Pureza, humildade, obediência

Na Anunciação, a atitude de Maria, a Virgem das virgens, foi perfeitamente virginal. De outro lado vemos como Ela foi humilde em toda a linha. Aquela que Deus destinara para ser sua Mãe, preparando sua alma e seu corpo para estarem inteiramente proporcionados — tanto quanto possível a uma criatura humana — à honra de ser a Mãe do Messias, não tinha de Si uma alta ideia. Pelo contrário, ficou perturbada porque julgou que o elogio do Anjo não podia caber para Ela.

Contudo, bastou São Gabriel dar-Lhe a certeza de que isso vinha de Deus para Maria responder: “Ecce ancilla Domini, fiat mihi secundum verbum tuum — Eis a escrava do Senhor, faça-se em Mim segundo a tua palavra”.

Assim, da humildade e da pureza conjugadas em Nossa Senhora resultou sua aceitação do plano de Deus, a respeito da Encarnação do Verbo.

Há, entretanto, outro “fiat” de Maria que é uma verdadeira beleza. Aos pés da Cruz, Deus quis que Ela consentisse em oferecer o seu Filho como vítima. Nossa Senhora O via estertorando na Cruz, dando aquele brado: “Meu Deus, meu Deus, por que Me abandonastes?”, e consentiu que aquilo se passasse para o gênero humano ser resgatado e as almas poderem ir ao Céu. Porque Deus queria que Ela quisesse, Ela quis! São os dois atos supremos de obediência da Santíssima Virgem.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 25/3/1990)

São José, Protetor da Santa Igreja

Modelo de todas as grandes virtudes, São José foi o homem escolhido por Deus para estar à altura d’Aqueles com quem deveria conviver: Nosso Senhor Jesus Cristo e Maria  Santíssima. Apesar dessa insigne missão, pouco se sabe sobre ele, mas a Igreja, dotada de sabedoria, proclama-o seu Protetor e Patriarca.

Na festa de São José há varias invocações que nós poderíamos considerar. Creio que dessas invocações, depois das que dizem diretamente respeito a Nosso Senhor Jesus Cristo, nenhuma é mais bonita do que a de Protetor da Santa Igreja Católica.

Da estirpe real de Davi

Os dados biográficos de São José são muito escassos. Sabemos que ele era da estirpe real de David, era virgem, foi casado com Nossa Senhora. Sabemos que eles mantiveram   virgindade depois do casamento e que ele teve o famoso caso da perplexidade.

Sabemos também que ele esteve presente no Santo Natal e uma das glórias dele é de, em todos os presépios, até o fim do mundo, naturalmente figurar como um dos personagens essenciais. Sabe-se que ele levou o Menino Jesus e Nossa Senhora até o Egito e de lá voltou, depois há um silêncio sobre ele.

Se tomarmos em consideração quem foi São José, compreende-se que deve ter sido um dos maiores Santos, e que até não faltam razões para se considerá-lo como o maior Santo de todos os tempos. Há razões para supor que o maior Santo tenha sido São João Batista ou, talvez, São João Evangelista. Em todo caso, há razões muito grandes e muito boas para supor que tenha sido ele, e podemos imaginar que a respeito de um tão grande Santo os dados biográficos os mais emocionantes, empolgantes e edificantes  não poderiam faltar. Ora, vemos que em lugar  de falar a respeito destes dados, e de nos dizer algo a respeito das maravilhas deste Santo, que ocupa um papel tão proeminente na piedade católica, pelo contrário, a Sagrada Escritura nos diz pouco, e muito pouco, e a Tradição também. Como se explica isso?

A primeira observação que cumpre fazer é que também a respeito de Nossa Senhora, figura não infinitamente, mas insondavelmente superior a São José, também a respeito d’Ela as Sagradas Escrituras dizem muito pouco, talvez até menos que a respeito de São José. Entretanto, sabemos que Nossa Senhora é a obra-prima da Criação e que  depois da humanidade Santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo, ligada à Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, por união hipostática e, portanto, já superior a qualquer  cogitação que o espírito humano possa fazer, depois d’Ele não há criatura, e nunca houve ou haverá, que possa sustentar uma pálida comparação com Nosso Senhor.

Ora, a respeito de Nossa Senhora, por que a Sagrada Escritura diz tão pouco? E por que a respeito destas duas grandes figuras há tal silêncio das Escrituras?

Pálida ideia da  realidade

Tenho a impressão que, além das razões indicadas habitualmente, como, por exemplo, a humildade de Nossa Senhora e de São José, que quiseram ficar apagados em louvor  a Nosso Senhor Jesus Cristo e em reparação a todas as provas de orgulho que os homens deveriam dar até o fim do mundo; além dessa razão, que é muito boa, há outra  muito formativa e feita para que compreendamos a índole, o espírito da Igreja Católica: por maiores que sejam as maravilhas  que Nossa Senhora e São José tenham    praticado em vida, aquilo que nós sabemos deles, pelo simples fato de uma ter sido a Mãe do Criador e o outro ter sido o Pai legal de Nosso Senhor Jesus Cristo e Esposo de   Nossa Senhora, isto só nos leva a deduzi-los tão grandes, que nenhum fato concreto praticado na vida daria uma ideia suficiente daquilo que eles foram, porque estão acima  de qualquer ato praticado.

Tomemos dois fatos notáveis: a perplexidade de São José, a confiança que conservou durante esse momento. A delicadeza com que resolveu o caso, a prova em que a  Providência o colocou, no momento em que ele estava chamado a receber a honra excelsa de ser o Pai legal de Nosso Senhor Jesus Cristo. Tomem, na vida de Nossa Senhora,  por exemplo, um fato eminente: as bodas em Caná, na qual Ela obteve, pelas orações d’Ela, a antecipação das manifestações da vida pública de Nosso Senhor e fez   com que Ele praticasse um milagre notável como a transmutação da água em vinho, um milagre direto e imediato, para uma família que se sentia provada naquele momento.

Nossa Senhora praticou ali uma grande ação, mas por maior que seja essa ação, não nos dá uma ideia suficiente de Nossa Senhora. O que nós sabemos d’Ela, sabendo que  Ela é Mãe de Deus, é tão mais do que isso! Assim também São José: algumas coisas dele que nós sabemos, por mais eminentes que sejam, não chegam à altura de quem Ele é.

Como terá sido o homem que Deus destinou a ser o Pai legal de Nosso Senhor? Porque São José, como Esposo de Maria Virgem, tinha um verdadeiro direito sobre o fruto das entranhas d’Ela, embora não fosse o pai do Menino Jesus. Então, como deve ter sido esse varão, como  Deus deve ter adornado essa alma, como deve ter constituído esse corpo, como deve ter enchido de graça essa pessoa, para que ela estivesse à altura desse papel?

Ora, se Deus tanto respeitou e venerou Nossa Senhora, quanto não terá venerado ao escolher um esposo adequado a Ela? Porque Ele deve ter feito desse casal o casal  perfeito, no qual o esposo fosse o mais proporcionado possível à esposa.

O que deve ter um homem para estar na proporção de ser Esposo de Nossa Senhora? É uma coisa verdadeiramente insondável. E qualquer coisa que ele tenha dito, feito, não nos dá ideia de quem ele foi, como nos dá essa simples afirmação: Pai do Menino Jesus e Esposo de Nossa Senhora!

Ora, ser o Pai do Filho de Deus é a mais alta honra a que um homem possa chegar, depois da honra de ser a Mãe do Filho de Deus, que é, evidentemente, uma honra maior. Quer dizer, ele não só foi nobre porque se casou com Nossa Senhora, mas porque Nosso Senhor o investiu na mais alta função de governo que possa haver na Terra abaixo de Nossa Senhora.

O exercer uma alta função de governo, de acordo com os conceitos da sociedade tradicional daquele tempo, nobilitava, conferia nobreza. Ora, ser o Pai do Menino Jesus, governar o Menino Jesus e Nossa Senhora é mais do que governar todos os reis e impérios do mundo. Ora, isso não lhe veio só do casamento.

Deus o escolheu para isso. Compreendemos então a nobreza excelsa que lhe vinha disso.

Quer dizer, fica acima de todo elogio e de todo feito. Aqui é que entra a coisa bonita: vemos que a Providência quis constituir, a respeito de Nossa Senhora e São José, os  fundamentos de culto com base num raciocínio teológico, porque é o raciocínio teológico que nos pinta o perfil moral destas pessoas excelsas.

Protetor da Igreja

Imaginem, agora, o que é ser o Santo Padroeiro da Igreja Católica. Protetor de algo é de algum modo um símbolo daquilo que ele protege. Para conceberem isso precisam imaginar da seguinte maneira: considerem, por exemplo, alguém que é guarda de uma rainha. Essa pessoa, de algum modo, toma em si algo da realeza, e escolhem-se para  ser os guardas da rainha os indivíduos mais capazes, os que tiveram maior coragem, os que nas guerras provaram maior dedicação à coroa.

Se é uma honra ser guarda da rainha, se é uma honra ser guarda do Papa, a ponto de ele ter uma guarda nobre especialmente constituída de fidalgos romanos para  guardarem a pessoa dele, então, que honra é ser guarda da Santa Igreja Católica! O Anjo da Guarda da Igreja Católica por certo é o maior Anjo que existe no Céu. Porque das  criaturas de Deus nenhuma tem a dignidade da Igreja. Exceção de Nossa Senhora, que é a Rainha da Igreja, ninguém pode se comparar à Igreja Católica. Nem qualquer Anjo, ou todos os Santos considerados cada um separadamente, têm a dignidade da Igreja Católica, porque ela envolve todos os Santos e ela é a fonte da santidade desses Santos, portanto, um Santo nunca pode ter a dignidade igual a da Igreja.

São José, pelo contrário, tem que ser alguém de tão alto, de tão excelso, que ele, por assim dizer, tem que ser o reflexo da Igreja que ele guarda para estar proporcionado a ela. E nós podemos então considerar que o  “thau” de São José, enquanto co-idêntico com o espírito da Igreja Católica, enquanto sendo exemplar prototípico e magnífico da  mentalidade, das doutrinas, do espírito da Igreja Católica, é um “thau” que só se pode medir por esse outro critério do “thau” dele, que é o fato de ser Esposo de Nossa Senhora e Pai adotivo do Menino Jesus e, portanto, estar proporcionado a Eles.

Alma excelsa

Se nós quisermos ter uma ideia da alma de São José, do espírito dele, acho que não encontraremos, eu ao menos não encontrei na minha vida inteira, uma  pintura ou uma escultura que representasse a ele adequadamente. Por exemplo, aqui no nosso oratório, tão a propósito colocado junto ao estandarte, os senhores têm uma  imagem muito boa de São José, que quando foi comprada foi até catalogada.

Como escultura é muito boa, mas não dá, a meu ver, aquilo que é a alma de São José. Seria preciso imaginar tudo quanto pensamos da Igreja Católica: toda a dignidade, toda a afabilidade, toda a sabedoria, toda a imensidade da Igreja, tudo quanto se pudesse dizer da Igreja Católica e imaginar isto realizado num homem, e então nós teríamos a  fisionomia moral de São José.

E então eu quisera ver quem seria o artista capaz de compor a face de São José.

Devemos imaginar pelo menos o perfil moral desse Santo, a castidade de São José, a pureza ilibadíssima dele, e nós devemos nos aproximar dele com respeito, com  veneração e pedir que nos conceda aquilo que nós tanto desejamos receber. Cada um se pergunte a si próprio, num exame de consciência de um minuto, qual é a graça que  quer pedir a São José por ocasião da festa de hoje.

Graças a implorar

A primeira das graças a pedir seria a da devoção a Nossa Senhora. Outra é a de refletir tão bem o espírito da Igreja Católica quanto esteja nos desígnios da Providência ao nos ter criado e nos ter conferido o Santo Batismo. Outra graça que poderíamos pedir é a de sermos filhos da Igreja Católica, tendo inteiramente o espírito do Grupo, que é o espírito da Igreja enquanto vivendo numa unidade viva da Igreja onde esse espírito se refrata de um modo particular. Nós podemos pedir a pureza, a despretensão, pedir  tudo, podemos escolher cada uma dessas coisas.

Podemos pedir todas essas coisas no seu conjunto. Às vezes é bom pedirmos uma coisa só – a graça nos leva a pedir uma coisa só –, às vezes é bom pedirmos tudo, porque há  momentos em que a graça nos leva a sermos audaciosos e a pedir muita coisa ao mesmo tempo.

Então hoje, na festa de São José, conforme o movimento da graça interior em cada um de nós, devemos pedir alguma coisa a ele. E se não soubermos bem o que pedir, dizer a São José: “Meu bom São José, vede que eu sou meio palerma, dai-me Vós aquilo que eu preciso, uma vez que sequer sei o que me convém!”

Eu acredito que do mais alto dos Céus ele sorri e dará com bondade alguma graça muito bem escolhida.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 19/3/1969, 19/3/1970 e 19/3/1976)

Não durmamos enquanto se renova a Paixão!

Em suas invectivas ao povo israelita, os profetas do Antigo Testamento eram instrumentos da misericórdia de Deus: seu objetivo era chamar o povo à conversão. De igual forma procederam os Papas ao longo dos séculos. Já as admoestações de Dr. Plinio tinham amiúde por objetivo despertar os católicos para suas obrigações, como se pode ver neste artigo.

 

Há dois funestíssimos erros, que não raramente lavram entre os católicos brasileiros e que, com extraordinária oportunidade, devem ser desmascarados na Semana Santa.  Como freqüentemente ocorre, esses erros não provêm propriamente de premissas falsas, mas de premissas incompletas. É uma visão parcial e estreita das coisas, que os  provoca. E só uma meditação acurada, feita à luz de considerações naturais ou de argumentos inspirados em motivos sobrenaturais, pode pôr à luz o mau germe que neles se  culta.

Ineficiência da Igreja diante da crise? O primeiro desses erros consiste em acoimar de ineficiente a ação da Igreja, para a solução da crise contemporânea. […] E [dizem] que, portanto, é preciso apelar para uma outra organização, que, ela sim, salvará a civilização católica.

Argumentemos. E argumentemos só com a infalível autoridade dos Pontífices. Porque se para algum católico um argumento inspirado nas palavras dos Papas não for suficientemente convincente, é melhor que esse católico estude bem o seu Catecismo, antes de tentar “salvar a civilização”.

Diz o Santo Padre Leão XIII, e, depois dele, todos os Pontífices o têm repetido, […] que essa crise moral gerou crises econômicas, sociais ou políticas. E só quando ela for    resolvida, serão resolvidos os problemas relacionados com as finanças, a organização política e a vida social dos povos contemporâneos.

Por outro lado, a solução desse problema moral só pode estar na ação da Igreja, porque só o Catolicismo, armado de seus recursos sobrenaturais e naturais, tem o dom maravilhoso de produzir nas almas os frutos de virtude indispensáveis para que floresça a civilização católica. O que acabamos de dizer é diretamente extraído das Encíclicas. Basta abri-las, para encontrar o que afirmamos.

Como conseqüência, de duas uma: ou os Papas estão errados, ou devemos reconhecer que só o Catolicismo salvará o mundo da crise em que está mergulhado. Portanto, é  inútil discutir se, no país A ou no país B, os católicos agiram ou não agiram bem. […]

Se é verdade que só a Igreja pode remediar os males contemporâneos, é só nas fileiras da Igreja que devemos procurar lutar pela eliminação desses males. Pouco nos importa que outros não cumpram o seu dever. Cumpramos o nosso. E, depois de termos feito todo o possível — a palavra “todo” significa tudo, mas absolutamente tudo, e  não apenas “um pouco” ou “muito” — resignemo-nos diante da avalanche que vem. Porque, ainda que pereçam o Brasil e o mundo inteiro, ainda que a própria Igreja seja devastada pelos lobos da heresia, ela é imortal. Nadará sobre as águas revoltas do dilúvio. E é de dentro de seu seio sagrado que sairão depois da tempestade, como Noé da  Arca, os homens que hão de fundar a civilização de amanhã.

Duas lições, para duas mentalidades erradas

Mas é aí que não querem chegar certos católicos. Como os [apóstolos antes de Pentecostes], eles só compreendem Cristo sobre um trono de glória. Eles só Lhe são fiéis nos  dias parecidos com o Domingo de Ramos, quando a multidão O aclama e cobre o seu caminho com suas vestes. Porque, para eles, Cristo deve ser um Rei terreno. Deve dominar o mundo constantemente. E se, por algum tempo, a impiedade dos homens O reduzirem de Rei a Crucificado,  de Soberano a Vítima, não mais querem saber d’Ele. […]

No entanto, Cristo quis passar por todos os opróbrios,todos os vexames, todas as humilhações, mostrando que  a História da Igreja também teria seus Calvários, suas  humilhações, suas derrotas. E que muito mais meritória  era e é a fidelidade no Gólgota do que no Tabor.

Foi para ensinar a gente assim que Nosso Senhor se submeteu a todas as humilhações, no Calvário. Entretanto, foi para ensinar gente diferente que Ele quis a glória do Domingo de Ramos.

Há gente de uma mentalidade detestável, que acha absolutamente natural que Cristo sofra, que a Igreja seja vexada, humilhada, perseguida. Gente comodista, “cujus Deus venter est” — “que têm por Deus o seu próprio ventre”, e que pensa que, como a Igreja deve imitar a Cristo, é natural que todos os [seus inimigos] se atirem contra ela e a  façam sofrer. É a Paixão de Cristo que se repete, dizem eles. E enquanto essa Paixão se repete, eles levam sua vida farta e cômoda, nas orgias, nas imundícies, na exacerbação  e todos os sentidos e na prática de todos os pecados.

Para gente como esta é que foi feito o látego com que foram expulsos os vendilhões do Templo.

Devemos estar sempre com a Igreja

Não é verdade que devamos cruzar os braços ante as investidas dos inimigos da Igreja. Não é verdade que devamos dormir enquanto se renova a Paixão. O próprio Cristo  recomendou que seus Apóstolos orassem e vigiassem. E se devemos aceitar os sofrimentos da Igreja com a resignação com que Nossa Senhora aceitou os padecimentos de  seu Filho, não é menos exato que será um motivo de [reprovação] para nós, se nos portarmos ante as dores do Salvador com a sonolência, a indiferença e a covardia de  discípulos infiéis.

A verdade é esta: devemos estar sempre com a Igreja, “porque só ela tem palavras de vida eterna”. Se ela é atacada, lutemos por ela. Mas lutemos como mártires, até a efusão  e nosso sangue, até o emprego de nosso último recurso de energia e de inteligência. Se, apesar disto tudo, ela continuar a ser oprimida, soframos com ela, como São  João Evangelista aos pés da Cruz. E estejamos certos de que, neste mundo ou no outro, Jesus misericordioso não nos negará o esplêndido prêmio de assistirmos à sua glória  divina e suprema.

Plinio Corrêa de Oliveira (Excertos do “Legionário”, nº 236, de 21/3/1937.Título e subtítulos nossos.)

Proporcionado à Mãe e ao Filho de Deus

Maria Santíssima é a mais perfeita dentre as meras criaturas. Se tomarmos a soma das excelências de todos os Anjos e homens que já existiram, existem e existirão, não teríamos sequer pálida ideia da perfeição da Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Se Deus foi tão magnificente no predestinar e modelar a Mãe que daria ao mundo o Salvador, e em cumulá-La das mais preciosas graças, não seria menos pródigo no escolher o homem que deveria ser o esposo dessa Virgem e Mãe.

Um varão tinha de ser considerado proporcionado, por seu amor a Deus, sua justiça, pureza, sabedoria e todas as demais qualidades, a tal Esposa e a tal Filho. Esse homem, escolhido para esposo de Nossa Senhora e pai jurídico do Filho de Deus, foi São José.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/3/1967)

Consorte da Sede da Sabedoria e pai do Leão de Judá

Para se ter alguma noção do semblante de São José seria preciso deduzir, à maneira de suposição, o caráter de um homem que esteve à altura de ser o pai d’Aquele cuja Sagrada Face está estampada no Santo Sudário de Turim. Quer dizer, o homem que foi o educador, o guia, o protetor do Senhor daquele rosto impresso no Sudário; um homem da mesma linhagem, parente e esposo da Mãe d’Ele.

Conceber algo menor do que isso é não ter ideia da extraordinária figura de São José, modelo de fisionomia sapiencial porque consorte da Sede da Sabedoria, do Espelho da Justiça, Maria Santíssima. Modelo de fortaleza, porque pai do Leão de Judá, Nosso Senhor Jesus Cristo.

A este verdadeiro São José devemos elevar nossas preces, rogando-lhe interceda por nós junto à Virgem Santíssima e a seu Divino Filho, e nos alcance a graça de o imitarmos nas suas excelsas virtudes.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/3/1967)

Revista Dr Plinio 252 (Março de 2019)

Encarnação do Verbo: o mistério da Contra-Revolução

A Festa da Anunciação do Anjo a Nossa Senhora nos convida a admirar este sublime paradoxo: no momento em que a Virgem Santíssima afirmava ser a serva do Senhor, o próprio Deus quis fazer um supremo ato de servidão, de dependência e de escravidão em relação a Ela. Nisto encontramos a perfeição do espírito da Contra-Revolução.

 

Em seu Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem(1), São Luís Grignion de Monfort tem o seguinte pensamento:

Os verdadeiros devotos de Nossa Senhora terão uma devoção especial pelo mistério da Encarnação do Verbo, a 25 de março, que é o mistério adequado a esta devoção,…

Quer dizer, da sagrada escravidão.

…pois que esta devoção foi inspirada pelo Espírito Santo: primeiro, para honrar e imitar a dependência em que Deus Filho quis estar de Maria, para glória de Deus seu Pai e para nossa salvação; dependência que transparece particularmente neste mistério em que Jesus se torna cativo e escravo no seio de Maria Santíssima, aí dependendo dela em tudo; segundo, para agradecer a Deus as graças incomparáveis que concedeu a Maria, principalmente por tê-La escolhido para sua Mãe digníssima, escolha feita neste mistério. São estes os dois fins principais da escravidão a Jesus Cristo em Maria.

Um grau de sujeição inimaginável

O pensamento muito profundo é de que Nosso Senhor, vivendo em Maria durante o tempo da Encarnação, esteve em uma dependência incomparável d’Ela, pois sendo já inteiramente lúcido, ficou, entretanto, completamente dependente, como uma criança no seio materno depende de sua mãe.

É o maior estado de submissão que se possa imaginar. Uma criança fora do ventre materno tem uma vida própria, liberdade de movimentos, enfim, todo um dinamismo próprio ajudado pela mãe. Mas não vive, propriamente, da vida da mãe. Pelo contrário, a criança que está no seio materno, vive da vida da mãe; em tudo é conduzida e, por assim dizer, circunscrita por ela.

Como sujeição, é um estado bastante semelhante ao de escravidão, porque neste o escravo renuncia completamente à sua liberdade para ficar inteiramente circunscrito pela vontade de seu senhor. Sua vida, seus atos são para o serviço de seu senhor, seus pensamentos tendem a ele. Assim era Nosso Senhor em relação a Nossa Senhora.

Aquele que, sendo infinito, criou o universo e a quem o Céu e a Terra não podem conter, foi contido pelas entranhas indizivelmente gloriosas da Santíssima Virgem e teve para com Ela um grau de sujeição inimaginável!

Em resposta ao “Non serviam” de Lúcifer, o “Amém” do Filho de Deus

Portanto, quem quiser ser verdadeiro escravo de Nossa Senhora deve venerar de modo muito especial essa miraculosa e insondável sujeição de Jesus a Maria, na qual o infinitamente maior deixou-Se dominar e conter pelo menor, na realização de um plano divino, cuja sabedoria excede a qualquer cogitação humana.

Por outro lado, este é o mistério da Contra-Revolução, porque se a Revolução é um grande “Non serviam”(2), o mais alto grau de alienação – praticado pelo Filho de Deus em Maria Santíssima – é o mistério que mais esmaga a psicologia, a mentalidade e os falsos ideais da Revolução. Em lugar do “Non serviam” é o “Amém”. Lúcifer bradou: “Não servirei”; Nosso Senhor disse: “Assim seja” a tudo quanto Nossa Senhora quis.

Exatamente isso dá uma constrição especial no homem de espírito revolucionário, diabólico. Não é apenas ver a Deus servido por sua criatura e, portanto, sendo observada aí uma espécie de ordem de mérito, mas é o próprio Criador querendo obedecer à sua criatura e esta mandando n’Ele. É levar a obediência a um grau que se não soubéssemos, pela Revelação, ter havido a Encarnação, nunca poderíamos imaginar que essa virtude chegaria a tal extremo.

Se isso deu tanta glória a Deus, a ponto de naquilo que abusivamente poderíamos chamar a História d’Ele – porque Deus é infinito e não tem História – Ele quis que figurasse esse ato de obediência insondável, compreendemos também como a obediência praticada por nós dá glória a Nossa Senhora. Em contrapartida, como a revolta injuria a Maria Santíssima e seu Divino Filho.

Vemos, assim, até que ponto a Revolução é odiosa a Deus, e isso nos leva a compreender melhor o Inferno, com seus tormentos eternos, o desespero completo, o esmagamento perpétuo do demônio, à vista do fato de que ele atentou contra este princípio: ele deveria obedecer e não quis.

Certos teólogos dizem que a revolta de Lúcifer deu-se porque lhe foi mostrado o plano da Encarnação e dada a ordem de adorar o Verbo de Deus Encarnado. E por ser um anjo de tão alta categoria, ele não quis e revoltou-se.

Esta hipótese, que me parece totalmente provável, adquire uma clareza ainda maior se pensarmos no demônio considerando Nosso Senhor Jesus Cristo contido no claustro sacratíssimo de Nossa Senhora e obedecendo a Ela. Ver essa obediência do Verbo Encarnado a uma criatura infinitamente menor do que Deus – por mais excelsa que seja –, e a inferioridade d’Ele em relação a essa criatura, isso deve ter levado ao paroxismo a indignação de Lúcifer.

A festa da Contra-Revolução

Nós podemos dizer, portanto, que o dia 25 de março é a festa da Encarnação do Verbo, da escravidão a Nossa Senhora, da Contra-Revolução. É a festa na qual se celebra o espírito de obediência, o amor à hierarquia, à ordem, à dependência, a tudo quanto a Revolução odeia.

É mais do que concebível que nos preparemos para essa festa por meio de orações especiais para pedir a Nossa Senhora que esse espírito representado pela Encarnação atinja em nós a plenitude desejada por Deus quando nos criou.

De outro lado, vemos também o espírito mais do que humilde e contrarrevolucionário de Maria Santíssima em face deste mistério. Quando Ela soube que o Verbo Se encarnaria n’Ela, sua reação não foi de Se vangloriar, mas de pronunciar esta frase humílima: “Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra” (Lc 1, 38). Como se dissesse: “Se Deus quer de mim essa coisa inexplicável, isto é, que eu mande n’Ele, até isso Ele pode exigir de mim. Portanto, se Deus pede o meu consentimento a essa situação inimaginável, por obediência a Ele, n’Ele mandarei! Mas é Ele o Senhor, e a sua vontade, em todas as coisas, eu farei.”

Como ganha um realce especial, à luz disso, a atitude de Nossa Senhora na Anunciação, dizendo-Se escrava de Deus no momento em que Ele queria fazer um ato supremo de servidão, de dependência, de escravidão em relação a Ela! Encontramos nisto a perfeição do espírito da Contra-Revolução.               v

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/3/1971)

Revista Dr Plinio 252 (Março de 2019)

 

1) Cap. VIII, art. 1, §4, n. 243.

2) Do latim: “Não servirei.”

Oração para a Semana Santa

Jesus é depositado no sepulcro. Na aparência, é o fim, tudo está acabado… Na realidade, em breve tudo começará a renascer.

Junto a Vós, ó Refúgio dos Pecadores, os Apóstolos começam a chorar seus pecados. Logo virão a Ressurreição, a Ascensão e Pentecostes!

Quanto mais vitorioso parece o demônio, mais próxima está a vossa vitória.

Nestes dias em que, pelo atrativo de uma liberdade mal compreendida, está-se chegando a um assombroso desregramento dos costumes, ao caos na cultura e à anarquia nos países, dai-me, ó Mãe, uma fé firme nas promessas que fizestes em Fátima, uma esperança abrasada de que elas não tardam em se cumprir, uma certeza da derrota da Revolução e da instauração de vosso Reino. Amém.

 

Plinio Corrêa de Oliveira

São Leandro, Bispo de Sevilha

Sem o auxílio da graça, o homem é incapaz de obter êxito em seu apostolado; porém, amparado por ela, consegue o inimaginável. Disto nos dá um belo exemplo São Leandro de Sevilha, o qual extirpou a heresia que havia quase dois séculos grassava na Espanha.

Os grandes movimentos da História, em geral, são impulsionados por homens a quem Deus concede uma grandiosa missão, comunicando-lhes seu espírito e sua força. Um destes homens foi São Leandro de Sevilha. Convertendo os godos e salvando uma nação inteira do jugo dos arianos, ele bem pode ser considerado um dos fundadores da Idade Média.

Acompanhemos com especial veneração sua ficha biográfica(1):

São Leandro nasceu em Cartagena, Espanha. Seus pais pertenciam à alta nobreza, e sua família estava repleta de santos. Um de seus irmãos, Santo Isidoro, sucedeu-o no trono episcopal de Sevilha; o outro, São Fulgêncio, foi Bispo de Cartagena. Sua irmã, Santa Florentina, tornou-se religiosa.

Quando era jovem ainda, São Leandro retirou-se para um mosteiro, tornando-se perfeito modelo de ciência e piedade. Seus méritos o levaram à Sé Episcopal de Sevilha, onde não diminuíram em nada as austeridades que praticava.

Quando Leandro foi nomeado bispo, parte do território espanhol estava dominada pelos visigodos arianos havia cento e setenta anos. Entregando-se imediatamente ao combate da heresia, o novo Bispo rezava e implorava o auxílio de Deus. O sucesso coroou seu zelo, e em pouco tempo a heresia já contava com menos adeptos.

Entretanto, Leovigildo, então rei dos visigodos, e também ariano, irritado com a atividade de São Leandro, e principalmente com a conversão de seu filho primogênito, condenou o santo ao exílio e o filho à morte.

Seu segundo filho, Recaredo, que vindo a ser um fervoroso católico, ao herdar o trono conseguiu a conversão de todos os seus súditos.

São Leandro dedicou-se a manter o fervor dos fiéis e foi a alma de dois grandes concílios: o de Sevilha e o de Toledo, os quais condenaram o arianismo.

Homem de ação, Leandro a todos inspirava o amor à prece, especialmente aos religiosos. Escreveu instruções admiráveis à sua irmã sobre o exercício da oração e o desprezo do mundo. Reformou a liturgia na Espanha.

Afligido por numerosas enfermidades, o apóstolo dos visigodos faleceu em 596.

A ação do Espírito Santo e a pujança da santidade

A ficha é riquíssima de aspectos passíveis de comentário. O primeiro deles é o florescimento de santos numa mesma família da alta nobreza espanhola: Santo Isidoro de Sevilha — um dos maiores santos da história da Espanha —, São Fulgêncio, Santa Florentina e São Leandro.

Vemos que beleza há na conjunção de tantos santos numa mesma estirpe. Com isso, Deus faz sentir a importância do fenômeno “estirpe” na formação dos santos e na realização dos planos da Providência.

Por outro lado, observamos a pujança de santidade existente naquela época. Trata-se de um dos mais belos fenômenos da História, onde inúmeros santos inauguraram o Reino de Nosso Senhor Jesus Cristo durante a Idade Média; fenômeno não atribuível a nenhum homem, a nenhuma Ordem religiosa, mas diretamente oriundo da ação do Espírito Santo.

De fato, a não ser por um verdadeiro sopro universal do Divino Espírito Santo, não seria possível o surgimento de tantas almas santas ao mesmo tempo.

Em pleno domínio dos bárbaros arianos…

Ao ser eleito Bispo de Sevilha, São Leandro encontrou-se diante do seguinte problema: havia cento e setenta anos, bárbaros hereges exerciam uma função dominadora na Espanha.

Ao contrário do que muitos pensam, a maior parte dos bárbaros não era pagã, mas sim ariana. Quando invadiram o Império Romano, muitas tribos bárbaras já haviam sido visitadas, em suas respectivas regiões, por um Bispo ariano chamado Úlfilas(2), o qual as perverteu para o arianismo.

Desta maneira, enquanto descendentes dos antigos cidadãos do Império Romano, os católicos eram os vencidos, os pobres, estavam por baixo e gemiam sob o jugo dos arianos, os quais, por sua vez, constituíam o povo novo, forte e vencedor.

…a Providência suscita São Leandro de Sevilha

São Leandro recebeu, então, da parte de Deus, a missão de derrubar o domínio ariano. De que maneira ele o fez?

Em primeiro lugar, chorando diante de Deus e pedindo, por meio de Nossa Senhora, os auxílios necessários para a tarefa que deveria realizar de modo admirável. Cônscio da incapacidade humana perante as tarefas apostólicas, São Leandro sabia que o homem não é senão um instrumento de Deus e de Nossa Senhora, os verdadeiros realizadores do apostolado. Assim, as conversões deram-se em número colossal e o poder ariano foi diminuindo graças às suas pregações.

Aspectos fugazes, porém importantes, se desvendam na vida de São Leandro, uma das maiores figuras da hagiografia e da história espanhola.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferências de 26/2/1964 e 27/2/1967)

1) Butler, Alban. Lives of the Saints – With Reflections for Every Day in the Year.
2) Educado no Catolicismo, Úlfilas aderiu ao arianismo por ocasião de uma viagem a Constantinopla, onde Eusébio o sagrou bispo. Tendo voltado para o grêmio dos godos, dedicou-se à conversão de seus irmãos de raça à fé ariana.

São José – Modelo de cavaleiro

Um dos episódios mais bonitos da vida de São José é a fuga para o Egito.

O Santo Patriarca recebe em sonho a visita de um Anjo que lhe diz que o Rei Herodes está querendo matar o Menino Jesus. Então ele sai às escondidas, com Nossa Senhora e seu Divino Filho, e vão para o Egito.

A defesa do maior tesouro que houve na Terra — e tesouro maior do que esse não há no Céu — ficou inteiramente confiada a São José, que representava o braço vigoroso, a previdência, a força varonil na defesa de um Menino que era ao mesmo tempo Deus, mas quis ser fraco nas mãos de São José.

Nós louvamos e apreciamos muito a vocação de Godofredo de Bouillon, que comandou as tropas na reconquista de Jerusalém. É o cruzado por excelência, é uma coisa linda! Entretanto, muito mais do que retomar o Santo Sepulcro para Nosso Senhor é defender a Ele próprio! E disto São José foi encarregado bela e gloriosamente. Ele foi, portanto, o cavaleiro-modelo na defesa do Rei dos reis, do Filho de Deus encarnado.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 30/7/1989

São Domingos Sávio – Alegre apóstolo da seriedade

Considerado a obra prima da educação Salesiana, Domingos Sávio, eminentemente piedoso e cumpridor de seus deveres, foi o grande discípulo de São João Bosco. Vivendo em fins do século XIX, doze anos de idade foram suficientes para demonstrar sua vida exemplar na prática das virtudes e na observância da Lei de Deus.

Sendo uma época em que tomava livre curso o ateísmo e a anti-religiosidade, penetrando até mesmo na mentalidade e na formação das crianças, São Domingos foi um admirável apóstolo da seriedade. Mostrando uma sabedoria muito superior à sua idade provou possuir uma compreensão profundamente séria e sobrenatural, baseada na Fé, de tudo quanto devia realizar.

Difundiu em torno de si uma atmosfera de compostura, seriedade e calma, que entretanto não fazia com que as crianças deixassem de serem autênticas, proporcionando um meio de reflexão e de compostura. Opondo-se, portanto, ao traço característico da Revolução na infância, que é a falta de educação e de cerimonial; que faz dos indivíduos, quando forem homens formados, os adversários de todas as tradições de um tempo em que se cultivava a seriedade e a cerimônia.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/3/1973)