Numa “palavrinha” para discípulos mais jovens, Dr. Plinio imagina como seriam as cogitações do Menino-Deus na Gruta de Belém, na noite de Natal. E nos faz admirar, especialmente, como o Verbo Encarnado possuía a suma ciência, tudo compreendia, e sobre nós se debruçava com amor, ao surgir neste mundo.
Como ponto de partida para nossa meditação sobre o Natal, consideremos o seguinte aspecto. Em geral, a iconografia católica nos apresenta o Menino Jesus com as características de uma criança recém-nascida, ainda sem o uso da razão, possuindo todas as limitações inerentes à primeira infância.
Essa representação é justa, não encerra nada de censurável, porque o Divino Infante habitualmente se mostrava assim às pessoas com as quais tinha contato. Porém, tais ilustrações não nos propiciam a noção completa da realidade d’Ele na noite de Natal, e por isso algumas raras imagens do Menino-Deus no-Lo mostram com uma fisionomia bem diversa: séria, serena, pensativa, meditativa.
Quer dizer, apesar da exterioridade de uma criança tão terna, o Menino Jesus já possuía o pleno uso de sua inteligência, e desde o primeiro instante de seu ser, no recinto sagrado de Nossa Senhora, Ele já pensava e tinha o conhecimento de tudo.
Assim sendo, poderíamos nos perguntar quais seriam suas cogitações e reflexões naquela ocasião.
Antes de tudo, pensava Ele no Pai Eterno, no Espírito Santo, nos esplendores da Santíssima Trindade, da qual é a Segunda Pessoa em união hipostática com a natureza humana. Ao mesmo tempo, deveria refletir sobre Nossa Senhora, obra-prima de toda a criação. Sem dúvida, constituía para Jesus um profundo deleite considerar Maria Santíssima naquele momento, em atitude de conhecer, adorar, analisar e acariciar o próprio Filho. Alegrava-O vê-La guardar todas as coisas no seu coração, meditando-as, perscrutando nos traços fisionômicos do Menino as correlações com tudo o que Ela, pelo dom da sabedoria, aprendera nas Escrituras acerca do Messias.
Nossa Senhora estabelecia essas ligações com sumo respeito e insondável adoração para com o Divino Infante, que os recebia com verdadeiro encanto, prazer e intenso amor por sua Mãe.
Ali estava também São José, e a Santíssima Virgem já exercia sua mediação, apresentando ao Menino Jesus as orações de seu esposo, pai adotivo d’Ele. Embora não fosse o progenitor segundo a carne, tinha um autêntico direito sobre o fruto das entranhas sagradas de Maria e, portanto, sobre o Recém-nascido.
São José adorava o Menino Deus, agradecia a honra de ser seu pai e Lhe apresentava suas preces por meio de Nossa Senhora.
Mas o Verbo Encarnado não circunscrevia suas considerações a esse quadro radioso. Ele pensava igualmente nos anjos, nos pastores que vinham adorá-Lo, e nos Reis Magos, os quais se aproximavam de Belém e logo se prostrariam a seus pés. Além disso, podemos supor que refletia a respeito das razões que O levaram a tomar nossa natureza humana e nascer para o tempo. Esses motivos se estendiam, com vistas proféticas, ao longo de toda a História. E foi exatamente esta a meditação feita por Ele, trinta e três anos depois, no alto da cruz: durante a existência da humanidade, sofreria muitas ingratidões, mas também suscitaria incontáveis atos de adoração.
No presépio, Ele via então todos os Natais da História, até o fim do mundo, com os mais diversos modos de se prestar veneração e reconhecimento ao Filho de Deus. Contemplou, por exemplo, São Luís Rei que, maravilhado diante de uma imagem do Menino Jesus, foi o primeiro — acredita-se — a se inclinar quando entoadas as palavras do Credo: “… e se encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem Maria, e se fez homem”. Como considerou a todos nós que, à imitação daquele grande monarca francês, fazemos o mesmo gesto ao rezarmos essa passagem do Símbolo dos Apóstolos.
Quiçá terá antevisto os poucos fiéis no fim do mundo — antes de Ele retornar à Terra em sua pompa e majestade — cantando pela última vez o Credo, e se inclinando ao pronunciarem aquelas palavras.
Ponderava, enfim, todos os relacionamentos de alma dos homens com Ele e com Maria Santíssima, a propósito do Natal.
E já no seu pobre berço, sofria ao prever a incredulidade e a impiedade se espalhando em tantos lugares da Terra, diante da apatia e indiferença de muitos que se pretendem seguidores d’Ele. Mas, por outro lado, o Menino Jesus contemplou também todas as almas católicas, zelosas da glória e do serviço de Deus, vivendo e batalhando para o triunfo da virtude, sofrendo com os pecados e as ofensas que os homens cometem contra Ele, reparando-as com penitências e espírito de ascese.
Desse modo, a mente e o coração sagrados do divino Recém-nascido, desde aquela ocasião, voltava-se para os católicos fervorosos, e implorava ao Pai Eterno, em favor deles, as forças necessárias para perseverarem no bom combate que devem travar pelo bem e pela Santa Igreja.
Então, acerquemo-nos do Presépio, e por meio de Nossa Senhora, São José, dos anjos, dos pastores e dos Reis Magos, peçamos a Jesus que aceite nosso desejo de sermos conforme seus divinos desígnios para conosco, o nosso anelo de nos unirmos às cogitações, às meditações e às considerações proféticas que fez na manjedoura, para vivermos o Natal em uníssono com Ele.
Roguemos ao Menino Jesus nos conceda o mesmo amor que Ele teve a tudo quanto hoje existe de bom sobre a face da Terra, próximo a nós, em nosso movimento, assim como ao bem que almas esparsas pelo mundo estarão realizando, por perseverarem no cumprimento da Lei de Deus, nos ensinamentos da doutrina católica apostólica romana.
São estas algumas das importantes intenções que devemos formular no Santo Natal, e assim implorarmos uma inteira união de alma com o Divino Infante, de maneira a que tudo quanto exista no coração d’Ele esteja no nosso; tudo quanto palpite no Imaculado Coração de Maria lateje também no nosso, e que o Natal celebrado por nós reflita exatamente o sentido de tudo quanto Jesus e Maria experimentaram naquela noite mil vezes bendita nas montanhas de Belém.
Alguém poderia lembrar: “Não posso pedir algo para mim, de caráter pessoal e material?”
Sem dúvida, é uma petição inteiramente legítima. Se tivermos as vistas postas, antes de tudo, nos bens espirituais, em nossa santificação e salvação eterna, suplicada para nós e pelos outros, é lícito que contemplemos também nossas necessidades temporais, uma vez que não comprometam em nada o interesse maior da alma.
Nesse sentido, convém nos lembrarmos da bela e concisa oração formulada por São Nicolau de Flue: “Meu Deus, dai-me tudo que de Vós me aproxima; tirai-me tudo que de Vós me afasta”. Eis um excelente pedido para apresentarmos ao Menino Jesus, a rogos de Maria Santíssima e São José.
Plinio Corrêa de Oliveira
Revista Dr Plinio 93 – Dezembro de 2005
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