Perfeição do espírito da Contra-Revolução

Encarnação do Verbo é a Festa da escravidão a Nossa Senhora e da Contra-Revolução, na qual se celebra o espírito de obediência, o amor à hierarquia, à ordem, à dependência, a tudo quanto a Revolução odeia.

O espírito humilde e contrarrevolucionário de Maria Santíssima se manifesta em face deste mistério, pois quando Ela soube que o Verbo Se encarnaria n’Ela, sua reação não foi de Se vangloriar, mas de proferir esta frase humílima: “Eis a escrava do Senhor, faça-se em Mim segundo a tua palavra”.

Como se dissesse: “Se Deus quer de Mim essa coisa inimaginável, isto é, que Eu mande n’Ele, por obediência a Ele, n’Ele mandarei. Porque Ele é o Senhor, e em tudo farei a sua vontade”.

À luz deste mistério, ganha especial realce a atitude da Santíssima Virgem dizendo-Se escrava de Deus no momento em que Ele queria fazer um ato de escravidão em relação a Ela.

Aí vemos a perfeição do espírito da Contra-Revolução.

Plinio Corrêa de Oliveira – (Extraído de conferência de 16/3/1971)

Revista Dr Plinio (Março de 2016)

Encarnação do Verbo: o mistério da Contra-Revolução

A Festa da Anunciação do Anjo a Nossa Senhora nos convida a admirar este sublime paradoxo: no momento em que a Virgem Santíssima afirmava ser a serva do Senhor, o próprio Deus quis fazer um supremo ato de servidão, de dependência e de escravidão em relação a Ela. Nisto encontramos a perfeição do espírito da Contra-Revolução.

 

Em seu Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem(1), São Luís Grignion de Monfort tem o seguinte pensamento:

Os verdadeiros devotos de Nossa Senhora terão uma devoção especial pelo mistério da Encarnação do Verbo, a 25 de março, que é o mistério adequado a esta devoção,…

Quer dizer, da sagrada escravidão.

…pois que esta devoção foi inspirada pelo Espírito Santo: primeiro, para honrar e imitar a dependência em que Deus Filho quis estar de Maria, para glória de Deus seu Pai e para nossa salvação; dependência que transparece particularmente neste mistério em que Jesus se torna cativo e escravo no seio de Maria Santíssima, aí dependendo dela em tudo; segundo, para agradecer a Deus as graças incomparáveis que concedeu a Maria, principalmente por tê-La escolhido para sua Mãe digníssima, escolha feita neste mistério. São estes os dois fins principais da escravidão a Jesus Cristo em Maria.

Um grau de sujeição inimaginável

O pensamento muito profundo é de que Nosso Senhor, vivendo em Maria durante o tempo da Encarnação, esteve em uma dependência incomparável d’Ela, pois sendo já inteiramente lúcido, ficou, entretanto, completamente dependente, como uma criança no seio materno depende de sua mãe.

É o maior estado de submissão que se possa imaginar. Uma criança fora do ventre materno tem uma vida própria, liberdade de movimentos, enfim, todo um dinamismo próprio ajudado pela mãe. Mas não vive, propriamente, da vida da mãe. Pelo contrário, a criança que está no seio materno, vive da vida da mãe; em tudo é conduzida e, por assim dizer, circunscrita por ela.

Como sujeição, é um estado bastante semelhante ao de escravidão, porque neste o escravo renuncia completamente à sua liberdade para ficar inteiramente circunscrito pela vontade de seu senhor. Sua vida, seus atos são para o serviço de seu senhor, seus pensamentos tendem a ele. Assim era Nosso Senhor em relação a Nossa Senhora.

Aquele que, sendo infinito, criou o universo e a quem o Céu e a Terra não podem conter, foi contido pelas entranhas indizivelmente gloriosas da Santíssima Virgem e teve para com Ela um grau de sujeição inimaginável!

Em resposta ao “Non serviam” de Lúcifer, o “Amém” do Filho de Deus

Portanto, quem quiser ser verdadeiro escravo de Nossa Senhora deve venerar de modo muito especial essa miraculosa e insondável sujeição de Jesus a Maria, na qual o infinitamente maior deixou-Se dominar e conter pelo menor, na realização de um plano divino, cuja sabedoria excede a qualquer cogitação humana.

Por outro lado, este é o mistério da Contra-Revolução, porque se a Revolução é um grande “Non serviam”(2), o mais alto grau de alienação – praticado pelo Filho de Deus em Maria Santíssima – é o mistério que mais esmaga a psicologia, a mentalidade e os falsos ideais da Revolução. Em lugar do “Non serviam” é o “Amém”. Lúcifer bradou: “Não servirei”; Nosso Senhor disse: “Assim seja” a tudo quanto Nossa Senhora quis.

Exatamente isso dá uma constrição especial no homem de espírito revolucionário, diabólico. Não é apenas ver a Deus servido por sua criatura e, portanto, sendo observada aí uma espécie de ordem de mérito, mas é o próprio Criador querendo obedecer à sua criatura e esta mandando n’Ele. É levar a obediência a um grau que se não soubéssemos, pela Revelação, ter havido a Encarnação, nunca poderíamos imaginar que essa virtude chegaria a tal extremo.

Se isso deu tanta glória a Deus, a ponto de naquilo que abusivamente poderíamos chamar a História d’Ele – porque Deus é infinito e não tem História – Ele quis que figurasse esse ato de obediência insondável, compreendemos também como a obediência praticada por nós dá glória a Nossa Senhora. Em contrapartida, como a revolta injuria a Maria Santíssima e seu Divino Filho.

Vemos, assim, até que ponto a Revolução é odiosa a Deus, e isso nos leva a compreender melhor o Inferno, com seus tormentos eternos, o desespero completo, o esmagamento perpétuo do demônio, à vista do fato de que ele atentou contra este princípio: ele deveria obedecer e não quis.

Certos teólogos dizem que a revolta de Lúcifer deu-se porque lhe foi mostrado o plano da Encarnação e dada a ordem de adorar o Verbo de Deus Encarnado. E por ser um anjo de tão alta categoria, ele não quis e revoltou-se.

Esta hipótese, que me parece totalmente provável, adquire uma clareza ainda maior se pensarmos no demônio considerando Nosso Senhor Jesus Cristo contido no claustro sacratíssimo de Nossa Senhora e obedecendo a Ela. Ver essa obediência do Verbo Encarnado a uma criatura infinitamente menor do que Deus – por mais excelsa que seja –, e a inferioridade d’Ele em relação a essa criatura, isso deve ter levado ao paroxismo a indignação de Lúcifer.

A festa da Contra-Revolução

Nós podemos dizer, portanto, que o dia 25 de março é a festa da Encarnação do Verbo, da escravidão a Nossa Senhora, da Contra-Revolução. É a festa na qual se celebra o espírito de obediência, o amor à hierarquia, à ordem, à dependência, a tudo quanto a Revolução odeia.

É mais do que concebível que nos preparemos para essa festa por meio de orações especiais para pedir a Nossa Senhora que esse espírito representado pela Encarnação atinja em nós a plenitude desejada por Deus quando nos criou.

De outro lado, vemos também o espírito mais do que humilde e contrarrevolucionário de Maria Santíssima em face deste mistério. Quando Ela soube que o Verbo Se encarnaria n’Ela, sua reação não foi de Se vangloriar, mas de pronunciar esta frase humílima: “Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38). Como se dissesse: “Se Deus quer de mim essa coisa inexplicável, isto é, que eu mande n’Ele, até isso Ele pode exigir de mim. Portanto, se Deus pede o meu consentimento a essa situação inimaginável, por obediência a Ele, n’Ele mandarei! Mas é Ele o Senhor, e a sua vontade, em todas as coisas, eu farei.”

Como ganha um realce especial, à luz disso, a atitude de Nossa Senhora na Anunciação, dizendo-Se escrava de Deus no momento em que Ele queria fazer um ato supremo de servidão, de dependência, de escravidão em relação a Ela! Encontramos nisto a perfeição do espírito da Contra-Revolução.               v

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/3/1971)

Revista Dr Plinio 252 (Março de 2019)

 

1) Cap. VIII, art. 1, §4, n. 243.

2) Do latim: “Não servirei.”