“Carregou nossos pecados e suportou nossas dores”

Os comovedores acentos de um cântico que recorda as dores de Nosso Senhor Jesus Cristo durante sua Paixão, oferece a Dr. Plinio a oportunidade de meditar na infinita misericórdia do Divino Redentor ao abraçar a cruz e se entregar à morte para redimir os homens e lhes abrir as portas do Céu.

Entre os belos e tocantes cânticos que a piedade católica engendrou para honrar a Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo está o “Ecce vidimus”, que evoca os atrozes desfiguramentos que as injúrias físicas provocaram na pessoa do Divino Redentor.

“Eis que O vimos sem formosura”

O texto dessa música, retirado do Profeta Isaías (53, 4-5), nos sugere a ideia desses padecimentos, e assim diz: Eis que O vimos disforme e sem formosura. Ele está irreconhecível. Carregou nossos pecados e sofreu por nós. Está ferido por causa de nossas iniquidades. Somos curados em virtude de suas chagas. Na verdade, Ele carregou nossas fraquezas e suportou nossas dores.

Trecho em extremo significativo, pois é uma apóstrofe ao ilogismo e à contradição do que se abateu sobre Nosso Senhor.

De fato, não podemos sequer imaginar a extraordinária formosura do Filho de Deus, toda a beleza do seu corpo e de sua face sagrada. Sem dúvida, o conjunto dos princípios da estética do universo estavam condensados no semblante de Jesus. E quem fala da face, deve pensar no olhar. O olhar divino d’Ele, espelho da alma, certamente ainda mais esplendorosa que o corpo. Só esse olhar seria suficiente para encantar os anjos por toda a eternidade.

Além disso, devemos pensar em Nosso Senhor caminhando, com movimentos repassados de graciosidade, nobreza no andar, distinção no porte, sobriedade de maneiras, e sua infinita bondade se irradiando a todo momento de modo incomparável.

Que dizer então da voz do Divino Mestre dirigindo-se ao povo que O seguia? Quem pode conceber a variação dos timbres, a capacidade de expressão e de santa sedução que Ele imprimia em suas frases? Terá sido o som mais cativante que foi dado ao homem ouvir, desde o começo até o fim do mundo.

Ora, diz o cântico, este que reunia em si toda a beleza do universo foi visto passar carregando a cruz, palmilhando a via dos tormentos, disforme e sem formosura. Todo aquele esplendor fenecera; seus traços maravilhosos perderam a forma. Tudo desaparecera por força dos maus tratos, dos flagelos, dos açoites que Lhe arrancaram pedaços da carne e espalharam seu sangue por todos os lados. Na aparência externa de Nosso Senhor, tudo deixara de ser atraente. Ele não era senão uma imensa chaga sanguinolenta que passava, levando a cruz às costas.

O mais formoso dos homens com uma aparência de feiúra: que insondável paradoxo!

Irreconhecível porque carregou nossos pecados

À vista desse fato inaudito, a letra acrescenta, com acentos de profunda ternura: Ele está irreconhecível. Carregou nossos pecados e sofreu por nós.

Ou seja, nada mais lembra a figura do suave Jesus, Filho de Maria. Ele todo é sangue, ferida, irreconhecível porque pagou pelos nossos pecados.

Não carregava os pecados d’Ele, nem sofria por suas faltas. Verbo Encarnado, Jesus era a própria virtude, não tinha pecados a expiar. Essa grande vítima, acabrunhada sob o peso de tantos castigos, era a inocência infinita. E Ele padeceu nessa proporção desmesurada por causa da enormidade dos nossos pecados. Pecamos tanto e de tal maneira, que o Filho de Deus aceitou de oferecer ao Pai Eterno essa incalculável reparação: transformar-se nessa chaga trágica e pavorosa, acumulando outros sofrimentos até chegar ao alto do Calvário e ali, crucificado, pronunciar o “consummatum est”.

Cumpre a cada um de nós, redimidos por este holocausto, lembrar-se de que foi o pecado a causa de todo esse horror padecido por Jesus. Foram minhas fraquezas e minha maldade que Ele carregou vinte séculos antes de eu nascer. Naqueles dolorosos momentos de sua Paixão, Nosso Senhor pensou em mim, conheceu minha iniquidade, os lados miseráveis de meu caráter, e quis sofrer para me resgatar, pagar o preço de minhas culpas e abrir para mim as portas do Céu.

Essa verdade deve me tanger de gratidão. Deve, sobretudo, varar-me de lado a lado de compunção e de tristeza o pensar que Quem carregou os meus pecados era a pureza, a santidade, o sacrossanto por excelência, o Filho de Deus e de Maria Santíssima.

Não há, na capacidade humana, compunção nem intensidade de adoração, de reconhecimento e de reparação suficientes para agradecer o infinito benefício que recebemos do nosso Salvador.

O remédio das misérias humanas

Com efeito, prossegue o cântico: somos curados em virtude de suas chagas. Ou seja, todo esse sacrifício não foi em vão. Em cada chaga, em cada gota de sangue vertida por Nosso Senhor, estava a cura de nossos males e de nossas misérias morais. Contemplemos o corpo desfigurado e machucado do Divino Mestre: esta ferida, aquela outra, curaram minha alma. Se nesta existe algo de bom, é por causa daqueles ferimentos sagrados que vejo passar diante de mim.

Na verdade, Ele carregou nossas fraquezas e suportou nossas dores.

Quer dizer, o peso daquela cruz é o fardo das minhas fraquezas. Jesus as carregou. As dores que eu, por justiça, deveria sofrer, Ele, o inocente, padeceu-as por mim.

Mais uma vez, deve resultar dessa consideração um sentimento de gratidão indizível a Nosso Senhor, de reconhecimento a Nossa Senhora porque Ela consentiu no holocausto de seu Divino Filho por nós. Além disso, uma atitude de completa confiança em relação a Eles: pois quem foi resgatado por preço tão imenso, por pouco que confie no valor desse preço, por menos que peça seja aquele sangue derramado sobre nós para nos regenerar, este pode esperar sua salvação. Pode ter a certeza de que, mais dia menos dia, uma moção da graça, um movimento interior o reconduzirá ao caminho da virtude e do Céu.

Súplicas em nome das santas chagas de Jesus

Há, nesse sentido, duas lindas súplicas que exprimem as verdades acima consideradas. Uma: “Perdão e misericórdia meu Jesus, pelos méritos de vossas santas chagas”.

Quer dizer, “não mereço perdão nem misericórdia, mas vossas chagas, Redentor Divino, têm mérito infinito e foram oferecidas ao Altíssimo em meu favor. Constituem meu tesouro infinitamente grande. Peço-vos, pelos méritos de vossas santas chagas, perdão e misericórdia para mim”.

É uma súplica que dificilmente não tocará a bondade infinita de Nosso Senhor, pois invoca as próprias chagas com as quais Ele curou nossas almas, alcançou-nos graças para corrigirmos nossos defeitos e crescer no amor que devemos ter a Ele.

Outra jaculatória muito substanciosa e bela, despertada pela consideração das chagas de Nosso Senhor, é esta: “Padre Eterno, eu vos ofereço as santas chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo para curar a minha alma”.

Ou seja, eu, diante do Padre Eterno, posso ter defeitos e pecados, mas apresento a Ele as santas feridas de Nosso Senhor Jesus Cristo a fim de obter de sua infinita misericórdia o remédio para as minhas doenças de alma.

Pedir por meio de Nossa Senhora, “dona” das chagas de seu Filho

A essas considerações devemos acrescentar um ponto muito importante: não convém e nem será próprio do devoto de Maria Santíssima, meditar nos lances da Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, abstraindo da figura co-redentora de sua Mãe.

E ao invocarmos as chagas do Salvador como a cura de nossos pecados, é preciso lembrar que tal impetração passa pelos rogos da Medianeira de todas as graças. Dispensadora, por vontade divina, de todos os dons celestiais, os méritos dessas chagas como que foram todos entregues a Ela, para deles dispor em benefício dos homens. Em certo sentido, Ela é, pois, a dona dessas chagas. Aliás, as imagens de Nossa Senhora da Piedade — inclusive a famosa Pietà de Michelangelo —, que representam Jesus morto no colo de Maria, exprimem muito bem a ideia desse augusto senhorio: a Mãe é a dona daquele cadáver e, portanto, de todos os méritos infinitos que aquele Homem inanimado em seus braços conquistou para nós. Tudo nos vem através d’Ela, e por mais extraordinário que seja o valor dessas chagas, sem a intercessão de Maria nada obteremos.

Peçamos, então, o patrocínio de Nossa Senhora das Dores, a invocação propícia para essas súplicas. É a figura da Santíssima Virgem que traz seu próprio coração chagado e ferido pela consideração dos padecimentos do Filho. Nunca a alma de uma mãe carregou chaga semelhante à que feriu o coração de Maria, tomado por imensurável tristeza durante a Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Esse Imaculado Coração transpassado pela espada da dor é a porta por onde atingimos as chagas de Jesus. Rezemos a Nossa Senhora, do fundo de nossa alma, confiantes e humildes, na certeza de que Ela alcançará em nosso favor a aplicação dos méritos infinitos dos sofrimentos redentores de seu Divino Filho.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 22/3/1967)

Nossa Senhora da Soledade

O que é a soledade de Nossa Senhora? É o período da vida de Maria Santíssima que vai desde o “Consummatum est” até o instante em que Ela tomou conhecimento da Ressurreição. Ali esteve Ela inteiramente só!

Peçam a Nossa Senhora da Soledade que os faça compreender a sublimidade e a elevação de espírito da soledade d’Ela e tomar a resolução de aceitarem a soledade sem amargura, sem rancor, sem pena de si mesmos, com naturalidade, como um herói aceita a luta e a morte.

Não sejam desses isolados amargos, ácidos, orgulhosos, que se julgam os incompreendidos do gênero humano. Não! Sejam naturais, bons, alegres.

É esse o holocausto, o sacrifício que temos de fazer. Alguém dirá: “Eu não tenho coragem”. Meu filho, se você não tem, diga assim: “Por enquanto não tenho coragem”. E reze para tê-la.

Todas as portas se abrem para quem rezar! Peça, portanto, a Nossa Senhora da Soledade para lhe dar a coragem de suportar o isolamento.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 5/2/1989)

Divina fecundidade

Quando, através de seu humilde “fiat”, a Virgem Santíssima consentiu na Encarnação do Verbo, a Ela foi comunicada a fecundidade do Padre Eterno. Quer isto dizer que a capacidade concedida a Maria de gerar o Filho divino é quase uma participação no próprio poder criador de Deus. Ora, tornar-se digna de privilégio tão augusto supõe uma riqueza de vida espiritual inimaginável, uma elevação de virtudes e uma intimidade de alma com Deus que excede à nossa limitada inteligência. Na medida em que uma simples criatura podia receber aquela fecundidade, Nossa Senhora a recebeu, plenamente.

Compreende-se, pois, como na ordem da criação nada haja, nem de longe, comparável a Maria, Mãe de Jesus.

O gládio que transpassou o Coração da Santíssima Virgem

Durante trinta e três anos, Nossa Senhora, em meio a alegrias inenarráveis, previu a Paixão e Morte de seu Divino Filho. E junto à Cruz, enquanto tantos homens  desertaram, Ela estava de pé. Nunca  ninguém sofreu tanto, com força e sobranceria, quanto a Mãe de Deus. Unindo-Se às intenções da Trindade Santíssima, Ela queria o esmagamento do demônio e da Revolução por todo o sempre.

Na apresentação do Menino Jesus no Templo, em profeta Simeão que a respeito do Divino Infante fez esta esplêndida profecia: “Agora, Senhor, podeis deixar vosso servo  partir em paz, segundo vossa palavra, porque meus olhos viram a salvação que preparastes ante a face de todos os povos, luz para iluminar as nações e glória de Israel, vosso  povo” (Lc 2, 29-32).

Destinados à maior glória, percorrendo os mais extremos sofrimentos

Nossa Senhora, à vista dessa profecia, ficou ainda mais inteirada de toda a glória do Menino Divino que carregava nos braços. Depois de abençoar o Menino e sua Mãe, disse Simeão: “Este Menino está posto para ruína e a ressurreição de muitos em Israel, e para ser alvo de contradição” (Lc 2, 34).

Assim, depois de um futuro esplêndido, o venerável ancião predizia uma vida e uma luta tremenda para aquele Menino e prenunciava para Maria Santíssima um sacrifício:  “Uma espada transpassará tua alma” (Lc 2, 35). Quer dizer, Ela terá um dos sofrimentos mais atrozes que uma pessoa pode suportar. E ele anuncia isso com trinta e três    anos de antecedência.

Temos aqui dois fatos a considerar, muito elucidativos para a mentalidade do homem moderno: em primeiro lugar, uma vez que Deus decretara que esse Menino fosse o Rei vitorioso de que falava a profecia de Simeão, como explicar que, lógica e sabiamente, houvesse de querer, ao mesmo tempo, que Ele passasse por todas essas lutas, as quais importassem num determinado momento em revés? Porque não se podia compreender de outro modo essa espada de dor que atravessaria o Coração de Nossa Senhora.

Não seria natural, arquitetônico, de acordo com a ordem estabelecida pela sabedoria divina, que, uma vez sendo da vontade de Deus que o Menino Jesus fosse o Rei de todos os povos, em todos os tempos, que nada viesse atrapalhar essa carreira gloriosa? Que esta se fizesse de trabalhos bonitos, sapientes, triunfais, de lutas vencidas facilmente com um golpe “mágico” que faria tudo retroceder diante de Jesus, e assim Ele chegasse à sua glória?

Por que o mistério desse momento terrível, em relação ao qual estava anunciado que um gládio atravessaria o Coração de Nossa Senhora? Como se pode compreender que  Deus permita, no meio dessa trajetória, um sofrimento tão grande e uma aparente derrota? Isso não é uma coisa estranha?

A mentalidade “happy end” nos impede de compreender o modo pelo qual as obras de Deus se realizam

O estado de espírito do homem  moderno correspondente a isso reflete-se, com frequência, no modo pelo qual somos levados a considerar os reveses de nossa vida espiritual e de nosso apostolado. Muitas  vezes percebo em algumas pessoas dificuldades para explicarem a si mesmas a razão pela qual, embora estejam andando bem espiritualmente, podem ser tentadas.

A ideia é esta: se Nossa Senhora, se Deus querem que me santifique, por que, então, devo ser tentado? Por que até permitem que eu peque e Lhes desagrade? Isso não é uma contradição? Se o fim é um, não é normal que tudo caminhe direitinho e coerentemente para ele? Como explicar a ocorrência de coisas que parecem contrariar esse fim?

Vê-se nessas interrogações o reflexo daquela mentalidade “happy end” do cinema norte-americano. As coisas têm que correr certinhas; quando não correm, são atrapalhações  que podem ser até grossas, mas já se sabe que terminará tudo direitinho, porque o homem é chamado para ser feliz nesta Terra, entender tudo quanto se passa com ele e  triunfar.

E quando as coisas não acontecem assim, ele tem a sensação de que a vida humana não está em ordem. Tal como os heróis de um romance de filme, que sofrem durante o  enredo, mas o expectador já sabe – e tem a sensação de que os atores também – que tudo vai terminar à beira de um lago, olhando-se amorosamente, navegando num  barquinho, os passarinhos cantando, a fita acabando, e o burguês que a assistiu voltando prosaicamente para casa, satisfeito.

Essa mentalidade “happy end” intoxica nosso espírito e não podemos compreender o modo pelo qual as obras de Deus se realizam. Uma vez posto o pecado, com a queda dos  anjos, e posteriormente a do homem, a vida humana tem um caráter não só de prova, mas de expiação e de luta.

Aceitar o sofrimento não choramingando, mas como o  soldado que vai para a luta

A Providência Divina age de acordo com sua sabedoria, permitindo para os bons os reveses, as doenças, as tentações, a luta contra o adversário, e exigindo deles a aceitação  de que essas coisas lhes podem vir em ocasiões onde isso lhes pareça incompreensível, pois o normal nessa vida é sofrer e que muitas coisas, de fato, não deem bom resultado, ou tenham consequências diferentes do que se quereria. Desse resultado errado Deus tira, para sua glória, algo de melhor e mais brilhante do que o sucesso por  nós imaginado.

As provações e os sofrimentos inesperados não só constituem algo pelo qual o homem decaído deve passar, mas podem corresponder também a uma punição pelos pecados cometidos, ou esconderem uma prova de amor querida por Deus de sua criatura; uma prova de confiança cega, de desprendimento e de abnegação que a criatura deve dar e  que constitui um elemento altamente pedagógico para ela, porque a criatura só vale na medida em que realmente aceita esses sofrimentos com espírito sobrenatural, não  choramingando, mas como o soldado que vai para a luta.

Compreende-se, então, o mistério que há no seguinte fato: segundo a mentalidade moderna, não seria o caso de avisar Nossa Senhora, trinta e três anos antes, que Ela iria  sofrer essa dor. Mas fazer o contrário: ir tapeando ou ficar quieto. Mesmo na hora de Nosso Senhor ser morto, enfim, de Maria Santíssima tomar conhecimento da Paixão,  adiar, contar-Lhe aos poucos para Ela não se assustar muito. Afinal, quando não houvesse mais remédio, Ela saberia, e ainda assim haveria os calmantes.

A ação da Providência não é essa. Com trinta e três anos de antecedência, Ela avisa Nossa Senhora. Exatamente porque a previsão dessa dor já é uma tremenda dor. Maria  Santíssima carregou a previsão desse sofrimento durante todo esse tempo e o viu chegando de longe. Com isso, sua alma imaculada, criada sem pecado original, foi-se  aperfeiçoando e santificando na longa previsão e aceitação da dor que deveria vir.

Trinta e três anos de Horto das Oliveiras

Compreende-se que até para a alma imaculada da Santíssima Virgem a previsão forte, corajosa, razoável – eu diria, mesmo varonil – da dor vindoura era um elemento para uma crescente união com Deus, a qual Ela já possuía num grau insondável desde o primeiro instante de seu ser. Entretanto, essa profecia de Simeão foi intencionada para que Ela carregasse essa dor durante trinta e três anos, na compreensão desse fato de que o homem nasceu para sofrer, é normal que sofra, que é preciso aceitar a dor por  inteiro antes dela vir, e, quando chegar, que ela nos encontre calmos, fiéis, sobranceiros e heroicos, porque assim se deve ser diante do sofrimento.

Então, encontramos essa analogia entre a vida de Nosso Senhor e a de sua Mãe Santíssima: a vida de Nossa Senhora foi trinta e três anos de Horto das Oliveiras, ao longo  dos quais Ela previu a Paixão e a Cruz no meio de alegrias inenarráveis.

Ela foi vendo seu Divino Filho crescer, preparar- Se para a vida pública – durante a qual esse gládio de dor A esperava –, sair de casa, ouvindo falar dos rumores criados em  torno d’Ele e do ódio que subia e O rodeava de todos os lados. Era o mal que haveria de armar contra seu Filho o golpe mais atroz possível. E Ela que O adorava como seu  Deus e seu Filho, sentindo o pecado horrível que estava sendo preparado, considerava de frente os tormentos que deveriam vir.

O resultado foi a hora magnífica de sua fidelidade: enquanto tantos homens desertaram, Nossa Senhora se encontrava de pé junto à Cruz. Não era de duvidar que estivesse, pois estava confirmada em graça; mas Ela ali se encontrava como fruto dessa longa preparação. Quer dizer, não desmaiada, nem desfalecendo, nem alquebrada pelos  acontecimentos. A iconografia católica apresenta, em todos os séculos, Maria Santíssima muito firme, de nenhum modo desorientada, sem domínio de  Si, ou desejando  fugir. Essas são paixões vis que não caberiam em sua alma,  às quais se contrapunham, na ordem teórica, virtudes mais excelsas que Ela tinha elevado ao mais alto  dos  supremos graus. Nunca ninguém  sofreu tanto, com tanto domínio dos acontecimentos, compreendendo tanto a lógica do que se passava, com tanta força e sobranceria, com  anto ódio ao mal, quanto Nossa Senhora.

Para esmagar o demônio, Nossa Senhora desejou os mais atrozes sofrimentos

Ela sabia que todo o mal no mundo seria esmagado no momento em que o seu Divino Filho expirasse. Durante todo o tempo, a Santíssima Virgem esteve na seguinte  disposição: “Adoro meu Filho, mas se for preciso sacrificá-Lo para esmagar o demônio, derrotar o poder das trevas, concordo que meu próprio Filho morra. Eu O entrego,  por assim dizer, O imolo. Esse gládio Eu mesma enfio em meu próprio Coração. Mas é preciso que o demônio seja esmagado. É necessário  que o mal – que hoje chamamos   Revolução – seja estraçalhado por todo o sempre. Uno-me às intenções santíssimas do Pai, do Filho e do Espírito Santo e faço esse sacrifício horroroso.

Mas isso que está acontecendo no alto da Cruz Eu quero, e não deixo de querer um instante, com toda a intensidade de meu ser”.

Se isto não é espírito de combate,  disposição para arrasar o adversário, então não sei mais o que significam essas palavras.

Trinta e três anos de preparação! O que tem isso de comum com a vida de Nosso Senhor? Para não falar de preparação remota, no Horto das Oliveiras Nosso Senhor quis  meditar e prever tudo o que Lhe aconteceria. Então, Ele começou a sentir horror e pavor do que viria, e fez aquela oração: “Meu Pai, se for possível, afaste-se de Mim esse cálice” (Mt 26, 39). Quer dizer, se não for condição para o gênero humano ser redimido, enfim, se dentro de vossos desígnios for possível derrotar o demônio sem isso.

Porém, faça-se a vossa vontade e não a minha. Eu aceito e quero todo esse sofrimento para chegar a esse resultado. Ordem mental, lógica, calma e ante a dor, e o amor ao  sofrimento que se deve ter.

Gládio representando a dor e a luta

Muitas vezes, em nossa vida, há aspectos triunfais, no meio de toda a guerra em que nos movemos. Mas precisamos nos compenetrar bem de que o  normal, na luta tremenda que  estamos tendo, é virem vários momentos nos quais um gládio de dor transpasse a alma de cada um de nós. Por vezes  pareceremos derrotados, desorientados, abandonados pela Providência, como diz o Salmo que Nosso Senhor recitou no alto da Cruz: “Deus meu, Deus meu, por que Me abandonaste?” (Mt 27, 46).

Devemos nos colocar diante desta perspectiva: essas são as coisas que podem acontecer, nossa luta não será sempre uma parada de vitórias. Não seríamos dignos de Nosso Senhor Jesus Cristo, nem de sua Mãe Santíssima, se isso fosse assim. É mister termos diante dos olhos sempre a ideia de que um gládio de dor nos atravessará em determinado momento.

Devemos pedir a Nossa Senhora que nos alcance a graça – que, sob determinado ponto de vista, não temo chamar de suprema – de desejarmos, amarmos e, desde logo,  prepararmos nossa vida para essa hora.

Porque assim como a hora do gládio, junto com a da Encarnação, foi a grande hora da vida da Santíssima Virgem, a hora da fidelidade, assim também podemos dizer não ter  sido a grande hora de nossa vida somente a vocação, mas vai ser a hora da perseverança, que corresponderá à hora do gládio.

Tivéssemos nós um gládio que, com maior furor guerreiro e de um modo mais terrível, representasse ao mesmo tempo a dor que deve transpassar nossas almas e a luta  contra nossos adversários, e eu o poria como símbolo em nossa capela, porque, mais do que uma resignação, uma sadia e equilibrada apetência desse gládio deve nos caracterizar.

Conta-se que Nosso Senhor, quando recebeu a Cruz, antes de colocá-la nas costas chorou de emoção, abraçou-a e a beijou com muito carinho, porque desde sempre a  desejara. Oxalá, na hora de nosso gládio, possamos também chorar varonilmente de emoção, osculá-lo com muito carinho e dizer que desde sempre o desejávamos. É o  pedido do amor a esse gládio que devemos apresentar a Nossa Senhora das Dores.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/4/1965)

São Casimiro e a supremacia do exemplo

Mais do que agir e realizar grandes feitos, a excelência espiritual consiste em ser e em difundir no universo da Igreja o aroma da perfeição: eis o valioso ensinamento que nos transmite Dr. Plinio, ao comentar alguns traços da vida de São Casimiro, príncipe da Polônia.

 

No dia 4 de março a Igreja celebra a festa de São Casimiro, da estirpe real polonesa e patrono desta nação. Sua breve existência foi profundamente marcada pela intensa piedade que o caracterizava, conforme lemos no Pe. Rohrbacher:

Espírito continuamente unido a Deus

São Casimiro, príncipe da Polônia, foi o terceiro dos treze filhos de Casimiro III com Isabel da Áustria, filha do Imperador Alberto II. Veio ao mundo em 5 de outubro de 1458 e demonstrou, desde a infância, muita inclinação para a virtude.

Teve por preceptor João Dlugosz, denominado Longino, cônego de Cracóvia e historiador da Polônia, homem que aliava rara piedade a grande extensão de conhecimentos. Casimiro e os outros príncipes, seus irmãos, lhe eram tão ternamente afeiçoados que não podiam tolerar que os separassem dele um momento. Mas, nosso Santo foi aquele que mais aproveitou as lições de tão hábil mestre.

Viram-no, na flor da idade, entregar-se com ardor aos exercícios de piedade e às práticas da mortificação. Trazia um cilício sob as vestes, que eram sempre muito simples. Diversas vezes deitava-se no chão duro e passava boa parte da noite a orar e meditar. A Paixão de Jesus Cristo era o assunto mais costumeiro de suas meditações. Saía com freqüência à noite para ir rezar à porta das igrejas, onde esperava se abrissem para assistir às matinas.

Espírito e coração continuamente unidos a Deus, a paz interior de sua alma se manifestava a toda a gente pela serenidade da face. Cheio de respeito por tudo o que concernia ao culto divino, as menores cerimônias eclesiásticas lhe tocavam a piedade. Tinha particular devoção a Jesus padecente pelos homens, e jamais pensava no mistério da Redenção sem desfazer-se em lágrimas e sentir-se abrasado de amor.

Quanto ao santo sacrifício da Missa, a ele assistia com tanto fervor e recolhimento que parecia maravilhado em êxtase. Para marcar a confiança que possuía na proteção da Santíssima Virgem, compôs em honra d’Ela o hino que traz seu nome, e do qual desejou que uma cópia fosse depositada em seu túmulo, quando morresse. (Esse cântico iniciava-se com as palavras “Omni die, dic Mariae, mea laudis anima”.)

Amava tão ternamente os pobres que lhes sentia de certo modo as misérias. Não contente de lhes distribuir os bens, empregava ainda, para aliviá-los, tudo o que tinha de crédito junto a seu pai e a seu irmão Vlasdilau, Rei da Boêmia.

Consumando a obra da santificação

Os húngaros, insatisfeitos com Matias, seu monarca, quiseram elevar nosso Santo ao trono, em 1471. Enviaram para esse fim uma deputação ao Rei da Polônia, seu pai. O jovem Casimiro, que não completara ainda 13 anos, desejaria bem recusar a coroa que lhe ofereceram.

Mas, para agradar ao pai, partiu à testa de um exército, a fim de sustentar o direito de sua eleição. Tendo chegado às fronteiras da Hungria, soube que Matias acabava de reunir dezesseis mil homens para ir à frente dos poloneses e que tornara a conquistar o coração dos súditos. Soube também que o Papa Sisto IV se declarara pelo rei destronado e enviara uma embaixada a seu pai, para fazê-lo abandonar a empresa.

Todas essas circunstâncias reunidas deram secreta alegria ao jovem príncipe. Pediu ao pai que voltasse sobre os próprios passos, o que só com muita dificuldade lhe foi concedido. Porém, para não aumentar o desgosto que o pai sentia por ter visto malograr seus desígnios, evitou a princípio aparecer na presença dele. Em lugar de ir direto a Cracóvia, retirou-se ao Castelo de Dobzski, situado a uma légua da cidade, e lá passou três meses na prática de austera penitência.

Tendo reconhecido, em seguida, a injustiça da expedição que o tinham forçado a empreender contra o Rei da Hungria, recusou constantemente render-se a segundo convite que lhe fizeram os húngaros, e isso malgrado as solicitações e reiteradas ordens do pai.

Casimiro empregou os doze últimos anos de vida em consumar a obra de sua santificação. Viveu na maior continência, apesar das razões prementes que se alegavam para levá-lo ao casamento. Morreu de tísica em Vilna, capital da Lituânia, em 4 de março de 1483, com a idade de vinte e quatro anos e cinco meses. Predissera a morte e para esta se preparou através de um redobramento de fervor e pela recepção dos sacramentos da Igreja.

Operou-se grande número de milagres por sua intercessão, sendo canonizado pelo Papa Leão X em 1522. Cento e vinte anos após sua morte, encontraram-lhe o corpo incorrupto, assim como foram achados intactos os ricos tecidos com os quais o tinham envolvido, apesar da excessiva umidade do jazigo onde fora enterrado. Mandaram então construir magnífica capela de mármore para nela serem depositadas suas relíquias.

São Casimiro é patrono da Polônia, e o propõem comumente aos jovens como perfeito modelo de pureza.

Santidade é sobretudo o ser e o não agir

A respeito de São Casimiro, convém notar de modo especial três traços.

Há santos fundadores de povos, outros dão origem a ciclos de civilização, e por sua ação extraordinária eles movem a História.

Existe também a categoria dos santos que se tornam exímios na prática de uma determinada virtude, da qual são modelos em toda a vida da Igreja. E para que a atenção dos fiéis não se desvie deste ponto central, esses heróis da Fé morrem relativamente jovens e a biografia deles permanece marcada por aquela virtude.

São Luís Gonzaga, por exemplo, pouco realizou em sua breve existência. Morreu ainda adolescente, mas havia atingido um apogeu na prática da castidade. Se ele tivesse feito muitas obras, a tendência dos que o admirassem seria de se voltar para o que ele produziu e não para o que foi.

Tais santos nos mostram, assim, que a excelência espiritual consiste sobretudo em ser, em manter uma ação de presença dentro da Igreja, difundir o aroma da perfeição, não só enquanto estão vivos, mas depois de mortos. E que os dias deles, tão precocemente imolados e em geral oferecidos em benefício da Igreja Católica, são elementos preciosíssimos para a salvação das almas.

Elementos, portanto, valiosos na ordem do sacrificar-se e não no terreno do agir.

A supremacia do exemplo, da imolação, da realização interior de uma obra própria que justifica inteiramente a existência, apesar de externamente não se ter feito nada, esse é o ensinamento que almas como São Casimiro, São Domingos Sávio, São Luís Gonzaga e tantos outros, nos trazem à mente. É um aspecto deste sol de santidade que é a Igreja Católica Apostólica Romana.

Pompa e penitência

Há ainda um traço interessante na vida de São Casimiro: trajava roupas régias, embora simples, enquanto portava o cilício sob elas. Vemos nisso o equilíbrio do verdadeiro santo. Ele deseja fazer penitência, mas sabe que sua condição lhe impõe o vestir-se com a pompa inerente à sua categoria. E como não é um igualitário, usa todo o necessário para a manutenção de seu estado, sem descuidar da penitência: coloca sobre si um instrumento de sacrifício, mas o leva às ocultas.

Por fim, uma nota curiosa que pode ser especialmente útil para nós.

São Casimiro teve dificuldades com seu pai, pois este desejava que ele conquistasse a Hungria, e não compreenderia a recusa do filho alegando um motivo — no juízo do monarca — frívola: o Papa dava razão ao outro e o príncipe seria, portanto, um usurpador.

Dando provas de muito tato e sabedoria, o jovem santo evitou comparecer de imediato à presença do pai. Retirou-se para um castelo distante da corte, e ali permaneceu durante três meses, até que os ânimos serenassem. Só então retornou.

Foi um santo apuro e depois um santo ardil, que deve servir de inspiração para todos nós.

Plinio Corrêa de Oliveira

A CENA DO HORTO SE REPETE…

Sempre causou profunda impressão em Dr. Plinio o paralelo entre o odioso tratamento recebido por nosso Redentor, durante a Paixão, e as ofensas e ingratidões de que é alvo a Igreja Católica.  Reproduzimos aqui algumas reflexões a esse respeito, escritas em 1947.

 

A verdadeira piedade deve impregnar toda a alma humana, e, portanto, também deve despertar e estimular a emoção. Mas a piedade não é só emoção, e nem mesmo é principalmente emoção. A  piedade brota da inteligência, seriamente formada por um estudo catequético cuidadoso, por um conhecimento exato de nossa Fé, e, portanto, das verdades que devem reger nossa vida interior. A  piedade reside ainda na vontade.

Devemos querer seriamente o bem que conhecemos. Não nos basta, por exemplo, saber que Deus é perfeito. Precisamos amar a perfeição de Deus, e, portanto, devemos desejar para nós algo dessa perfeição: é o anseio para a santidade. “Desejar” não significa apenas sentir veleidades vagas e estéreis. Só queremos seriamente algo, quando estamos dispostos a todos os sacrifícios para conseguir  o que queremos. Assim, só queremos seriamente nossa santificação e o amor de Deus, quando estamos dispostos a todos os sacrifícios para alcançar esta meta suprema. Sem esta disposição, todo  o “querer” não é senão ilusão e mentira.

Podemos ter a maior ternura na contemplação das verdades e mistérios da Religião: se daí não tirarmos resoluções sérias, eficazes, de nada valerá nossa piedade. É o que se deve dizer  especialmente nos dias da Paixão de Nosso Senhor. Não nos adianta apenas o acompanhar com ternura os vários episódios da Paixão: isto seria excelente, não porém suficiente. Devemos dar a  Nosso Senhor, nestes dias, provas sinceras de nossa devoção e amor.

Estas provas, nós as damos pelo propósito de emendar nossa vida, e de lutar com todas as forças pela Santa Igreja Católica. A  Igreja é o Corpo Místico de Cristo. Quando Nosso Senhor interpelou São Paulo, no caminho da Damasco, perguntou-lhe: “Saulo, Saulo, por que me persegues? ” Saulo perseguia a Igreja. Nosso  Senhor lhe dizia que era a Ele mesmo que Saulo perseguia. Se perseguir a Igreja é perseguir a Jesus Cristo, e se hoje também a Igreja é perseguida, hoje Cristo é perseguido.

A Paixão de Cristo se repete de algum modo também em nossos dias. Como se persegue a Igreja? Atentando contra os seus  direitos ou trabalhando para dela afastar as almas. Todo ato pelo qual  se afasta da Igreja uma alma, é um ato de perseguição a Cristo. Toda alma é, na Igreja, um membro vivo. Arrancar uma alma à Igreja é arrancar um membro ao Corpo Místico de Cristo. Arrancar  uma alma à Igreja é  fazer a Nosso Senhor, em certo sentido, o mesmo que a nós nos fariam se nos arrancassem a menina dos olhos.

Se queremos, pois, condoer-nos com a Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo, meditemos sobre o que Ele sofreu nas mãos de seus algozes, mas não nos esqueçamos de tudo quanto ainda hoje se faz  ara ferir o Divino Coração. E isto tanto mais quanto Nosso Senhor, durante sua Paixão, previu tudo quanto se passaria depois. Previu, pois, todos os pecados de todos os tempos, e também os  pecados de nossos dias. Ele previu os nossos pecados, e por eles sofreu antecipadamente. Estivemos presentes no Horto como algozes, e como algozes seguimos passo a passo a Paixão até o alto do Gólgota.

Arrependamo-nos, pois, e choremos. A Igreja, sofredora, perseguida, vilipendiada, aí está a nossos olhos indiferentes ou cruéis. Ela está diante de nós como Cristo diante de Verônica. Condoamo-nos com os padecimentos  dela. Com nosso carinho, consolemos a Santa Igreja de tudo quanto ela sofre. Podemos estar certos de que, com isto, estaremos dando ao próprio Cristo uma consolação  idêntica à que Lhe deu Verônica.

Indiferença para com Deus

Comecemos pela Fé. Certas verdades referentes a Deus e a nosso destino eterno, podemos conhecê-las pela simples razão. Outras, conhecemo-las porque Deus no-las ensinou. Em sua infinita  bondade, Deus se revelou aos homens no Antigo e Novo Testamento, ensinando-nos não apenas o que nossa razão não poderia desvendar, mas ainda muitas verdades que poderíamos conhecer  racionalmente, mas que por culpa própria a humanidade já não conhecia de fato.

A virtude pela qual cremos na Revelação é a Fé. Ninguém pode praticar um ato de Fé, sem o auxílio sobrenatural da graça de Deus. Essa graça, Deus a dá a todas as criaturas e, em abundância  torrencial, aos membros da Igreja Católica. Essa graça é a condição da salvação deles. Ninguém chegará à eterna bem-aventurança, se rejeitar a Fé. Pela Fé, o Espírito Santo habita em nossos corações. Rejeitar a Fé é rejeitar o Espírito Santo, é expulsar de sua alma a Jesus Cristo.

Vejamos, agora, em torno de nós, quantos católicos rejeitam a Fé. Foram batizados, mas no curso do tempo perderam a Fé. Perderam-na por culpa própria, porque ninguém perde a Fé sem culpa,  e culpa mortal. Ei-los que, indiferentes ou hostis, pensam, sentem e vivem como pagãos.

São nossos parentes, nossos próximos, quiçá nossos amigos! Sua desgraça é imensa. Indelével, está neles o sinal do Batismo. Estão marcados para o Céu, e caminham para o inferno. Em sua alma  redimida, a aspersão do Sangue de Cristo está marcada. Ninguém a apagará. É de certo modo o próprio Sangue de Cristo que eles profanam quando nesta alma resgatada acolhem princípios,  máximas, normas contrárias à doutrina da Igreja. O católico apóstata tem qualquer coisa de análogo ao sacerdote apóstata.

Arrasta consigo os restos de sua grandeza, profana-os, degrada-os e se degrada com eles. Mas não os perde. E nós? Importamo-nos com isto? Sofremos com isto? Rezamos para que estas almas se  convertam? Fazemos penitências? Fazemos apostolado? Onde nosso conselho? Onde nossa argumentação? Onde nossa caridade? Onde nossa altiva e enérgica defesa das verdades que eles negam  ou injuriam? O Sagrado Coração sangra com isto. Sangra pela apostasia deles, e por nossa indiferença. Indiferença duplamente censurável, porque é indiferença para com nosso próximo e  sobretudo indiferença para com Deus.

Coincidência ou conspiração? Quantas almas, no mundo inteiro, vão perdendo a Fé? Pensemos no incalculável número de jornais ímpios, rádio-emissões ímpias, de que diariamente se enche o  orbe. Pensemos nos inúmeros obreiros de Satanás que, nas cátedras, no recesso da família, nos lugares de reunião ou diversão, propagam idéias ímpias. De todo este esforço, quem há de admitir que nada resulte? Os efeitos de tudo isto estão diante de nós. Diariamente, as instituições, os costumes, a arte se vão descristianizando, indício insofismável de que o próprio mundo se vai perdendo para Deus.

Não haverá em tudo isto uma grande conjuração? Tantos esforços, harmônicos entre si, uniformes em seus mé- todos, em seus objetivos, em seu desenvolvimento, serão mera obra de  coincidências? Onde e quando, intuitos desarticulados produziram articuladamente a mais formidável ofensiva ideológica que a história conhece, a mais completa, a mais ordenada, a mais  extensa, a mais engenhosa, a mais uniforme em sua essência, em seus fins, em seu evoluir?

Não pensamos nisto. Nem percebemos isto. Dormimos na modorra de nossa vida de todos os dias. Por que não somos mais vigilantes? A Igreja sofre todos os tormentos, mas está só. Longe, bem  longe dela, cochilamos. É a cena do Horto que se repete. (…) Incontável falange de almas tíbias E entre nós? Esta Fé que tantos combatem, perseguem, atraiçoam, graças a Deus nós a possuímos. Que uso fazemos dela? Amamo-la? Compreendemos que nossa maior ventura na vida consiste em sermos membros da Santa Igreja, que nossa maior glória é o título de cristão? Em caso  afirmativo — e quão raros são os que poderiam em sã consciência responder afirmativamente — estamos dispostos a todos os sacrifícios para conservar a Fé?

Não digamos num assomo de romantismo, que sim. Sejamos positivos. Vejamos friamente os fatos. Não está junto de nós o algoz que nos vai colocar na alternativa da cruz ou da apostasia. Mas  todos os dias, a conservação da Fé exige de nós sacrifícios. Fazemo-los? Será bem exato que, para conservar a Fé, evitamos tudo que a pode pôr em risco? Evitamos as leituras que a podem  ofender? Evitamos as companhias nas quais ela está exposta a risco? Procuramos os ambientes nos quais a Fé floresce e cria raízes? Ou, em troca de prazeres mundanos e passageiros, vivemos em  ambientes em que a Fé se estiola e ameaça cair  em ruínas?

Todo homem, pelo próprio fato do instinto de sociabilidade, tende a aceitar as opiniões dos outros. Em geral, hoje em dia, as opiniões dominantes são anticristãs. Pensa- se contrariamente à Igreja em matéria de filosofia, de sociologia, de história, de ciências positivas, de arte, de tudo enfim. Os nossos amigos, seguem a corrente. Temos nós a coragem de divergir? Resguardamos nosso  espírito de qualquer infiltração de idéias erradas? Pensamos com a Igreja em tudo e por tudo? Ou contentamo-nos negligentemente em ir vivendo, aceitando tudo quanto o espírito do século nos inculca, e simplesmente porque ele no-lo inculca?

É possível que não tenhamos enxotado Nosso Senhor de nossa alma. Mas como tratamos este Divino Hóspede? É Ele o objeto de todas as atenções, o centro de nossa vida intelectual, moral e  afetiva? É Ele o Rei? Ou, simplesmente, há para Ele um pequeno espaço onde se O tolera, como hóspede secundário, desinteressante, algum tanto importuno? Quando o Divino Mestre gemeu,  chorou, suou sangue durante a Paixão, não O atormentavam apenas as dores físicas, nem sequer os sofrimentos ocasionados pelo ódio dos que no momento O perseguiam. Atormentava-O ainda tudo quanto contra Ele e a Igreja faríamos nos séculos vindouros. Ele chorou pelo ódio de todos os maus, de todos os Arios, Nestórios, Luteros mas chorou também porque via diante de si o cortejo interminável das almas tíbias, das almas indiferentes que, sem O perseguir, não O amavam como deviam.

É a falange incontável dos que passaram a vida sem ódio e sem amor, os quais, segundo Dante, ficavam de fora do inferno porque nem no inferno havia para eles lugar adequado. Estamos nós  neste cortejo? Eis a grande pergunta a que, com a graça de Deus, devemos dar resposta nos dias de recolhimento, de piedade e de expiação em que vamos entrar agora.

Plinio Corrêa de Oliveira (Transcrito do Legionário, nº 764, de 30/3/1947. Título e subtítulos nossos.)

Semana Santa

Sob o peso da Cruz, o Divino Redentor suportava o fardo das nossas fraquezas, padecendo por nós todas as suas dores. Que esta verdade incite a profunda gratidão de nossa alma e nos seja motivo de ilimitada confiança. Pois quem se viu resgatado por preço tão imenso, embora pouco mereça, deve esperar que esse Sangue preciosíssimo se derrame sobre ele para regenerá-lo e salvá-lo, despertando em seu coração o movimento que o reconduza ao caminho da virtude e o leve, finalmente, ao Céu.

Cântico da fidelidade

Segundo as revelações de Sóror Maria de Ágreda, na noite do sábado da Paixão, Nossa Senhora “fazia heroicos atos de Fé, esperança, amor, veneração e culto à divindade e humanidade de seu Filho e Deus verdadeiro; com genuflexões e prostrações O adorava, e com admiráveis cânticos O bendizia”.

Um quadro extraordinário se nos apresenta à imaginação: Maria Santíssima, sozinha no silêncio daquela noite trágica, talvez no próprio recinto onde se realizou a Última Ceia, interrompendo suas preces para cantar as suas reparações ao Criador.

Ela que entoara o “Magnificat” num momento de gáudio indizível, agora compensava, pelo seu cântico de fidelidade, todas as injúrias e ofensas sofridas por Jesus.

Cena em extremo tocante, contemplada apenas pelos Anjos: na noite da desolação, o canto da alma mais virtuosa em toda a Terra elevando-se até o Céu…

Plinio Corrêa de Oliveira

Como um mendigo

Importa à nossa devoção filial formarmos uma ideia inteira da bondade e do perdão ilimitados de Maria Santíssima para conosco; reconhecermos a necessidade do nosso contínuo apelo a esse perdão e a essa bondade maternais.

Cumpre recorrermos a Ela em todos os momentos, de joelhos em terra, como humildes e confiantes mendigos, batendo no peito e estendendo-lhe o chapéu de nossa indigência. Então Nossa Senhora se faz toda doçura, suavidade e paciência em relação a nós; perdoa-nos e nos cura, até mesmo de nossas ingratidões mais descabidas…

Dor e glória

Em Nosso Senhor Jesus Cristo o que mais atraía Dr. Plinio era seu sofrimento, com o matiz de majestade, de sabedoria profunda, de transcendência em relação a tudo, com uma bondade que  chega até o último ser.

Passemos à consideração da Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, com base em um bonito Crucifixo.

Dor, majestade, paz e misericórdia

A meu ver a fotografia faz ver uma beleza do Crucifixo — porque a fotografia não pode inventar —, mas que só um olhar muito atilado de um bom crítico de arte percebe. Arte só, não, piedade. Como o estado de alma de Nosso Senhor no alto da Cruz está bem interpretado!

Os dois pontos da escultura em que mais o trabalho artístico e a expressão se aprimoram são: os lábios abertos, os dentes separados ligeiramente, dando a ideia, também levemente, do queixo caído; depois, os olhos que fitam, triste e desoladamente, alguma coisa que eles estão contemplando, mas não estão vendo.

O olhar está distante, na consideração de algo muito diverso que o enche de tristeza. O queixo, assim ligeiramente caído, dá a impressão de tal abandono das forças, que não há mais vigor nem sequer para manter cerrados os lábios.

Contudo, apesar do extremo dessa dor moral, mais do que física — de fato, Nosso Senhor sofreu mais a Alma do que no Corpo durante a sua Paixão —, nós notamos uma paz, uma misericórdia, uma delicadeza de sentimentos, em que o furor não está presente. A tristeza, sim, está em tudo e por tudo. Mas uma tristeza tal que, Esse condenado à morte, privado dos trajes que qualquer passante possui, entretanto tem uma atitude que deixa longe a majestade de qualquer rei!

O artista soube muito bem representar os cabelos de Nosso Senhor, não penteados direito — porque isso não teria propósito depois de tudo quanto Ele sofreu —, mas lindamente desgrenhados, de maneira a formarem cachos lindíssimos! A barba é tão pequena que não daria jeito para pô- -la revolta. Então, ela cai ordenadamente para emoldurar o rosto.

Nosso Senhor chorou também a decadência das nações católicas

A pessoa que contempla essa imagem tem quase a impressão de que entrará, de um momento para outro, no campo de visão desse olhar. O aspecto de tristeza é pungente.

Durante sua Paixão e Morte, Nosso Senhor Jesus Cristo previa tudo quanto iria acontecer até o fim do mundo, como a humanidade tomaria aquele sacrifício extraordinário, único, realizado por  Ele; gemia e sofria por todas as ingratidões que os homens teriam para com Ele. De vez em quando, o horizonte da História era cortado, diante de seus olhos proféticos, por esta ou aquela figura, este ou aquele Santo, esta ou aquela Ordem religiosa, esta ou aquela escola de pensamento, esta ou aquela Cruzada cheia de fervor.

E o Divino Redentor sentia-Se confortado em meio a sua dor. Isso não O terá ajudado a carregar a Cruz e a sofrer sua Paixão até o último alento, até o último ponto em que Ele disse: “Meu Deus,  meu Deus, por que Me abandonaste?” (Mt 27, 46).

Podemos ter certeza de uma coisa: em determinado momento, Ele chorou a decadência das nações católicas do Ocidente. Tudo quanto nos causa horror nos dias de hoje, que repulsa terá provocado à santidade infinita do próprio Deus?

Percebem-se os grandes espinhos que transpassaram a fronte de Nosso Senhor. No alto do olho esquerdo nota-se uma machucadura terrível. Tem-se a impressão de que um espinho esteve lá e caiu, deixando um ferimento medonho.

Vejam com quanta delicadeza escorre o Sangue ao longo do Corpo Divino, de maneira a formar dois longos filetes, na ponta de cada um dos quais está um rubi!

O primeiro canonizado da História

A impressão de desolação e de desamparo é muito acentuada nesta fotografia. É uma dor de quem sabe não ter remédio, nem limite, e caminha para a morte que se anuncia, não com as  consolações de quem está esperando o Céu, mas na tristeza do que vai acontecer, porque Ele percebe a maldade dos homens que estão se jogando contra Ele.

Podemos imaginar a diferença entre essa fisionomia e a que deve ter feito o bom ladrão, no momento em que ouviu Nosso Senhor lhe dizer: “Hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23, 43).

Ao dizer ao bom ladrão que ele estaria no Paraíso, Jesus afirmava, antes de tudo, que Ele estaria lá, e o ladrão se encontraria com  Ele. O bom ladrão foi o primeiro canonizado na história das  canonizações; teve ali o Céu garantido.

Por que Nosso Senhor disse isso a ele? O bom ladrão pediu perdão e Jesus o perdoou. Mas na hora de perdoá-lo o Redentor quis dar-lhe essa alegria, para ele transpor com ânimo os terríveis  umbrais da morte.

Ora, essa alegria não se nota neste semblante. Alguém dirá: “Dr. Plinio, não há uma contradição?” Não. Jesus quis beber a taça da dor até o fim, sofrer tudo quanto era possível sofrer. Ao outro Ele  deu uma alegria no momento do passo final. Nosso Senhor entrou triste na hora de sua Morte, mas logo depois Ele teve, naturalmente, a alegria em que sua Alma santíssima, hipostaticamente unida à Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, deixava de sofrer as dores do Corpo. Começava o período em que Ele ia ao Limbo para encontrar todas as almas que estavam lá e levá-las para o Céu.

A boa tristeza e a má alegria

Nesse semblante a desolação parece tão profunda que se tem a impressão de não tardar para sobrevir a morte. A desolação moral é maior do que a física. Dir-se-ia ser uma longa meditação que vai chegando às suas últimas e mais amargas consequências.

Os autores que comentam a construção das grandes catedrais da Idade Média observam que elas são construídas na consideração da glória de Cristo Ressurrecto. E que a ideia da alegria e da vitória d’Ele encheu de luz a piedade dos medievais.

É verdade que, quando a Idade Média começava talvez a entrar no seu declínio — é difícil precisar —, iniciou-se um movimento extraordinário de devoção a Nosso Senhor Jesus Cristo crucificado.

Esse movimento foi se difundindo por São Francisco de Assis com os estigmas, etc. Mas o que a Idade Média deixou de mais característico foi Cristo Ressurrecto.

Entretanto, desde menino, o que mais me impressionou foi Jesus Cristo na sua dor. Estivesse Ele crucificado ou não; numa atitude como o Sagrado Coração de Jesus, mostrando seu Coração aos  homens e dirigindo- -Se a eles; ou em qualquer outro episódio  de sua vida, como naquele conjunto escultural da Igreja do Sagrado Coração de Jesus que O representa entre os doutores no  Templo, etc.; o que sempre me atraiu mais para considerar e adorar foi a Ele enquanto, naquele determinado episódio, sofrendo.

E dando ao seu sofrimento aquele matiz de majestade, de sabedoria profunda, de transcendência em relação a tudo, mas de bondade que chega até o último ser, o último verme,  o último pecador  que se coloque diante d’Ele. Isto foi o que sempre, de modo muitíssimo especial, atraiu- -me n’Ele e me levou a adorá-Lo. Não custei a perceber que essa disposição de minha alma estava em contraste diametralmente com a alegria de fandango que dominava a minha época de menino, com a difusão de toda a atmosfera de Hollywood, de todo o ambiente do cinema moderno, criando  um clima de alegria artificial, doida, tonta, agitada, sedenta de pecado e já meio imersa no pecado, que caracterizava o meu tempo de infância. Então, era uma alegria má. E eu ficava colocado  entre a boa tristeza e a má alegria.

Eu não sabia discernir bem entre a boa e a má alegria, e me parecia que havia no mundo duas correntes, considerado o mundo do ponto de vista psicológico: uma era a dos que amavam a dor e  que, portanto, adoravam a Nosso Senhor; e a outra a dos que amavam a alegria e eram os partidários do cinema. E isso formava uma contradição que eu não sabia explicar inteiramente.

Porém, eu era levado a um equívoco de ponto de vista, segundo o qual toda pessoa alegre era suspeita de certa adesão ao fandango cinematográfico, que ia arrastando tantas e tantas almas para o  pecado. Pelo contrário, a pessoa triste eu considerava que estava sempre no caminho certo, pelo menos para se converter, se não era uma pessoa inteiramente virtuosa.

Levei anos para perceber que aqueles que estão tristes com Nosso Senhor são os alegres desta vida, e aqueles que estão alegres com satanás são os tristes desta vida.

Tristeza digna, nobre, varonil

Sempre me pareceu que, apesar disso ser verdadeiro, por estarmos nesta época de tanto pecado e  tanta ignomínia — que determinou  a mensagem de Fátima com tudo o que ela contém —, o  autêntico católico poderia ter sua alma alegre, estaria bem, mas essa alegria nunca deixaria de ter um véu de tristeza digna, nobre, varonil, como quem acompanha Nosso Senhor até o alto da Cruz.

Observando as cerimônias religiosas daquele tempo, eu notava isto: mesmo nas cerimônias mais gaudiosas estava presente um traço de dor, certa compaixão a qual tinha por objeto a Nosso  Senhor Jesus Cristo. Inclusive na festa mais límpida, mais alegre, mais desanuviada, o  Natal, havia uma nota de tristeza, de compaixão do Menino que nasce tão pequenino, no frio, deitado na  mera palha, e que vem começar sua longa jornada na Terra… Essa nota de compaixão perpassava as alegrias luminosas  e magníficas do Natal.

Na própria Páscoa da Ressurreição, Nosso Senhor é apresentado ressurrecto, mas com suas chagas brilhando.

As chagas lembram tudo aquilo pelo que Ele passou. Quer dizer, uma reminiscência da dor, da Cruz sempre presente, de um modo ou de outro, numa cerimônia católica. Foi por essa razão  também que eu quis sempre ter a cruz nas nossas sedes: cruzeiros pretos, altos, secos, como foi negra e sem consolações a Paixão de Nosso Senhor. E dois magníficos crucifixos na Sede do Reino  de Maria, um dos quais acabamos de comentar. Assim me veio a ideia de ser esta a posição natural da alma do católico.

Daí nasce a seguinte convicção: a vida, para ser tomada catolicamente, tem que levar consigo esse traço de grandeza e de seriedade, sem o qual ela não vale nada. A vida é uma participação na Cruz  e Nosso Senhor Jesus Cristo. Eu tenho que sofrer como Ele sofreu. E quanto mais eu padecer, tanto melhor será, porque terei tido maior honra de me achegar mais a Ele.

E, diante do sofrimento, adestrar a nossa sensibilidade. Não para fugir, não para rogar incondicionalmente a Nossa Senhora que afaste de nós a dor. Pedir pode-se. Ele mesmo pediu: “Se for  possível, afastai de Mim este cálice”. Mas Ele acrescentou: “faça-se a vossa vontade e não a minha” (cf. Lc 22,42).

Assim nós devemos olhar para a dor que nos espreita no caminho: “Se for possível, afastai de mim este cálice; se não for possível, faça-se a vossa vontade e não a minha”. E estar com a alma  preparada e temperada para, a qualquer momento, com paz, com varonilidade e, sobretudo, com espírito de Fé suportar qualquer dor: a mais inopinada, a mais injusta, a que abalaria mais nosso   princípio axiológico. Seja lá o que for, aguentar, porque foi assim que Ele sofreu.

Que Nossa Senhora nos ajude a ter essas reflexões bem no fundo de nossas almas.

Penetramos nos tempos cujo dia seguinte nós não conhecemos. Espreitar-nos-á a dor? Talvez! Se nos espreitar a dor, nos espreita a glória. Vamos para a frente!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 21/8/1985)