa de Nossa Senhora Auxiliadora.

Oração a Nossa Senhora Auxiliadora

Vamos agora ler uma oração composta por São João Bosco a Nossa Senhora Auxiliadora:

“Ó Maria, Virgem poderosa, Vós, grande e ilustre defensora da Igreja; Vós, auxílio maravilhoso dos cristãos; Vós, terrível como um exército em ordem de batalha; Vós, que destruístes as heresias em todo o mundo, nas nossas angústias, nas nossas lutas, nas nossas aflições, defendei-nos do inimigo e na hora da morte acolhei nossa alma no Paraíso. Amém.”

É uma linda oração que mostra como o pensamento dele estava nessa ideia de que Nossa Senhora é a auxiliadora da Igreja. 

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 24/5/1967)

 

 

1) Não dispomos dos dados bibliográficos da referida obra.

2) Dom Jean-Baptiste Chautard (*1858 – †1935), monge trapista e Abade do Mosteiro de Sept-Fons.

Estrela do Mar e Porto de Bonança

Estrela do mar reluz com a bela e caridosa missão de orientar os navegantes que, em meio às vagas incertas e furiosas, correm o risco de se extraviar. Assim é Nossa Senhora que, na noite desta vida, brilha constantemente fixa e luminosa, indicando-nos o caminho do Céu.

Ela é, também, o nosso porto seguro. Quantas vezes nos debatemos em meio às ondas das provações inerentes à vida espiritual, ou decorrentes da fidelidade à Igreja! Ora é a prática da virtude, que parece não progredir; ora são as inevitáveis vicissitudes de nossa existência terrena, sempre nos pedindo cuidados, e muitas vezes nos trazendo dissabores. É, então, como se navegássemos num mar sem ponto de referência, esforçando-nos por atingir o fim de nossa trajetória.

Para tais ocasiões, a solução é o recurso à Santíssima Virgem, rogando-Lhe:

“Vós sois o Auxílio dos cristãos, o Refúgio dos pecadores. Está na vossa grandeza, ó minha Mãe, considerar meus defeitos, minhas necessidades, meus sofrimentos, e serdes para mim como um porto, abrigando-me neste mar alto e turbulento. A medida de vossa grandeza é também a de vossa misericórdia.

Tende pena de mim e acolhei-me!”

AUXILIADORA DOS CRISTÃOS

Em 24 de maio, a Igreja comemora a festa de Maria Auxiliadora dos Cristãos. Esta invocação da Santíssima Virgem foi especialmente cara a Dr. Plinio, desde sua infância. A jaculatória “Auxilium Christianorum, ora pro nobis” (Auxílio dos Cristãos, rogai por nós) brotava freqüentemente de seus lábios. Testemunho eloquente disto são os comentários transcritos abaixo, feitos em resposta à pergunta de um jovem ouvinte.

 

Nossa Senhora Auxiliadora dos Cristãos! Por que o título de Auxiliadora? Nossa Senhora tem  como maior glória o ser auxiliadora? Para Ela não é glória maior ser Mãe de Deus? É claro!

Para Ela não é gloria maior ser co-Redentora do gênero humano? É claro! Para Ela não é glória maior ter sido concebida sem pecado original? É claro!

Por que, então, Nossa Senhora Auxiliadora? Por que tanta insistência em torno desta  invocação: Nossa Senhora Auxiliadora?

Compreende-se, pois Ela, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e nossa Mãe, está  permanentemente disposta a nos ajudar em tudo aquilo que nós precisamos. São Luís Maria   Grignion de Montfort tem uma expressão que parece exagerada, mas que está absolutamente dentro da verdade: se houvesse no mundo uma só mãe reunindo em seu coração todas as  formas e graus de ternura que todas as mães do mundo teriam por um filho único, e essa mãe tivesse um só filho para amar, ela o amaria menos do que Nossa Senhora ama a todos e cada um dos homens.

De maneira que Ela de tal modo é Mãe de cada um de nós e nos quer tanto a cada um de nós  — por desvalido que seja, por desencaminhado que seja, por espiritualmente trôpego que seja — que quando qualquer homem se volta para Ela, o primeiro movimento d’Ela é um  movimento de amor e de auxílio. Porque Nossa  Senhora nos acompanha antes mesmo de nos voltarmos para Ela. Ela vê nossas necessidades e é por sua intercessão que nós temos a graça de nos voltarmos para Ela. Deus nos dá a graça de nos voltarmos para Ela, nós nos voltamos e a primeira pergunta d’Ela é: “Meu filho, o que queres?”

Mas nós temos dificuldade em ter isto sempre em vista. Por quê? Porque nós não vemos, e, na  nossa miséria, muitas vezes somos daqueles que não creem porque não vêem. Nós esquecemos. Não duvidamos, mas esquecemos, nos sentimos tão deslocados que dizemos: “Mas será mesmo? Depois, aconteceu-me isto, aconteceu-me aquilo, aconteceu-me aquilo outro, eu pedi a Ela e não fui atendido: por que vou crer que agora serei socorrido? Mãe de Misericórdia… para mim, às vezes sim, mas às vezes não… Nesta próxima provação, por que confiar que serei socorrido, ó Mãe de Misericórdia?!”

É nessas horas, mais do que nunca, que devemos dizer: “Auxilium Christianorum, ora pro  nobis!” Nas horas em que nós não compreendemos, não temos noção do que vai acontecer, nós devemos repetir com insistência: “Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum!”

Porque para todo caso há uma saída. Nós às vezes não vemos a saída que Nossa Senhora dará  ao caso, mas Ela já está dando uma saída monumental.

A esse título, portanto, muito especial, nós devemos repetir sempre: “Auxilium Christianorum!” Nossa insuficiência proclama a vitória d’Ela, canta a glória d’Ela. Por isso, esta prece deve estar nos nossos lábios em todos os momentos: “Auxilium Christianorum, ora pro nobis! Auxilium Christianorum, ora pro nobis!”

Meus caros, rezemos, portanto, “Auxilium Christianorum! Auxilum Christianorum! Auxilium  Christianorum!” em todas as circunstâncias de nossa vida, e nossa vida acabará tal que, na hora de morrer, quando nós estivermos no último alento e ainda dissermos “Auxilium Christianorum”, daí a pouco o Céu se abrirá para nós.

Jesus vivendo em Maria

Nossa Senhora deseja conceder–nos muito mais do que pedimos e até o que não sabemos pedir. Mas é preciso rogar a Ela com a intimidade e a certeza de sermos atendidos como se fôssemos uma criança de colo.

 

Comemora-se em Blois, na França, a festa de Nossa Senhora das Ajudas, a respeito da qual há a seguinte nota aqui consignada:

Cidade onde a heresia jamais penetrou

A devoção à Santíssima  Virgem da cidade de Blois, onde a heresia jamais penetrou, é grande e sincera. É importante que a heresia jamais tenha penetrado lá, porque houve C um período de calvinismo agudo na França  em que mais ou menos em todas as cidades, no século XVI, o protestantismo penetrou em quantidade maior ou menor. Que Blois tenha ficado isenta dessa lepra é uma coisa excelente e digna de  nota, e se relaciona adequadamente com a grande devoção que essa cidade sempre teve para com Nossa Senhora.

Seus habitantes, reconhecidos a tão magnânima Senhora, deram-Lhe o título de Nossa Senhora das Ajudas, pela proteção constante da Virgem que se faz sentir, não só nos tempos das heresias e  pestes, mas também em outras circunstâncias trágicas.

Portanto, a cidade sempre reconheceu ser especialmente protegida pela Santíssima Virgem. Assim constituiu- se a invocação de Nossa Senhora das Ajudas.

Em 1784, as águas do Loire que banham Blois ameaçavam submergir a cidade. O povo, unido, recorreu à sua intercessora e, durante a Missa, no momento da elevação, as águas começaram
a descer rapidamente, até o rio voltar ao seu leito normal.

Ora, uma inundação decorre de causas complexas que atuam com certo vagar. De maneira que é difícil que a água desça tão rapidamente. Temos, pois, a conjunção de dois fatores: de um lado,  Maria Santíssima protegendo nas necessidades materiais, e de outro, tomando essa proteção como um meio para encaminhar as almas à ideia de que Ela ampara também nas necessidades espirituais. Este é o auxílio de Nossa Senhora, o qual se manifesta aqui especialmente no dom inestimável da ortodoxia concedido a essa cidade preservada de modo insigne.

Maria Santíssima nos socorre nas angústias, tribulações e perigos

Relaciona-se com isso o seguinte pensamento de Santo Ildefonso: Ó Virgem Maria, sois clemente em nossas necessidades, doce  em nossas tribulações, boa em nossas angústias, pronta a nos socorrer em nossos perigos. Esta frase está muito bem calculada, porque em relação às necessidades é preciso ter pena, de onde vem exatamente a clemência, pela qual uma pessoa é tocada pelo infortúnio e apuro que outrem está passando.

Então, torna-se generosa. Nas tribulações, a pessoa quer doçura, encontrar um amparo, um apoio, uma palavra amiga. Eis porque, por exemplo, Nosso Senhor quis que seus Apóstolos estivessem  acordados e vigiassem no Monte das Oliveiras. Ele desejava o apoio, a doçura da amizade na tribulação na qual estava.

Assim, nas angústias Nossa Senhora é bondosa porque nos socorre nas tribulações e perigos. Há em São Paulo uma capelinha com um lindo título: Nossa Senhora dos Aflitos. É a Virgem Maria  invocada enquanto tendo pena, sendo clemente e misericordiosa para aqueles que se encontram em toda espécie de aflições. Quando se trata de uma aflição que Nossa Senhora pode remover sem  diminuir com isso o benefício espiritual da pessoa, Ela remove. Sendo uma aflição que, na sua sabedoria, Maria Santíssima julga necessária para essa mesma finalidade, Ela arranja um jeito de a  pessoa ter mais força, de sentir a doçura d’Ela, de poder resistir melhor àquela aflição. Esta é a ideia que vem externada nesta e em tantas outras devoções à Mãe de Deus.

Um ícone bizantino muito significativo

Mais especialmente esta ideia se exprime no culto a Nossa Senhora Auxiliadora. Para compreendermos cada vez melhor esta devoção, seria interessante fazer aqui o comentário de uma oração  composta pelo famoso Padre Condren, varão de alta espiritualidade da França, completada por Monsenhor Olier e enriquecida por Pio IX, em 1853, com trezentos dias de indulgência.

Esta oração foi objeto de um comentário especial do venerável Padre Libermann, e também Dom Chautard tem alguns trechos em que ele a comenta lindamente, em função de um ícone bizantino  que representa Nossa Senhora com um olhar recolhido em oração, onde se vê que Ela está contemplando ideias, conceitos, voltada para o mundo do espiritual e do imponderável, e não para as coisas contingentes que A cercam.

Ela está de mãos abertas, que era a atitude de quem rezava na antiga liturgia bizantina, e sobre o seu peito aparece um círculo, dentro do qual se encontra Jesus com o halo de santidade na cabeça,  representado ainda como muito mocinho, quase um meninote, tendo um rolo de pergaminho na mão esquerda e a direita em atitude de quem está lecionando. É uma alusão à Encarnação do  Verbo. Tendo em Si o Menino Jesus que, enquanto vivendo n’Ela é um Mestre, Nossa Senhora Se recolhe para ouvir os ensinamentos d’Ele em seu interior.

Por outro lado, a atitude contemplativa da Santíssima Virgem é um ensinamento que Ela dá aos outros. De modo que aqui a mediação se exerce magnificamente. O Menino Jesus ensina a Nossa  Senhora e, através d’Ela, instrui os de fora. O recolhimento d’Ela é docente. Este ícone representa precisamente o princípio de que, se temos vida interior e Jesus Cristo vive em nós pela piedade,  pela vida sobrenatural, pela moral, pelo desejo de nos santificarmos, pela fidelidade à ortodoxia – que é um imperativo do primeiro Mandamento: amar a Deus sobre todas as coisas –, quando isto  acontece, então Nosso Senhor Se serve de nós como de uma tribuna, um púlpito ou uma cátedra, e através de uma osmose que se nota em nossas palavras e em todo o nosso ser, Ele ensina aos  outros.

Jesus e Maria vivendo em outros

Eu estava lendo uma biografia de São Francisco de Sales, na qual o autor fazia observar que o Santo escreveu alguns livros excelentes, como a “Introdução à Vida Devota”, e outro muito bom, sem  ser tão célebre, que é o “Tratado do Amor de Deus”. Pelas notas de sermões dele, verifica-se que eram exposições de pontos perfeitamente comuns da Doutrina Católica. Entretanto, as pessoas não  e saciavam de ouvir.

Um calvinista daqueles mais horrorosos foi ouvir o que ele dizia, e depois o interpelou, dizendo: — Ouvi o que o senhor disse. Quer que eu lhe diga francamente? Não compreendo sua fama. Não  entendo, sobretudo, porque essas senhoras procuram tanto pelo senhor. Analisando suas palavras, afinal de contas, escrevendo, muitos já disseram o que o senhor afirma. O que há, portanto, de  novo no que o senhor diz? Pois bem. O que havia era Jesus e Maria vivendo em São Francisco de Sales. Existia tal unção, tal vida interior, tal osmose da graça naquilo que ele dizia, que Deus falava  através dele e dava uma fecundidade extraordinária. De onde vinha a fecundidade?

Exatamente deste fato: a presença de Jesus e Maria em alguém, passando por osmose para outrem. São João Batista Maria Vianney era exatamente assim. Dom Chautard conta que uma vez um advogado de Paris foi ver o Cura de Ars e, voltando para a sua cidade, alguém lhe perguntou:

— O que você viu em Ars?

Ele respondeu:
— É muito simples. Eu vi Deus num homem.

Aqui está a ideia da “inabitação” que não é física, evidentemente, não tem relação nem sequer com a presença real, mas é receber a graça e irradiá-la. A graça vem exatamente desta “inabitação” de Deus que Nossa Senhora teve com presença física, real e sobrenatural, em todos os graus e modos possíveis.

Devemos ser leões que rugem contra o mal

A este propósito, pediram-me para comentar a seguinte oração, e depois falarei de Nossa Senhora como Auxílio dos Cristãos, em função disso.

Ó Jesus, que viveis em Maria, vinde e vivei em vossos servos: no espírito de vossa santidade, na plenitude de vossas forças, na perfeição de vossas vias, na verdade de vossas virtudes, na comunhão de vossos mistérios. Dominai sobre toda potestade inimiga em vosso espírito, para a glória do Padre. Amém.

Jesus viveu em Maria e, por Maria, Ele se comunica aos homens. Nossa Senhora é o sacrário, o santuário de dentro do qual todas as graças se difundem para os homens. Ela é o templo do Espírito  Santo, o tabernáculo onde está Nosso Senhor, e por causa disso devemos pedir a Jesus, enquanto vivente em Maria, pois é de dentro deste Templo que Ele quer receber nossas orações.

Pedir o quê? Que Ele viva em nós. Ou seja, que tenhamos o espírito de Nosso Senhor Jesus Cristo, um espírito todo ele santo, que é o espírito da Santa Igreja Católica Apostólica Romana. 

Portanto, o espírito contrarrevolucionário, expressão mais característica e radical do espírito da Santa Igreja.

Além disso, roguemos a plenitude das forças de Nossa Senhora. Maria Santíssima é a Virgem forte, combativa, intransigente e absolutamente inflexível diante do demônio, do mundo e da carne. 

Devemos pedir essa força, que é intransigência, vigilância e iniciativa dentro da combatividade. Contra o quê? Primeiro, contra o que há de mal dentro de nós. Em segundo lugar, contra o mal que  está fora. De maneira tal que sejamos leões rugindo contra o mal, como exatamente Nosso Senhor Jesus Cristo foi o Leão de Judá, e como sua Mãe Santíssima, de Quem se diz que, sozinha, esmagou todas as heresias do mundo inteiro.

Seguir de modo perfeito as vias de nossa vocação

Depois, pedir a perfeição das vias de Jesus. Nosso Senhor é quem traça a via para cada um. E para nós indicou a via de nossa vocação. Muitos não sabem qual é a sua vocação e rolam pela vida  como seixos do fundo de um rio. Nós, graças a Deus, sabemos qual é a nossa . A via para nós está clara. Devemos pedir a graça de segui-la de um modo perfeito, “na verdade de vossas virtudes”,  portanto, não uma virtude fofa, balofa, inconsistente, mas autêntica, verdadeira e sincera. Esta é a vida de Jesus que se comunica a nós.

Agora vem o pedido de uma ação contra nosso adversário: Dominai sobre toda potestade inimiga… Dominai o demônio, as forças do mundo que tentam arrastar-nos para o mal. Nós pedimos para  nosso bem, é evidente, mas para a maior glória de Deus, pois queremos isto por amor a Ele.

Mais do que o êxito do apostolado, precisamos querer nossa santificação

Que relação tem esse comentário com a festa de Nossa Senhora Auxiliadora? O maior dos auxílios que Maria Santíssima pode nos dar é exatamente o de nos comunicar este espírito de santidade,  esta força, esta perfeição de via, esta autenticidade de virtudes, esta comunhão de mistérios, esta vitória contra o demônio; e comunicar-nos tudo isso para nossa santificação.

Acima de tudo, mais até do que o êxito do apostolado, queremos que cada um de nós se santifique. E para esta santificação, o auxílio de Nossa Senhora se opera por essa forma.

O pensamento “Jesus vivendo em Maria” está muito ligado à noção de Nossa Senhora Auxiliadora. Ela apresenta-Se a nós, na imagem, com o Menino Jesus no braço para indicar a relação  materna que Ela tem com seu Divino Filho, aquela relação de intimidade absoluta, de atender as últimas e menores dificuldades de uma criança, com aquele afeto, aquela bondade, que se tem, não para com o grande  e o forte, mas para com o pequenino e o fraco.

Já pensaram o que representava para Nossa Senhora ver uma criança chorar? Perceber que ela tinha frio ou fome, e saber que era Deus infinitamente poderoso, nobre, Criador d’Ela, ali chorando  dentro do berço e pedindo o auxílio d’Ela, querendo ser tratado e adorado por Ela enquanto pequenino?

De tal maneira está entranhada nessa intimidade entre ambos a ideia de que Ele é Filho d’Ela, que Jesus quis receber de Maria um culto meigo, miúdo, acessível, todo feito de carinho, porque na  essência divina há um fundamento para isso.

Como se fôssemos uma criança de colo…

Isto fez da Santíssima Virgem a Mãe de todo o gênero humano. Nossa Senhora, Mãe de Jesus Cristo e de todos os cristãos, é Mãe do Corpo Místico de Cristo. E em relação a cada um de nós, a  posição d’Ela é de querer que sejamos como meninos, como o filho carregado no colo que Lhe pede toda espécie de coisas, e a quem Ela dá muito mais do que pede, até mesmo o que não sabe pedir. Mas a condição é de rezar com aquela intimidade, com a certeza de ser atendido por Ela, como se fôssemos uma criança de colo. É a este título que Maria nos auxilia. É aquela multidão de  auxílios concedida aos pequenos, muito mais do que aos grandes.

Aqui está bem o traço filial da devoção a Nossa Senhora Auxiliadora e que estabelece uma linha de comunicação, de afinidade ou de identidade com a pequena via de Santa Teresinha do Menino   Jesus. É a criança, o pequeno que cultua a Virgem Maria por esta forma, e com quem Ela quer ter relações assim. Debaixo deste ponto de vista se poderia dizer que o Reino dos Céus é dos  meninos, e quem não for pequenino não entra nele.

Na Igreja, as almas mais grandiosas, mais majestosas, mais fortes, mais extraordinárias, sempre que trataram da Santíssima Virgem Maria, falaram nesse diapasão. Mesmo quando disseram as  coisas mais altas sobre Ela, tinham bem em mente ser a Mãe que desejava tratar a cada um deles com aquela bondade, aquela solicitude, aquele sorriso com que se trata um menino. Aqui está um “aperçu” da devoção a Nossa Senhora enquanto Auxiliadora.

 

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 254 (Maio de 2019)

Visita de Nossa Senhora a sua prima Santa Isabel

Ao entoar o seu Magnificat, Nossa Senhora se alegra pelo fato de Deus, tendo considerado a sua pequenez, querer exaltá-La, estabelecendo com Ela uma gloriosa relação. “Engrandeceu-me, e nisto agiu santamente Aquele que é poderoso, pois o me ter feito grande redundará em benefício e obra de misericórdia para todas as gerações, em todas as épocas da História” — é o pensamento que A inspirava.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 27/9/1990)

Invencível esperança na misericórdia de Maria

Evocando o momento em que, pela primeira vez, sentiu-se amparado pela misericórdia de Nossa Senhora, Dr. Plinio nos convida a nutrirmos uma ilimitada e constante confiança na bondade de Maria Santíssima, “em todas as ocasiões, em todas as circunstâncias e de todos os modos”.

 

Como já tive oportunidade de comentar, quando menino, estudando no Colégio São Luís, certa ocasião procedi mal. Eu atravessava, talvez, a pior época de minha vida, e estava descontente comigo mesmo. Ora, aconteceu-me de, por essa época, receber nota 6 em uma disciplina e, inconformado, no boletim escrevi sobre ela um “10”.

Julgava ser objeto de merecido castigo

Ao saber do fato, mamãe — sempre muito afetiva, mas também firme —, por mais que quisesse minha companhia, me disse:

— Se ficar provado que você não merecia a nota que escreveu, inabilmente, com seu próprio punho no boletim, mandarei você para o Caraça.

Tratava-se de um colégio muito bom de Minas Gerais, com regime de internato, mas cuja fama em São Paulo, por razões que ignoro, era a de uma penitenciária de crianças. Naturalmente, a ideia de ir para lá causava-me horror.

Afinal, verificou-se que um funcionário do colégio havia se enganado ao passar as notas no boletim, e que eu havia tirado 10, como constava no livro apropriado. Antes de se comprovar o fato, porém, passei por grande apuro. Como, a propósito de outras questões, eu também havia procedido mal, julguei-me objeto de merecido castigo.

Angustiado olhar para a imagem de Maria Auxiliadora

Sob o peso dessa apreensão, fui assistir à Missa dominical na Igreja do Sagrado Coração de Jesus, grande edifício que, juntamente com o liceu dos salesianos, ocupa um quarteirão inteiro. Por coincidência, realizava-se naquela hora a celebração dedicada aos estudantes do liceu. Só estes enchiam o templo. Formados em fileiras, entoavam cânticos religiosos, e qualquer outra pessoa que estivesse ocupando algum lugar nos bancos devia ceder-lhe a eles. Foi o que aconteceu comigo. Tive de me deslocar para o fundo da igreja e, não encontrando espaço na nave central, fui para a lateral, à direita de quem olha para o altar, fazendo face à imagem de Nossa Senhora Auxiliadora.

Deu-se início à Missa. O contraste entre a situação daqueles meninos cantando, felizes, e meu apuro, era penoso. Em certo momento, olhei para a imagem e pedi a Nossa Senhora que me ajudasse. Pareceu-me, então, que os traços de seu rosto se moviam, e ela sorria para mim, afagava-me, como se dela partisse uma promessa de que tudo se arranjaria. Não se tratava de um milagre, mas de uma impressão.

“Pela primeira vez senti o sabor da Salve Rainha”

Durante esse fato eu rezava a Salve Rainha, prece conhecida por mim, mas que nunca me havia chamado especialmente a atenção. Não sabendo bem o latim, eu a recitava em português. Ora, no idioma latino, “salve” significa uma saudação. Contudo, eu entendia que tal palavra estivesse relacionada com “salvação”. Eu dizia, portanto, “Salve Rainha, Mãe de misericórdia”, no sentido de “Salvai-me Rainha”! Seja como for, naquela hora de aflição senti o sabor dessa oração pela primeira vez na vida.

Lembro-me de que ao dizer “Mãe de misericórdia”, eu pensava: “Mamãe é tão boa, mas eu não diria dela que é mãe de misericórdia. Nossa Senhora, sim, o é. E, por mais que mamãe me queira bem, sei que Nossa Senhora me quer insondavelmente mais. Com Ela, conseguirei safar-me dessa situação”.

Ponto por ponto, uma prece consoladora

Ao dizer: “Vida, doçura e esperança nossa, salve!”, vinha-me à mente: “É isso mesmo! Vida é com Ela, porque nos livra de apuros como este, e de precipícios nos quais nem nossa mãe pode nos escorar. É a doçura d’Ela que nessa apreensão me atende”.

“Esperança… Minha esperança é Nossa Senhora, porque, se Ela não olhar para mim, estou perdido.”

E o pensamento me voltava: “Já que sois assim, salvai-me! pois estou arrasado”.

“A Vós bradamos, os degredados filhos de Eva”. Eu não sabia exatamente o significado de “degredados filhos de Eva”, mas entendia que tal expressão indicava uma situação muito infeliz, como aquela na qual me encontrava. “Estou nessa dificuldade sem saída”, pensava eu. “Esta é a oração para resolver o meu caso”.

“A Vós suspiramos, gemendo e chorando…” Veja! Eu inteiro sou um gemido. “… Nesse vale de lágrimas”. É isso! Estou nadando nas minhas próprias lágrimas.

“Eia, pois, advogada nossa…” Maria Santíssima não vai me julgar. Deus é o Juiz; Ela é minha advogada, que me defende em qualquer situação. Sinto que, se Ela estiver do meu lado, sou atendido.

“Esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei”. Eu olhava para a imagem e tinha a impressão de que sorria para mim. Tranquilizava-me essa ideia: “Ela me acompanha do Céu, com seus olhos de Mãe misericordiosa. Isso vai dar certo!”

“E depois deste desterro, mostrai-nos Jesus, bendito fruto do vosso ventre. Quer dizer, após sair dessa difícil circunstância, no fim da vida verei Jesus. Realmente! Esta oração foi feita para mim”.

A partir daquele momento, minha devoção a Nossa Senhora se tornou mais fervorosa. E com o passar do tempo, pelo favor d’Ela, continuou a crescer.

Nunca deixemos de confiar n’Aquela que é nossa esperança

Baseado nesse meu exemplo pessoal, seja-me permitido ressaltar a necessidade de nutrirmos uma confiança sem limites e constante na bondade de Maria Santíssima, em todas as ocasiões, em todas as circunstâncias e de todos os modos, dizendo a Ela: “Salve Rainha, Mãe de Misericórdia, vida, doçura, esperança nossa, salve!”

Ela é a nossa vida, porque, não fosse sua insondável misericórdia para conosco, estaríamos mortos. É nossa doçura, pois tudo quanto existe de doce em nossa existência nos vem pelo intermédio d’Ela. E a suavidade de Nossa Senhora para com seus filhos, ainda mesmo quando fracos e infiéis, é incomparável. Todas as formas materiais de doçura — a do mel, do açúcar, da brisa, ou a própria doçura dos corações maternos — não são senão pálida imagem dessa doçura das doçuras que vem a ser o Imaculado Coração de Maria, inundado da suavidade infinita de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Maria, vida, doçura, esperança nossa, salve. Esperemos sempre na intercessão d’Ela por nós, na sua misericórdia para conosco, com uma esperança invencível, pois quem possui tal Mãe, que de tal maneira induz os seus filhos a olharem para Ela, nunca pode deixar de esperar no seu maternal auxílio.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências em 6/5/1968 e 21/7/1990)