AS VIRTUDES DE MARIA, remédio para nossa alma

Tesoureira das dádivas do Senhor e Mãe de Misericórdia, Nossa Senhora pode obter para nós a graça da santificação, apesar de todas as nossas carências e debilidades. Ao  comentar uma bela oração escrita por São Luís Grignion de Montfort, dirigida a Maria, Dr. Plinio evidencia uma importante realidade: a devoção à Santíssima Virgem como  meio necessário para a nossa salvação.

Atendendo o filial pedido que me fazem, passo a comentar um trecho da prece composta por São Luís Grignion de Montfort, “Oração a Maria para seus fiéis escravos”:

Ó Maria, minha querida Mãe, (…) dou-me a vós todo inteiro na qualidade de escravo perpétuo, sem nada reservar para mim ou para outrem. Se vedes em mim qualquer coisa que não Vos pertença, eu Vos suplico de tirá-la agora e de Vos tornar Senhora absoluta de tudo o que possuo; de destruir e desarraigar e aniquilar em mim tudo o que desagrada a Deus; de implantar, promover e operar tudo o que Vos agrada. Que a luz de vossa fé dissipe as trevas de meu espírito; que vossa humildade profunda tome o lugar de meu orgulho; que vossa contemplação sublime suste as distrações de minha imaginação vadia; que a vossa vista contínua de Deus encha minha memória de sua presença; que o incêndio de vosso Coração dilate e abrase a tibieza e a frieza do meu; que vossas virtudes substituam meus pecados; que vossos méritos sejam meu ornamento e suplemento perante Deus.

Enfim, mui querida e bem-aventurada Mãe, fazei, se for possível, que não tenha outro espírito senão o vosso para conhecer Jesus Cristo e suas divinas vontades; que não tenha outra alma senão a vossa para louvar e glorificar o Senhor; que não tenha outro coração senão o vosso para amar a Deus com um amor puro e ardente como Vós.

Foco de virtudes que sanam nossos defeitos

Nesse trecho transparece a unção e o fogo dos melhores textos de São Luís Grignion. Ele se apresenta e fala como se fosse uma alma pecadora, contendo em si inúmeros defeitos que deseja corrigir, e cuja solução se apóia no seguinte princípio: Sendo Nossa Senhora, por disposição divina, o receptáculo de todas as virtudes que possam reluzir numa criatura humana, Ela é o canal dessas excelências a serem distribuídas pelo universo. Dessa sorte, cada perfeição de Maria produz como que um efeito medicinal sobre a nossa lacuna moral oposta: sua pureza é dotada de uma capacidade de extinguir nossa impureza; sua humildade, de extirpar nosso orgulho; sua piedade, de erradicar nossa falta de devoção; seu recolhimento, de eliminar nossa dissipação.

Portanto, Nossa Senhora se assemelha a um foco do qual se difundem graças invulgares e dons especiais, próprios a vencerem nossas mazelas. Então, é legítimo dirigirmos uma oração a Ela pedindo-Lhe infunda em nós suas virtudes, para que estas nos transformem.

Como as curas do Divino Mestre no Evangelho

Revela-se-nos aqui o princípio da atuação intensa e sanativa da graça nas almas.

De fato, obedecendo aos desígnios de Deus, a graça pode descer sobre uma alma e num minuto modificá-la por completo, assim como, na expressão da Escritura, uma pedra é capaz de se tornar outro filho de Abraão. Quer dizer, pode tomar a pessoa mais radicada num defeito, mais tíbia, mais entregue a um vício, na situação mais aflitiva e miserável, e num momento livrá-la de todos esses males, desde que peça e seja ouvida por Nossa Senhora.

Assim, desejosa de se corrigir, mas acovardada diante da imensidade de suas imperfeições, contra as quais se verificam vãos todos os seus esforços, ela se volta para Maria Santíssima, rogando o socorro de graças superabundantes e necessárias para a sua conversão.

Daí São Luís Grignion formular essa prece pela qual o homem fraco, tíbio, pecador, em cujo fundo de alma lateja o anseio das mais altas virtudes, pode realmente resolver seu problema e encontrar os meios para galgar a elevada montanha da santidade.

Devemos, pois, pedir a Nossa Senhora uma atuação d’Ela em nosso coração, como eram as de Nosso Senhor no Evangelho ao curar os doentes. Na verdade, cada milagre daqueles significava uma ação divina sobre um organismo que apresentava um defeito, uma disfunção ou algo do gênero, remediando-o num instante. E quando os evangelistas narram tais curas, deixam ver que Nosso Senhor, restabelecendo os corpos, fazia entender que Ele podia sanar as almas, sendo cada uma daquelas debilidades físicas o símbolo de uma carência moral.

O socorro de Nossa Senhora, quando menos se espera

Exemplo magnífico dessa influência do sobrenatural numa alma temos no fato da conversão de São Paulo Apóstolo. Ferrenho perseguidor da Igreja nascente, em determinado momento, na estrada de Damasco, é ofuscado por uma luz, cai ao chão e, recompondo-se, a primeira pergunta que brota de seus lábios é: “Senhor, que quereis que eu faça?”. Quer dizer, ele se pôs inteiramente às ordens da graça para operar de acordo com a vontade dela.

Como este, inúmeros exemplos há na Igreja de pessoas que se convertem e mudam radicalmente, por uma ação fulminante da graça. Ouviram uma palavra, perceberam um gesto, tiveram um pensamento que as tocou e transformou por inteiro.

Então, se confiarmos na oração, se compreendermos a sua necessidade e sua eficácia, temos a possibilidade de obter os frutos espirituais mais inesperados e magníficos. Sobretudo se nos compenetrarmos de que essa prece é dirigida a Deus por meio de Maria, nossa Mãe de misericórdia e nossa vida. Sem Ela não haveria valor, nem doçura nem esperança em nossa existência. Com Ela, nossa vida é plena de vida, nossas doçuras são repletas de doçura e nós, em qualquer situação na qual nos achemos, devemos ter esperanças superabundantes e imensas. Nossa Senhora se compadece de nós e nos atende, pois é nossa Mãe. Em dado momento, nos tomará pelos braços e nos conduzirá à santidade a que somos chamados.

Cumpre considerar, entretanto, que o modo de Nossa Senhora exercer sua bondade para conosco é insondável. Assim, não raro as almas que recebem graças fulminantes são as mais provadas, depois de caminharem de provação em provação até um ponto onde não entendem mais o que se passa com elas, encontrando-se numa espécie de beco-sem-saída da perplexidade e do sofrimento. Nessas horas se dão as ações admiráveis de Maria em nosso favor.

Quantas vezes tenho visto almas nessas encruzilhadas da vida espiritual, tão aflitas e atormentadas que chegam a chorar. Observando-as, sinto o desejo de dizer a cada um: “Meu caro, espere, Nossa Senhora virá quando você menos imagina e vai socorrê-lo”. E com freqüência, no momento em que se tem a impressão de não haver saída para mais nada, a pessoa recebe uma graça magnífica e tudo se resolve pelas mãos de Maria, de um modo mais esplêndido do que jamais se poderia esperar.

Sacrossanta importunidade

É necessário, pois, tomar em consideração essa preciosa verdade: podendo rezar e possuindo uma Mãe como Nossa Senhora, nunca, nunca, nunca se deve ter desespero nem sequer a menor dúvida a respeito do auxílio do Céu. A quem bate, se abrirá; a quem pede, se dará. A nós de sermos insistentes na oração.

Lembremo-nos da célebre parábola do Evangelho, onde um homem se achava deitado na cama com seus filhos e aparece um vizinho importuno a lhe bater à porta, pedindo pão. O que já havia se recolhido não queria atender. Porém, o pedinte tanto insistiu que o pai de família se levantou, abriu a porta e lhe deu o pão. Comentário de Nosso Senhor: “Se esse homem não fosse importuno, não teria sido atendido”.

Portanto, a virtude aconselhável ante essas palavras é a da sacrossanta importunidade. Precisamos fazer violência ao Céu: pedir, pedir, pedir; bater, bater, bater. Seremos ouvidos, por maiores que sejam nossas dificuldades.

Pedir as graças próprias à nossa vocação

E o seremos, de maneira especial, no tocante ao nosso desejo de corresponder à vocação de perfeitos servos de Nossa Senhora.

Nesse sentido, poder-se-ia perguntar se caberia algum pequeno aditamento, repassado de enlevo, veneração e ternura, a essa prece de São Luís Grignion. Parece-me que sim, entendido nos seguintes termos.

Em uma instituição ou movimento católico semelhante ao nosso, o conjunto apresenta mais virtudes do que a soma das qualidades morais de seus membros. Compreende-se, pois ele recebeu uma série de graças que costumam estar em nosso ambiente, pairar em  nosso meio, como patrimônio do grupo. Elas são o tesouro do qual vivemos, e não significam outra coisa senão a própria projeção da misericórdia de Maria Santíssima entre nós, comunicando-nos suas virtudes e nos convidando continuamente a pedir essas graças.

Então, se Nossa Senhora nos chama para pertencer ao movimento, é natural que supliquemos a Ela nos obtenha os dons e dádivas celestiais específicos para o cumprimento dessa missão à qual fomos destinados. Dádivas e dons estes de que seu Coração Imaculado está repleto, aguardando nossa prece feita, como disse, com ternura, veneração e enlevo profundos.

Essa seria, a meu ver, uma forma magnífica de completar essa linda oração de São Luís, de maneira a alcançarmos as graças para sermos conformes a Jesus Cristo e a Nossa Senhora, atingindo o auge da perfeição em fazer a sua sacrossanta vontade enquanto seus filhos e servos amorosos.

Fátima, profetismo e mudança de mentalidade

A devoção a Nossa Senhora de Fátima se desdobra em duas outras invocações: Nossa Senhora do Carmo e Imaculado Coração de Maria. Assim, naquele conjunto de fatos nos quais se inserem as aparições em Fátima, a Santíssima Virgem quer ser venerada também por meio desses dois títulos. Que relação têm eles com o assunto Fátima?

Nossa Senhora do Carmo está relacionada com o Monte Carmelo e, portanto, com o Profeta Elias e toda a família de almas que, passando por São João Batista e chegando  até São Luís Grignion de Montfort, representam o profetismo dentro da Igreja. Isso representa um convite a que tenhamos o espírito profético.

Outro é o significado de Nossa Senhora apresentar-Se sob o título de Imaculado Coração de Maria. O coração simboliza a mentalidade. Essa devoção supõe a renúncia à  nossa mentalidade revolucionária para assumirmos a participação na mentalidade do Imaculado Coração de Maria. Quer dizer, é o esmagamento do orgulho e da  sensualidade que são as duas raízes da Revolução. Sem dúvida, a Virgem Maria brilhou de um modo perfeito em todas as virtudes, mas aquelas que, a justo título, os  pregadores costumam pôr mais em realce são a humildade e a pureza. Isso corresponde, portanto, a assumir uma mentalidade contrarrevolucionária.

Há, pois, um sentido profundo na jaculatória que costumamos rezar: “Cor Sapientiale et Immaculatum Mariæ, opus tuum fac – Ó Coração Sapiencial e Imaculado de Maria,  realizai a vossa obra”.

O Coração Sapiencial de Maria é a mentalidade cheia de sabedoria da Mãe de Deus, oposta à demência revolucionária. Poder-se-ia dizer: “Coração contrarrevolucionário de  Maria”. “Opus tuum fac” significa que a completa mudança da alma para assumir a mentalidade de Nossa Senhora depende de uma iniciativa d’Ela. Corresponde, portanto, a pedir à Rainha dos corações que faça a obra específica de mudar a mentalidade dos homens.

Então, se quisermos ter uma devoção inteiramente refletida, ponderada a Nossa Senhora de Fátima, devemos desenvolver essa reflexão: Nossa Senhora de Fátima  acompanhada com uma impostação de alma rumo ao profetismo representado na Rainha do Carmo, e ao Sapiencial e Imaculado Coração de Maria enquanto Aquela que age nos corações dando às pessoas a verdadeira mentalidade que devem ter.

A realeza de Nossa Senhora, fato incontestável em todas as épocas da Igreja, veio sendo explicitada cada vez mais a partir de São Luís Grignion de Montfort, até aquele 13 de  julho de 1917, quando Maria anunciou em Fátima: “Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará”. É uma vitória conquistada pela Virgem, é o seu calcanhar que outra vez  esmagará a cabeça da serpente, quebrará o domínio do demônio, e Ela, como triunfadora, implantará seu Reino. Portanto, devemos confiar em que Maria já determinou atender as súplicas de seus filhos contrarrevolucionários, e que Ela, Soberana do universo, pode fazer a Contra-Revolução conquistar, num relance, incontável número de almas. Nossa Senhora Rainha haverá de expulsar desta Terra os revolucionários impenitentes, que não querem atender ao seu apelo, de maneira que um dia Ela possa dizer: “Por fim o meu Coração Imaculado triunfou!”

Plinio Corrêa de Oliveira

Auxiliadora até dos mais miseráveis

Minha Mãe, eu, sucumbindo ao peso da tentação, não andei bem.

Pequei. Tenho o receio de me habituar ao pecado e de nele me embrutecer. Por outro lado, imensa é a minha vontade de me regenerar.

Sei que não mereço a vossa proteção, mas, porque sois a auxiliadora de todos os cristãos, não apenas dos bons, porém até dos mais miseráveis, peço-Vos: vinde e auxiliai-me.

Plinio Corrêa de Oliveira (Composta em 24/5/1965)

Onipotência Suplicante

Mediante a Encarnação do Verbo no seio puríssimo de Maria, Deus, por um ato de sua infinita bondade, criou os vínculos que O ataram ao gênero humano e Nossa Senhora, tornando-Se Mãe d’Ele, passou a ser também a Mãe espiritual de todos os homens.

Em vista disto, quando Ela pede a seu Divino Filho por nós, é como uma mãe que intercede junto a um filho em benefício de outro irmão deste. É impossível não atendê-la. 

Por isso os teólogos atribuem a Nossa Senhora o título de Onipotência Suplicante. Em virtude de suas insondáveis perfeições, Ela é sempre ouvida por Deus em suas preces a nosso favor, e d’Ele nos obtém aquilo que, por nós mesmos, não mereceríamos.

Quantos exemplos atestam essa incansável solicitude de Maria para com os homens! Compreende-se, assim, a importância da intercessão de Nossa Senhora, como ela  alivia a nossa penosa existência e enche de júbilo nossas almas. Como seria soturna a vida de um católico se não fosse a proteção da Virgem. Ao contrário, como ela é leve, cheia de esperança, de perdão e de afeto materno, com a contínua assistência de Maria, a Onipotência Suplicante!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 21/9/1991)

Obra-prima da misericórdia divina

Para honrar a Esposa do Espírito Santo e Mãe do Verbo Encarnado, a Santíssima Trindade coroou Nossa Senhora como Rainha do Universo: todos os Anjos e Santos, todos  os homens vivos, todas as almas do Purgatório, assim como todos os réprobos e demônios, devem obedecer à Celeste Soberana. De sorte que Maria, além de medianeira das graças, é igualmente a do poder de Deus. É por intermédio de sua Mãe que Ele executa todas as suas obras e realiza todos os seus desígnios.

Mais ainda. Nossa Senhora não é somente o canal por onde o império divino passa e se manifesta na criação, mas é também a Rainha que decide por uma vontade própria,  consoante os desejos do Rei. Ela é, na verdade, uma obra-prima do que poderíamos chamar a habilidade de Deus de ter misericórdia em relação aos homens.

Oração: Pedindo graças que fazem parte do segredo de Maria

Ó Maria Santíssima, Esposa do Espírito Santo, obtende-me d’Ele a graça necessária para que eu olhe de frente a minha alma, fazendo um exame implacável e verdadeiro de tudo quanto nela se contém. Obtende-me amar o que ali puseste de bom e odiar o que há de mau. De sorte que, expulso dela o mal, triunfe o bem, e comece em mim aquela aurora do Reino de Maria, pelo qual devemos viver, lutar e morrer. E se tal for a minha fraqueza e falta de generosidade que eu não consiga corresponder às vossas graças, dai-me graças ainda maiores, aquelas que fazem parte do vosso segredo e das quais diz São Luís Grignion que o homem, como que, não lhes pode resistir.

Plinio Corrêa de Oliveira (Composta em 25/7/1970)

CLEMÊNCIA INDIZÍVEL

A realeza que Nossa Senhora exerce sobre o gênero humano não é a do juiz, mas a da advogada, isto é, d’Aquela que não tem por missão julgar e punir os pecadores, mas a de os defender.

Por isso tem Ela para conosco toda sorte de predisposições favoráveis, e sempre nos atende com inefável bondade.

Entretanto, a alma moderna, muito atribulada e tratada com terrível dureza pela atual tirania do demônio, encontra certa dificuldade em compreender o verdadeiro sentido da clemência de Nossa Senhora.

Tanto mais quanto uma falsa piedade apresenta esta misericórdia de modo alvar e adocicado, como se ela fosse uma espécie de cumplicidade com o erro. Ora, a ternura e a bondade de Maria não consistem numa vil condescendência para com quem praticou o mal, e sim na materna e invariável disposição de lhe conceder as graças necessárias para abandonar o erro e o pecado.

É nesse sentido que se deve entender a clemência de Nossa Senhora. E enquanto tal, ela é única, suprema e indizível.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Gloriosa Santidade

A Providência concedeu a Nossa Senhora a glória de se encontrar no píncaro da Criação, tendo acima d’Ela apenas o Homem-Deus, seu adorável Filho. Quem recebesse a suprema graça de comtemplá-La, teria, num só golpe de vista, a noção de toda a sabedoria e santidade da Igreja, da beleza de toda a sua liturgia em todas as épocas, do esplendor de todos os Santos, do talento de todos os doutores, do heroísmo de todos os cruzados e de todos os mártires. Porque não há virtude, qualidade e beleza que a Igreja tenha engendrado, e que não brilhe completamente em Nossa Senhora, com fulgor extraordinário.

Por isso, nosso louvor à Santíssima Virgem, além de ser um cântico à grandeza e bondade d’Ela, deve ser um reconhecimento efetivo dessa bondado e dessa grandeza, traduzido em atos concretos: ou seja, na imitação de todas as virtudes e predicados que Ela, numa perfeita correspondência à graça, possuiu e praticou no mais alto grau.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Confiança

“A confiança é uma espécie de fina ponta da esperança. Quando esperamos alguma coisa, temos alegria e a convicção de que algo de bom nos virá. É essa confiança que dá força a nossas almas e as fazem caminhar para a frente.”

Fátima e Nossa Senhora do Carmo

Em Fátima, a Virgem Maria também apareceu com as características de Nossa Senhora do Carmo. Que relação existe entre a mensagem de Fátima e a Ordem do Carmo? Essa questão é abordada por Dr. Plinio, com base no texto de uma revelação recebida por Santa Teresa de Ávila.

 

Gostaria de apresentar alguns traços da revelação de Fátima que a diferenciam de outras revelações anteriores.

Castigo por causa da imoralidade e da irreligião dos povos

Eis um traço muito curioso: é a única revelação que conheço, de tal maneira admitida, aceita e acatada em meios católicos e até pela hierarquia eclesiástica, a qual trata não só de um tema moral — porque isso é frequente em várias revelações —, mas tira derivações desse tema moral para o campo político, numa ilação que tem muito de comum com a doutrina que posteriormente tentamos expor no livro Revolução e Contra-Revolução.

O plano de ideias que Nossa Senhora apresenta para os homens é que há uma crise moral prodigiosa, a qual é, no fundo, uma crise religiosa; e essa crise religiosa e moral vai desembocar numa catástrofe política. Essa catástrofe política que Ela profetiza qual vai ser? A Rússia espalhará seus erros por toda a Terra. É um castigo por causa da imoralidade e da irreligião dos povos. Quer dizer, há um nítido conteúdo político.

Outro aspecto curioso que não encontrei ainda em nenhuma outra revelação — não digo que não houve, pois não pretendo ter conhecido todas —: Nossa Senhora Se mostra em três invocações sucessivas: com as características de Nossa Senhora de Fátima, mas também como o Imaculado Coração de Maria e como Nossa Senhora do Carmo.

Por que essas invocações? Encontramos fundamento para isso na própria revelação. Ela declara o seguinte: “Por fim, o meu Imaculado Coração triunfará.” O que quer dizer que Ela quer ter um triunfo que vai ser uma enorme efusão de graças, porque o coração aí significa a bondade e a vontade, e o triunfo d’Ela vai se realizar depois de um castigo tremendo, por uma efusão de graças enorme. É o Reino do Coração d’Ela que Maria Santíssima anuncia.

Por causa disso, Ela como que referenda a devoção ao Imaculado Coração de Maria, apresentando-Se com essas características numa de suas visões. É para se compreender, para dar um estímulo à devoção ao Imaculado Coração de Maria.

Uma Ordem religiosa nos últimos tempos

Mas por que Ela Se apresenta como Nossa Senhora do Carmo numa das aparições?

Isto é muito menos claro. Que relação tem a invocação do Carmo com os tempos vindouros, em que seu Coração vai triunfar? Há alguma tarefa, alguma missão do Carmo dentro disso?

Essa pergunta nos interessa muito, tomando em consideração que quase todos nós somos terceiros carmelitas1. Há revelações muito impressionantes feitas a Santa Teresa de Jesus, que se encontram nas boas biografias desta Santa carmelita, e que dizem algo a esse respeito. São os parágrafos 12, 13, 14 e 15 das obras de Santa Teresa de Jesus, tomo I, Livro da Vida, capítulo 40. É algo oficial e documentado.

Parágrafo 12:

Fazendo uma vez oração com muito recolhimento, suavidade e paz, parecia-me estar rodeada de Anjos e muito perto de Deus. Comecei a suplicar a Sua Majestade pela Igreja. Foi-me, então, dado a entender o grande proveito que havia de fazer uma Ordem nos últimos tempos, e com que fortaleza seus filhos haviam de sustentar a Fé.

Uma Ordem que, como veremos, parece ser a própria Ordem do Carmo, à qual Santa Teresa pertencia e que por prudência e modéstia ela não queria mencionar. Haveria um tempo em que a Ordem do Carmo teria filhos que lutariam pela ortodoxia com muito denodo.

Parágrafo 13:

Quando certa ocasião rezava junto ao Santíssimo Sacramento, apareceu-me um Santo cuja Ordem esteve um tanto decaída.

Ela era exatamente a reformadora da Ordem do Carmo, que estivera muito decaída.

Tinha nas mãos um grande livro. Abriu-o e deu-me a ler as seguintes palavras escritas em letras grandes e muito inteligíveis: Nos tempos vindouros, florescerá essa Ordem, haverá muitos mártires.

Então, é um incremento de luta pela ortodoxia, martírio e florescimento dessa Ordem.

Religiosos com espadas nas mãos

Parágrafo 14:

Outra vez, durante Matinas, no Coro, vi diante de meus olhos seis ou sete religiosos dessa Ordem, com espadas nas mãos.

Notem que se tratam de espadas, símbolo da luta.

Significava isso, penso, que hão de defender a Fé, porque mais tarde, estando em oração, fui arrebatada em espírito e pareceu-me estar num vasto campo onde lutavam muitos combatentes e os desta Ordem pelejavam com grande fervor; tinham os rostos formosos e muito incendidos. Venciam deitando por terra numerosos inimigos e matando outros. Tive a impressão de que a batalha era contra hereges.

Parágrafo 15:

Ao glorioso Santo de que falei acima, tenho visto várias vezes. Tem me dito diversas coisas, agradecendo a oração que faço por sua Ordem e prometendo encomendar-me ao Senhor. Não assinalo a Ordem para que não se desagradem as demais. O Senhor declarará os nomes, se for servido que se saibam. Cada Ordem, ou cada um de seus membros deveria esforçar-se para que, por seu meio, fizesse o Senhor tão ditosa sua religião que em tão grande necessidade, como agora tem a Igreja, pudesse servir. Felizes as vidas que se sacrificarem por tão nobres causas.

Vemos aqui mencionar uma Ordem, provavelmente a do Carmo, que terá uma grande batalha pela Fé nos tempos futuros. Ora, até esse momento, não chegou essa batalha; a Ordem do Carmo não fez isto até agora.

E Nossa Senhora nos fala, precisamente, de grandes perseguições, de grandes lutas, de grandes martírios na revelação de Fátima.

E ali a Santíssima Virgem Se mostra com as características de Nossa Senhora do Carmo. Parece haver entre tudo isso uma relação para a qual eu chamo a atenção a fim de prezarmos cada vez mais nossa condição de irmãos da Ordem Terceira do Carmo, e compreendermos o que há de providencial nessa pertencença à família carmelitana.  v

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 13/5/1965)

 

1) Dr. Plinio e os mais antigos membros do Movimento por ele fundado pertenciam ao Sodalício Flos Carmeli, da Basílica Nossa Senhora do Carmo, em São Paulo.