Nossas obrigações para com a Cruz

Na seqüência de seus comentários ao opúsculo escrito por São Luís Maria Grignion de Montfort, Dr. Plinio ressalta esta grave advertência do santo: quem quiser ser um autêntico Amigo da Cruz, deve fugir do mundanismo que o conduzirá por um caminho de perdição, oposto ao da perfeição e santidade para o qual foi chamado.

 

São Luís Grignion de Montfort assim continua a sua Carta:

Sois por vossas ações, meus queridos Amigos da Cruz, aquilo que o vosso grande nome significa? Ou pelo menos tendes vontade e desejo autênticos de assim vos tornardes com a graça de Deus, à sombra da Cruz do calvário e de Nossa Senhora da Piedade? Entrastes no verdadeiro caminho da vida (Pr 6, 23; 10, 17; Jr 21, 8) , que é o caminho estreito e espinhoso do Calvário? Não estareis, sem pensar nisso, no caminho largo do mundo, que é a via da perdição? Sabeis que existe um caminho que parece ao homem reto e seguro, e que conduz à morte (Pr 14, 12)?

Justificadas apreensões de um Santo

Nestas perguntas transparece intensamente o espírito de São Luís Grignion. Quer dizer, de um lado ele toma em consideração os Amigos da Cruz como pessoas eleitas por Deus para um alto chamado. De outro lado, porém, ergue-se diante delas a malícia do século, e à vista das condições em que estas pessoas vivem, São Luís manifesta suas  apreensões. Donde formular questões como esta: “sois verdadeiros Amigos da Cruz?”

Ou seja, fácil é alguém tomar o nome de Amigo da Cruz, mas igual facilidade há para deixar de sê-lo. Portanto, trata-se de uma preocupação cujo fundamento é evidente. Então, insiste: “Pelo menos tendes verdadeiro desejo e vontade de assim vos tornardes com a graça de Deus”, etc.?

A formulação empregada por ele é muito apropriada e fina, porque um verdadeiro Amigo da Cruz é alguém que, em primeiro lugar, está em ordem com seus deveres para com a Santa Cruz. Mas também é aquele que possui ao menos um desejo autêntico de estar em ordem a esses deveres. Poderá ter suas faltas, suas fraquezas, mas almeja atingir a plenitude de entrega própria ao seu chamado. Este será considerado igualmente um verdadeiro Amigo da Cruz.

Dois graus de amor à Cruz

Percebe-se aqui dois graus de amor à Cruz, assim como pode haver dois graus de perfeição religiosa no cumprimento de uma vocação.

Antes de tudo, tal perfeição é a inteira conformidade do membro de uma ordem com sua respectiva regra. Contudo, pode dar-se o caso de que algum religioso, ainda neófito, não tenha alcançado essa conformidade; ou, por desventura, terá retrocedido na sua trajetória rumo àquela perfeição. Mas, se ele demonstrar o desejo de se tornar um verdadeiro religioso e de adquirir um elevado grau de observância, ele ainda se achará no seu lugar próprio dentro da ordem. Quer dizer, há para com ele, da parte de Deus e dos seus superiores, uma atitude de misericórdia, de compaixão, e até de compreensão, a par das graves exigências que a regra lhe impõe.

O mesmo se aplica ao Amigo da Cruz. Há aquele que se entregou por completo ao amor e ao serviço da Cruz para com ela se identificar; e há aquele que, por lacunas espirituais, ainda não alcançou essa plenitude de devoção, mas a deseja atingir. Então, olhando para estes últimos, São Luís Grignion escreve: “Não estareis, sem pensar, no caminho largo do mundo, o caminho da perdição? Sabeis bem que existe uma via que parece reta e segura, e na realidade conduz à morte?”

A expressão “sem pensar”  é curiosa,  e insinua bem o que poderia ser uma culpa inconsciente do Amigo da Cruz. Ora, o caminho do mundo é tão agradável, e o homem de tal maneira se habitua ao que lhe compraz, que ele por irreflexão acaba cometendo uma falta. Esta, embora não seja inteiramente consciente — e, portanto, não reúna as condições próprias ao pecado mortal — é um passo em falso. E a sucessão de faltas e concessões inconscientes, acabam desviando a pessoa para longe do caminho verdadeiro. Daí a nota da prudência pastoral, da vigilância de São Luís de Montfort em relação a esses Amigos da Cruz.

Censura aos que cedem à concupiscência do mundo

Continua ele:

Distinguis bem a voz de Deus e de sua graça, da voz do mundo e da natureza? Escutais a voz de Deus, nosso Pai, que depois de ter dado a sua tríplice maldição a todos que seguem as concupiscências do mundo: Ai, ai, ai dos habitantes da Terra (Ap 8, 13), grita‑vos amorosamente, estendendo‑vos os braços: separai‑vos, meu povo (Nb 16, 21). Separai‑vos, meu povo escolhido, queridos Amigos da Cruz de meu Filho, separai‑vos dos mundanos, malditos por minha majestade, excomungados por meu Filho (Jo 17, 9), e condenados por meu Espírito Santo (Jo 16, 8-11).

Importa compreender bem a razão dessas fortes censuras, dessa maldição tão pesada sobre o mundanismo.

Lembremo-nos de que, na linguagem da vida espiritual, o apego e o amor desregrado às coisas do mundo é, ao lado do demônio e da carne, uma das concupiscências que inclinam o homem para o pecado e o afastam de Deus. Portanto, o mundanismo assim entendido sempre foi algo ruim, ao qual o católico desejoso de alcançar a santidade deve combater.

No tempo de São Luís Grignion, o mundanismo ainda se revestia de uma aparência elevada e nobre, característica do Ancien Régime prévio à Revolução Francesa, mas que preparou largamente a irrupção desta no cenário europeu. Se tomarmos gravuras que representam burgueses dos séculos XVI e XVII, veremos que são ainda pessoas sérias, compassadas, dignas. Não era uma burguesia mundana, e tinha conservado toda aquela circunspeção dos antigos tempos. Pelo contrário, considere-se um burguês das vésperas da Revolução Francesa, e já não se o distingue mais do nobre, não só porque os trajes se igualaram, mas também por causa da atitude. Nivelaram-se. E o mundanismo revolucionário que impregnava as cortes, irradiou-se para as outras camadas da sociedade, putrefazendo-a por completo.

Em nossos dias, podemos dizer que o mundanismo se multiplicou pelo mundanismo, e as suas seduções, atiçadas por obra do demônio, são ainda mais perniciosas. Donde as censuras de São Luís Grignion conservarem toda a sua atualidade, e são perfeitamente aplicáveis aos que se entregam ao mundo, pois estes romperam com as amarras que os uniam a Deus Nosso Senhor.

Se desejamos ser autênticos Amigos da Cruz, devemos limpar nossas almas de qualquer laivo de mundanismo, de qualquer apego ao que há de frívolo, de laicista e de fundamentalmente contrário à sabedoria, nos costumes do mundo.

Contagiabilidade da virtude contra o vício

Continua São Luís Grignion:

Tomai cuidado para não vos sentardes em sua cadeira toda empestada, não sigais os seus conselhos, nem mesmo pareis em seu caminho (Sl 1, 1).

Essa cadeira toda empestada de que fala São Luís é uma referência ao Salmo 1, onde o salmista exclama: “Feliz o homem que (…) não se assenta entre os escarnecedores”, ou, segundo outras traduções, “que não toma assento na cátedra de corrupção dos pecadores”. Esta última expressão me parece ainda mais vigorosa. Quer dizer, trata-se da cadeira de onde o pecador ensina o pecado e, de certa forma, é a própria sede do pecado, na qual este se instala e aí faz luzir sua “glória”.

Fugi da grande e infame Babilônia (Is 48, 20; Jr 50, 8), não escuteis outra voz e não sigais outras pegadas senão as de meu Filho bem-amado, que vos dei por vosso caminho, vossa verdade, vossa vida (Jo 14, 6), e vosso modelo (Mt 17, 5).

Vemos aqui uma espécie de demolição ardente, levada a cabo por São Luís Grignion, contra toda a sedução exercida pela sociedade frívola do seu tempo. Ele queria os Amigos da Cruz afastados desse mundanismo.

Por outro lado, é também interessante notar que no meio dessa sociedade frívola surgiram outros movimentos de autêntica piedade católica, que reagiram a seu modo contra a decadência generalizada do ambiente em que viviam. Creio que tal reação se deve ao princípio da contagiabilidade da virtude, considerado por nós em exposição anterior. Ou seja, na ordem sobrenatural há reversibilidades, reciprocidades, interações pelas quais uma virtude séria e profunda praticada de um lado repercute no outro. Assim, havendo na Vandeia ou na Bretanha daquela época, muitos genuínos Amigos da Cruz, efetivamente separados do mundo, ainda que não conhecessem os Amigos da Cruz de Versailles, aqueles reforçavam a possibilidade de perseverança, de santificação e de vitória destes últimos no meio dos deleites e das delícias da corte mundana.

O exemplo de Maria Teresa d’Áustria

Recordo-me, a esse propósito, da figura da grande imperatriz Maria Teresa d’Áustria. Não se tratava de uma santa, mas era uma boa senhora católica, com o padrão mínimo de algo do qual a santidade é a expressão mais elevada. E ao considerar muitos aspectos de sua rica personalidade, poderemos ver quanta retidão, compostura, destreza, e quanta dignidade assentada sobre o trono, em meio a uma corte que, se não era a primeira, era das mais importantes do mundo, a do Sacro Império Romano Alemão.

Creio que essa situação só se tornava possível por esse trabalho de subestrutura da virtude que se contagiava entre os bons de lugares diferentes. E em seguida notava-se a recíproca: a Cruz levantada no mais alto degrau da corte, repercutia sobre todo o país e nas camadas profundas da população, gerando novos Amigos da Cruz. Esses são os grandes mecanismos por onde o amor de Deus se afirma, se multiplica e conquista as almas.

Abraçar a Cruz em união com o Divino Redentor

Prossegue São Luís Grignion:

Não escutais esse amável Jesus que, carregando sua cruz, vos conclama: vinde após Mim (Mt 4, 19), o que me segue não anda nas trevas (Jo 8, 12); tende confiança, Eu venci o mundo (Jo, 16, 33)?

Conforme o ensinamento de todos os grandes autores, São Luís Grignion acrescenta que a Cruz só é suportável quando carregada em união com Nosso Senhor. A Cruz concebida esquematicamente, apenas de modo teórico, aterroriza o homem e este foge dela. O único modo de a Cruz ser atraente, é considerar Aquele que nela se acha pregado e d’Ele receber as forças necessárias para aceitá‑la.

É palavra do próprio Jesus: “Quando Eu for elevado, atrairei a mim todas as criaturas”. Ou seja, o Divino Crucificado é o verdadeiro encanto da Cruz, o que realmente atrai as almas para ela. E não apenas atrai, como lhes concede as graças e o vigor indispensáveis para carregá-la. Com os olhos fitos n’Ele, pensando no seu Sagrado Coração e no precioso Sangue que por nós derramou, na sua agonia e morte, é que adquirimos forças para segui-Lo.

E não nos esqueçamos de que essas graças e essas forças nos são concedidas por intermédio de Maria Santíssima, a Medianeira Universal, que se encontrava aos pés da Cruz, com seu Coração Imaculado transpassado e coroado de espinhos.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 17/6/1967)

Revista Dr Plinio 116 (Novembro de 2007)

 

Enlevo e holocausto

A “Carta Circular aos amigos da Cruz” – I

Serviço, obediência e holocausto em prol da Igreja, nascidos do enlevo pelas perfeições de Deus, são atitudes próprias da alma onde lateja um autêntico amor à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. É o que Dr. Plinio nos convida a compreender, ao comentar — numa série de conferências que equivalem a um retiro espiritual — a “Carta circular aos amigos da Cruz”, escrita por São Luís Grignion de Montfort.

 

São Luís Maria Grignion de Montfort escreveu uma obra com um título glorioso: “Carta Circular aos amigos da Cruz”. Por ser pequena, deu-lhe a forma de carta. A julgar pelo título, foi redigida para afervorar certo número de pessoas conhecidas do santo, particularmente amigas da Cruz ou, pelo menos, com um começo de amor a ela, numa época (início do século XVIII) onde se era pouco amigo da Cruz(1).

Ardorosa linguagem do santo

Esse é um pormenor importante, e não de interesse meramente livresco. Porque uma é a linguagem empregada com os inimigos, outra, com os amigos. Há ainda um terceiro modo de falar, utilizado com os irmãos, aqueles que vibram de entusiasmo pelo mesmo ideal que o nosso, aos quais não queremos apenas afervorar, mas impulsionar nas sendas desse ideal. São Luís escreve numa linguagem que convém às duas últimas categorias, embora mescle considerações diversas.

Com efeito, alguns pensamentos são próprios a estimular o amor à Cruz, outros constituem defesas ou apologias da Cruz, para serem usados em polêmicas contra os inimigos dela. Analisaremos ambos os aspectos, para bem compreendermos a linguagem e o significado da Carta, que assim começa:

Já que a divina Cruz me esconde e me interdiz a palavra, não me é possível e nem desejo vos falar, para vos externar os sentimentos do meu coração sobre a excelência e as práticas divinas de vossa união na adorável Cruz de Jesus Cristo.

Hoje, entretanto, último dia de meu retiro, saio, por assim dizer, da atração do meu interior, a fim de esboçar neste papel alguns leves dardos da Cruz, para com eles transpassar vossos bons corações. Prouvesse a Deus que, para acerá-los, bastasse o sangue de minhas veias, em lugar da tinta da minha pena! Mas, ai de mim! Mesmo se ele fosse necessário, é por demais criminoso. Que o espírito de Deus vivo seja, pois, a vida, a força e o teor desta carta; que sua unção seja a tinta de meu tinteiro; que a divina Cruz seja minha pena, e vosso coração, o meu papel!

Graça especial para se ter amor à Cruz

Percebe-se nesse trecho certo estilo próprio à literatura da época, mas também um pensamento teológico muito profundo. Ou seja, para tudo quanto é bom, faz-se necessária a graça de Deus, e de modo especial no que diz respeito à cruz. Porque o homem é tão egoísta e infenso ao sofrimento que, se não houver uma graça particularmente intensa, pujante, a ação de qualquer pessoa é incapaz de despertar noutra o amor à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Por exemplo, a graça do enlevo pelas coisas celestes, pelas coisas de Deus, proporciona a uma pessoa coragem para que ela carregue grandes cruzes como se fossem pequenas. Quer dizer, esse amor latente por Deus, por Nossa Senhora, pelas grandezas do Céu agem com tal profundidade no homem que, por um ato de consentimento livre, consciente — e ao mesmo tempo subconsciente, o que parece paradoxal, porém verdadeiro — ele se deixa transformar. E o amor à Cruz é o sintoma dessa mudança de mentalidade.

Esse é um ponto fundamental na vida espiritual. Pois quando no coração de alguém cresce o enlevo por algo, ele fica apetente de obediência, serviço e holocausto, que são cruzes. Fazer a vontade de outrem e não a própria: obediência; servir ao próximo e não a si mesmo e a seus egoísmos: serviço; e mais que tudo isso, o holocausto, o sacrificar pelo outro o que se possui, até a imolação da própria vida. Essas três atitudes de alma constituem cruzes e são a substância de toda cruz que existe na Terra.

Pode-se supor que é a esse amor nascido do enlevo pelas coisas de Deus, o qual torna as almas capazes de abraçar a Cruz, é a essa graça especial que se refere São Luís Grignion no exórdio de sua carta.

“Coragem! Combatei valentemente!”

E prossegue:

Estais reunidos, amigos da Cruz, como outros tantos soldados crucificados para combater o mundo, não fugindo dele como os religiosos e religiosas pelo medo de serdes vencidos, mas como valorosos e bravos guerreiros no campo de batalha, sem largar o pé e sem voltar as costas. Coragem! Combatei valentemente!

Como já vimos, uma das características de São Luís Grignion é o espírito combativo, com um quê de fogoso no sentido de apostrofar os erros dos adversários. Então ele, que fundou uma congregação religiosa, reunindo pessoas para fugirem do mundo, conhece a variedade dos dons que existem na Igreja. E compreende que certas almas são chamadas a permanecer no mundo para combater o mal. Porque viver no mundo é sinônimo de lutar contra o mal. É para esses que ele escreve: “valorosos e bravos guerreiros no campo de batalha…” Apenas isso? Não. “Coragem! Combatei valentemente!” Quer dizer, é preciso tomar a iniciativa em defesa da virtude, contra o pecado.

Essas palavras se compaginam com a forte personalidade de São Luís Grignion de Montfort, fazendo-nos imaginar um missionário que fala e brande um crucifixo para os seus ouvintes, convidando-os à luta. Nesse trecho há qualquer coisa do timbre de voz de nosso santo, que é insubstituível. Aqui transparece sua psicologia inteira: abrasado de entusiasmo, não passando um minuto sequer sem um amor a Deus superlativo, lucidíssimo, com os olhos voltados ao mesmo tempo para o ideal que o enlevava e para a ação por ele contemplada. Portanto, da chama da contemplação passava para o ato, realizando um apostolado dardejante, levando muitas pessoas consigo. Era um braseiro ardente, cujo calor comunicativo se sente nessas palavras.

Mais anjo do que homem

Tem-se a impressão, aliás, ao lermos esses escritos de São Luís Grignion, de vermos nele mais um anjo do que um homem, com o amor próprio de um serafim. Constantemente aceso e deitando labaredas em torno de si. Ele possuía uma castidade primeira, uma candura inicial, uma incontaminação da sabedoria, sem nenhuma concessão às máximas mundanas, aos desvios da Revolução. Era um reflexo do espírito de Nossa Senhora agindo entre os homens, como um anjo.

Como se vê, nesses comentários procuramos fazer sentir o tom de voz e quase o calor pessoal de São ­Luís Grignion de Montfort, pois para nós é indispensável compreendermos a personalidade dele, que tanto nos fala à alma. Afinal, ele é o santo da verdadeira devoção a Nossa Senhora, a qual alcança para seus devotos a plenitude de dons como este do amor à Cruz, enaltecido por São Luís nessa sua admirável carta circular.

(Continua em próximo artigo)

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 20/5/1967)

A “Carta circular aos Amigos da Cruz” – VII Amoroso apelo de Jesus

Na seqüência de seus comentários ao opúsculo de São Luís Grignion de Montfort, Dr. Plinio nos coloca diante desta imperiosa questão: temos retribuído como devemos — isto é, pelo nosso empenho em perseverar na virtude — aos sofrimentos que o Divino Redentor e sua Mãe Santíssima padeceram por nós no caminho do Calvário?

 

Na exposição anterior sobre a “Carta circular aos Amigos da Cruz” consideramos o pensamento de São Luís Grignion acerca dos dois partidos que se enfrentam na história humana: o de Jesus, constituído pelos que se despojam das coisas terrenas para segui-Lo com sua Cruz,  e o do mundo, composto pelos homens que se deixam levar pelas vãs ilusões mundanas.

Pungentes palavras de Nosso Senhor a seus seguidores

Na seqüência, o santo autor assim escreve:

Lembrai-vos, meus caros confrades, que nosso Bom Jesus vos olha neste instante e diz a cada um de vós em particular: “Eis que quase todos me abandonaram no caminho real da Cruz. Os idólatras cegos zombam de minha Cruz como de uma loucura; os judeus obstinados se escandalizam com ela, como se fosse objeto de horror (1Cor 1, 23); os hereges quebram-na e a derrubam como coisa digna de desprezo. Mas, e isto só posso dizer com lágrimas nos olhos e com o coração transpassado de dor, os filhos que criei em meu seio e que instruí em minha escola, os meus membros que animei com meu espírito abandonaram-me e desprezaram, tornando-se inimigos de minha Cruz (Is 1, 2)! “Numquid et vos vultis abire” (Jo 6, 67)?

“Quereis vós também abandonar-me, fugindo de minha Cruz, como os mundanos, que nisto são outros tantos Anticristos: antichristi multi?” (1 Jo 2, 18) Quereis, enfim, conformar-vos ao século presente, desprezar a pobreza de minha Cruz para correr após as riquezas? Evitar a dor de minha Cruz para procurar os prazeres? Odiar as humilhações de minha Cruz para ambicionar as honras? Tenho, na aparência, muitos amigos que me fazem protestos de amor, mas no fundo me odeiam, pois não amam a minha Cruz; muitos amigos de minha mesa, e pouquíssimos de minha Cruz.”

A este apelo amoroso de Jesus elevemo-nos acima de nós mesmos; não nos deixemos seduzir pelos nossos sentidos, como Eva; não olhemos senão o autor e consumador de nossa fé, Jesus crucificado. Fujamos da concupiscência do mundo corrompido; amemos Jesus Cristo da melhor maneira, isto é, através de toda sorte de cruzes. Meditemos bem estas admiráveis palavras de nosso amável Mestre, que encerram toda a perfeição da vida cristã: “Si quis vult venire post me, abneget semetipsum et tollat crucem suam, et sequatur me!” [Se alguém quiser vir após Mim, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me] (Mt 16, 24).

Sendo fiéis, podemos diminuir as dores de Jesus na Paixão

O que vimos até aqui é, portanto, uma espécie de prêmio do estilo de vida de renúncias que Nosso Senhor Jesus Cristo traçou para seus fiéis seguidores. E essas palavras exortam e preparam a alma a receber bem um programa tão austero.

Façamos uma análise desse trecho.

Lembrai-vos, meus caros confrades, que nosso Bom Jesus vos olha  neste instante, e diz a cada um de vós em particular: “Eis que quase todos me abandonaram no caminho real da Cruz”.

Esta imagem tem um fundamento histórico, ou seja, Jesus Cristo, do alto do Céu, vê todas as almas e lamenta que tantas delas O tenham abandonado no caminho da Cruz. Além disso, possui um sentido mais profundo, que sempre devemos tomar em consideração, referente às disposições de Nosso Senhor durante a Paixão.

Sabemos que Ele sofreu na previsão do mal que faríamos. E, portanto, de um modo misterioso, mas muito real, podemos diminuir as dores d’Ele na Paixão, de acordo com o bom procedimento que tenhamos. Nosso Senhor, em vários momentos de sua Paixão, se não em todos, teve-nos em vista, considerando as alternativas de nossas almas em seguir o caminho da Cruz, em aceitar ou não os sofrimentos.

Ser-nos-ia possível fazer essa meditação tomando cada passo da Via Sacra. Por exemplo, quando o Redentor caiu três vezes sob o peso da Cruz, poderia ter pensado: “Plinio Corrêa de Oliveira aguentará as cruzes sob as quais deverá cair? Ó Pai Eterno, eu Vos peço por ele, para que tenha força e ânimo, a fim de carregá-las”. Nossa Senhora, acompanhando seu Divino Filho, teve presente Plinio Corrêa de Oliveira e cada um dos que estão aqui, na previdência que ambos tinham dos acontecimentos vindouros, e se perguntavam o que faríamos das cruzes com as quais nos visitariam: se bem as receberíamos ou se as abandonaríamos; que proveito tiraríamos da imensa quantidade de sangue derramado, de seus gemidos, prantos, dores e tudo o mais que estavam sofrendo.

Não é, portanto, despropositado fazermos esse raciocínio, cheio de compunção. Para compreendermos tudo quanto esse pensamento tem de pungente, devemos imaginar um pai que fez tudo por seu filho e, ao chegar o momento de receber uma retribuição, pergunta-se: como meu filho vai me recompensar? Corresponderá ao bem que lhe fiz? Ou, pelo contrário, pagar-me-á com uma injúria, uma blasfêmia, um abandono? Ou, então, com uma dessas friezas que naturalmente enregela a alma de um pai?  Essas são algumas considerações — todas elas válidas, e haveria outras — a fazer a propósito desse trecho de São Luís Grignion de Montfort.

A necessidade da graça para compreender essas verdades

A partir da fé essas perguntas são muito coerentes e lógicas. Cumpre dizer, entretanto, que quando temos cogitações como essas, sentimos a necessidade da graça. Porque sabemos que tudo isso é muito razoável, porém muitas vezes nada disso nos fala sensivelmente à alma. Se recebermos uma graça, podemos nos transformar ao calor de raciocínios assim, baseados na fé. Compreendemos, desse modo, como a graça divina é indispensável para avançarmos na vida espiritual.

Alguém poderia indagar: “Por que, então, o senhor perde tempo com esses comentários, se acha que sem a graça não é possível aproveitar isso?”

São feitos na esperança de que Nossa Senhora, em certo momento, faça-os frutificar, concedendo graças que me ajudem, e a cada um dos meus ouvintes, a corresponder a essas verdades. Deve-se agir assim: repetir, repetir, até o momento em que Ela tenha pena de nós e nos obtenha uma grande graça para mover nossas almas. O valor disso, portanto, é exatamente o da repetição, à maneira de um mendigo que, do lado de fora da porta, bate, bate, bate até ela lhe ser aberta. Ou daquele homem importuno, elogiado por Nosso Senhor no Evangelho: para conseguir pão, bateu tanto à porta da casa de seu vizinho que este pensou: “Ainda que seja só nesta ocasião, para acabar com o incômodo, vou abrir e dar-lhe o que pede”. Assim também devemos fazer.

A Cruz: razão mais profunda pela qual se abandona Nosso Senhor

É interessante notar que, por esse trecho, percebe-se ter tido São Luís Grignion uma concepção do agir humano inteiramente de acordo com os princípios que procuramos traçar em nosso livro “Revolução e Contra-Revolução”. Ou seja, para ele, assim como pensamos nós, a razão mais profunda pela qual as pessoas abandonam Nosso Senhor é a Cruz. O Redentor quer que os homens carreguem a Cruz, e muitos não a aceitam. Donde poderem ser classificados de acordo com a atitude que tomam em função do sofrimento. Então diz ele:

Os idólatras cegos zombam de minha Cruz como de uma loucura.

Os idólatras, isto é, os que vivem para os prazeres, vêem a cruz e a consideram uma loucura. O gênero de vida levado pelos católicos coerentes com sua religião é tido como uma demência pelos mundanos.

Os judeus obstinados se escandalizam com ela, como se fosse objeto de horror. Os hereges quebram-na e a derrubam como coisa digna de desprezo.

Ele se refere aos protestantes que, em sua época, estavam ainda, sob certo ponto de vista, no auge de suas iniciativas, e quebravam as cruzes ao longo dos caminhos da Europa inteira. Diziam que venerar a cruz é uma forma de idolatria.

Mas, e isto só posso dizer com lágrimas nos olhos e com o coração transpassado de dor, os filhos que criei em meu seio e que instruí em minha escola, os meus membros, que animei com meu espírito, abandonaram-me e desprezaram, tornando-se inimigos de minha Cruz!

Por “membros” entende-se aqui os integrantes do Corpo Místico de Cristo, ou seja, da Igreja. Muitos abandonaram e desprezaram a Cruz, e não quiseram seguir Nosso Senhor. Vemos, assim, como muitas apostasias que presenciamos ocorrem em função da Cruz. Quer dizer, muitos homens não querem o sofrimento, por isso abandonam o Divino Salvador. Se Ele somente oferecesse vantagens terrenas, muitos O seguiriam.

 

(Continua em próximo artigo. Extraído de conferência em 8/7/1967)

 

“Passou pela vida praticando o bem”

Ao discursar como paraninfo do Colégio Arquidiocesano, em 1936, Dr. Plinio exalta o ideal do catolicismo autêntico que, diante do mundo posto na alternativa de decidir por Cristo ou contra Ele, não transige nem se intimida, proclamando sua Fé com enérgica e inquebrantável tenacidade.

 

Permiti que esta oração, que nasceu do âmago de meu coração e contém o mais sincero de meus sentimentos, seja dirigida, em nome da gloriosa mocidade católica, que tenho a honra de representar nesta solenidade, aos meus jovens amigos, os bacharelandos do Colégio Arquidiocesano, de 1936 . (….)

As gerações que precederam a esta, que hoje ingressa na vida, então divididas em campos antagônicos. Uma imensa divergência intelectual separa seus expoentes mais representativos. Do alto das cátedras universitárias e das tribunas parlamentares, através das colunas dos jornais ou das páginas dos livros, pela palavra ampliada ao microfone ou abafada no segredo das confabulações políticas, procuram os professores, os escritores e os estadistas do presente traçar os rumos por onde querem guiar o Brasil.

Não se iludam, porém, os pregadores de ideologias boas ou más, construtoras ou demolidoras: sua doutrinação só será fecunda, na medida em que ela penetrar no espírito e no coração das gerações novas. A estas é que pertence o futuro. Para onde ela se orientar, orientar‑se‑á o Brasil de amanhã. Os pregadores de doutrinas não são, hoje em dia, senão meros advogados de causas santas ou de causas fraudulentas. À nova geração, é que incumbe a augusta função de juiz. (…)

A crise da adolescência

Pouco têm escrito sobre [a crise da adolescência] os sociólogos e os historiadores. Não importa. Tratemos de analisar esta crise, de lhe apontar as origens, de lhe investigar os efeitos, e chegaremos à conclusão de que nela se encontra uma das causas mais ativas de grande catástrofe do mundo contemporâneo.

A crise da adolescência é, em via de regra, o fato culminante daquilo a que se poderia chamar a história interior de toda a humanidade, nos últimos cem anos. É na diferença das atitudes tomadas por nós e nossos avós perante esta crise, que se encontra, em grande parte, o segredo da radical oposição entre o século XIX e o século XX, na filosofia, na sociologia, na política, na literatura e nas artes.

Nos cento e poucos anos que medeiam entre a queda de Napoleão e os dias que vivemos, a sociedade tem educado a infância em princípios que, geralmente, são cristãos.

Faça‑se a estatística do número de adolescentes que, anualmente concluem o curso em colégios católicos, e ter‑se‑á uma ideia da extensão que a influência cristã tem na formação da infância contemporânea. Por mais que, em nossos dias, os fatores do ambiente contrariem esta influência, ela ainda é considerável. E muito mais considerável ela foi nas gerações anteriores tão céticas quanto a nossa, mas mais respeitadoras — por espírito de tradição, se quiserem — da moral cristã.

No século passado, como neste século ainda, o lar e o colégio, os dois principais ambientes em que transcorre a infância, foram guiados, em via de regra, por um espírito que, ora mais ora menos intensamente, apresenta matizes cristãos.

No colégio católico, a doce figura do Cristo irradia sobre os alunos o esplendor de sua harmonia moral. Por mais que essa irradiação seja inconscientemente recebida como muitas vezes ocorre, ela não deixa de ser real. O Cristo que se contorce em sofrimentos e em súplicas pela humanidade, no Crucifixo do refeitório, o Cristo que, no altar da Capela, aponta aos alunos o seu peito entreaberto, no qual pulsa um coração abrasado de amor, o Cristo cuja doçura e cuja imensa misericórdia são ensinadas na aula de Religião, exerce sobre os alunos uma impressão profunda, a que não se furtaram nem sequer os campeões da impiedade do século XIX.

No lar, o Cristo também figura como um protetor benigno e supremo dos interesses domésticos. É à sua bondade, que se deve toda a felicidade da família. É à sua clemência, que a família recorre nos momentos amargos da provação. É à sombra de sua lei, que florescem castamente as afeições domésticas, é d’Ele, que emana o ambiente de pureza sem o qual a vida da família não é possível.

O Cristianismo floresce no ambiente doméstico, não apenas pela eficácia do culto que aí se pratica, como na carícia casta de mãe, da irmã, na austeridade do pai, e na inocência da vida dos filhos.
No século XIX como no século XX — aliás, no século XX menos do que no século XIX — é esta a regra geral.

O jovem entra num mundo que prega uma lei oposta

Mas, com a adolescência, rompem‑se os véus que ocultavam à infância o verdadeiro aspecto da vida moderna. E o jovem, afeito a um ambiente de Fé e de pureza, se vê forçado a ingressar inesperadamente em um mundo que prega uma lei diametralmente oposta à que ele aprendeu a respeitar. (…)
Ao adolescente, educado no amor da Fé e da pureza, a sociedade dirige, no limiar da vida, uma frase que é a antítese da do famoso bispo de Reims: “curva a cabeça, cristão, queima o que adoraste e adora o que queimaste.”

Se o adolescente tiver o heroísmo de resistir, o mundo o apupará como um covarde. Se tiver a covardia de ceder, aplaudi‑lo‑á como um herói.

Esboçando em largos traços o panorama da crise da adolescência na sociedade semi‑cristã dos últimos cem anos, não tive a pretensão de enquadrar, nesta descrição, com todos os seus detalhes particulares, a imensidade de aspectos diversos que, segundo as circunstâncias de tempo e lugar, essa crise pode assumir.

A necessidade de optar por Cristo ou contra ele

Em todos estes aspectos, no meio de tantas variantes, só quis destacar um traço fundamental, que se conserva invariável. Hoje como ontem — e, repito‑o, ontem muito mais do que hoje — a influência da Religião se exerce sobre a infância, de modo todo particular. Essa influência, que a sociedade moderna tolera por um resto de Fé ou de tradição, entra em choque com as exigências do ambiente que rodeia a mocidade. Deste choque, nasce para os adolescentes a necessidade de optar por Cristo ou contra Ele. Mais consciente em uns, menos consciente em outros, esta necessidade se impõe a todos. E é nas lutas íntimas que esta opção provoca, que consiste, em síntese, a crise da adolescência.

Nesta crise, como procedeu o homem do século XIX? Colocado na contingência de optar pelo Cristo ou contra Ele, que partido tomou?

Um e outro. Ou melhor, nem um nem outro. A atitude do século XIX, na crise da adolescência, foi sobretudo, uma atitude de vacilação. Desta vacilação nasceu a grande característica do século, que foi a incoerência.

É peculiar ao Catolicismo uma admirável harmonia entre sua doutrina religiosa, seus princípios morais e suas diretrizes sociais. Não é possível negar a primeira, sem atacar os fundamentos dos outros. Como não é possível rejeitar a esta, sem se colocar em oposição flagrante com aquela. O monolito, desde que seja fragmentado, deixa de ser monolito. O Catolicismo, desde que seja privado de uma de suas partes deixa de ser Catolicismo.

Não percebeu isto o século XIX. E exatamente por isto, na imensa vacilação que foi a causa de sua incoerência fundamental, o século XIX raras vezes chegou a repudiar completamente o Cristo pela boca de seus principais pensadores.(…) E não foi diversa a atitude da generalidade dos homens. A maior parte deles admirava a moral cristã, exigindo dentro do lar a sua rigorosa observância. O que não era obstáculo a que negasse os princípios religiosos em que se estribava esta moral, e se julgasse livre de a violar na vida extraconjugal. A família continuava a viver cristãmente, ainda mesmo depois de perdida a Fé. Como dizia Renan, a sociedade do seu tempo conservava vestígios do Cristianismo, sem conservar a Fé, como um vaso que tem por algum tempo o perfume das flores que dele retiraram.

Outros, faziam o contrário. Conservavam a Fé mas desprezavam todas as conseqüências morais que dela decorrem. Católicos na igreja e no lar, eram pagãos na política, na vida profissional e, sobretudo, na vida extraconjugal.

Espíritos fragmentados, admirando verdades a que não obedeciam, ou obedecendo a princípios que não aceitavam, os homens do século XIX tinham dentro de si o imenso mal‑estar que a prosperidade material apenas conseguiu anestesiar, e que tumultua necessariamente no coração de todo homem que não estabeleceu dentro de si o reinado da coerência. (…)

Repúdio à incoerência das gerações passadas

O século XIX admirava a “fé do carvoeiro”, na sua simplicidade e na sua pureza. Mas ridicularizava como preconceito inconsciente a Fé do cientista. Admitia a Fé nas crianças. Mas condenava‑a nos jovens e nos homens adultos. Quando muito, tolerava‑a na velhice. Exigia a pureza para a mulher. E exigia a impureza para o homem. Exigia a disciplina para o operário. Mas aplaudia o espírito revolucionário do pensador.

Evidentemente, contradições tão profundas deviam gerar crises íntimas, de grande intensidade. Em geral, foi em crises assim, que se formaram todos os agitadores que, no século XIX, atearam na Europa o incêndio dos ideais revolucionários. E foi também em crises assim, que se formaram quase todos os grandes convertidos ao Catolicismo, que proclamaram bem alto, contra o mundo e o século em que viviam, a sua Fé na Igreja de Deus.

Os acontecimentos dramáticos de que o século XX tem sido ator e testemunha, só concorreram para precipitar o desenlace desta crise.

Cada vez mais, a atitude de incoerência das gerações passadas vai sendo repudiada pelas gerações presentes. A bem dizer, nas gerações que despontam, só se deixam governar pela moral fragmentária do século passado os insuficientes, os displicentes, os indiferentes. (….)

Pregadores infatigáveis do grande ideal

As falanges marianas são, no Brasil, um exército quase inumerável de moços que, em um combate de todas as horas e de todos os minutos, pugnam pelo Cristo e pela civilização, contra o mundo contemporâneo que rola pelo abismo da anarquia, impelido pela força de seus próprios vícios. (…)

Pela palavra, pelo exemplo, pelo estudo, o Congregado Mariano é um pregador infatigável do grande ideal pelo qual vive. Indiferente à admiração de alguns como ao desprezo de muitos, ele segue o seu caminho invariavelmente reto, cumprindo o dever, amando o próximo, amando a Pátria, servindo a todos os semelhantes, por amor de Deus. De sorte que, na sepultura de cada Congregado Mariano, a Pátria possa escrever um dia, como epitáfio, aquelas palavras admiráveis que o Apóstolo disse do próprio Cristo Jesus (At 10, 38): “Pertransivit benefaciendo” (Passou pela vida praticando o bem).

Mas o amor ao bem tem como corolário necessário o ódio ao mal. O Congregado Mariano é um inimigo irredutível do mal. Onde muitos se calam, onde tantos se acovardam, onde quase todos silenciam, a voz do Congregado Mariano se ergue altiva e denodada, para estigmatizar o mal, para desmascarar seus partidários, para contrariar os ardis dos inimigos da civilização. Com a mesma indiferença com que enfrenta hoje os sarcasmos e as perseguições, enfrentará amanhã os canhões e as baionetas. Não há barreira que seu idealismo não vença. Não há dificuldade que sua abnegação não supere. Não há obstáculo que prevaleça contra a sua tenacidade enérgica e invencível.

Plinio Corrêa de Oliveira (Excertos do discurso publicado em “Echos”, nº 29, de 22/11/1936)