O fim da Idade Média inglesa

As palavras de Dr. Plinio abaixo transcritas, que versam sobre um dos mais importantes momentos da história inglesa, guardam profunda relação com seus comentários estampados logo a seguir, na seção “Luzes da Civilização Cristã”.

 

Antes de Henrique VIII, a Inglaterra era um dos baluartes da Igreja Católica. Em toda a vida intelectual, artística, política e social, a influência dos princípios católicos era profunda. O número de Santos nascidos em território inglês foi tão grande que a Inglaterra chegou a chamar-se-á “Ilha dos Santos”.

Características particularmente salientes desse espírito católico eram exatamente o apego profundamente sincero do povo à autoridade do rei e, ao mesmo tempo, a altivez com que se insurgia contra todas as tentativas da Coroa, tendentes a transformar a monarquia em tirania.

A luta dos ingleses por suas liberdades traz o estigma característico do espírito católico, um grande respeito à autoridade e um grande amor à justiça. Amantes da autoridade, os ingleses, antes de Henrique VIII, nunca chegaram a tentar a destruição da monarquia, mesmo quando lutavam pela sua liberdade. Amigos da justiça, sempre reivindicaram seus direitos, sem que seu respeito à autoridade lhes tolhesse a liberdade de ação.

A história medieval inglesa não conhece a maior parte das abominações que comoveram a história da França, da Alemanha ou da Itália no mesmo período (que, seja dito de passagem, são insignificantes perto daquelas às quais assiste o mundo contemporâneo).

As “jacqueries” em que os camponeses queriam exterminar os senhores feudais, as revoluções em que os nobres queriam exterminar a realeza, e as lutas em que a realeza procurava aniquilar os direitos do
povo e da nobreza, tiveram na Inglaterra um aspecto imensamente mais benigno e mais razoável que em outras partes. O feudalismo inglês, modelo admirável de inteligência administrativa, foi quiçá o mais perfeito regime político da Europa medieval.

Nas lutas dos barões e do povo com os reis, as desinteligências existentes a respeito do governo da Inglaterra acabaram por se resolver definitivamente. E surgiu, com o bafejo da Igreja, a estrutura política mais firme que a Europa tenha conhecido até hoje.

O pecado do outrora “Defensor da Fé”

Uma crise de caráter íntimo e passional veio pôr em jogo a estabilidade desse admirável edifício, todo ele alicerçado e cimentado nos princípios católicos.

Antes de a atmosfera político-religiosa se deteriorar, o Rei Henrique VIII, fazendo-se intérprete do sentimento do povo inglês, escreveu uma obra de refutação do protestantismo, que começava a incendiar a Alemanha. O Papa, reconhecido pela intervenção do Rei, outorgou-lhe o honroso título de “Defensor da Fé”. E Lutero, indignado com Henrique VIII, o chamava “o mais sujo de todos os porcos”.

Mas acontece que Henrique VIII sentiu em si a mesma fraqueza que arrastou David ao pecado e Salomão à perdição.

Um romance — expressemo-nos assim, para não dizer algo pior — havia se formado na vida do Rei. Desejava ele anular seu casamento com a Rainha para contrair núpcias com outra dama de sua corte. Não conseguindo do Papa a anulação do casamento, ficou colocado em um cruel dilema: ou renunciar à Fé, ou renunciar ao “romance”. Renunciou à Fé. Fez-se protestante o “Defensor da Fé”! E sua união ilícita foi abençoada pelo mesmo protestantismo que o alcunhara de “o mais sujo de todos os porcos”.

O fim da monarquia orgânica

É interessante notar que Henrique VIII encontrou em São Tomás Mórus, seu primeiro Ministro, um adversário irreconciliável da anulação de seu casamento. Profundamente católico, Tomás Mórus recusou-se a abjurar a Fé. Foi condenado à morte. Sofreu o martírio e hoje brilha nos altares da Igreja Universal com a auréola da santidade (*).

Pode-se dizer que, com o desaparecimento de São Tomás Mórus, extinguiam-se também os últimos bruxuleares da Idade Média — moribunda naquele século XVI — e da monarquia orgânica. Esta, como se sabe, baseava-se no princípio da subsidiariedade, pelo qual cada grupo social deve tirar de si mesmo os recursos para prover suas necessidades e solucionar seus problemas. Conta com o auxílio do grupo superior apenas na medida em que, por sua própria natureza, não lhe for possível suprir suas carências nem resolver suas dificuldades. De maneira tal que exista uma espécie de autonomia de todos os corpos e instituições dentro do Estado.

Era o que se verificava na organização da Idade Média, em que cada unidade social dispunha de uma vitalidade pela qual produzia o seu próprio impulso. Assim, os feudos tinham leis, costumes e até idioma característicos. Os pequenos se encaixavam nos maiores, que só intervinham na existência dos primeiros para remediar as violações da Lei de Deus e dos princípios da civilização cristã, ou para sustentá-los quando as limitações de sua pequenez assim o exigissem. As cidades se desenvolviam com vida própria e, dentro delas, as corporações levavam também sua existência particular, com regras e usos peculiares. Acima de todos, o rei, ápice dessa estrutura de subsidiariedades. Era ele o mantenedor de todas as liberdades e autonomias, o coordenador e estimulante de todas as atividades gerais.

Entre estas autonomias, a maior, a mais notável, era a da Igreja Católica. E quando se trata da Igreja, não se pode falar em autonomia, mas sim em soberania. Ela é uma entidade soberana, tanto quanto o Estado, e, na sua esfera própria, não pode ser dominada nem dirigida por nenhum governante civil.

Quando, porém, teve início a decadência da Idade Média, os monarcas passaram a se fazer absolutos, tomando como modelo os imperadores romanos, verdadeiros déspotas da antiguidade. Levados por essa mania de absolutismo, começaram a eliminar todas as autonomias inferiores, e se jogaram, com particular empenho, sobre a liberdade da Igreja. Desejavam transformá-la num instrumento para o governo de seus respectivos países, embora num âmbito próprio à força espiritual e, portanto, independente das funções do poder temporal.

Um fato de graves conseqüências…

Ora, Henrique VIII, a pretexto de legitimar seu divórcio, foi mais longe. Ao determinar a ruptura da igreja anglicana com Roma, teve por objetivo adquirir o mais pleno domínio sobre toda a Inglaterra, tornando-se, ao mesmo tempo, chefe do Estado e do poder espiritual.

Para se ter ideia das conseqüências desse fato na antiga “Ilha dos Santos”, basta tomarmos em consideração duas coisas.

Em primeiro lugar, o minguamento das Ordens religiosas, que começaram a se esvaziar em virtude da supressão do celibato. O rei, agora líder da igreja anglicana, permitiu que monges e freiras abandonassem seus conventos para contrair matrimônio, munidos de uma pequena dotação que o próprio monarca lhes concedia, a fim de iniciarem “a nova vida”. Semelhante disposição concernia também os padres seculares.

Em segundo lugar, os bens da Igreja Católica foram confiscados pelo monarca e, na sua maior parte, distribuídos entre os nobres — de tal sorte que, ainda hoje, muitas famílias residem em antigas abadias, transformadas em habitações particulares.

Ora, na velha e boa Inglaterra, os pobres viviam às custas da Igreja, sendo por Ela muito bem sustentados. A partir do momento em que foram fechadas e espoliadas as instituições eclesiásticas, os mendigos se viram privados daqueles meios de subsistência. Passaram, então, a confluir para Londres, no intuito de angariar esmolas junto às classes mais abastadas da capital britânica. Resultado, surgiram os primeiros decretos na igreja anglicana de repressão à mendicância, um dos tristes frutos do desaparecimento das instituições de caridade.

… que perduram até hoje

Não foram essas as únicas conseqüências do que se passou na Inglaterra do século XVI. Outras, igualmente graves, surgiram com o passar do tempo, e algumas delas se fazem sentir até os dias de hoje (**).

Com efeito, as sementes de protestantismo que o anglicanismo adotou, produziram os frutos de anarquia que lhe são próprios. Destes foi um prelúdio a Revolução que destituiu e decapitou o rei Carlos I.

De lá para cá, lentamente, a desagregação das instituições políticas inglesas se tem acentuado mais e mais. A luta entre o fator “ordem católica” e o fator “anarquia protestante” na doutrina anglicana, se projetou no terreno político. As duas tendências se têm combatido num confronto de todos os momentos, e é por elas que se explica a grandeza e a decadência da monarquia britânica.

Grandeza, porque nenhum domínio temporal está, hoje em dia, colocado mais alto. Firmado em um princípio, o poder do monarca inglês não se alicerça sobre um entusiasmo de momento, mas sobre um profundo amor da multidão a uma dinastia ligada à história do País.

Decadência, porque este poder, de aparência tão magnífico, é apenas um vestígio do que ele foi outrora, uma reminiscência histórica, nos quadros constitucionais ingleses. Poucos são, atualmente, os homens que recebem tantas reverências e manifestações de respeito quanto a Rainha da Inglaterra. E, no entanto, poucos são os chefes de Estado mais privados de reais atribuições na vida política de seu país do que ela…

A poderosa intercessão de Maria

Nossa Senhora nos quer tão bem que tudo quanto Lhe peçamos, certamente obteremos. Por pouco que valham nossas orações, Maria Santíssima recolhe nossas preces e, com os méritos d’Ela, torna-as magníficas.

São Luís Grignion de Montfort faz uma comparação muito bonita. Ele fala de um camponês que queria oferecer uma homenagem a um rei, mas a única coisa que ele possuía era uma maçã. Então, ele procurou a mãe do rei e lhe disse:

— Senhora, esta maçã não vale nada, mas se vós a oferecerdes ao rei, ele sorrirá e a comerá. Eu vos peço, oferecei ao rei esta pobre maçã. Apresentada por vós, ele lhe dará valor e a aceitará.

A rainha o fez, e o rei ficou muito contente: comeu a maçã porque sua mãe lhe havia dado.

Assim são nossas orações; entretanto, devemos oferecê-las a Nossa Senhora, dizendo:

— Mãe nossa, nossas orações valem muito pouco, mas, por favor, oferecei-as a Deus, porque por vosso intermédio elas serão muito bem recebidas.

Por causa disso, deveremos sempre rezar com muita confiança de que seremos atendidos. A Mãe de Deus nos tirará de nossos erros, de nossas faltas e obterá perdão para nossas culpas.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 1/2/1991)

O perdão dos pecados e a misericórdia de Nossa Senhora

A gratuita misericórdia de Deus para conosco, dando-nos sua própria Mãe como intercessora, de um lado, e ­nossa completa ausência de méritos, de outro, fez de Dr. Plinio um convicto devoto da ­Santíssima Virgem.

 

Um membro de nosso Movimento escreveu-me, fazendo uma pergunta que pode ser assim resumida:

Certas graças determinam para quem as recebe uma espécie de Grand Retour1, como a que Nossa Senhora de Coromoto concedeu a um índio.

Para que Maria Santíssima dê a uma pessoa graça assim fulminante, é preciso que ela tenha pelo menos alguma boa disposição em sua alma, um primeiro desejo de sair do mal?

Ou pode-se admitir que a graça venha a tocar um indivíduo que está aprazivelmente comendo as bolotas dos porcos, sem nenhuma vontade de voltar para a casa paterna?

Gratuidade da parte de Deus e nossa completa ausência de méritos

Passo, então, a responder.

Segundo a doutrina católica, não existe a possibilidade de fazermos nenhum ato de vida espiritual sobrenatural que não tenha como ponto de partida uma graça a nós concedida gratuitamente. Quer dizer, o primeiro passo é sempre dado por Deus.

O ato é sobrenatural quando praticado tendo em vista a Fé, adesão da inteligência a algo que foi revelado.  Nenhum ato sobrenatural pode ser feito pelo homem antes que Deus lhe dê a possibilidade de vir a praticá-lo. De maneira que no início das nossas relações com Deus está a completa gratuidade da parte de Deus, e a total ausência de méritos de nossa parte.

A misericórdia gratuita de Deus para com o pecador

Isto se dá de modo evidente, por exemplo, com a criança que é batizada, a qual não tem o uso da razão e recebe, entretanto, desde logo, o dom infuso da Fé. 

E também com o pecador. Imaginemos dois pecadores. Um tem o resto de algo concedido por Deus e que ele não recusou inteiramente; o outro não possui nada, porque rejeitou tudo. Cada um deles, para dar um passo adiante na vida espiritual, precisa ter um perdão de Deus, uma graça. É claro que este perdão é maior para aquele que recusou tudo. Mas, em relação a ambos é preciso um perdão, um ato de misericórdia gratuita de Nosso Senhor.

Para Deus nada é impossível

Poder-se-ia apresentar a seguinte dúvida: Suponhamos um católico que apostatou da Fé e passou a ser satanista.

E um outro católico, que vive em estado habitual de pecado mortal, mas não apostatou, reza de vez em quando e assiste a Missa aos domingos. Embora esteja morto para a vida espiritual, porque se encontra em estado de pecado mortal, há nele uma série de disposições de alma que, em última análise, são restos do efeito da graça. Pergunta-se: a este pecador não adianta nada ter estes restos, para atrair a misericórdia de Deus?

É claro que adianta muito. Porque Deus, infinitamente santo e justo, sabe premiar até os pequenos restos de adesão que alguém dá a Ele. O melhor prêmio que Ele pode dar é exatamente chamar esta alma para junto de Si. De maneira que estes restos de virtude são uma razão que mais especialmente inclina a Deus a salvá-la. Mas é errado dizer que as outras almas de nenhum modo são tocadas por Deus, ou não podem ser salvas. Todo homem é salvável por Deus. E, portanto, é possível que qualquer pessoa, de um momento para outro, se converta.

Assim como esses restos de virtude, que podem existir numa pessoa em estado de pecado mortal, são razões para Deus se inclinar mais para ela, é verdade também que o negrume de pecado, no qual se encontra aquele que poderíamos chamar pecador total, afasta-o do Criador. E somente atos de misericórdia de Deus podem determinar sua conversão. É certo que não haverá conversão, quando se trata de formas de pecado onde existe um empedernimento, uma dureza tremenda, uma malícia intrínseca pavorosa.

Deus é onipotente, e por um ato livre de sua misericórdia, a um pecador que está em estado de pecado completo, omnímodo, Ele pode dar mais do que a outro, no qual há restos de virtude, e fazer do primeiro um grande santo.

Mas estas são operações de Deus excepcionalíssimas, com as quais, portanto, não se pode contar. Haveria até liberalismo em admitir que fossem fatos normais, correntes. É o que o bom senso indica e o convívio com as pessoas nos exprime.

Repito: pode acontecer, em rigor, que o Criador, a rogos de Nossa Senhora, ainda converta essa pessoa, por mais que sua atitude reflita obstinação, porque para Deus nada é impossível.

A Teologia é uma ciência feita de subtilezas. Existe a misericórdia especial e a excepcionalíssima, incomparável, como a que opera a conversão de um adorador do demônio.

Se estivermos unidos a Ela, tudo se arranjará

O caminho de nossa perseverança e de nossa salvação é o de sempre ter devoção a Nossa Senhora. Ela é a Arca da Aliança, a Porta do Céu, o Refúgio dos pecadores, a Consoladora dos aflitos, o Auxílio  dos cristãos. Se estivermos unidos à Mãe de Deus, tudo acaba se arranjando. Ela acaba nos dando graças incríveis, e as coisas vão para frente.

É terrível quando se inicia a decadência espiritual de uma pessoa. Alguém dirá: “Dr. Plinio, agora o senhor está me assustando, porque comecei a decair.” Digo-lhe: “Meu filho, pegue imediatamente na corda e recomece a subir.” O que faz um náufrago no meio das ondas, ao qual se lança uma corda, mas ele de repente percebe que está segurando-a com uma mão só? Vai começar a gritar e largar a corda? Não!  Deve agarrá-la com as duas mãos!

Rezar muito para ser fiel na hora da morte

Devemos sempre pedir a graça da perseverança final, de sermos fiéis no último momento de nossa vida. Porque é uma graça autônoma das outras. Por causa disto, na Ave-Maria se pede sempre: “…rogai por nós, pecadores, agora e na hora da nossa morte. Amém”. As batalhas, as tentações na hora da morte são tremendas; representam a última luta do homem. Se não rezarmos para sermos fiéis neste momento…

Uma pessoa expirou; seu corpo está estendido; ela não responde mais nada. Os médicos a abandonaram. Mas considera-se hoje possível que a alma esteja ligada ao corpo aproximadamente duas horas depois do que se convencionou chamar de morte. Esta alma está lúcida. O que lhe acontecerá neste combate, nesta situação na qual eventualmente ouça comentar em torno de si que ela está morta? E vem o demônio com uma tentação:

— Lembra-se, tal pecado?

— Ah, meu Deus, não o confessei!

— Você está só com medo do inferno; sem graça sacramental você não se salva. Agora, desespere. 

É uma mentira do demônio, porque se a pessoa fez bem a confissão e se esqueceu de acusar algum pecado, a graça do sacramento o perdoa. Na hora de nossa morte, lembrar-nos-emos bem disto?  É preciso, portanto, pedir muito a perseverança final.

E também a perseverança durante os acontecimentos previstos por Nossa Senhora em Fátima, a perseverança na eventualidade de grandes sofrimentos, como estar jogado num lugar qualquer, deitando sangue, todo ferido e não recebendo auxílio de ninguém. Para tudo isto é preciso pedir. E se a pessoa não pedir, não obtém. Esta é a razão pela qual se deve rezar e vigiar muito.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/2/1971)

PALCO DE GLÓRIAS

Do cimo do monte que lhe serve de pedestal, ele contempla, sobranceiro e elegante, a aldeia que o circunda, o vale e as vastidões de terra que se estendem à sua frente. Suas torres de variegadas proporções, em gracioso movimento para o céu, conferem ao seu todo o signo da leveza, enquanto seus vigorosos panos de muro, maciços, apenas atenuados por janelas e arcos ogivais, dão-lhe a nota da majestade grandiosa e forte.

Deixa-se ver entre folhagens ou brandamente refletido no espelho das águas que correm um pouco abaixo de seus alicerces. Numa e noutra visão, aparece recuado nos tempos de heroicas epopeias, de lutas e de glórias em que cravou raízes naquela paisagem espanhola. Apesar de reconstituído em sua maior parte no século XIX, o lindo Castelo de Segóvia conserva ainda a atmosfera dos seus dias de batalhas e triunfos. Ao visitá-lo, sem muito esforço nossa imaginação viaja pela história, e nos achamos na presença de um rei santo, São Fernando III, que o utilizou como uma espécie de posto avançado em seus vitoriosos combates.

Podemos figurá-lo ali, na sala do trono, ou na sala de estar, — com suas paredes de pedras rudes e tetos ricamente lavorados — séria, solene, bonita, onde o soberano vivia na intimidade com a rainha. A distração mais repousante de ambos era se dirigirem para junto de alguma das largas aberturas em ogiva, através das quais perlustravam os campos e as pradarias que se desdobravam além. Então, o casal régio sentado em cadeiras de madeira com espaldar alto, com almofadas de um conforto discutível, olhava para aquela imensidão na qual nada se erguia, a não ser uma pequena fortificação de Templários, distante algumas centenas de metros do castelo. Observar a movimentação dos cavaleiros que entravam e saíam de seu reduto, constituía, assim, um motivo de entretenimento para o rei e sua esposa.

São Fernando, porém, sabia que os momentos de lazer não deviam ser o preponderante da existência para a qual fora suscitado por Deus. Sua missão providencial exigia dele a disposição para o sacrifício e para a luta. E foi esse mesmo Castelo de Segóvia o palco de um dos episódios mais eloquentes da gesta que o santo monarca empreendeu de forma magnífica.

Ainda hoje é mostrado aos visitantes o lugar em que São Fernando almoçava, quando lhe foi avisado que Sevilha, a metrópole dos invasores, a cidade cuja conquista proporcionaria o êxito em todas as demais batalhas, estava prestes a ceder diante das investidas das tropas espanholas. E o mensageiro lhe dirigiu o apelo: “Vinde, Majestade, auxiliar os vossos, e hoje à noite entrareis em Sevilha!”

Mais não era preciso para aquele coração de herói e de santo. No mesmo instante o Rei interrompeu a refeição, mandou preparar suas armas e seu cavalo, e se dirigiu à brida solta até a cidade sitiada, onde já seus intrépidos soldados empreendiam os assaltos finais. Ao verem o soberano que se aproximava, os inimigos compreenderam que nada mais lhes restava senão se render e entregar a praça. Naquela noite, São Fernando se lembraria das torres e grossas paredes do Castelo de Segóvia sem nostalgias nem tristezas. Ele já dormia em Sevilha, olhando para o próximo campo de batalha. Pois assim fazem os Santos. Não contemporizam, não deixam para daqui a pouco, e, quando é necessário, interrompem a refeição, sem consumi-la até o último bocado, nem beber o último trago de vinho. Se chegou o momento do combate, que venham as armas e o cavalo, façamos uma jaculatória a Nossa Senhora, um Nome do Pai, e corramos… de encontro ao quê?

Ao que poderia ser para São Fernando a morte, ou a vitória e a glória… Pouco lhe importava que fosse a vitória, a glória ou a morte. Importava, sim, que Maria Santíssima triunfasse e que a Espanha novamente Lhe pertencesse.

Conhecimento perfeito da grandeza de Deus

Qual era a atitude de Nossa Senhora perante seu Divino Filho?

Antes de tudo, era de uma grande estima e de uma grande consideração das grandezas d’Ele.

Apesar de Nossa Senhora ser Mãe de Jesus Cristo e, portanto, ter a natural autoridade que toda mãe tem sobre seu filho, nenhuma criatura conheceu tão bem quanto Ela a grandeza de Nosso Senhor Jesus Cristo; nenhum intelecto criado pôde sondar tão profundamente essa grandeza e, por isso, nenhum soube admirá-Lo tão completamente.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 21/8/1969)

O Magnificat, hino de sabedoria, humildade e grandeza

Único cântico que se sabe proferido por Nossa Senhora em sua vida terrena, o “Magnificat” despertava na alma de Dr. Plinio enlevadas considerações que ele, em mais de uma ocasião, comprouve-se em transmitir a seus jovens discípulos. Como essas, que abaixo transcrevemos.

 

Entoado por Nossa Senhora no encontro com Santa Isabel, o “Magnificat” é um maravilhoso hino inspirado pelo Altíssimo, é Deus cantando sua própria glória pelos lábios da mais amada das suas filhas. É, também, uma linda mensagem, coerente, lógica e séria, que Ele transmitiu a todos os homens de todos os séculos, pela voz virginal de Maria.

O cântico se inicia com a palavra “Magnificat” do latim “magnus”, isto é, grande para enaltecer Aquele que é a Grandeza personificada, reconhecendo que Deus merece este superlativo de louvor e de honra na sua glória extrínseca, passível de crescimento, por haver realizado n’Ela, Virgem bendita, o cumprimento da maior e mais alvissareira promessa divina feita à humanidade: a Encarnação do Verbo.

A exultação em Deus, seu Salvador

Então a alma d’Ela se apressa em extravasar o seu sentimento de profunda gratidão, proclamando como o Senhor assim se revelava o magno por excelência.

Em seguida, vem a alegria: “Et exsultavit spiritus meus in Deo salutari meo” (“E o meu espírito exulta!”).

Exultar é sentir um júbilo intenso, e não uma qualquer satisfação, como a que poderia experimentar alguém se soubesse que os seus investimentos renderam um pouco além do esperado. Esta seria uma alegria pequena, perto daquela que se exprime pela palavra “exultação”.

Por isso Nossa Senhora a emprega, para significar como seu espírito transbordou de gáudio em relação a Deus, o seu magnífico Salvador.

Essa felicidade se mostra tanto mais intensa quanto, conforme o pensamento que se completa no versículo seguinte, Ela considera a sua pequenez e vê como Deus a salvou de modo extraordinário, super-excelente, não só fazendo d’Ela a Mãe do Verbo Encarnado, mas dispondo que Ela tivesse em toda a existência de Nosso Senhor Jesus Cristo o papel admirável que sabemos.

Legítima alegria por ter sido engrandecida

Depois de afirmar a sua exultação, a Santíssima Virgem manifesta então o motivo dessa imensa alegria: “Quia respexit humilitatem ancillae suae – porque Deus olhou para a humildade da sua Serva”. Em conseqüência dessa atenção do Senhor para com Ela, “ecce enim ex hoc beatam me dicent omnes generationes”, eis que “todas as gerações”, isto é, todos os homens até o fim do mundo, vão por sua vez enaltecê-La, chamando-A “bem-aventurada”.

“Quia fecit mihi magna qui potens est” – porque me fez grande Aquele que é poderoso”. Percebe-se aqui, mais uma vez, o gáudio de Maria por ter sido objeto de um especial desígnio do Onipotente: Ela, tão humilde, tornou-se grande pela força d’Ele.

Há, nessa passagem, um interessante ensinamento que deve ser considerado.

Alegrando-se com a grandeza divina, Nossa Senhora ao mesmo tempo se alegra com o fato de ter sido também engrandecida por uma condescendência d’Ele, e sabe que essa sua magnitude Lhe valeria o louvor e a devoção das gerações vindouras. É uma glória única, que a cobre de felicidade, e pela qual, cheia de reconhecimento, agradece a Deus.

Ora, essa atitude de Nossa Senhora aceitando, auferindo e amando a própria excelência, demonstra como é legítimo nos alegrarmos com a grandeza que Deus eventualmente nos conceda. Desde que, a exemplo de Maria, esse júbilo esteja alicerçado no amor a Ele, compreendendo que essa glória estabelece uma relação mais íntima entre nós e o Criador.

Eis outra importante lição a ser colhida do “Magnificat”.

O temor se divide em servil e reverencial. O temor servil é aquele que tem, por exemplo, um escravo ao fazer a vontade de seu dono pelo receio de sofrer duros castigos se não obedecer. O temor reverencial é aquele que alguém demonstra em relação a outrem, não por medo das penalidades que lhe possa infligir, mas por respeito e veneração pela superioridade dele, por não querer ultrajá-lo nem violar a obediência que deve a ele.

Um exemplo maravilhoso de temor reverencial encontramos nas ardorosas palavras que Santa Teresa de Jesus dirige a Nosso Senhor: “Ainda que não houvesse Céu, eu vos amara; ainda que não houvesse inferno, eu vos temera”. Quer dizer, ainda que Deus não lançasse à geena aqueles que se revoltam contra Ele, por temor de Deus experimentavam, antes de serem tocados pela graça e se converterem.

Pode-se supor, por exemplo, que São Paulo na via de Damasco não tivesse temor de Deus. Mas, atingido por um raio, ele caiu do cavalo, perdeu a visão, e logo ouviu a voz de Nosso Senhor que o interpelava. Quando se levantou, era outro homem, tornando-se o grande Apóstolo dos gentios. Era uma extraordinária ação da misericórdia divina muito provavelmente a rogos de Maria estendendo-se sobra uma alma que até então não temia a Deus.

Queda dos soberbos e exaltação dos humildes

“Fecit potentiam in brachio suo, dispersit superbos mente cordis suis – Manifestou o poder do seu braço, e dissipou aqueles que se orgulhavam nos pensamentos do seu coração”.

“Et sanctum nomen eius – E o Seu Nome é Santo”. Quer dizer, “Deus agiu assim para comigo, e procedeu santamente”. Essa fabulosa obra que o Senhor realizava na sua serva, vinha marcada pela infinita perfeição com que Ele modela tudo quanto sai de suas mãos onipotentes.

Misericórdia para os que temem a Deus

Após ter manifestado de tal maneira a grandeza de Deus e a sua própria, Nossa Senhora evoca o aspecto de bondade: “Et misericordia eius a progenie in progenies, timentibus eum – e a misericórdia d’Ele se estende de geração em geração, sobre aqueles que O temem”.

Significa que o fato de Deus A ter feito tão grande redunda num benefício e numa obra de misericórdia de que se aproveitarão todos os homens ser Ele quem é e pelos infinitos títulos que Ele possui acima de nós, temeríamos não fazer a vontade d’Ele. É essa a forma altíssima e nobilíssima do temor reverencial.

Então, aos que amam a Deus com um amor tal que até O temem não apenas por causa do inferno, mas sobretudo por não querer desagradá-Lo na sua infinita santidade -, para estes se abre a inesgotável misericórdia de Deus: “et misericordia eius a progenie in progenies, timentibus eum”. Cumpre salientar que, muitas vezes, a bondade divina não se prende a essa restrição, superando-se em requintes de solicitude até mesmo para com homens que pouco ou nenhum

Entendamos o que significa “manifestar o poder de seu braço”. Trata-se de uma metáfora, pois Deus, puro espírito, não possui braço. Este, porém, é no homem o membro pelo qual ele mostra a sua força e executa os decretos de sua inteligência e de sua vontade. Então, ao se referir ao “braço de Deus”, Nossa Senhora nos faz ver como Ele age energicamente em relação aos soberbos e orgulhosos, àqueles que se fecham para a ação da graça e não O temem nem O amam nos seus corações. Para com esses, Deus manifesta o poder de seu braço.

O pensamento se completa no versículo seguinte: “Deposuit potentes de sede, et exaltavit humiles – Depôs de seus tronos os poderosos, e exaltou os humildes”.

Por meio da Encarnação do Verbo, Deus quebrou o poder com que o demônio e seus sequazes neste mundo atormentavam os bons. Então, depôs aqueles de seus tronos, e exaltou a estes que eram perseguidos.

Alguém poderia objetar: “Mas, Dr. Plinio, não foi o que aconteceu. Deu-se o contrário! Anás, Caifás, Pilatos e congêneres, todos se achavam nos seus tronos, perseguiram e mataram Nosso Senhor!”

É verdade. Mas essa história não está narrada até o fim. Porque depois de Jesus ter sido morto, aconteceu precisamente o que aqueles poderosos queriam evitar: Ele ressuscitou, triunfando sobre a morte e sobre todos

os seus algozes. Com Ele, triunfava a Santa Igreja, venciam os Apóstolos e Nossa Senhora, os humildes até en-

tão desprezados. E para todo o sempre, serão estes glorificados e exaltados, enquanto Anás, Caifás e Pilatos serão mencionados com vitupério e horror. Então se comprovou a veracidade do dito: “deposuit potentes de sedes, et exaltavit humiles”.

Essa ideia ainda prevalece na seqüência do cântico: “Esurientes implevit bonis, et divites dimisit inanes – Cumulou de bens os famintos, e despediu os ricos com as mãos vazias”.

Nossa Senhora não pretende fazer aqui uma alusão aos recursos materiais ou financeiros. Ela se refere, antes de tudo, aos que se acham na carência de bens espirituais, aos indigentes das dádivas celestiais. A esses pobres de espírito que, humildemente, suplicam essas graças, Deus os atende na abundância infinita de sua misericórdia. Pelo contrário, aos “ricos”, àqueles que se julgam inteiramente satisfeitos no seu orgulho, Deus os despede de mãos vazias, isto é, sem torná-los partícipes do tesouro de seus dons sobrenaturais.

Em Maria, cumpre-se a promessa feita a Abraão

Por fim, Nossa Senhora volta à ideia central que inspira esse hino maravilhoso: “Suscepit Israel puerum suum: recordatus misericordiae suae – Tomou cuidado de Israel, seu servo, lembrado da sua misercórdia”.

Quer dizer, o Povo Eleito receberia em breve o Messias há milênios prometido, a Quem Deus enviaria ao mundo, recordando que

sua misericórdia assim havia disposto. Daí a conclusão: “Sicut locutus est ad patres nostros, Abraham et semini eius in saecula – Conforme tinha dito a nossos pais, a Abraão e à sua posteridade para sempre”.

A promessa feita a Abraão, fundador da raça hebraica, e aos descendentes dele ao longo dos séculos, de que o Salvador nasceria de sua progênie, acabava de ser cumprida. Nossa Senhora já trazia em seu claustro materno o Esperado das nações. Ela, uma filha de Abraão, daria à luz o Filho de Deus.

E assim o “Magnificat”, esta joia inapreciável, este maravilhoso cântico de sabedoria, humildade e grandeza, muito harmoniosamente se encerra pensando na Encarnação do Verbo, como o fizera na primeira estrofe.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

Divino artifício de bondade

Ao destinar, desde toda a eternidade, a Virgem Santíssima para Mãe d’Ele e de todos os homens, Nosso Senhor como que usou de um sublime artifício para aumentar ainda mais, se fosse possível, a sua infinita misericórdia em relação a nós.

Com efeito, existindo n’Ele um equilíbrio absoluto entre a bondade e a justiça, Jesus gostaria entretanto de levar mais longe aquela do que leva esta. Então o fez através de Maria, cujo amor materno é um extremo e um requinte insuperáveis do próprio amor de Deus para com seus filhos, e cuja benevolência ultrapassa todos os auges de medida que o coração humano possa conceber.

Tesouro da verdadeira Igreja

Célebre por sua imponente beleza e extraordinário significado para a piedade católica, a Basílica de Santo Antônio de Pádua reluz como precioso tesouro da arquitetura engendrada pela Igreja.

Ao considerá-la, vem-me ao espírito, uma vez mais, a comparação com o perpétuo objeto de meu enlevo, de meu encanto e entusiasmo: o mar. Nele, como já tive ocasião de dizer, sempre me agradou contemplar as inúmeras formas de pulcritude com que Deus o criou, os diversos estados em que ele se apresenta a nós, desde a extrema calma até  a extrema agitação, com todas as gamas intermediárias. Ora é o ordenado das grandes ondas que avançam em ofensiva para a terra, sem tumulto nem descabelo, como um  ataque em regra de uma cavalaria nobre. Por vezes as ondas nem sequer arrebentam, apenas se avolumam e se estendem; outras, pelo contrário, estouram na praia ou nos  rochedos, e há um gáudio de gotas pelo ar, bailando alegremente, como se executassem uma lendária dança da vitória. Ora me compraz ver o mar inteiramente calmo, quase  imóvel.

Dir-se-ia que ele se encontra de tal maneira absorto na contemplação do céu, para o qual olha a todo momento, que nem pensa em si mesmo… De repente, a partir de um  ponto qualquer daquela imensidão líquida, algo começa a se mover. Dali a pouco é um vagalhão, é um tumulto aquático, e é outro assalto contra a terra. Dessa vez, porém, as  ondas não se aproximam em fileiras ordenadas, mas parecem vir se empurrando e se acotovelando, cada qual no desejo de tomar a dianteira e conquistar a terra mais  depressa. É a beleza da variedade, do inesperado, do quase susto, do imprevisto, que tem seu encanto próprio. E é essa sucessão de aspectos que torna o mar tão entretido.

Ora, a arquitetura, e especialmente a arquitetura religiosa, pode ter uma variedade de feitios análoga aos movimentos do mar. Será, por exemplo, a calma e a estabilidade de  uma Catedral de Notre-Dame de Paris: irrepreensível, ordenada, perfeita, lindíssima, cheia de lógica, de poesia e candura.

Outras vezes, a arquitetura borbulha e apresenta aspectos meio inesperadas. E é o próprio movimento da alma religiosa, nos seus entusiasmos, nos seus êxtases, nos seus  impulsos, na sua generosidade, nos lances ‘a la’ Santa Teresa de Jesus, ‘a la’ Santo Inácio de Loyola, que nos deixam desconcertados diante de sua grandeza. E isso é o que se  nota no jogo das várias cúpulas e minaretes da Basílica de Santa Antônio de Pádua, borbulhantes como o movediço das ondas do mar.

Olhando-se para o teto da igreja quase se esquece do corpo do edifício. Tem-se a impressão de que todo o resto existe como uma bandeja para carregar bem alto o  movimento musical das coberturas. E assim como podemos imaginar uma melodia num “crescendo” em que as notas se vão sucedendo alegremente umas às outras, assim nos parece que esses minaretes e cúpulas estão jubilosos à espera da hora em que sejam separados da base para poderem subir em direção ao céu. E que essa ansiedade do maravilhoso, uma ansiedade festiva, feliz, é apenas contida por uma corda que mão caridosa a qualquer instante vai cortar.

Noutra analogia com o mar, do mesmo modo como este é também rico e esplendoroso nos mistérios de suas profundezas, igualmente o interior da Basílica de Pádua é um imenso escrínio de tesouros espirituais e artísticos. É, sobretudo, o ambiente criado pela presença do Santíssimo Sacramento, pelas relíquias do grande Santo franciscano, pelas graças de que elas são veículo e que impregnam todo o recinto da igreja, estimulando e condicionando a piedade dos fiéis que ali rezam e se recolhem com edificante  devoção.

Além disso, a profusão de maravilhas que ali deixou a arte cristã, entre abóbadas, colunas e capitéis esplendidamente trabalhados; capelas, altares e murais em que se pode admirar o talento de mestres imortais, e um grande número de pinturas e imagens que datam de diferentes épocas da Cristandade, fazem com que a Basílica pareça um compêndio da história da piedade católica.

Todos esses fatores — beleza arquitetônica, presença do Coração Eucarístico de Jesus, relíquias de Santo Antônio de Pádua, imagens especialmente abençoadas, fiéis que recebem graças e as deixam transpirar de algum modo na sua maneira de ser, de andar e de rezar — concorrem, numa igreja como a Basílica de Pádua, com particular intensidade para conferir uma impressão única de piedade autêntica, e uma sensação de presença verdadeira da verdadeira Igreja, a Esposa Mística de nosso Divino Redentor.

Palavra confortadora

Assim como São João Batista estremeceu de gáudio no seio de sua mãe ao ouvir a voz de Maria Santíssima, devemos pedir a Nossa Senhora que nos obtenha a graça de igualmente exultarmos ao som da voz d’Ela ressoando em nossos corações. Que, em meio aos sofrimentos e aflições a que todos estamos sujeitos nesta vida, a Mãe de Misericórdia nos diga uma dessas palavras interiores pela qual estremeçamos de santa alegria, e nos dê coragem e ânimo para carregarmos todas as nossas cruzes até o fim da vida.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 2/7/1963)

A bela devoção das três Ave Marias

Entre as devoções a Nossa Senhora, existe uma muito especial: rezar todos os dias as três Ave Marias.

Mas, onde nasce esta devoção?

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Sua origem data do Século XIII e está ligada a Santa Matilde de Hackeborn, uma freira alemã beneditina, a quem Nossa Senhora revela um modo de elevar uma ação de graças à Santíssima Trinidade pelos privilégios concedidos à Virgem Maria.

Santa Matilde nasceu em 1241 em uma nobre família. Pensando em sua morte suplicou com grande fervor “a Mãe de Deus que a assistisse nos últimos momentos de sua vida.

Ela ouviu que Nossa Senhora lhe dizia:

“Sim, eu farei o que pedes, mas quero que, de sua parte, me rezes todos os dias três Ave Marias.

A primeira, pedindo que assim como Deus Pai me elevou a um trono de Gloria sem igual, fazendo-me a mais poderosa no Céu e na Terra, assim também eu te assista na Terra para fortificar-te e afastar de ti toda potestade inimiga.

Pela segunda Ave Maria me pedirás que assim como o Filho de Deus me cumulou de sabedoria, a tal extremo que tenho mais conhecimento da Santíssima Trindade que todo os Santos, assim te assista eu no transe da morte para encher tua alma das luzes da Fé e da verdadeira Sabedoria, para que não a escureçam as trevas do erro e ignorância.

Pela terceira, me pediras que assim como o Espírito Santo me encheu das doçuras de seu amor, e me fez tão amável que depois de Deus sou a mais doce e misericordiosa, assim eu te assista na hora da morte enchendo tua alma de tal suavidade de amor divino, que toda pena e amargura da morte transforme-se para ti em delícias” mude para te muerte se cambie para ti em delicias”.

Esta não seria a única revelação que teria uma santa em relação à devoção das três Ave Marias.

Outra religiosa contemporânea de Matilde, Santa Gertrudes, conhecida como “A Grande”, teve uma visão que confirmaria a outra revelação.

Assim aconteceu: eram as vésperas da festa da Anunciação, e ao cantar a Ave Maria, Gertrudes viu, de repente, como emergiam do Coração do Pai, do Filho e o Espírito Santo três fontes de água que penetravam no Coração de Maria Santíssima.

Neste instante, ela ouviu uma voz que lhe disse:

“Depois do Poder do Pai, a Sabedoria do Filho e a ternura Misericordiosa do Espírito Santo, nada se compara ao Poder, Sabedoria e Ternura Misericordiosa de Maria”.

A Santa Matilde a Virgem prometeu que quem rezar diariamente as três Ave Marias, receberá seu auxílio durante a vida e uma especial assistência no momento de sua morte, apresentando-se a Virgem com um brilho e uma beleza tal que só de vê-la receberá o consolo e as alegrias do Céu.

Além destas Santas, outros santos foram especiais difusores desta devoção, como Santo Afonso Maria de Ligório, que aconselhava com frequência esta bela prática de piedade; ou São João Bosco, que a recomendava aos jovens.

São Pio de Pietrelcina disse também que muitos se converteram só por praticar essa devoção.

Modo de rezar as três Ave Marias:

-Maria minha Mãe; livra-me de cair em pecado mortal. Pelo poder que lhe concedeu o Pai Eterno.

Ave Maria…

-Pela sabedoria que lhe concedeu o Filho.

Ave Maria…

-Pelo Amor que lhe concedeu o Espírito Santo.

Ave Maria…

Termina-se a oração com um Gloria… e a jaculatória: “Por Vossa Conceição Imaculada, ó Maria, purificai meu corpo e santificai minha alma”

(Com as indulgências outorgadas por São Pio X). (JSG)