Escravidão de amor a Nossa Senhora

Eis a conclusão das palavras dirigidas por Dr. Plinio a um grupo de jovens que acabavam de fazer a consagração a Nossa Senhora, pelo método de São Luís Grignion de Montfort. Dr. Plinio lhes  explicara inicialmente o contexto no qual esse Santo explicitou e desenvolveu suas doutrinas.

 

Em seu “Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem”, São Luís Grignion estabelece vários princípios que justificam a nossa consagração a Ela como escravos de amor.

Medianeira desejada pela Providência

O mais importante deles é a mediação universal de Nossa Senhora. Ou seja, o fato de que Ela é a medianeira entre Deus e os homens para a obtenção e a distribuição de todos os dons divinos que  pedimos ao Céu.

De tal modo essa intercessão de Maria é querida pela Providência que — ensinam os teólogos — nada do que os fiéis pedem a Deus seria alcançado, se a Santíssima Virgem não rogasse também  por eles. Pelo contrário, se Ela sozinha fizer a mesma oração em seu favor, será atendida.

Compreende-se. Escolhida para ser a mãe do Verbo encarnado, sempre imaculada e cheia de graça, a união que Nossa Senhora tem com Jesus é a mais alta que uma simples criatura humana pode ter com Deus. Em virtude desse vínculo extraordinário, Nosso Senhor nada recusa à sua Mãe, o que faz d’Ela uma intercessora onipotente junto a Ele. Esse é o princípio ensinado por São Luís Grignion e reconhecido pela Igreja.

Passemos a outro ponto.

Co-redentora do gênero humano

Quando foi decidido pelo Pai Eterno que Jesus Cristo deveria morrer para expiar nossos pecados, quis Ele ter o consentimento da Santíssima Virgem, o que representou para Ela um golpe  espantoso. Pensemos em nossas mães. Se alguém lhes dissesse: “Quer me dar seu filho, para que ele sofra blasfêmias, seja ridicularizado, perseguido, preso, entregue ao desprezo e ao ódio do povo, flagelado, coroado de espinhos, obrigado a carregar sua cruz até o Calvário e morra de modo atroz?” — nenhuma delas cederia o filho! Não há mãe que queira isso para aquele que ela trouxe ao mundo.

Porém, Nossa Senhora sabia ser necessário esse holocausto para a redenção do gênero humano. Ela deu seu consentimento, e com isso sofreu uma dor intensíssima, como se um gládio Lhe  transpassasse o coração. Daí vem a devoção a Nossa Senhora das Dores, e a imagem d’Ela com o coração aparente, atravessado por uma espada.

É uma evocação do sacrifício que Ela fez.

Nos seus eternos desígnios, Deus quis que esse padecimento de Maria fosse unido ao de Nosso Senhor para resgatar os homens, e por essa razão Ela é chamada pela Igreja de Co-redentora do  gênero humano.

Nossa Senhora é nossa arqui-mãe

Em conseqüência dessa participação de Nossa Senhora na redenção do mundo, podemos dizer, com inteira  propriedade, que Ela é nossa mãe: sem o auxílio e o consentimento d’Ela, não teríamos  nascido para o Céu e para a vida da graça. Ela aceitou e quis o sacrifício de seu Divino Filho por todos e cada um dos homens, até o fim dos tempos, e é, portanto, mãe de todos e cada um de nós.

Mãe a um título mais alto que simplesmente o de mãe natural, posto ser mais alta a vida sobrenatural para a qual Ela nos gerou. Em certo sentido, Ela é a nossa arqui-Mãe, a Mãe das mães. E tem, então, para conosco, uma tal misericórdia, que São Luís Grignion de Montfort não hesita em afirmar que Maria ama cada um em particular mais que todas as mães somadas amariam seu filho  único. Daí, diga-se de passagem, a entranhada confiança que devemos depositar na clemência d’Ela.

É louvável que nos consagremos a Nossa Senhora

Ora, se Nossa Senhora nos deu de tal maneira seu sacrifício, sua alma, se Ela nos amou a tal ponto, se é tão autenticamente nossa mãe, se Ela nos ofereceu seu Filho, o Filho de Deus, se O imolou por nós, se nos cumulou de tantos bens, é justo e louvável que nos consagremos a Ela por completo. Eis a tese de São Luís Grignion.

Pertencemos a Ela, de direito, pelo que Ela fez por nós. O santo autor diz muito bem que, quando um rei (ele se referia aos monarcas absolutistas) conquista um povo, torna-se senhor desse povo.

Nossa Senhora nos comprou e nos conquistou por seu sacrifício, e por isso Lhe pertencemos. Mas, como somos seres inteligentes e livres, é preciso que, por uma deliberação nossa, nos  entreguemos a Ela. Com nosso consentimento, essa união se torna completa.

De fato, não pode haver dom mais proporcionado ao que Nossa Senhora nos fez, do que a doação de nós mesmos a Ela, como seus devotíssimos escravos. Quer dizer, a escravidão de amor à  Santíssima Virgem Maria como Mãe de Deus, como nossa Co-redentora e nosso celestial amparo.

Características dessa escravidão

Por essa escravidão consagramos nossa vida nas mãos de Maria Santíssima, e Lhe entregamos todos os nossos méritos para que disponha deles como melhor quiser. Convenhamos, não é um  muito bom negócio para Ela… Que são os pobres méritos dos homens em comparação com os que Ela alcançou! Mas, se é este o desejo d’Ela, deixemos que Nossa Senhora use de nossos méritos  como Lhe aprouver, em benefício de terceiros, em tal intenção da Igreja, etc., etc. São Luís Grignion, entretanto, procura nos fazer ver a inestimável vantagem dessa entrega, aplicando à  generosidade de Nossa Senhora uma expressão francesa muito interessante: “Em troca de um ovo, ela nos dá um boi”. Ou seja, damos diminutos méritos e, em retribuição, Ela nos concede uma  torrente de graças.

Devemos, pois, fazer tudo o que Nossa Senhora deseja que façamos, quer dizer, cumprir a lei de Deus e procurar sermos perfeitos. Em outras palavras, tudo o que sabemos que seja o melhor para  os interesses da Igreja, segundo a moral e a perfeição cristã. Em compensação, Ela nos toma sob sua proteção de modo especial, e nos torna beneficiários de méritos superabundantes.

Eis no que consiste essa consagração de amor à Santíssima Virgem.

 

Heroísmo, graça e beleza

Ergue-se sozinha, desafiando a vastidão das águas que se abrem à sua frente. Dir-se-ia antes um palácio em forma de torre, espaçoso, amplo, imponente, com seus diversos andares encimados pelo caminho de ronda, ao longo do qual os vigias atentos são capazes de perlustrar todo o horizonte.

Cercada de pátios, patamares e guaritas, fruto de uma concepção corajosa, misto de guerreiro e sagrado, a Torre de Belém é, a meu ver, um dos mais belos monumentos da Cristandade.

Quando a vi pela primeira vez, desde logo tornou-se dos meus maiores encantos. Era a forma de grandeza e de pulcritude que eu desejava conhecer, sem a poder imaginar. Contemplando-a com meus próprios olhos, veio-me ao espírito este pensamento: “Já a pressentia, mas não conseguia colocá-la em palavras; tudo em mim se inclinava para ela, para o desejo que algo assim existisse. Eis a torre que eu tanto esperava!”

Senti, por assim dizer, uma vivíssima consonância que nos unia. Pareceu-me magnífica como dignidade, calma, distinção, majestade. Como vigor, força e, ao mesmo tempo, suavidade e delicadeza, presente naquelas sacadas de onde o rei e a corte assistiam a partida dos valorosos navegantes. Pude imaginar os adeuses de parte a parte, os lenços que se agitavam para marcar a separação e todas as outras manifestações de carinho e amizade para com os que se ausentavam. Tudo isso me veio de imediato à imaginação, porque havia essa consonância da Torre comigo.

Lembrar-me dela é para mim uma fonte de alegria: “Lá está a Torre, e sempre poderei revê-la!”

Extraordinária definição de ousadia, altiva, séria, resolvida a enfrentar os mares, ela nos convida a superiores cogitações. Sua atmosfera é incompatível com a superficialidade, a intriga e as mesquinharias da baixeza humana. Dela emanam aromas espirituais e sobrenaturais, o maravilhoso perfume da graça divina, posto que edificada por almas movidas de espírito católico, cuja inspiração artística sublimou-se por uma espécie de carisma e dom celestial para atingir aquele esplendor de realização.

Obra do passado, ela nos fala de futuro. Suas pedras de alvura reluzente nos transporta para o mundo dos contos de fábula.

É o próprio símbolo do heroísmo, da graça e da beleza.

Tenho para mim que certos lugares e monumentos que não possuem um significado diretamente religioso, mas constituem uma expressão cultural definida muito católica, devem ser admirados por amor à Igreja. A Torre de Belém é um deles.

Eu lhe devoto tanto apreço porque amo a Esposa Mística de Cristo. E quando a elogio, faço-o com uma emoção religiosa: porque a graça me toca a alma ao vê-la, e ao perceber nos seus encantos os reflexos dos sentimentos cristãos que levaram os navegadores, os missionários e os conquistadores lusitanos a empreenderem uma epopeia que traçou indelével sulco nas águas da História.

Oração para pedir a troca de vontades

Ó Coração Sapiencial e Imaculado de Maria, que simbolizais a mentalidade sagrada, a vontade santíssima, a perfeitíssima disciplina da Mãe de Deus, nós Vos pedimos: abri-Vos para nós.

Considerai nossas mentes infiltradas de máximas revolucionárias! Tende em vista as nossas vontades debilitadas por toda espécie de maus hábitos e pressões decorrentes do ímpeto da Revolução! Olhai para a nossa sensibilidade trabalhada pelos mais nocivos fermentos do mundo satânico que a Revolução vem desenvolvendo, e tende pena de nós!

Nós Vos pedimos que substituais nossas mentalidades revolucionárias, de maneira que nossos princípios reflitam, com a fidelidade perfeita, a doutrina e o espírito da Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Trocai a nossa vontade corrompida, substituindo-a pela vossa sem mancha, sem hesitação, sem concessões! Substituí nossa sensibilidade pela vossa, ordenada, equilibrada, puríssima, em tudo obediente à vossa vontade e inteligência!

Vós sois, Coração Imaculado, o Sacrário do Espírito Santo. Habitai no meu coração para que o vosso Divino Esposo habite em mim e eu seja um templo d’Ele!

Dai-me, assim, ó Coração Sapiencial e Imaculado de Maria, o Grand Retour tão desejado e fazei-me um discípulo perfeito vosso! Amém.

Plinio Corrêa de Oliveira (Composta provavelmente na década de 1980)

 

O “Lembrai-Vos”, uma oração para todos os momentos

É muito importante ponderarmos bem as magníficas palavras do “Lembrai-Vos”, esta bela oração com que rogamos a misericórdia de Nossa Senhora.

“Lembrai-Vos, ó piíssima Virgem Maria, que nunca se ouviu dizer…” A palavra nunca é bastante categórica. “… que algum daqueles…” Algum daqueles, isto é, quem quer que seja: não houve um só caso.

“…que têm recorrido à vossa proteção, implorado vossa assistência e reclamado vosso socorro, fosse por Vós desamparado.” Proteção, assistência, socorro. Proteção para evitar que a tentação venha. Assistência é um auxílio numa situação difícil. Socorro é para uma pessoa que está periclitando, sumindo, afundando.

Está bem: nunca se ouviu dizer que, tendo alguém pedido proteção, assistência e socorro a Nossa Senhora, fosse por Ela desamparado. “Animado eu, pois, com igual confiança, a Vós, ó Virgem entre todas singular, como a Mãe recorro, de Vós me valho”.

Quer dizer, se nunca Vós deixastes de proteger a ninguém, aqui estou eu, que sou um ente humano e, como tal, batizado na Igreja Católica, sou vosso filho, venho Vos pedir auxílio. Estou tentado, eu tive culpa, digamos que até caí em tentação. Mas eu existo, vivo, e a vossa Clemência me mantém nesta vida. E, permanecendo vivo, tenho o direito e o dever de rezar para Vós. Assim, aqui me apresento, cheio de confiança na vossa misericórdia.

“E, gemendo sob o peso de meus pecados, me prostro a vossos pés.”

Note-se como é animadora esta expressão. Ela não diz o seguinte: “Eu, o inocente, o puro, o límpido; eu, o homem sem mancha, me dirijo a Vós e peço socorro. A minha inocência me dá direito a vosso auxílio”. Não! Mas diz: Gemendo sob o peso de meus pecados… Ou seja, são tantas faltas que elas me prostraram no chão. Eu estou caído ao solo sob o fardo delas, e este me oprime de tal modo que eu chego a gemer.

Ora, gemendo sob o peso de meus pecados, o que faço eu? Prostro-me aos vossos pés. Eu venho para junto de Vós, minha Mãe, e a Vós me agarro, na opressão de meus pecados.

Então vem a conclusão: “Não desprezeis as minhas súplicas, ó Mãe do Verbo de Deus humanado, mas dignai-Vos de as ouvir propícia e de me alcançar o que Vos rogo. Assim seja”. O pensamento é lindo. Dignai-Vos de ouvir com benignidade, com bondade, o que eu estou dizendo. De vossa parte eu espero um sorriso e que me alcanceis aquilo que Vos peço. Amém.

Digamos agora uma palavra sobre a oração no seu conjunto.

Ela é uma tocante e filial manifestação da confiança de qualquer alma, em qualquer estado, posta em qualquer situação, para com Nossa Senhora. Uma confiança que a reveste de ânimo e a faz voltar-se à Santíssima Virgem, dizendo-Lhe: “Isto eu Vos peço, tende pena de mim e auxiliai-me”.

O raciocínio que essa súplica encerra é simplíssimo: “Vós nunca abandonastes ninguém; ora, eu sou alguém; logo, Vós não me abandonareis”. É uma reflexão a mais lógica possível, a mais concludente, a mais convincente, a mais singela na sua esquematicidade, a mais irresistível, expressa numa linguagem de fervor e devoção. Uma linguagem que, além de bonita, tem um verdadeiro conteúdo teológico: Nossa Senhora é Mãe de cada homem; donde Ela não deixará de socorrer a qualquer um que a invoque. Nunca será supérfluo insistir neste ponto: é preciso invocá-La, é  necessário que a Ela sempre  recorramos, máxime nos momentos difíceis de nossa existência. Seja nas horas de tentações, de provações, angústias e sofrimentos, seja nos problemas comuns de todos os dias.

Por exemplo, em nossas atividades apostólicas, em nossas ações de caridade, devemos confiar e suplicar o auxílio de Nossa Senhora. Pedir a Ela que favoreça tal conversa com uma alma aflita ou com alguém que vemos vacilar nas sendas da virtude. Então peçamos: “Minha Mãe, considerai esse espírito tíbio e mole que corre o risco de se afastar de Vós. Comunicai a ele algo de vossa vitalidade e de vosso fervor”.

E se o mole sou eu, digo-Lhe: “Minha Mãe, infundi em mim esse vosso ardor. Eu me vejo atolado na pasmaceira, da qual, entretanto, tenho horror. Quanto mais Vós o tereis! Tende pena de mim, e curai-me dessa lepra”. E assim como no apostolado, também em nossas mais diversas ocupações sociais e profissionais, devemos tratar Nossa Senhora como uma Mãe boníssima a quem nós pedimos tudo aquilo que nossa alma aspira ou necessita, sobretudo quando ordenado para a glória dEla.

Segundo a boa tradição católica, os Anjos estão sempre prontos a em tudo nos socorrer e ajudar, enquanto os demônios, pelo contrário, procuram  nos causar danos e atrapalhações.

É conhecida, por exemplo, a funesta ação de um espírito maligno que costumava talhar a manteiga fabricada por certos camponeses europeus. O fato pode até despertar sorrisos, pois lembra algo da inocência da vida rural, em comparação com as fuligens e inferneiras das grandes metrópoles.

Desperta sorriso, sim, mas contém uma realidade. Quantas vezes fazemos alguma coisa e esta sai errada, desanda, talha. Por quê? Não raro, devido à ação preternatural de algum demônio. Nesses momentos, a atitude correta não é nos enervarmos, nem nos apavorarmos, nem tampouco nos desesperarmos. É rezar: “Lembrai-Vos, ó piíssima Virgem Maria…”

Quer dizer, a solução para as nossas dificuldades, grandes e pequenas, está em possuirmos essa constante confiança, em todas as horas, na infalível assistência de Nossa Nossa Senhora da Penha (Rio de Janeiro) Senhora.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Rainha dos acontecimentos

O báculo e as chaves que Nossa Senhora do Bom Sucesso traz consigo dão a entender que Ela abre e fecha os acontecimentos grandiosos, as misérias e as catástrofes na vida dos homens, as vitórias de Deus na História.

Ela traz triunfalmente seu Divino Filho, como quem diz: “Estou vencendo, mas venço para que Ele vença. Eu sou Rainha, sim, porém o sou porque Ele é o Rei!”

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 14/8/1982)

Apresentação de Nosso Senhor no Templo

Após ter gerado do modo mais maravilhoso e feliz possível o Filho divino que o Espírito Santo concebeu nas suas entranhas virginais, Nossa Senhora quis se sujeitar, junto com o Menino, à Lei de Moisés pela qual deveriam se apresentar no Templo: Ela, para completar os dias de sua purificação, e Ele, a fim de ser oferecido e resgatado como primogênito.

Submetendo-se, sem o precisarem, a tais preceitos, Mãe e Filho nos deixaram um lindo exemplo de amor e obediência aos desígnios de Deus. Ao mesmo tempo em que proporcionaram ao santo Simeão a alegria indizível de ver com seus próprios olhos o Messias prometido pelas Escrituras.

Sustentando o Verbo Encarnado em seus braços, o profeta O louvou e aclamou como a glória de Israel, a salvação que Deus preparara diante de todos os povos, como a Luz para iluminar as nações…

(cf. Lc 2, 29-32).

Plinio Corrêa de Oliveira

Sob o manto da Mãe do Bom Sucesso

O conhecimento de trechos das revelações de Nossa Senhora do Bom Sucesso a Soror Mariana de Jesús Torres fez com que essa invocação da Mãe de Deus se tornasse uma das principais na obra de Dr. Plinio.

Claramente movido por uma graça interior, em certa ocasião, Dr. Plinio exprimiu um desejo: “Bem que Nossa Senhora do Bom Sucesso poderia nos dar um sinal… Um sinal a respeito do quê? De uma especial assistência a nós. Nada determinado”.

No dia seguinte a essas palavras, Dr. Plinio teve, como de costume, longa agenda de atendimentos. Entre os despachos marcados, estava uma palavrinha de acolhida para um grupo de discípulos equatorianos. Após os cumprimentos, comunicaram serem eles portadores de um presente todo especial para Dr. Plinio: as chaves do Mosteiro da Imaculada Conceição de Quito, que normalmente pendem da mão direita da imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso!

Portanto, a Rainha do Céu não esperara 24 horas para enviar o solicitado sinal. Ao recebê-lo, Dr. Plinio comentou: “A chegada dessas chaves tem relação com o que temos dito a respeito das conjunturas atuais. Elas são um estímulo à oração e significam que, se rezarmos diante delas, Nossa Senhora nos atenderá. Eu fico tocado até o fundo da alma e agradeço muitíssimo, mas muitíssimo!”

Infelizmente as históricas chaves eram emprestadas e, após serem veneradas durante algumas semanas, tiveram de ser devolvidas à sua ilustre proprietária.

Teria sido um sinal passageiro? Nossa Senhora do Bom Sucesso é Mãe de uma bondade insondável. Para tornar ainda mais patente o sinal, concedeu em 11 de fevereiro de 1992, dia de Nossa Senhora de Lourdes, nova e talvez ainda maior graça, enviando, a título de empréstimo — e por um ano! —, um de seus mantos. Acompanhava outra valiosa relíquia: a manga de um de seus antigos vestidos, com um tocante bilhete das freiras daquele mosteiro:

“Reliquia de Nuestra Madre del Buen Suceso. Al Dr. Plinio Corrêa de Oliveira.

Sus hijas de la Limpia Concepción de Quito.”

A título temporário também, como mais uma dádiva, Nossa Senhora do Bom Sucesso fazia retornar, por mais um tempo, as tão simbólicas chaves.

O que entre nós se passou? — comentou Dr. Plinio. Dir-se-ia que houve uns números musicais muitíssimo bem regidos e executados que animaram os nossos corações, depois foram introduzidas as chaves que pendiam do braço da imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso, e foi trazido aqui um dos mantos dessa gloriosa imagem para estar presente durante as nossas reuniões, pelo menos, pelo espaço de um ano. Foi trazido juntamente um tecido branco da manga do vestido da própria imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso, portanto, algo que tomou contato direto com o braço da imagem, e quem sabe se era o braço da destra d’Ela que foi coberto por esse tecido?

É esse símbolo da destra d’Ela que vem presidir e ornamentar as nossas reuniões(1).

Essa especial relação de alma com a Virgem do Bom Sucesso se manifestou também nas tocantes palavras com que Dr. Plinio descreveu a pequena imagem recebida por ele de presente em 1979:

Eu já tenho visto fotografias muito bem tiradas da verdadeira e autêntica imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso. E tenho tido a impressão de alta veneração, respeito filial, afeto, que a imagem desperta.

Entretanto, olhando para esta esculturazinha aqui, tão inferior à imagem original no lado escultural, eu notei nela um imponderável qualquer, que parece ter uma alegria e uma propriedade de despertar alegria, como se Ela estivesse anunciando o sucesso que vai obter para nós; como se Ela estivesse nos entendendo, ou comunicando algo da sua alegria triunfal de Rainha. Têm-se a impressão de que Ela, no Céu, já sabendo a vitória que terá, e gozando no Céu do maior ápice de todas as vitórias possíveis, desta vitória em concreto Ela já comunica alguma coisa na consideração desta imagem.

E que o ambiente imponderável que cerca esta imagem como que nos diz: “Meus filhos, alegrai-vos, levantai vosso ânimo! Nada tem importância quando Eu resolver vencer. A minha hora de misericórdia está chegando para vós e, portanto, nada vos atingirá de maneira contrária a meus planos. O que atingir será de acordo com meus planos e, no fundo, para vosso bem. Alegrai-vos, portanto, o sucesso é meu, porque Eu sou a Rainha do Bom Sucesso; e o sucesso é, portanto, vosso, porque vós sois meus filhos!” E assim eu julgo ver nessa imagem uma comunicação de alegria, mas uma alegria radiosa, que vem de dentro e se esparge sobre os que a contemplam, que realmente me causou uma profunda impressão(2).

 

Plinio Corrêa de Oliveira

1) Conferência de 18/2/1992.
2) Conferência de 2/6/1979.

Excelso socorro dos fracos

Sendo de uma excelsitude inimaginável, Maria Santíssima é também de modo incomensurável a celestial Protetora dos homens, sobretudo dos mais miseráveis. Compreende-se, pois se todas as suas qualidades e virtudes reluzem no mais elevado grau de perfeição, entre elas rebrilha a sua maternal misericórdia.

Assim, Nossa Senhora se compraz em ter uma particular inclinação para os que menos merecem, e assisti-los com a abundância torrencial de sua incansável solicitude.

De maneira que, inimaginavelmente alta, Ela é, mais do que nenhuma outra criatura, o amparo e socorro dos fracos.

Plinio Corrêa de Oliveira

A “Oração da Restauração”

Muitos já teremos sentido em nosso interior, envolto nos acentos do arrependimento, um carinhoso e materno afago da graça a nos prometer que um dia voltaremos a trajar, purificada de suas manchas, a “alvíssima túnica” da inocência recebida com o Sacramento do Batismo. É esse sentimento feito de certeza e esperança que levou Dr. Plinio a compor, em 1967, a “Oração da Restauração”, cujo significado mais profundo ele nos explica nos comentários transcritos nestas páginas.

No Antigo Testamento — tanto quanto me lembre isso não ocorre no Novo — encontramos preces nas quais o orante dirige perguntas a Deus. Por exemplo: “Senhor, por que dormis?”, e outras interrogações análogas que esperam uma resposta do Criador.

De passagem, é interessante notar que as súplicas presentes nas páginas do Antigo como nas do Novo Testamento são inspiradas pelo Divino Espírito Santo, ou ensinadas diretamente por Nosso Senhor Jesus Cristo. São diferentes de uma prece privada, como esta que agora passo a comentar.

A pergunta-chave

A Oração da Restauração contém uma indagação, que é o ponto chave dela: “Não tendes também Vós , Senhora, saudades deste tempo?”

É a impetração de um pecador que se encontra no início ou na plenitude de um processo de arrependimento, e por isso se lembra com nostalgia do tempo em que ele era bom. E se recorda do convívio espiritual que tinha com Nossa Senhora, através da graça. Essa lembrança o enche de contrição e de saudades, pois ele quereria reviver aquela felicidade matutina do começo de sua vida, e que depois não teve igual.

Argumento do faltoso em seu favor

Então ele deseja dar a Maria Santíssima um argumento que A leve a atender seu pedido. Porque, precisamente por ser pecador, sente a insuficiência de seus próprios meios. Sozinho, nada obtém, e só alcançará algo se os seus argumentos forem aceitos. Então, com ânimo redobrado, parte à procura de uma razão para apresentar, e diz a Nossa Senhora: “Se eu, que sou filho, tenho saudades de Vós, quanto mais Vós, que sois Mãe, deveríeis ter saudades de mim!”

É a essência da oração.

E tão grande é a certeza da reciprocidade de sentimentos, que o suplicante não espera resposta. Como se Nossa Senhora lhe tivesse dito: “Sim, meu filho, tenho saudades de ti”, ele tira a conclusão: “Vinde, pois, minha Mãe, e por amor ao que desabrochava em mim, restaurai-me!”

Quer dizer, “por amor ao bem que ia surgindo em mim (está subentendido: ‘que eu sufoquei’), restaurai-me.”

“Recomponde em mim o amor a Vós”. Significa que ele não sente tanto quanto deveria o amor a Nossa Senhora, merecedora de maior devoção sua. Então pede-Lhe recomponha na sua alma esse amor, como consequência das saudades que Ela, por sua vez, tem dele: “Se Vós, minha Mãe, lembrais de mim, restaurai-me!”

“Dai-me aquilo que perdi…”

“E fazei de mim a plena realização daquele filho sem mancha que eu teria sido, se não fosse tanta miséria”.

Ou seja: “Eu era um filho que Vós amáveis inteiramente, pois não tinha manchas. Nesse tempo, estabelecia convosco um convívio amado por mim e por Vós. Entretanto, agora apresento essas nódoas. Vós não podeis desejar tal relacionamento com esse homem manchado. Então, tirai-me as máculas! Se tendes de fato saudades de mim, compadecei-vos e dai-me aquilo que eu perdi!”

Esse é o pensamento contido na oração.

Trata-se, portanto, de uma prece estruturada com lógica, embora não o pareça à primeira vista, devido ao intenso sentimento que a repassa. Mas este e a lógica não se excluem. O reto sentimento é o fruto da lógica. E a oração de tal maneira é confiante que, depois disso, não faz insistência. Termina dando ao pecador a tranquila certeza de que será atendido.

Oração da confiança filial

Ela pode chamar-se a “oração da confiança filial”. E acontece que, quanto mais uma prece incute confiança, tanto mais ela tem condições de ser ouvida pelo Céu. E o pecador, de si, não tem nenhum título para ser acolhido. Porém, se confia, apesar dos seus pecados, sua atitude adquire mérito, pois é duro confiar quando se ofendeu a Deus. Esse ato difícil o faltoso realiza. E assim, essa oração não é a do pecador que se arrependeu e se converteu, mas daquele que se sabe um pulha, um nada, sem nenhuma qualidade que agrade a Nossa Senhora, senão sua confiança.

Diz ele a Maria Santíssima: “Vós me favorecestes e me amastes tanto outrora — e aí entra o lado bem brasileiro da oração —, não tendes saudades desse tempo? Minha Mãe, se tenho saudades, será que Vós não tendes também?”

Imagine-se uma mãe que expulsou seu filho de casa, por grave e justo motivo. Certo dia, andando pela rua, ela se encontra com o rapaz. Procura manter uma fisionomia severa, condigna com a situação imposta pelos fatos. Contudo, se o filho lhe disser: “Mamãe, mereci ser expulso, mas que saudades tenho de vossa casa!”, qual será o efeito disso no coração materno?

Por mais que ela deseje manter a cara amarrada e séria, a misericórdia fala mais alto e a inclina para a clemência. A fim de que esse movimento seja completo, o filho pergunta: “Será que vós, vendo minhas saudades, não tendes também saudades do meu afeto?”

Isso é muito psicológico e cogente. É a súplica esperançada do desesperado.

Triste situação do que retorna ao pecado

Para se compreender o que caracteriza essa oração, devemos considerar que o mundo de hoje naufragou num tal abismo de relaxamento moral que bem poucos são os que ingressam no nosso movimento sem nunca ter cometido um pecado grave. A maioria são dos que se converteram, abandonaram os maus hábitos e abraçaram as vias da virtude. Depois, infelizmente, pode suceder que algum recaia no pecado. Então, é uma miséria que se soma a outra. Na linguagem acerba e veraz de São Pedro, “o cão volta ao seu vômito”. Quer dizer, o indivíduo vomitou o pecado, mas, ao recair, procura alimentar-se do que lançou fora de si, à semelhança do procedimento de alguns cachorros.

Segundo o Evangelho, Nosso Senhor fala de um homem infestado pelo espírito maligno. Ele foi exorcizado, expulso o demônio que o atormentava, e sua alma se tornou como uma casa limpa. Entretanto, da narração se pode deduzir que ele pecou de novo, e sua casa, ou seja, sua alma, ficou ainda mais infestada que antes, atormentada por vários demônios. Nosso Senhor fala em sete, mas sabe-se que este é um número simbólico. Na realidade, sobreveio uma falange de espíritos imundos para povoarem a alma daquele que tinha sido exorcizado.

Mas, a oração apelando para a misericórdia de Nossa Senhora obtém a segunda desinfestação, que é definitiva.

Gancho que liberta o pecador do pecado

Então, a Oração da Restauração é composta tendo em vista essas verdades. É a prece de uma alma outrora possuidora de grande inocência, perdida por causa do pecado. Tendo se afastado de Nossa Senhora, ela se volta para a Santíssima Virgem e Lhe diz: “Ai, que saudades!”. E apesar do seu pecado, ela — a devedora! — cobra da Mãe de Deus a reciprocidade: “Tenho saudades. Não é natural que Vós tenhais também?!”

Essa pergunta, dirigida a uma mãe, produz o resultado que conhecemos.

Forma-se, assim, uma espécie de gancho no qual o pecador se agarra e sobe. É uma súplica muito adequada para uma época como a nossa, onde as ofensas a Deus são superabundantes, terríveis, e as infestações, medonhas. E para qualquer homem que alguma vez amou Nossa Senhora, essa prece ficará bem em seus lábios.

Se, porventura, alguém declarasse: “Mas, Dr. Plinio, nunca amei Nossa Senhora”, eu lhe recomendaria que dissesse à Virgem Bendita: “Minha Mãe, quem vos amou, pode rezar a Oração da Restauração. Muito pior é a situação em que me encontro, pois nunca vos amei, e não posso sequer dirigir-vos essa súplica. Hoje, porém, compreendo quão lastimável é o estado de um homem que nunca vos teve por Mãe. Não posso perguntar se tendes saudades de mim, porque nunca fui vosso! Mas, se tendes pena de quem foi vosso, quanto mais não deveis ter de quem nunca o foi?!

“Vendo minha situação, ó Mãe, não vos compadeceis? Vinde e salvai-me!”

Essa seria a Oração da Instauração que eu ensinaria a um filho nessas condições.

Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 82 – Janeiro de 2005

Vaso de Eleição

Destinada desde toda a eternidade para gerar o Filho do Altíssimo, Nossa Senhora é o Vaso de Eleição cuja alma foi adornada de uma coerência extraordinária, uma unidade admirável, sem hesitações nem dilacerações, repleta de fé sobrenatural, de certeza e convicção na existência de Deus, de firmeza nos mais altos como nos menores princípios.

Alma soberanamente límpida e lúcida, soberanamente elevada e grande, soberanamente séria e profunda, na qual se comprouve de modo perfeito o Senhor do Céu e da Terra.

Plinio Corrêa de Oliveira