Perfeição do espírito da Contra-Revolução

Encarnação do Verbo é a Festa da escravidão a Nossa Senhora e da Contra-Revolução, na qual se celebra o espírito de obediência, o amor à hierarquia, à ordem, à dependência, a tudo quanto a Revolução odeia.

O espírito humilde e contrarrevolucionário de Maria Santíssima se manifesta em face deste mistério, pois quando Ela soube que o Verbo Se encarnaria n’Ela, sua reação não foi de Se vangloriar, mas de proferir esta frase humílima: “Eis a escrava do Senhor, faça-se em Mim segundo a tua palavra”.

Como se dissesse: “Se Deus quer de Mim essa coisa inimaginável, isto é, que Eu mande n’Ele, por obediência a Ele, n’Ele mandarei. Porque Ele é o Senhor, e em tudo farei a sua vontade”.

À luz deste mistério, ganha especial realce a atitude da Santíssima Virgem dizendo-Se escrava de Deus no momento em que Ele queria fazer um ato de escravidão em relação a Ela.

Aí vemos a perfeição do espírito da Contra-Revolução.

Plinio Corrêa de Oliveira – (Extraído de conferência de 16/3/1971)

Revista Dr Plinio (Março de 2016)

Sagrada intimidade com Nossa Senhora e com a Santa Igreja

Encarnação do Verbo, celebrada em 25 de março, é a Festa da Escravidão a Maria Santíssima.

Com efeito, durante o tempo de sua gestação no claustro virginal de Maria, o Verbo Encarnado viveu uma dependência incomparável em relação a Ela. É o maior estado de submissão que se possa imaginar, pois a criança que está no seio materno vive da vida da mãe, e em tudo é conduzida e, por assim dizer, circunscrita por ela.

Como no estado de escravidão voluntária o escravo renuncia completamente à sua liberdade para ficar inteiramente contido e circunscrito pela vontade de seu senhor – de maneira que a sua vida é para o serviço de seu senhor, os seus pensamentos tendem ao seu senhor, os seus atos são para o serviço de seu senhor –, assim também era Nosso Senhor em relação a Nossa Senhora.

Portanto, quem quiser ser verdadeiro escravo de Nossa Senhora deve venerar, de modo muito especial, essa miraculosa e insondável sujeição de Jesus a Maria, em que o infinitamente maior se deixou dominar e conter pelo menor, na realização de um plano de Deus, de uma sabedoria que excede a qualquer cogitação humana.

Por outro lado, se tomarmos a sério a devoção apregoada por São Luís Maria Grignion de Montfort, compreenderemos que a Sagrada Escravidão comporta uma espécie de intimidade com Maria Santíssima por onde cada escravo trata à sua maneira com Ela, e Nossa Senhora aceita benignamente o modo de ser de cada um.

Desta forma, a Sagrada Escravidão à Santíssima Virgem tem um aspecto que poderia chamar-se “a sagrada intimidade com Nossa Senhora”, um sagrado e personalíssimo trato em que Ela é toda inteira como se existisse só para nós.

O mesmo poderíamos dizer a respeito da Igreja Católica. Para cada um dos que nela entram, a Santa Igreja abre um firmamento de beleza particular. Ela tem um jeito de encher até os bordos tanto a alma pequena quanto a grande, sendo para cada fiel como o maná que no paladar espiritual tem um sabor próprio feito completamente para aquele.

Assim, por mais diferentes que sejam os homens, cada católico sempre poderá afirmar: “A Igreja Católica é tal que se fosse feita para mim, ela seria exatamente como é”.(*)

 

Plinio Corrêa de Oliveira
* Excertos de conferências de 15/8/1970 e 16/3/1971.

 

Revista Dr Plinio 228 (Março de 2017)

Suavidade e formosura celestiais

Em um de seus harmoniosos louvores à Santa Mãe de Deus, assim canta a Igreja: “Ó Virgem lindíssima, ó Mãe melíflua”. Celestialmente bela, Nossa Senhora está toda circundada de doçura. Essa conjugação entre a formosura e a suavidade não é fortuita. Há certa forma de beleza majestosa, da qual se desprende de todos os modos a doçura do mel. A formosura de Nossa Senhora não só é extrema, como também apresenta extrema doçura.

Desta emana toda sorte de benevolência e bondade. Maria é, pois, por excelência a Virgem melíflua, cuja suavidade atrai toda alma que d’Ela se aproxima.

Plinio Corrêa de Oliveira

Rainha e Medianeira universal

Correlacionando dois especiais títulos de Nossa Senhora, Dr. Plinio discorre com grande profundidade sobre alguns pontos  da doutrina mariológica, tirando dela conclusões para os dias atuais, bem como princípios para a vida de piedade.

 

Dentre os diversos títulos de Nossa Senhora estão dois que me parecem ser de especial importância, sobre os quais gostaria de fazer alguns comentários: Nossa Senhora Rainha e Maria Medianeira de todas as Graças(1). Procurarei analisá-los juntos, pois, como se verá, ambos têm uma íntima relação.

Medianeira necessária, por livre vontade Deus

Pelo título de Medianeira de todas as Graças reconhece-se ser Nossa Senhora o canal das graças distribuídas por Deus, bem como o fato de ser através d’Ela que todas as súplicas sobem a Deus. Antes de tudo, é importante frisar que Ela não é um canal necessário em sentido absoluto. Ou seja, absolutamente falando, Deus não precisa ter Nossa Senhora como medianeira.

Nosso Senhor Jesus Cristo é o único Mediador necessário e absoluto, entre os homens e Deus. Tendo Se encarnado, Ele Se fez Homem, tornando-Se o elo indispensável entre a humanidade e a divindade.

Ora, se a ordem das coisas determina que todas as graças dispensadas aos homens devem vir através de Deus Filho, a vontade de Deus dispôs que essas mesmas graças deveriam passar por Maria, sua criatura eleita. Então, Nossa Senhora é Medianeira por livre vontade de Deus.

Rainha porque medianeira

Do fato de Nossa Senhora ser Medianeira provém seu título de Rainha.

Deus, sendo Rei do universo, ao constituir Maria como Medianeira de todas as Graças e de todas as súplicas, outorgou-lhe o poder de governar. De tal modo que os desígnios e o governo de Deus sobre o universo podem ser alterados pelos pedidos e orações d’Ela. Ou seja, o reinado de Maria se torna efetivo através de sua Mediação Universal.

A mais excelsa dentre das criaturas

Nisso se vê o papel incomparável de Nossa Senhora no conjunto da Criação. Das meras criaturas Nossa Senhora é a mais alta, pois tudo o que existe, exceto Deus, está abaixo d’Ela.

Por sua vez, do fato de Nossa Senhora ser Rainha do Universo, decorre que Ela é também Rainha do gênero humano, uma vez que o gênero humano é, dentro do universo sensível, a realidade mais alta. Ora, sendo a alma do homem aquilo que ele tem de mais elevado, a realeza de Maria se exerce especialmente nas almas. Pois, a realeza sempre se exerce mais plenamente no que há de mais nobre num reino.

Por isso, bem caberia a Nossa Senhora o título de Rainha das Almas, ou então, o de Rainha dos Corações — o qual é especialmente considerado por São Luís Grignion de Montfort — e que equivale a dizer Rainha das Vontades.

Estes títulos de Nossa Senhora afirmam, em primeiro lugar, seu direito de possuir, de ser conhecida, amada e obedecida por todos os homens; em segundo lugar, seu poder de fazer valer tais direitos, de maneira a poder recompensar os que o reconhecem e punir os que o negam.

Assim, a direção das almas depende essencialmente de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas também de Nossa Senhora, por vontade de Deus.

Uma Rainha destronada?

Alguém poderia pensar o seguinte: No mundo de hoje, Nossa Senhora está como uma rainha exilada, ou como uma ex-rainha; completamente rejeitada pelos homens, Ela tornou-se uma Rainha destronada.

Este modo de pensar é um grande equívoco, pois Maria Santíssima é indestronável, e quando Ela aparenta ter sido destronada, no fundo, trata-se de uma punição. Portanto, até nessa circunstância Ela está reinando.

Explico-me: Nossa Senhora obtém de Deus graças suficientes(2) em abundância para que as almas se salvem. Mas, a essas graças as almas têm possibilidade de rejeitar.

Porém, Nossa Senhora pode também obter-nos graças eficazes(3) — as quais não se podem recusar —, e assim fixar as almas na virtude.

Um clássico exemplo disso é o de São Paulo ao ser derrubado do cavalo, na via de Damasco. Ele foi objeto de uma ação de fulminante graça, que é a graça própria à conversão, a qual os teólogos afirmam ser irresistível.

Isso, em última análise, equivale a dizer que se Nossa Senhora quiser Se fazer obedecer por todos os homens, Ela o poderia. E se não o faz é porque está agindo por desígnios superiores, em plena harmonia com os desígnios de Deus.

Ora, o fato de Ela não obter essa graça irresistível para os homens constitui da parte d’Ela uma punição, que no fundo é o exercício efetivo de seu poder de Rainha. Daí decorre que ainda quando os homens A abandonam, Ela não deixa de ser Rainha.

O “Segredo de Maria”

Portanto, ainda que por vezes não o faça, Ela pode determinar que os homens não A abandonem. Essa graça especialíssima, que age por cima da vontade humana, fazendo a alma progredir e se converter, é o que São Luís Grignion de Montfort chama de “Segredo de Maria”. Pela ação de tal graça a pessoa não deixa de ser inteiramente livre, mas, sendo tão prodigamente iluminada e auxiliada, torna-se incapaz de escolher o erro e o pecado. Pois a verdadeira liberdade é a possibilidade de escolher o bem; pelo contrário, a possibilidade de escolher o mal se chama libertinagem. Quando Nossa Senhora, por razões misteriosas, obtém para alguém esta graça que trabalha a alma, transformando-a e fazendo-a florescer, dá-se com ela algo análogo ao que se deu com a água que, por sua intervenção, transmutou-se em vinho nas bodas de Caná.

Nossa Senhora intercede junto a Nosso Senhor, o Qual, impossibilitado de recusar um pedido de sua Mãe, pronuncia sobre nossas almas uma palavra que as transforma no mais saboroso dos vinhos.

Tais são as extraordinárias graças que podemos receber de Deus se o pedirmos por intermédio de Maria.

Simbolizar materialmente realidades espirituais

Há um modo de manifestar os desejos a Nossa Senhora que muito especialmente me atrai, mas que infelizmente tem se tornado cada vez mais raro. Ele me agrada, sobretudo, por atender a uma necessidade natural do homem, o qual, por ser composto de corpo e alma, tende a procurar expressar através de formas sensíveis e materiais os movimentos de seu espírito. Normalmente isto se realiza através de gestos do corpo, mas pode também ser praticado de outras formas.

Uma delas encontramos no costume de acender velas aos pés de uma imagem. Elas ardem até consumirem-se por inteiro em louvor a Nossa Senhora, simbolizando assim a pessoa que durante toda a sua vida se imola para louvar Maria Santíssima.

A vela quando acesa com este intuito torna-se um símbolo material da oração. O mesmo pode-se dizer a respeito da lamparina junto ao Santíssimo Sacramento, e do incenso, bem como de muitas outras coisas.

Lembro-me, por exemplo, de um ato de piedade que eu vi por primeira vez no Colégio São Luís, quando eu ainda era muito menino: em determinadas ocasiões, geralmente numa festa mariana, as pessoas escreviam num bilhete um ou mais pedidos, os quais eram depois reunidos e queimados de modo que a fumaça que deles se desprendia simbolizava as preces que sobem aos Céus, chegando a Nossa Senhora.

Isso, evidentemente, é um mero símbolo, pois não há de se imaginar que a fumaça em sua materialidade suba realmente até o trono de Nossa Senhora; porém, tal gesto representa de modo palpável algo de imaterial que são os desejos que temos na alma. Deste modo, de certa forma, contribui para tornar mais plena a nossa oração.

Por outro lado, isso certamente ajuda a que a oração seja mais bem recebida por Nossa Senhora, pois, apesar de simbólica, tal prática tem um valor efetivo.

O efetivo valor de um símbolo

Este valor é análogo ao da oração de uma pessoa que, contrita aos pés de um Crucifixo, chorasse seus pecados e com suas lágrimas umedecesse os pés do Crucificado. Evidentemente, o pranto vertido sobre a imagem não molha os pés de Nosso Senhor no Céu; entretanto, pelo fato de as lágrimas molharem os pés da imagem de Cristo, de certa forma, se torna efetivo o gesto de banhar com lágrimas os pés adoráveis de Nosso Senhor.

Da mesma forma, o ato de apresentar os pedidos a Maria Santíssima escritos num bilhete para ser queimado e oferecido a Ela, quando feitos com espírito de piedade, tem realmente muita profundidade e por isso mereceria ser perpetuado.

Muitas são as formas que temos para oferecer nossos pedidos a Maria. Seja qual for a que adotamos, o essencial é recorrermos sempre a Nossa Senhora Medianeira Universal, pedindo que Ela nos alcance de Deus a especialíssima graça de termos nossa alma inteira, irresistível e misteriosamente transformada, tal como a água nas bodas de Caná, para assim sermos verdadeiros súditos da Rainha do Universo e inteiramente conformes aos seus sapienciais desígnios.

 

(Extraído de conferência
de 31/5/1971)

1) Sobre a Mediação de Nossa Senhora, conferir a Encíclica Redemptoris Mater (38-41).
2) Graça suficiente: Graça atual que age unida ao esforço de quem a recebe. (Cfr. Pe. Garrigou-Lagrange, Les Trois Ages, pp. 116-121.)
3) Graça eficaz: Graça atual que, passando por cima das insuficiências da natureza humana, produz o ato sobrenatural em vista do qual foi concedida. (Idem)

A Eucaristia, eixo da piedade católica

Quão sensível era Dr. Plinio à ideia de um universo aberto, no qual a Igreja Triunfante e a Penitente se unem à Militante! Entusiasmava-o considerar a ação da graça divina, dispensada a rogos de Maria em favor de todos, e impetrada pelos méritos infinitos do Santo Sacrifício de Jesus, renovado nos altares do mundo inteiro.

 

Vós falastes sobre a tríplice devoção ao Santíssimo Sacramento, a Nossa Senhora e ao Papa. Monsenhor Segur, prelado francês do século XIX, chamava essas três devoções de “rosas dos bem-aventurados”. Podemos dizer que são as três rosas dos contrarrevolucionários. Vós pedistes que se destacasse, na exposição de hoje, a parte referente à Sagrada Eucaristia. Este é um dos temas a respeito do qual mais gosto de tratar.

Embora todos compreendam uma mesma verdade objetiva, cada um deita a tônica da atenção num determinado ponto

Uma vez que me pediram para tratar da devoção ao Santíssimo Sacramento enquanto vivida por mim, eu gostaria de começar por ressaltar o seguinte:
Todo ato de piedade tem a sua justificação teológica; se não deitar raiz na Doutrina Católica de nada vale. Mas não basta ter fundamento na Doutrina Católica, porque nossas almas não são como páginas em branco de um livro, nas quais se pode escrever livremente. São almas vivas, que recebem as coisas e vivem em relação a estas. Todas as pessoas compreendem uma mesma verdade objetiva, mas cada uma deita a tônica da atenção num determinado ponto, de modo diferente das demais pessoas.

E um dos encantos do convívio humano consiste nisto: comunicar o que, entretanto, não se pode dizer. Vendo o outro que está ao nosso lado, percebemos que ele notou alguma coisa que não chamou tanto a nossa atenção; houve uma repercussão na alma dele, diferente da nossa; não sabemos exprimir, mas algo nós sentimos.

Uma das coisas que tornam a companhia de uma pessoa mais agradável ocorre quando, por exemplo, visitando um museu, apreciando uma cena humana, considerando um panorama, essa pessoa deixa entrever o que cogita, mas não diz.

Embora pouco se fale sobre esse assunto, isto se aplica às verdades da Fé.

A ação de Nossa Senhora se adapta a cada alma

Quando conhecemos uma verdade da Fé, sentimos em nossa alma uma repercussão que, embora não consigamos exprimir, é o melhor do que degustamos.

Por exemplo, analisemos o modo de nossas almas reagirem diante da imagem de Nossa Senhora que se encontra neste auditório(1). É impossível olhá-la sem sorrir; é impossível olhá-la sem que uma forma de otimismo da Fé sopre em nossa alma.

A ação de Nossa Senhora sobre cada alma se adapta de acordo com seu caráter único, de tal modo que é irrepetível. E na história de todas as graças concedidas por Maria Santíssima — no Céu isso se verá —, há incontáveis reações possíveis à vista dessa pequena imagem, indicando as inúmeras modalidades de Nossa Senhora ser graciosa.

Todos aqui estão prestando atenção na reunião, mas, às vezes, pelo movimento natural da cabeça, do corpo, dos olhos, olham para a imagem. E notam que ela reluz em sorrisos, como as pedrazinhas da imagem reluzem também. Conforme o lugar em que a pessoa está sentada, pequenas pedras se acendem em cor verde, vermelha, ou azul. A pessoa, então, se contenta e diz: “Oh! Nossa Senhora!”

É um carinho único que Ela tem para cada um de nós. Porque cada um é o filho único de Maria Santíssima. Ela é tão completa e tão perfeita como Mãe, que, a bem dizer, é como uma pessoa para cada filho. Nossa Senhora é Mãe do Unigênito, do Filho por excelência, e São Luís Grignion de Montfort gosta muito de considerar uma frase da Escritura: “Homo et homo natus est in Ea”(2). Ou seja, uma sucessão indefinida de homens nascerão d’Ela; gerando a Nosso Senhor Jesus Cristo, a Santíssima Virgem gerou para a vida espiritual todos os homens.

No Céu, isso poderá ser visto, e creio que quase se poderia fazer uma invocação especial de Nossa Senhora, ou até muitas invocações, para cada ser. Penso até que todos os seres no Paraíso cantam as invocações da Santíssima Virgem que lhe são próprias, as quais são as invocações da Igreja, mas com acento próprio de cada ser, e esse conjunto forma a harmonia dos coros celestes.

O assunto está preparado — dessa vez a preparação foi longa — para tratarmos da Sagrada Eucaristia.

O ato de piedade máximo — a recepção da Comunhão — deve repercutir, especialmente, em nossa alma

Se isto é assim com todos os atos da piedade católica, claro está que o será com o ato de piedade máximo: a participação da Santa Missa e a recepção da Comunhão.

A Missa é a renovação incruenta do Santo Sacrifício do Calvário, em que Nosso Senhor Jesus Cristo Se ofereceu como vítima expiatória por todos os homens; Ele, o Homem-Deus, Inocente, na sua natureza humana passou pelo castigo que Adão nos mereceu, e resgatou todos os homens.

No momento em que o sacerdote pronuncia as palavras da Consagração, a hóstia é consagrada, transubstanciando-se no Corpo, Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo. Da renovação deste sacrifício do Divino Redentor resulta esse dom inapreciável: a visita d’Ele às nossas almas.

O inefável da Sagrada Eucaristia sentido pela alma católica

Se Ele estivesse sensivelmente presente — realmente presente está —, e eu pudesse ver, por exemplo, um pequeno movimento de sua mão divina, e observar seu pulso, considerando que ali pulsa o Sagrado Coração de Jesus, uma vez que a pulsação do Coração se reflete nessas veias! Dessas pulsações divinas vive tudo quanto tem vida na ordem espiritual das coisas. Que respeito!

Se eu conseguisse, além disso, apalpar a orla de seu manto como aquela mulher que ficou curada ao tocá-la(3)! E se pudesse com esse ato atingir, num só momento, o grau de santidade que quereria obter, não era natural que eu rejubilasse inteiramente?

Recordo-me das palavras de um salmo e que acho uma beleza: “…se regozijarão os meus ossos humilhados”(4). Um indivíduo está reduzido a ossos, a uma caveira; pode ele estar numa situação mais baixa? Mas é dita uma palavra por Nosso Senhor e a caveira se refaz, ressuscita de júbilo!

As palavras d’Ele são de vida eterna. Ouvir uma palavra de Jesus! Ele está na Hóstia; eu não O vejo, mas creio.

Chega a hora de eu comungar, e Nosso Senhor vai estar realmente em mim.

Será que Ele não vai me dizer nada?

Sim, no interior de nossas almas, Ele dirá:
— Meu filho, quando dois estão juntos, um sente o outro. Será que quando Eu estou em ti não sentes nada? Ouve a linguagem silenciosa de minha presença, que não te fala aos ouvidos.

Às vezes, o silêncio diz de uma pessoa o que a expressão da fisionomia, as maneiras ou modo de ser, ou a palavra, não chegam a exprimir.

“Meu filho, tu sabes disso? Presta atenção em Mim! Eu estou em ti, a graça te fala. Tu não sentes nada?”

Assim é o inefável da Sagrada Eucaristia que a alma católica sente.

Posso dizer o que sinto.

É algo que comunica luz, amor, força. E permanece em nossa alma, embora para muitos pareça ser passageiro.

Então, pela Sagrada Comunhão, para os assuntos da Fé a inteligência fica mais perspicaz; quanto ao amor, torna-se mais aberto para tudo quanto é virtude; em relação à força fica-se mais pronto para tudo quanto é sacrifício, e a vontade de lutar se multiplica por si mesma.

Como uma Missa celebrada na Terra repercutirá no Céu?

Essa é uma hora de grande solenidade, para a qual devemos impostar a alma numa posição de veneração, gravidade e seriedade.

Eu não posso deixar de pensar, quando vai se aproximando a hora da Consagração, no que estará se passando de soleníssimo, festivo, vitorioso e grandioso no Céu neste momento. Que alegria e glória para Deus! Ainda que o Céu e a Terra tivessem sido criados para que houvesse uma só Missa, estava tudo justificado.

Ao se iniciar uma Missa, não estarão os Anjos — empregando uma linguagem antropomórfica — solenemente se preparando? Eu imagino que, nesse momento, o Céu deva estar como uma corte quando vai se realizar um ato mais grave e mais augusto do que a coroação de um rei.

Pouco depois do tilintar das campainhas, termina a Consagração, o Céu reluzirá de glórias.

A Santa Missa causa terror nos demônios!

Falei da comunicação das almas entre si na Terra. E também a respeito da comunicação mais perfeita das almas no Céu, bem como da visão beatífica. Entretanto, essas considerações ficariam incompletas se eu não acrescentasse o seguinte: embora, de certo modo, toda a Criação tenha sido considerada sumariamente, falta algo: o inferno.

Quando a Consagração se aproxima, eu imagino que o inferno fique aterrorizado, ele deve rugir de ódio e gostaria de fazer explodir o mundo para evitar que se celebrasse uma Missa. Ele sabe a derrota renovada que sofrerá.

A celebração eucarística relembra para Satanás o momento de sua derrota

A derrota dele se deu no momento em que Nosso Senhor Jesus Cristo morreu e o gênero humano foi resgatado. Houve um sabá horrível lá embaixo, em que todos se agatanharam e se atormentaram em termos indizíveis.

A Missa é a renovação incruenta do Santo Sacrifício. E todas essas vergonhas para o demônio se acumulam.

A Alma santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo, não abandonando jamais a união hipostática, foi ao limbo — com alegria prodigiosa de todos os justos, a começar por Adão e a coroar-se por São José — e levou todos para o Céu.

Podemos imaginar Jesus que, chegando ao limbo, falou para todos sobre a Redenção. Adão e Eva, que estavam esperando a milhares de anos… Santo Adão, Santa Eva aguardavam o momento em que aclamariam o Filho deles. Eles, pecadores, aclamando o Filho Redentor.

A Missa é a renovação incruenta do Santo Sacrifício. E todas essas vergonhas para o demônio se acumulam.

Quando a pessoa comunga, o demônio recua

Quando estivermos no Céu, talvez tenhamos algum conhecimento — que não nos molestará em nada — dos rugidos do inferno, e veremos o negrume hediondo, horrível, do mal; e então cantaremos com redobrado vigor porque estaremos esmagando os demônios.

O maligno faz tantas infiltrações nas almas, e as remexe sadicamente, porcamente, criminosamente. Quando a pessoa comunga, cresce nela essa luz do senso católico, essa força, esse amor; o demônio recua e fica torturado.

Ao se aproximar o momento de receber a Sagrada Eucaristia, podemos dizer contra o demônio: “Recuarás agora, bandido! Eu vou comungar!” De recuo em recuo, depois das expulsões provisórias chegará à expulsão total.

Aí estão as considerações que povoam a minha alma por ocasião da Comunhão.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de Conferência de 13/11/1982)

1) As conferências de Dr. Plinio davam-se, normalmente, com a presença de uma imagem de Nossa Senhora de Fátima.
2) Sl 86,5.
3) Cfr. Mc 5,25-31.
4) Sl 50,10.

As dores de Nossa Senhora

Depois de descrever a fisionomia moral da Mãe de Deus, Dr. Plinio considera os sofrimentos pelos quais passou a “Mulier dolorum” ao longo de toda a sua existência, em união com seu Unigênito. Tais considerações nos convidam a um exame de consciência feito com paz e inteira confiança na misericórdia divina.

 

Hoje é um dia muito significativo para nós, pois é a Festa das Sete Dores de Nossa Senhora.

Parece-me que não podemos deixar passar a ocasião sem dizer uma palavra a respeito.

”Mulier dolorum”

O que nós podemos considerar a respeito de Nossa Senhora e de suas dores, fundamentalmente, é o seguinte:
Enganam-se aqueles que julgam que a Virgem Maria teve em sua vida uma única ocasião de dor correspondente à Paixão e Morte de seu divino Filho. Esse momento foi realmente de uma dor suprema, a maior que jamais se tenha sentido no universo, abaixo da dor insondável de Nosso Senhor Jesus Cristo em sua humanidade santíssima.

Foi uma dor tão grande que recapitulou todas as dores do universo. Tudo quanto os homens sofreram desde a queda de Adão e sofrerão até o último instante em que houver homens vivos na Terra, vai ser incomparavelmente menor do que a dor que Nossa Senhora sofreu.

Contudo, erraria quem pensasse que Ela padeceu essas dores durante a Paixão, mas fora daquele período não teria sofrido mais. E, portanto, sua vida viria transcorrendo calma, satisfeita, inundada pelo contentamento de ser Mãe do Salvador quando, de repente, chegou aquela dor lancinante que durou até a Ressurreição de Nosso Senhor, mas depois passou o sofrimento e Ela teve novamente uma vida alegre.

Na realidade isso não se deu e é um modo completamente equivocado de considerar as dores de Nossa Senhora.

Nosso Senhor Jesus Cristo foi chamado por um dos profetas — se não me engano, o profeta Isaías(1) — de “Vir dolorum”: o Varão das dores; o homem ao qual era próprio sofrer, que está cheio de dores e que trazia essas dores na sua alma santíssima durante toda a sua existência.

De maneira que a Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo não foi um fato isolado na sua vida, mas o ápice de uma sequência enorme de dores que começaram desde o primeiro instante de seu ser e foram até o momento em que Ele exalou, num dilúvio de dores, o terrível “Consummatum est”(2). Durante todo esse tempo Ele continuamente sofreu.

Ora, como Nossa Senhora é o espelho da sabedoria, é espelho da justiça e Ela reflete em Si tudo o que é de Nosso Senhor Jesus Cristo, deve-se dizer de Nossa Senhora que Ela foi a “Mulier dolorum”, a Mulher, a Dama das dores e que também Ela teve a sua vida inteira pervadida pela dor, pelo sofrimento.

É certo que essa dor teve proporção com as forças incalculáveis que a graça Lhe dava. Sem dúvida, foi uma dor imposta pela Providência e, portanto, por mais lancinante que tenha sido, não era dessas dores que produzem turbulência e provações que devastam e sujam a alma.

Eram dores imensas, mas muito arquitetônicas, muito sábias, recebidas com uma serenidade de alma admirável! De maneira que, assim como se atribui a Nosso Senhor essas palavras de Isaías: “Ecce in pace amaritudo mea amarissima”(3) — “Eis na paz a minha amargura muito amarga” —, também de Nossa Senhora se pode dizer: “Eis na paz a minha amargura amaríssima”. No meio de um oceano de dor, aquilo tudo equilibrado, raciocinado, refletido e suportado com amor e com estabilidade de alma incomparável, sem emoções exageradas.

Entrelaçamento das mais tremendas dores com as mais excelsas alegrias

Portanto, com uma quase infinidade de sofrimentos padecidos sem torcida, sem pânicos, mas com muito medo, com muita angústia e, em certas circunstâncias, até com um peso de dor que chegava quase a estraçalhar, a Santíssima Virgem foi durante a vida inteira uma grande sofredora. Entretanto, uma sofredora que teve momentos de alegria e, mais do que isso, Ela teve uma grande felicidade ao longo de toda a sua existência.

Ela também teve gáudios como nunca pessoa alguma teve. E todas as alegrias do mundo, desde o primeiro instante em que o homem foi criado no Paraíso, até o último momento em que haja homens na Terra, todas somadas não darão as grandes alegrias de Nossa Senhora.

Mas essas dores e alegrias se entrelaçavam continuamente e Ela vivia suportando o fardo dos mais tremendos padecimentos e, ao mesmo tempo, aliviada pelo bálsamo das mais excelsas alegrias. Assim vista a fisionomia moral insondavelmente santa de Maria, convém nos atermos especialmente às suas dores. Quais foram as dores de Nossa Senhora?

O tormento ao considerar os pecados dos homens

Antes mesmo de saber que seria a Mãe de Deus, Ela começou a sofrer uma dor que para uma alma zelosa é imensa e que atormentou incontáveis santos — creio ter afligido todos os santos ao longo da história — e que Nossa Senhora, naturalmente, teve em grau superlativo.

Concebida sem o pecado original, desde o primeiro instante do uso da razão, a Santíssima Virgem já iniciou sua vida mística. E teve conhecimento do pecado e de toda a infelicidade dos homens. Nutrindo pela glória de Deus tal zelo que daria mil vidas para evitar um pecado mortal, Ela passava por essa dor tremenda de ver a humanidade inteira imersa em pecados. Sofria ao considerar aquelas pessoas que morriam e cujas almas, em número enorme, caíam no inferno, ou então, quando não se condenavam, iam para a triste morada do “Sheol”, onde muitas já se encontravam há dezenas de séculos à espera de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Além disso, Nossa Senhora viu os pecados cometidos por ocasião da vinda do Messias, e os que viriam depois do Salvador até o fim do mundo. E isso causava a Ela um tormento do qual não podemos ter ideia.

Houve um santo — eu não sei se foi Santo Inácio de Loyola — que disse o seguinte: se ele tivesse de viver a vida inteira simplesmente para evitar um pecado mortal de uma pessoa que depois fosse para o inferno, ele daria por bem empregados todos os sofrimentos de sua existência. Portanto, não para salvar aquela alma, mas para impedir de ser feita a Deus uma ofensa grave, de tal maneira o pecado mortal é um mal insondável.

Mas se era esse o pensamento de um santo, o que pensava Nossa Senhora, perto da Qual o maior santo é menos do que uma gota d’água comparada a todos os mares do mundo, menor que um grão de poeira em comparação a todos os universos? A santidade da Virgem Maria não tem proporção com nada. Nós não podemos fazer o cômputo da desproporção entre a santidade d’Ela e a de todos os anjos e santos reunidos. Assim, que tormento os pecados dos homens constituíam para Ela!

Dor diante da perspectiva e da realização da Paixão

A Santíssima Virgem recebeu, depois, a magnífica notícia de que seria a Mãe do Verbo encarnado. Podemos imaginar sua alegria ao adorar Jesus no primeiro momento em que Ela O concebeu por obra do Espírito Santo! Mas também sua dor ao pensar ser esse Messias o homem sofredor de que falara o profeta Isaías…

Segundo a opinião de alguns, antes dos trágicos acontecimentos da Paixão a Santíssima Virgem não tinha conhecimento da morte de Nosso Senhor na Cruz, e soube apenas no momento em que esta se deu. Eu não discuto a questão. É fora de dúvida que Ela, pelo profeta Isaías, sabia que seu Filho deveria sofrer dores inenarráveis.

Maria de Ágreda(4) conta que havia na casa de Nazaré um oratório onde, várias vezes, Nossa Senhora encontrou Jesus ajoelhado e suando sangue, na previsão de sua Paixão e da ingratidão com que os homens a receberiam.

Diante disso, que é tão verossímil, podemos imaginar a dor de Nossa Senhora vendo uma criança de cinco anos, depois de dez, mais tarde de quinze, depois um moço de vinte e, por fim, um homem já feito de vinte e cinco, e de trinta anos, ajoelhado frequentemente, a sofrer e a transpirar sangue face à perspectiva dos tormentos que viriam? Tanto mais Ela que amava Jesus, não apenas como uma mãe ama seu filho, mas como uma mãe ama seu Filho que é Deus!

Com certeza, Ela se prostrava perto de Nosso Senhor e sofria das dores d’Ele. E não é de admirar que Ela tenha suado sangue como Ele.

Ao iniciar-se a vida pública de Jesus, Nossa Senhora passa pela dor da separação. Começam os milagres, vêm as vitórias, é o momento da alegria. Mas, pouco depois, surge a ingratidão e prepara-se a tempestade de injustiças que desfechou na Paixão. Com tudo isso Ela sofria de um modo inenarrável! Se houve santos que desmaiaram ao receberem a revelação dos padecimentos do Salvador, podemos imaginar o que representava para Nossa Senhora o mínimo episódio da Paixão.

Por amor a nós, quis sacrificar o seu Filho Unigênito

Afinal, chega o momento da crucifixão, e as dores de Nosso Senhor atingem o seu paroxismo. E Maria Santíssima fica nessa alternativa: de um lado, desejar que Ele morra logo para diminuir as dores; de outro, que sua vida ainda se prolongue, em primeiro lugar porque toda mãe anseia por prolongar a vida de seu filho e, em segundo lugar, pela ideia de que assim Ele sofreria mais e os pobres pecadores seriam mais favorecidos.

Ela, então, concorda com o prolongamento desse sofrimento e firma o propósito de aceitar que Nosso Senhor seja imolado apenas naquela hora extrema, com todas as dores que Ele tivesse de sofrer.

Ela, Rainha do Céu e da Terra, com uma palavra poderia encerrar todos os sofrimentos expulsando os demônios e toda aquela gente que estava lá. Mas, para a salvação das nossas almas, Ela quis deixar aqueles algozes ali.

Apenas uma ou outra situação extrema Ela evitou. Conta Maria de Ágreda que o demônio havia arquitetado o seguinte projeto: quando Nosso Senhor fosse erguido no alto da Cruz e começasse a sua agonia, em determinado momento, derrubar a Cruz no chão, de maneira que a Sagrada Face batesse na terra e se despedaçasse. Mas Nossa Senhora, diante do excesso de ignominia de uma intenção como essa, proibiu o demônio de realizá-la.

Agora, por que Ela deixou o demônio fazer todo o resto? Porque amava tanto a salvação de nossas almas — mas da alma de cada um de nós — a ponto de querer que o Filho d’Ela passasse por tudo aquilo para, por exemplo, eu não ir para o inferno. E Ela ama de tal maneira a minha alma e a de cada um dos senhores que, ainda que houvesse um só dos senhores para ser salvo naquele dilúvio de dores, Ela quereria que seu divino Filho sofresse aqueles tormentos para salvar essa alma.

Imaginem, por exemplo, Nossa Senhora vendo a coroa de espinhos penetrar na fronte sagrada de Nosso Senhor e produzir lesões nervosas que faziam o seu Corpo estremecer em meio a todas aquelas dores que Ele já padecia. Contemplar o Sangue escorrendo de todos os lados, a sede tremenda, a febre altíssima, os estertores de todo o Corpo.

A Santíssima Virgem conhecia e media tudo isso. Entretanto, queria que fosse assim. Ela era como um sacerdote que imolava a Vítima divina no alto do Calvário. E se era esse o preço de uma alma, Ela desejava que o Filho d’Ela sofresse o que estava sofrendo para conquistar uma alma.

A grandeza de Nossa Senhora não está tanto na enormidade das dores padecidas, quanto no fato de ter Ela querido sofrer o que sofreu. Ela quis que o Filho d’Ela realizasse esse sacrifício tremendo e admirável, e fez isso por amor a nós. Porque Deus nos amou a ponto de querer sacrificar o seu Unigênito, Ela nos amou tanto que aderiu a essa função sacrifical, e quis sacrificar por cada um de nós o seu Filho Unigênito.

Um exame de consciência

A Semana Santa está se aproximando e é o momento de cada um de nós fazer, individualmente, uma meditação a esse respeito. Por mais que o homem pense, ele não pode deixar de se nutrir dessa reflexão que nunca deve bastar para a alma católica.

Colocar-se, portanto, sozinho frente a um Crucifixo ou diante de uma imagem de Nossa Senhora das Dores, e esquecer o restante do mundo. Porque diante de Deus, o mundo inteiro para mim não existe. E então fazer-me esta pergunta: Eu, Plinio, tenho consciência do preço da minha salvação? Todas as graças que eu tenho recebido, eu faço ideia dos gemidos e das dores que elas custaram e do que causaram no Coração Imaculado de Maria?

Eu tenho ideia de que tudo quanto se passou no Gólgota de tal maneira visava a minha salvação que se teria realizado ainda que eu fosse o único beneficiado?

Eu estou compenetrado de que no alto da Cruz Nosso Senhor Jesus Cristo pensou nominalmente em cada homem, desde o começo do mundo até aqui? E que, portanto, passou pela mente divina d’Ele, com pensamento de misericórdia, de bondade e de salvação, o nome de Plinio Corrêa de Oliveira? E que Ele teve em vista não apenas meu nome, mas viu minha alma, minha pessoa, o meu ser, e amou o meu ser por Ele criado e, num ato de amor a meu ser, fez aquele sacrifício para eu ir para o Céu?

Dou-me conta de que a minha salvação custou tudo isso?!

E como tenho eu correspondido a tantos benefícios? Qual tem sido minha ingratidão? Quantas faltas cometidas, muitas vezes por imprudência! Simplesmente por não querer evitar uma ocasião, por não fazer uma pequena mortificação, eu peguei o Sangue de Cristo e o joguei na sarjeta! Apesar desse Sangue derramado em meu favor, eu me pus em condição de perdição.

Entretanto, Deus me tolerou nessa vida, me suportou e me esperou com outras graças ainda maiores do que aquelas já recebidas.

A Semana Santa é uma ocasião de graças para cada um de nós. O flanco de Nosso Senhor Jesus Cristo está aberto, jorrando misericórdia para todos nós e nos chamando à contrição, à penitência, à reconciliação magnífica com Ele. Há uma efusão de bondades e de carinho para conosco como jamais poderíamos imaginar!

Portanto, minha primeira preocupação na Semana Santa deve ser a de pensar em minha alma. Pensar sem temor, sem pânico, porque Deus é Pai de misericórdia e Nossa Senhora é a Mãe e o canal de todas as misericórdias. Mas pensar com seriedade, a fundo, colocar-me diante desse Sangue de Cristo que corre e perguntar-me: O que fiz eu desse Sangue?

Junto à Cruz como São João Evangelista

Nosso Senhor pensou em tantas almas que haviam de desprezar o Sangue d’Ele levianamente, estupidamente, a propósito de uma ninharia, de uma bagatela: pela risada de uma criada, como São Pedro, por trinta dinheiros como Judas, por preguiça e vontade de dormir como os outros Apóstolos, por medo, por oportunismo, por sensualidade, enfim, por quantas coisas as almas haveriam de rejeitá-Lo!

Mas isso ainda é pouco. Nosso Senhor teve em vista, e Nossa Senhora também, todas as traições, todos os abandonos, tudo quanto almas sacerdotais O fariam sofrer.

Davi tem essa queixa em relação a um amigo que fez mal a ele: “Se outrem me fizesse isso eu não me queixaria. Mas tu, um outro eu mesmo, que comigo comias doces alimentos?!”(5)

Tudo isso foi visto. Mas também foram considerados com amor aqueles que, por uma graça especial conquistada por esse Sangue infinitamente precioso, seriam fiéis e estariam junto à Cruz como São João Evangelista.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 17/3/1967)

1) Is 53, 3.
2) Jo 19, 30.
3) Is 38, 17 (Vulgata).
4) Maria de Jesus de Ágreda (1602-1665). Religiosa e mística espanhola da Ordem da Imaculada Conceição. Em uma de suas principais obras, “Mística ciudad de Dios”, narra as revelações recebidas da Virgem Santíssima.
5) Cf. Sl 54, 13-15 (Vulgata).

Inimaginável amor materno

Ao consentir na dolorosa morte de seu Filho adorável, Nossa Senhora o fez por amor a nós, unindo esse seu tremendo sacrifício aos méritos do holocausto de Cristo, a fim de nos resgatar. Por isso, Ela é chamada Co-redentora do gênero humano. Mais ainda. Por essa cooperação na Paixão de Jesus, Maria Santíssima nos alcançou, junto a Ele, a vida sobrenatural da graça, e se tornou assim verdadeira Mãe de todos os homens.

Ora, se ao coração materno é próprio a bondade, a meiguice, a generosidade, a indulgência, porque se inclina, de modo particular, a essas disposições, o Coração Imaculado de Maria representa esse afeto e essa doçura maternais para conosco, num grau inimaginável.

Como bem o frisou São Luís Grignion de Montfort, o amor d’Ela para conosco é incomparavelmente maior que a soma do amor de todas as mães do mundo por um único filho. E cumpre dizer: Nossa Senhora ama com solicitude especial os justos, mas possui igualmente um carinho terníssimo para com os pecadores, conforme atesta a tocante oração do “Lembrai-Vos…”.

Nossa Senhora é, pois, a Mãe que aceitou sacrificar o próprio Filho por nós. Por todos e cada um de nós!

Nossa Senhora da Soledade

O que é a soledade de Nossa Senhora? É o período da vida de Maria Santíssima que vai desde o “Consummatum est” até o instante em que Ela tomou conhecimento da Ressurreição. Ali esteve Ela inteiramente só!

Peçam a Nossa Senhora da Soledade que os faça compreender a sublimidade e a elevação de espírito da soledade d’Ela e tomar a resolução de aceitarem a soledade sem amargura, sem rancor, sem pena de si mesmos, com naturalidade, como um herói aceita a luta e a morte.

Não sejam desses isolados amargos, ácidos, orgulhosos, que se julgam os incompreendidos do gênero humano. Não! Sejam naturais, bons, alegres.

É esse o holocausto, o sacrifício que temos de fazer. Alguém dirá: “Eu não tenho coragem”. Meu filho, se você não tem, diga assim: “Por enquanto não tenho coragem”. E reze para tê-la.

Todas as portas se abrem para quem rezar! Peça, portanto, a Nossa Senhora da Soledade para lhe dar a coragem de suportar o isolamento.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 5/2/1989)

Divina fecundidade

Quando, através de seu humilde “fiat”, a Virgem Santíssima consentiu na Encarnação do Verbo, a Ela foi comunicada a fecundidade do Padre Eterno. Quer isto dizer que a capacidade concedida a Maria de gerar o Filho divino é quase uma participação no próprio poder criador de Deus. Ora, tornar-se digna de privilégio tão augusto supõe uma riqueza de vida espiritual inimaginável, uma elevação de virtudes e uma intimidade de alma com Deus que excede à nossa limitada inteligência. Na medida em que uma simples criatura podia receber aquela fecundidade, Nossa Senhora a recebeu, plenamente.

Compreende-se, pois, como na ordem da criação nada haja, nem de longe, comparável a Maria, Mãe de Jesus.

O gládio que transpassou o Coração da Santíssima Virgem

Durante trinta e três anos, Nossa Senhora, em meio a alegrias inenarráveis, previu a Paixão e Morte de seu Divino Filho. E junto à Cruz, enquanto tantos homens  desertaram, Ela estava de pé. Nunca  ninguém sofreu tanto, com força e sobranceria, quanto a Mãe de Deus. Unindo-Se às intenções da Trindade Santíssima, Ela queria o esmagamento do demônio e da Revolução por todo o sempre.

Na apresentação do Menino Jesus no Templo, em profeta Simeão que a respeito do Divino Infante fez esta esplêndida profecia: “Agora, Senhor, podeis deixar vosso servo  partir em paz, segundo vossa palavra, porque meus olhos viram a salvação que preparastes ante a face de todos os povos, luz para iluminar as nações e glória de Israel, vosso  povo” (Lc 2, 29-32).

Destinados à maior glória, percorrendo os mais extremos sofrimentos

Nossa Senhora, à vista dessa profecia, ficou ainda mais inteirada de toda a glória do Menino Divino que carregava nos braços. Depois de abençoar o Menino e sua Mãe, disse Simeão: “Este Menino está posto para ruína e a ressurreição de muitos em Israel, e para ser alvo de contradição” (Lc 2, 34).

Assim, depois de um futuro esplêndido, o venerável ancião predizia uma vida e uma luta tremenda para aquele Menino e prenunciava para Maria Santíssima um sacrifício:  “Uma espada transpassará tua alma” (Lc 2, 35). Quer dizer, Ela terá um dos sofrimentos mais atrozes que uma pessoa pode suportar. E ele anuncia isso com trinta e três    anos de antecedência.

Temos aqui dois fatos a considerar, muito elucidativos para a mentalidade do homem moderno: em primeiro lugar, uma vez que Deus decretara que esse Menino fosse o Rei vitorioso de que falava a profecia de Simeão, como explicar que, lógica e sabiamente, houvesse de querer, ao mesmo tempo, que Ele passasse por todas essas lutas, as quais importassem num determinado momento em revés? Porque não se podia compreender de outro modo essa espada de dor que atravessaria o Coração de Nossa Senhora.

Não seria natural, arquitetônico, de acordo com a ordem estabelecida pela sabedoria divina, que, uma vez sendo da vontade de Deus que o Menino Jesus fosse o Rei de todos os povos, em todos os tempos, que nada viesse atrapalhar essa carreira gloriosa? Que esta se fizesse de trabalhos bonitos, sapientes, triunfais, de lutas vencidas facilmente com um golpe “mágico” que faria tudo retroceder diante de Jesus, e assim Ele chegasse à sua glória?

Por que o mistério desse momento terrível, em relação ao qual estava anunciado que um gládio atravessaria o Coração de Nossa Senhora? Como se pode compreender que  Deus permita, no meio dessa trajetória, um sofrimento tão grande e uma aparente derrota? Isso não é uma coisa estranha?

A mentalidade “happy end” nos impede de compreender o modo pelo qual as obras de Deus se realizam

O estado de espírito do homem  moderno correspondente a isso reflete-se, com frequência, no modo pelo qual somos levados a considerar os reveses de nossa vida espiritual e de nosso apostolado. Muitas  vezes percebo em algumas pessoas dificuldades para explicarem a si mesmas a razão pela qual, embora estejam andando bem espiritualmente, podem ser tentadas.

A ideia é esta: se Nossa Senhora, se Deus querem que me santifique, por que, então, devo ser tentado? Por que até permitem que eu peque e Lhes desagrade? Isso não é uma contradição? Se o fim é um, não é normal que tudo caminhe direitinho e coerentemente para ele? Como explicar a ocorrência de coisas que parecem contrariar esse fim?

Vê-se nessas interrogações o reflexo daquela mentalidade “happy end” do cinema norte-americano. As coisas têm que correr certinhas; quando não correm, são atrapalhações  que podem ser até grossas, mas já se sabe que terminará tudo direitinho, porque o homem é chamado para ser feliz nesta Terra, entender tudo quanto se passa com ele e  triunfar.

E quando as coisas não acontecem assim, ele tem a sensação de que a vida humana não está em ordem. Tal como os heróis de um romance de filme, que sofrem durante o  enredo, mas o expectador já sabe – e tem a sensação de que os atores também – que tudo vai terminar à beira de um lago, olhando-se amorosamente, navegando num  barquinho, os passarinhos cantando, a fita acabando, e o burguês que a assistiu voltando prosaicamente para casa, satisfeito.

Essa mentalidade “happy end” intoxica nosso espírito e não podemos compreender o modo pelo qual as obras de Deus se realizam. Uma vez posto o pecado, com a queda dos  anjos, e posteriormente a do homem, a vida humana tem um caráter não só de prova, mas de expiação e de luta.

Aceitar o sofrimento não choramingando, mas como o  soldado que vai para a luta

A Providência Divina age de acordo com sua sabedoria, permitindo para os bons os reveses, as doenças, as tentações, a luta contra o adversário, e exigindo deles a aceitação  de que essas coisas lhes podem vir em ocasiões onde isso lhes pareça incompreensível, pois o normal nessa vida é sofrer e que muitas coisas, de fato, não deem bom resultado, ou tenham consequências diferentes do que se quereria. Desse resultado errado Deus tira, para sua glória, algo de melhor e mais brilhante do que o sucesso por  nós imaginado.

As provações e os sofrimentos inesperados não só constituem algo pelo qual o homem decaído deve passar, mas podem corresponder também a uma punição pelos pecados cometidos, ou esconderem uma prova de amor querida por Deus de sua criatura; uma prova de confiança cega, de desprendimento e de abnegação que a criatura deve dar e  que constitui um elemento altamente pedagógico para ela, porque a criatura só vale na medida em que realmente aceita esses sofrimentos com espírito sobrenatural, não  choramingando, mas como o soldado que vai para a luta.

Compreende-se, então, o mistério que há no seguinte fato: segundo a mentalidade moderna, não seria o caso de avisar Nossa Senhora, trinta e três anos antes, que Ela iria  sofrer essa dor. Mas fazer o contrário: ir tapeando ou ficar quieto. Mesmo na hora de Nosso Senhor ser morto, enfim, de Maria Santíssima tomar conhecimento da Paixão,  adiar, contar-Lhe aos poucos para Ela não se assustar muito. Afinal, quando não houvesse mais remédio, Ela saberia, e ainda assim haveria os calmantes.

A ação da Providência não é essa. Com trinta e três anos de antecedência, Ela avisa Nossa Senhora. Exatamente porque a previsão dessa dor já é uma tremenda dor. Maria  Santíssima carregou a previsão desse sofrimento durante todo esse tempo e o viu chegando de longe. Com isso, sua alma imaculada, criada sem pecado original, foi-se  aperfeiçoando e santificando na longa previsão e aceitação da dor que deveria vir.

Trinta e três anos de Horto das Oliveiras

Compreende-se que até para a alma imaculada da Santíssima Virgem a previsão forte, corajosa, razoável – eu diria, mesmo varonil – da dor vindoura era um elemento para uma crescente união com Deus, a qual Ela já possuía num grau insondável desde o primeiro instante de seu ser. Entretanto, essa profecia de Simeão foi intencionada para que Ela carregasse essa dor durante trinta e três anos, na compreensão desse fato de que o homem nasceu para sofrer, é normal que sofra, que é preciso aceitar a dor por  inteiro antes dela vir, e, quando chegar, que ela nos encontre calmos, fiéis, sobranceiros e heroicos, porque assim se deve ser diante do sofrimento.

Então, encontramos essa analogia entre a vida de Nosso Senhor e a de sua Mãe Santíssima: a vida de Nossa Senhora foi trinta e três anos de Horto das Oliveiras, ao longo  dos quais Ela previu a Paixão e a Cruz no meio de alegrias inenarráveis.

Ela foi vendo seu Divino Filho crescer, preparar- Se para a vida pública – durante a qual esse gládio de dor A esperava –, sair de casa, ouvindo falar dos rumores criados em  torno d’Ele e do ódio que subia e O rodeava de todos os lados. Era o mal que haveria de armar contra seu Filho o golpe mais atroz possível. E Ela que O adorava como seu  Deus e seu Filho, sentindo o pecado horrível que estava sendo preparado, considerava de frente os tormentos que deveriam vir.

O resultado foi a hora magnífica de sua fidelidade: enquanto tantos homens desertaram, Nossa Senhora se encontrava de pé junto à Cruz. Não era de duvidar que estivesse, pois estava confirmada em graça; mas Ela ali se encontrava como fruto dessa longa preparação. Quer dizer, não desmaiada, nem desfalecendo, nem alquebrada pelos  acontecimentos. A iconografia católica apresenta, em todos os séculos, Maria Santíssima muito firme, de nenhum modo desorientada, sem domínio de  Si, ou desejando  fugir. Essas são paixões vis que não caberiam em sua alma,  às quais se contrapunham, na ordem teórica, virtudes mais excelsas que Ela tinha elevado ao mais alto  dos  supremos graus. Nunca ninguém  sofreu tanto, com tanto domínio dos acontecimentos, compreendendo tanto a lógica do que se passava, com tanta força e sobranceria, com  anto ódio ao mal, quanto Nossa Senhora.

Para esmagar o demônio, Nossa Senhora desejou os mais atrozes sofrimentos

Ela sabia que todo o mal no mundo seria esmagado no momento em que o seu Divino Filho expirasse. Durante todo o tempo, a Santíssima Virgem esteve na seguinte  disposição: “Adoro meu Filho, mas se for preciso sacrificá-Lo para esmagar o demônio, derrotar o poder das trevas, concordo que meu próprio Filho morra. Eu O entrego,  por assim dizer, O imolo. Esse gládio Eu mesma enfio em meu próprio Coração. Mas é preciso que o demônio seja esmagado. É necessário  que o mal – que hoje chamamos   Revolução – seja estraçalhado por todo o sempre. Uno-me às intenções santíssimas do Pai, do Filho e do Espírito Santo e faço esse sacrifício horroroso.

Mas isso que está acontecendo no alto da Cruz Eu quero, e não deixo de querer um instante, com toda a intensidade de meu ser”.

Se isto não é espírito de combate,  disposição para arrasar o adversário, então não sei mais o que significam essas palavras.

Trinta e três anos de preparação! O que tem isso de comum com a vida de Nosso Senhor? Para não falar de preparação remota, no Horto das Oliveiras Nosso Senhor quis  meditar e prever tudo o que Lhe aconteceria. Então, Ele começou a sentir horror e pavor do que viria, e fez aquela oração: “Meu Pai, se for possível, afaste-se de Mim esse cálice” (Mt 26, 39). Quer dizer, se não for condição para o gênero humano ser redimido, enfim, se dentro de vossos desígnios for possível derrotar o demônio sem isso.

Porém, faça-se a vossa vontade e não a minha. Eu aceito e quero todo esse sofrimento para chegar a esse resultado. Ordem mental, lógica, calma e ante a dor, e o amor ao  sofrimento que se deve ter.

Gládio representando a dor e a luta

Muitas vezes, em nossa vida, há aspectos triunfais, no meio de toda a guerra em que nos movemos. Mas precisamos nos compenetrar bem de que o  normal, na luta tremenda que  estamos tendo, é virem vários momentos nos quais um gládio de dor transpasse a alma de cada um de nós. Por vezes  pareceremos derrotados, desorientados, abandonados pela Providência, como diz o Salmo que Nosso Senhor recitou no alto da Cruz: “Deus meu, Deus meu, por que Me abandonaste?” (Mt 27, 46).

Devemos nos colocar diante desta perspectiva: essas são as coisas que podem acontecer, nossa luta não será sempre uma parada de vitórias. Não seríamos dignos de Nosso Senhor Jesus Cristo, nem de sua Mãe Santíssima, se isso fosse assim. É mister termos diante dos olhos sempre a ideia de que um gládio de dor nos atravessará em determinado momento.

Devemos pedir a Nossa Senhora que nos alcance a graça – que, sob determinado ponto de vista, não temo chamar de suprema – de desejarmos, amarmos e, desde logo,  prepararmos nossa vida para essa hora.

Porque assim como a hora do gládio, junto com a da Encarnação, foi a grande hora da vida da Santíssima Virgem, a hora da fidelidade, assim também podemos dizer não ter  sido a grande hora de nossa vida somente a vocação, mas vai ser a hora da perseverança, que corresponderá à hora do gládio.

Tivéssemos nós um gládio que, com maior furor guerreiro e de um modo mais terrível, representasse ao mesmo tempo a dor que deve transpassar nossas almas e a luta  contra nossos adversários, e eu o poria como símbolo em nossa capela, porque, mais do que uma resignação, uma sadia e equilibrada apetência desse gládio deve nos caracterizar.

Conta-se que Nosso Senhor, quando recebeu a Cruz, antes de colocá-la nas costas chorou de emoção, abraçou-a e a beijou com muito carinho, porque desde sempre a  desejara. Oxalá, na hora de nosso gládio, possamos também chorar varonilmente de emoção, osculá-lo com muito carinho e dizer que desde sempre o desejávamos. É o  pedido do amor a esse gládio que devemos apresentar a Nossa Senhora das Dores.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/4/1965)