Brasil, à espera de um grandioso porvir…

Na memória e na sensibilidade de quem contempla as belezas naturais com as quais Deus ornou o Brasil, resta a impressão de que elas exprimem, à sua maneira, a vocação deste gigantesco país.

Muitos de seus lindos e abençoados panoramas refletem a especial vocação da alma brasileira de ser profundamente católica apostólica romana, de estar disposta a receber uma extraordinária comunicação do espírito da Santa Igreja.

Como corolário dessa disposição, o brasileiro é convidado a ter uma mentalidade afim  com a formosura de seus mares e litorais, com a elegância de seus ipês em flor, com a variedade de suas montanhas, ora graciosas e suaves, ora rudes e desafiadoras, com a grandeza de suas íngremes penedias que escorrem e se confundem com deleitáveis planícies…

Que dizer das praias do Brasil? Ele tem uma só praia, com alguns intervalos, que se estende do Rio Grande do Sul ao Amapá. É um dos seus mais belos aspectos naturais.

Dificilmente nos cansamos de ver o mar imenso, envolvendo ilhas que dão aos panoramas litorâneos uma nota semelhante à de pedras preciosas encastoadas num anel. E as ondas, acompanhadas de nuvens que parecem icebergs colossais caminhando em direção ao continente, têm um curioso movimento que exprime também certas habilidades da alma brasileira, certos jeitos, seja para acariciar, seja para louvar a Deus, seja ainda para fazer diplomacia…

Irmã da imensidade e beleza marítimas é a abundância das águas fluviais, correndo às quantidades pelo Brasil afora. Exemplo paradigmático são as cataratas do Iguaçu, em cujas quedas se pode avaliar a caudal e o ímpeto do líquido que se precipita majestosamente por toda a parte. Que extraordinário e fragoroso domínio!

***

Das águas para os campos e serranias. Em geral, montanhas não muito altas, sem píncaros que pareçam galgar até os céus. Dir-se-ia que existem, confiantes e contentes, sob as vistas do firmamento, sem necessidade de tentar arranhá-lo, porque sentem que ele desce até elas. Deixam-se banhar pacificamente pela luz do sol, e permanecem à espera de um futuro talvez não remoto.

Uma espera tranquila, doce, cordata, de quem sabe que, sem dúvida alguma, esse dia chegar á.

Suaves ondulações de terreno, cobertas de um verde ora alegre e risonho, ora um tanto escuro e sombrio, sem nada de trágico porém. Aqui e ali, aninham-se restos de antigas florestas, sobejos de matas virgens: é o Brasil da selva, do mistério primitivo, repleto de surpresas.

Ao lado das montanhas e ondulações adocicadas, cabem também os grandes gestos geográficos, o estupendo e o extraordinário rasgando aquela doçura, como para dar a entender ao nosso povo que, na placidez de seu temperamento, há de contar, nas ocasiões dramáticas, com lances heroicos.

Então surge, por exemplo, o famoso Dedo de Deus, na serrania que conduz a Teresópolis (foto da página 31). Quando se repara nele, tem-se a impressão de que houve algum dia ali um forte, onde guerreiros impávidos lutaram contra invasores que tentavam conquistá-lo. E que um murro formidável de um avantajado demônio dos antigos tempos arrebentou com quase tudo no seu cimo.

Porém, restou um dedo em riste, dizendo: ‘Ainda voltarei! A minha altura natural é esta e a ela não renunciarei. Dia virá em que a montanha inteira ascender á ao mesmo píncaro, que continuo
a reivindicar, na figura ideal desta fortaleza sonhada!’

***

Se nos voltamos para a exuberante e variegada flora brasileira, parece nos faltar o vocabulário para comentá-la de modo satisfatório. Haja vista um ipê na plenitude de sua floração, na riqueza estupenda de sua beleza, ou seja, no que ele tem de verdadeiramente único. É uma árvore de ouro. Sua copa não desenha uma esfericidade perfeita, pois tem reentrâncias diversas as quais fazem com que os jogos de luz sobre o dourado mudem de tonalidade, e se evidenciem os diferentes matizes dessa cor.

E quando o ipê floresce contrastando com uma paisagem seca e desoladora, dir-se-ia que ele é um protesto do futuro, a proclamar: Esperem! Alguma coisa ainda virá!

***

Praias, rios, cordilheiras, ipês… Panoramas, cenários e ambientes que convidam a cogitações, que sugerem planos, anseios, ideais, tendo no alto de si um grandíssimo descortino, meio feito de imponderáveis que nos levam a esperar os desígnios de Nossa Senhora para o Brasil.

Pois algo há de se passar aqui, à altura dessas imensidões. Elas não foram criadas sem que um dia surgissem homens a elas proporcionados. Por isso sobre elas paira uma graça carregada de belos prognósticos, uma bênção que faz dessas paisagens panoramas- argumentos. Dizem-nos da parte da Providência: “Esperai, porque este será o Brasil do Reino de Maria! Confiai! Vós não maginais
como será! Esses panoramas são apenas um sinal, um prenúncio daquilo que virá, se fordes fiéis. Um Brasil ainda mais lindo, maior e mais extraordinário. E que aí, na proporção do que virá, esse povo também se despertar á e estará à altura!

Sim, para isso foi criado o Brasil. O Brasil da Terra de Santa Cruz. O Brasil de Nossa Senhora Aparecida,  que vive à espera de seu grandioso futuro.

A Fé em Cristo Redentor

Não posso me esquecer de uma noite em que eu estava no Rio de Janeiro, na qual eu tinha os olhos fixados na estátua de Cristo Redentor no Corcovado, cercada pela neblina levantada do mar.

Durante algum tempo era apenas um foco de luz, no qual eu não discernia nada; em determinado momento, batia o vento, fazia-se um pouco de claridade e eu percebia um dos braços e uma das mãos do Cristo Redentor, iluminados com aquela luminosidade especial, pois a pedra sabão, de que é revestido o monumento, reflete a luz projetada sobre ele.

Continuando o vento a soprar, aparecia a face do Cristo Redentor, depois o seu peito onde pulsa seu Sagrado Coração, em seguida os seus pés divinos que todos nós gostaríamos de oscular. E eu prestava atenção: em nenhum instante, por mais densas que fossem as névoas, a luz deixava de encontrar certo ponto de apoio no monumento; sendo apenas uma luz fixa sobre uma silhueta ou uma das mãos, que protege e abençoa, um coração palpitante de amor, ou uma face cheia de solicitude, em nenhum momento a neblina conseguiu apagar a figura do Redentor.

Com esta fé caminhamos para o futuro, quaisquer que sejam as circunstâncias. Pode ser que provações muito difíceis toldem nos nossos olhos as perspectivas da vitória, ou circunstâncias imprevistas coloquem para nós problemas que hoje ainda não são os nossos. Mas, para além das névoas, para além de tudo quanto pode tapar a verdade, no horizonte visual do brasileiro há algo que nada tira: é a imagem do Cristo Redentor, a Fé em Nosso Senhor Jesus Cristo. Esta Fé há de nos salvar!

Meus caros, o Brasil há de vencer, e é rumo a esta vitória que todos caminhamos com o passo resoluto e a alma cheia de fé.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência 17/10/1978)

Como um profeta do Antigo Testamento

São Vicente Ferrer foi grande na Ordem dos Dominicanos como, por exemplo, o foi São Tomás de Aquino em sua esfera própria. Exceção feita dos Apóstolos, provavelmente ninguém excedeu a São Vicente Ferrer como pregador popular.

Ele lutou enormemente para a moralização dos costumes. Pelo poder de sua pregação, sacudia as consciências adormecidas e foi, por excelência, o santo oposto à tibieza. Daí o número colossal de conversões operadas por ele.

Entretanto, por mais numerosas que tenham sido essas conversões, delas não surgiu um movimento organizado para combater a Revolução nascente. Ele converteu muitas almas, mas não a sociedade em seu conjunto. E isso porque os homens de seu tempo não o ouviram tanto quanto deveriam.

Este santo foi o dique levantado pela Providência, mas que a maldade dos homens destruiu. E, na abertura dessa torrente que começa a cair para o abismo, fica de pé a figura grandiosa de São Vicente Ferrer, anunciando as catástrofes que provinham do fato de ele não ter sido ouvido. Exatamente como um profeta do Antigo Testamento, vaticinando desgraças ao povo eleito porque este não dera atenção aos enviados de Deus.

Assim fica ele pairando sobre o firmamento da Igreja, num pórtico que é o fim da Idade Média, e pode ser considerado como o começo da Revolução.

Aí está a imensa figura de São Vicente Ferrer!

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 4/4/1966)

Esvoaça do lado de fora, mas não entra

Certa ocasião, quando São Vicente Ferrer entrava em Barcelona — uma das maiores e mais ilustres cidades de seu tempo —, fizeram-lhe uma recepção tão extraordinária que de todas as janelas pendiam tapeçarias em sua honra, o povo o aclamava e ele caminhava debaixo de um pálio, cujas varas eram carregadas pelos principais da cidade. Então, alguém lhe perguntou, baixinho, ao ouvido:

— Irmão Vicente, e a vaidade?

— Esvoaça do lado de fora, mas não entra — respondeu ele.

A resposta de um orgulhoso seria: “Nem sinto tentação”. E um pusilânime diria: “Pobre de mim, estou inundado de vaidade”.

Este Santo deu a resposta certa: Como homem, posso e estou sendo tentado. Porém, a tentação esvoaça do lado de fora, mas, pela graça de Deus, ela não entra.

De fato, neste vale de lágrimas é normal sermos tentados. A tentação tempera a alma. Quem diz “não” para o demônio sai mais forte, mais pertencente a Nossa Senhora. O servo bom e fiel que foi provado e venceu manifesta a sua fidelidade, faz render na luta os seus talentos, colhe louros e os entrega à sua Senhora.

Somos soldados da Igreja Militante e devemos nos entusiasmar com isso.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 16/1/1970)

Refúgio dos Pecadores

Maria Santíssima é o refúgio perene, contínuo, que jamais se fecha a qualquer espécie de pecadores. Está na grandeza de Nossa Senhora ser um imenso e perfeito refúgio, porque tudo n’Ela excede a nossa capacidade de cogitação.

Um porto é um abrigo contra o mar revolto, e um navio encontra ali um refúgio. Dizemos que esse refúgio é tanto maior e mais esplêndido quanto mais navios couberem nele. Em uma enseada como a do Rio de Janeiro, por exemplo, onde não sei quantas esquadras poderiam entrar e sentirem-se completamente protegidas contra o mar bravio, vemos uma grandeza, uma magnificência e um esplendor incomensuráveis.

A Santíssima Virgem é assim. Ela pode dar refúgio a pecadores cujos pecados atingem um tamanho inimaginável, ingratidões inconcebíveis, insondáveis. Desde que a alma se volte para esta boa Mãe, Ela cobre tudo e aceita de dar toda espécie de perdão para toda espécie de pecados. Maria é, portanto, o refúgio por excelência.

Se sentirmos tristeza por notarmos que temos alguma culpa, devemos dizer a Ela:

“Temos culpa, é verdade. Mas Vós sois o Refúgio dos Pecadores, e está na vossa grandeza, ó minha Mãe, tomar os meus pecados e defeitos, e abrir para eles como que um porto para me defender do alto-mar das consequências interiores e exteriores das minhas desordens. À vossa grandeza corresponde também a grandeza de vossa misericórdia. Vós tereis pena de mim e me acolhereis.”

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 5/9/1970)

Santo Isidoro de Sevilha e a virtude nas boas maneiras

A compostura, o modo de andar, a gravidade nos gestos, podem não ser apenas meras atitudes externas, mas o reflexo de uma alma virtuosa. Verdade esta freqüentemente esquecida pelos adeptos desenfreados do estilo “descontraído” e “espontâneo”, porém lembrada de modo persuasivo nas palavras de Santo Isidoro de Sevilha, aqui comentadas por Dr. Plinio.

 

Comemora-se no dia 4 deste mês a festa de Santo Isidoro de Sevilha, Arcebispo, Confessor e Doutor da Igreja. Dele diz o martirológio ter sido insigne pela santidade e doutrina. Engrandeceu toda a Espanha com seu zelo pela fé católica e observância da disciplina eclesiástica. Considerado um dos homens mais doutos de sua época, lutou tenazmente contra os arianos(1). Irmão de São Fulgêncio, Bispo de Cartagena, de Santa Florentina, religiosa e de São Leandro, a quem sucedeu no arcebispado de Sevilha.

Sábios conselhos de um santo

Faço notar, antes de tudo, a beleza encantadora presente numa floração simultânea de santos como se deu na família de Santo Isidoro. Nas Obras escolhidas deste Doutor da Igreja há um capítulo intitulado Lamentações de uma alma pecadora, do qual destacamos o seguinte trecho:

“Em todos os teus atos, em todas as tuas obras, e em todo o seu trato, imita os bons, emula os santos, tem diante de teus olhos o exemplo dos mártires, considera os exemplos dos justos, imitando-os; que o exemplo dos santos e os ensinamentos dos Padres sejam para ti incentivo de virtude. Tem bom espírito, guarda tua boa fama e não a diminuas com nenhuma ação e não a deixes cair em descrédito.

“Demonstra o que professas em teu porte e andar. Haja em tua apresentação a simplicidade; em teu movimento, a pureza; em teu gesto, a gravidade; em teu passo, a honestidade. Que não demonstres o vergonhoso, o lascivo, o petulante, o insolente, o superficial. O gesto do corpo é o sinal da mente. Teu andar, por conseguinte, não represente tua superficialidade, teu passo não ofenda a ti ou a teu próximo. Não te prestes a ser espetáculo dos outros; não permitas que te denigrem; não te unas a pessoas vãs.

“Evita os maus, rechaça os indolentes. Foge das reuniões excessivas com homens, mormente dos que, por sua idade, são mais inclinados aos vícios. Acompanha-te dos bons, deseja sua companhia. Busca o convívio dos bons, junta-te aos santos. Se fores partícipe do seu trato, também o serás de sua virtude. O que caminha com os sábios, será sábio; o que caminha com os estultos, será estulto, pois os semelhantes gostam de reunir-se aos semelhantes. É perigoso viver entre os maus, é pernicioso acompanhar-se daqueles que têm vontade perversa. Tu te nutrirás de sua infâmia se te juntas com os indignos. É melhor sofrer o ódio dos maus que a sua companhia. Assim como muitos benefícios traz consigo o viver com os santos, assim muito mal traz a companhia dos maus, pois aquele que toca um imundo, é por ele contaminado.”

Devemos espelhar o que há de bom em nossa alma

Desse lindo trecho de Santo Isidoro de Sevilha devemos destacar, em primeiro lugar, o aspecto profundamente “ambientes e costumes”(2), quando fala do modo de apresentação do homem, da forma pela qual convém se externar aos olhos dos outros. Toda pessoa precisa compor para si um personagem. Ninguém deve ser inteiramente espontâneo — como pretendem certas pessoas “modernas” — no sentido de que sua presença exterior seja sugerida simplesmente por seus movimentos desalinhados, desataviados, incontrolados.

Em seu modo de ser, de olhar, andar, por seu porte e seu procedimento geral, o homem necessita procurar espelhar aquilo que há de bom em sua alma. Nem sempre as qualidades morais transparecem de maneira natural. Muitas vezes, alguém possui grandes virtudes, mas estas não se refletem no seu exterior se ele não tomar cuidado em manifestá-las e reprimir atos espontâneos que possam dar impressão do contrário.

E quanto aos nossos defeitos de alma, temos obrigação de evitar que transpareçam, não por hipocrisia e vaidade, mas por compostura, respeito aos outros e, sobretudo, a Deus, convictos de que o mal não tem direito de se expor à luz do sol.

Portanto, cada um tem necessidade de compor para si mesmo uma linha de conduta externa, um conjunto de gestos, de frases, de vocabulário, de modos de olhar, de ser, que são expressões autênticas de muitos aspectos de sua alma.

Isto não seria assim se o homem fosse concebido sem pecado original. Porém, tendo havido a queda de Adão, é preciso esse esforço. Por isso, nas civilizações que atingem certo grau de perfeição, ensina-se às pessoas a terem porte, maneiras e a constituírem para si seu próprio personagem. Lembro-me que o inimitável Saint-Simon(3) dizia: “Fulano transpõe os umbrais de uma porta com total inconsequência”. A expressão é muito interessante, porque todo limiar de porta que se ultrapassa, em si tem conseqüência. O umbral é um marco.

Noutra feita, criticando os modos de determinada pessoa, afirmava ele: “Trata-se de um homem a quem não se ensinou a dançar…”. As danças daquela época — que nada têm de comum com as de hoje — eram de alta compostura, superior finura de porte e apresentação, e proporcionavam ao indivíduo a arte de ter boas maneiras em tudo. Compreende-se, assim, o pensamento, a doutrina que estavam subjacentes a essas frases de Saint-Simon.

Incentivo à prática da virtude

Afirma Santo Isidoro: “Demonstra o que professas — quer dizer, o que pensas, o que és — em teu porte e andar”. Como se pode obter isso sem estudar uma postura e modo de caminhar adequados? Essa recomendação indica ser necessário o controle de si mesmo e que há certas maneiras de andar e de se portar significativas de algo bom e outras de alguma coisa má. Portanto, tal conselho nada tem de mundanismo. Pelo contrário, é um incentivo à prática da virtude.

Continua o Santo: “Seja tua apresentação a simplicidade”.

Simplicidade não é o mesmo que simploriedade. Aquela é o modo de ser do indivíduo não complicado nem afetado, sem ademanes e requebros inúteis. O homem simples procura ser útil, e age de maneira ao mesmo tempo intencional, produto da educação, e autêntica.

O gesto do corpo é o sinal da mente

“Em teu movimento, a pureza”.

Faço notar a beleza desta ideia! Os gestos da pessoa pura são diferentes dos da impura. Por exemplo, no volver a cabeça para atender alguém e perguntar: “O que é?”, pode-se perceber às vezes tratar-se de uma alma casta, ou então o contrário. Vê-se, pois, como é profundo o pensamento de Santo Isidoro.

Ele continua: “Em teu passo haja honestidade”. Ser honesto não significa tão-somente — como se julga hoje — não furtar. Em latim, “honestus” quer dizer composto, apresentando certa beleza, distinção e elegância.

“Que não demonstres o vergonhoso, o lascivo, o petulante, o insolente, o superficial. O gesto do corpo é o sinal da mente”.

Este é um magnífico princípio que deve nortear a vida do católico. E o Santo acrescenta: “Teu andar, por conseguinte, não represente tua superficialidade, teu passo não ofenda a ti ou a teu próximo. Não prestes a ser espetáculo dos outros, não permitas que te denigrem”.

Ouçamos as recomendações de Santo Isidoro

Em seguida, Santo Isidoro fala das boas e más companhias. Tais conselhos são muito importantes para combater certo erro moderno, segundo o qual se deve fazer apostolado introduzindo-se, sem nenhuma ou com pouca prevenção, no meio dos maus. Quando alguém se infiltra entre os ímpios para evangelizar, expõe-se ao risco de se tornar mau, assim como o convívio com os virtuosos pode tornar bom quem era ruim.

Isso se aplica de modo particular aos movimentos como o nosso, dedicados a atrair as almas para Nosso Senhor Jesus Cristo e a Igreja. Qualquer conselheiro Acácio(4) poderia dizer: “Se vocês frequentassem os ambientes mundanos, poderiam ter mais relações sociais e assim fazer maior bem”.

Ora, isso todo mundo sabe. Agir assim seria bom em tese, caso não houvesse inconvenientes: um deles, a fuligem inoculada nas almas de quem voluntariamente vive nos meios onde se ofende a Deus…

Temos aqui, então, comentadas algumas preciosas recomendações de Santo Isidoro de Sevilha, as quais devemos não apenas ouvir, mas praticar, adotando-as no nosso existir quotidiano como verdadeiros exercícios de piedade que nos façam crescer em perfeição, no amor a Deus, a Nossa Senhora e ao próximo.

 

1) Sectários da heresia difundida por Ario (280-336), padre de Alexandria (Egito), que negava a natureza divina de Nosso Senhor Jesus Cristo.
2) Dr. Plinio fez inúmeras exposições mostrando a importância dos ambientes e costumes para a formação ou deformação das almas. O aspecto “ambientes e costumes” de um assunto consiste em considerá-lo sob esse ângulo.
3) Duque de Saint-Simon (1675-1755), escritor francês que, em suas “Memórias”, descreveu com penetração, finura e charme a vida de corte em Versailles, na época de Luís XIV.
4) Personagem de uma obra do escritor português Eça de Queiroz (1845-1900). O conselheiro Acácio dizia, de modo sentencioso, coisas evidentes.

O Santíssimo Sacramento e a misericórdia de Nossa Senhora

Nosso Senhor Jesus Cristo está presente em todos os sacrários, em cada hóstia, em cada fragmento de hóstia. E basta querermos nos aproximar e falar com Ele que o Redentor ali está para nos atender. Não O vemos nem O escutamos, porém o mais importante é que Jesus nos vê e nos ouve.

 

A devoção ao Santíssimo Sacramento e a devoção a Nossa Senhora! São tantos os aspectos por onde essas devoções podem ser consideradas, tantos os fulgores, tantas as maravilhas, que não há palavras suficientes para exprimi-los.

Levando em conta que um bom método para fazer com que as pessoas se interessem e adquiram gosto por um assunto consiste em mostrar-lhes o nexo entre elas, seus problemas e o tema tratado, vou considerar as vossas dificuldades e de cada homem em concreto, à luz da devoção ao Santíssimo Sacramento e a Nossa Senhora.

Por que Deus não retribui sempre nesta vida o bem ou o mal praticados?

Começarei por falar do Santíssimo Sacramento.

Em um de seus livros, Santo Agostinho levanta uma questão: se Deus fizesse com que nesta Terra os homens fossem punidos por todos seus atos maus e premiados por todos seus atos bons, não seria um modo de organizar bem as coisas? Porque se a cada pecado mortal correspondesse uma doença tremenda, acompanhada de uma cirurgia pesadíssima com risco de morte; se cada pecado venial causasse uma nevralgia de arrebentar, uma dor de cabeça de atordoar, um reumatismo de se arrastar pelo chão, é claro que os homens tomariam muito mais cuidado em não pecar.

De outro lado, se houvesse prêmios: a cada tentação rejeitada, uma viagem à Europa; a cada ato de virtude praticado, um esplendor a mais apareceria na personalidade do homem, por exemplo, ficaria mais insigne, mais amável, mais atraente e mais dominador. Andando pela rua, os seus conhecidos o olhariam e diriam: “Ele praticou um ato muito bonito. Ei-lo, como está magnífico!” Para promoção da virtude e repressão do pecado, indiscutivelmente seria de uma grande valia.

Ser virtuoso por amor a Deus e não por interesse

E Santo Agostinho responde muito bem: se a cada ato de virtude praticado nesta Terra os homens recebessem uma recompensa, e cada ato mau tivesse como efeito uma punição imediata, eles não praticariam a virtude por amor à virtude, nem evitariam o mal por horror ao mal, mas por interesse. Seriam todos uns subornados. Deus subornaria as pessoas para irem para o Céu, e não lhes pediria uma prova de desinteresse e de amor tão intensa quanto é a do homem que, sabendo que nesta Terra talvez não seja punido, e provavelmente também não seja premiado, vence a tentação cruel por amor a Deus e ódio ao pecado, sem se preocupar com uma recompensa ou um castigo terreno.

Sem dúvida, como diz Nosso Senhor, o homem virtuoso terá o cêntuplo neste mundo, mais a vida eterna. Mas o cêntuplo nem sempre é a felicidade terrena; muitas vezes são graças e mais graças para suportar espinhos e mais espinhos, cruzes e mais cruzes. Ele viverá no reino da Fé, da Esperança e da Caridade, portanto, das virtudes teologais. Mas é um reino que não apalpamos e ao qual precisamos ter muito amor para sermos realmente fiéis. Assim, teremos as recompensas e evitaremos os castigos eternos. Porém se olharmos em torno de nós, notaremos quantas pessoas péssimas vivem felizes e desdenham o homem bom que passa perto delas.

A solidão após a subida de Nosso Senhor ao Céu

Não obstante, se Deus quisesse, tornar-se-ia visível aos homens. E poderia fazê-lo com tanta magnificência, com tanto esplendor que homem nenhum deixaria de praticar a virtude. Ora, Ele não o fez. Pelo contrário, após a Ascensão, Nosso Senhor Jesus Cristo deixou aqui sua Mãe, portanto o que na Criação havia de melhor. Mas não era Ele… Jesus subiu ao Céu. Podemos imaginar o quanto Ela sentia a ausência d’Ele, a solidão, e como Maria Santíssima comunicava essa sensação a todos em torno d’Ela.

Como terá sido a descida do Monte das Oliveiras, do alto do qual O tinham visto subir para o Céu? Todos ao mesmo tempo cheios do esplendor do que tinham presenciado, mas muito entristecidos: Jesus foi embora e voltará somente no fim do mundo, para julgar os vivos e os mortos. Que dilaceração! Ele subiu para esses céus visíveis e penetrou nos Céus invisíveis, onde se deu uma festa invisível para a qual não estavam convidados. Eles desciam as encostas e permaneciam na Terra, enquanto Nosso Senhor subia para o Céu. Oh, que rumos opostos e que separação cruel e definitiva: até o fim do mundo!

Aqueles homens morreriam e depois deles outros ainda, e as gerações se sucederiam. Vê-Lo-iam ao passarem os umbrais da morte, após terem feito a grande e terrível viagem. Mas nesta Terra não. Somente no Céu.

Como seria delicioso estar junto a Nosso Senhor, conversar com Ele um instante!

Lembro-me de que, ainda menino, vendo os desenhos de meu livro de História Sagrada, que eu reputava ultra expressivos — santinhos e outras coisas semelhantes —, considerava como seria delicioso estar junto a Ele, como seria maravilhoso, arrebatador, formativo, santificante conversar com Ele um instante! Que o olhar d’Ele se aprofundasse dentro do meu, ao menos por um momento, e já seria muita coisa! Mas não! Séculos antes de eu nascer, já Ele estava no Reino celeste. Séculos depois de eu ter morrido, Ele também estará no Céu. Nesta Terra eu não O verei! 

Eu sentia uma espécie de separação, como se as portas de ferro de um cofre contendo um tesouro maravilhoso e repleto de Anjos — eram as portas do Céu — estivessem trancadas. E eu do lado de cá, desejoso de ver, mas para mim não, para os filhos de Eva não!

Isso me dava uma sensação de solidão. Aquele a Quem eu quereria ter conhecido, que teria dado sentido à minha vida, a Quem eu teria seguido; Aquele que com um olhar poderia ter resolvido tantas dificuldades em mim, retificado tanto caminho torto, simplificado tantas batalhas, eliminado tantas incertezas, estava do outro lado! Era como se uma voz me dissesse: “Você, Plinio, caminhará sozinho. Terá outras ajudas, a Ele não. Para você o sol, que é Nosso Senhor Jesus Cristo, se pôs. Você nasceu na noite e morrerá na noite. Quando os seus olhos se fecharem e você tiver vencido a batalha desta vida — olhe em torno de si: quem está vivendo de maneira a ganhá-la?; você a ganhará? — então O verá. Mas é na outra vida, nesta não!”

E diante disso eu pensava: “Como estou só, como a luta é dura, Nosso Senhor está longe! Compreendo agora que Ele não poderia estar me aparecendo, e que eu não poderia estar no alto do Tabor com Ele continuamente porque não teria mérito na noite desta vida, na qual tenho a impressão de lutar só, não vejo nada e sou obrigado a reagir contra as minhas más tendências. Minha inteligência iluminada pela Fé me mostra o Bem, mas tenho que fazer esforço para ser fiel a Ele. Vejo, sobretudo, que este Bem que eu amo na Terra existe no Céu: um Deus pessoal e infinito que não conheço. Oh, que tristeza, que pena!”

”Meu filho, eu preparei para você esta maravilha: a transubstanciação!”

Aí surge a questão do mérito, e no mérito, o melhor de nossa vida. Era preciso que fosse assim. Nós ficamos nessa tristeza, mas diante desse drama de alma — porque para quem seja capaz de pensar, isto redunda num verdadeiro drama de alma — compreendemos o que a sabedoria e a misericórdia divinas prepararam para fazer companhia ao homem.

É como se a essas perplexidades Deus respondesse: “Meu filho, Eu quero lhe dar o mérito; não vou lhe aparecer, não vou premiá-lo nesta Terra, mas minha presença você terá. Sinto pena de sua solidão, tenho desvelo pela sua fraqueza e vontade de salvá-lo. Eu preparei para você esta maravilha: a transubstanciação!”

Sob as aparências do pão e do vinho, Nosso Senhor Jesus Cristo está realmente presente em Corpo, Sangue, Alma e Divindade em todos os sacrários da Terra. E a presença d’Ele se multiplica, portanto, incontavelmente por todos os rincões do orbe, onde houver uma igreja católica com o sacrário. De maneira tal que, ao passarmos por uma igreja, fazemos o sinal da Cruz para testemunhar nossa convicção de que Nosso Senhor ali Se encontra como outrora na Terra Santa, nos dias de sua vida terrena.

E se fosse só isto! Se Nosso Senhor estivesse apenas a dois passos de nós, como ficaríamos comovidos! Mas Ele quis ir além de toda cogitação e instituir o Santíssimo Sacramento, de maneira a poder ser recebido por nós na Sagrada Comunhão. Ele quis habitar em nós como num sacrário!

Todos nós que estamos nesta sala fomos sacrários por alguns minutos, durante todos os dias em que comungamos ao longo de anos. Seremos sacrários, se Deus quiser, por alguns instantes até o momento de nossa morte. Que felicidade e que companhia! Que intimidade, que penetração! Ser um conosco a ponto de vir morar dentro de nós! Ninguém poderá jamais, com a inteligência, esgotar a medida dessa união e compreender a forma dessa misericórdia.

Presença insensível, mas inteiramente real, e que às vezes se torna sensível

Portanto, Deus tem pena de nosso isolamento e nos diz: “As portas do Céu estão fechadas, mas assim como Eu transpus os muros do Cenáculo e apareci entre os Apóstolos, agora também transponho as distâncias que separam o Céu da Terra e resolvo permanecer em todos os sacrários, em cada hóstia, em cada fragmento de hóstia, inteiramente presente. E basta os homens quererem aproximar-se e falar comigo que Eu estarei ali para atendê-los. Eles não Me verão nem Me ouvirão, porém o mais importante é que Eu os veja e os ouça”.

De fato, é Nosso Senhor quem tem as riquezas, as graças. E se Ele conhece as nossas orações, é sensível a elas e as recebe bem, que importância há em sentirmos ou não que Ele as recebe? A Fé nos diz que Ele as acolhe. É Ele mesmo Quem nos dá a graça para crermos no Santíssimo Sacramento e sentirmo-nos atraídos para junto d’Ele. E quando nos ajoelhamos para comungar ou para adorá-Lo, para recitar o Ofício ou o Rosário diante d’Ele, seu olhar pousa com amor sobre cada um de nós como outrora sobre os Apóstolos.

Se, por um lado, temos a sensação de isolamento num regime onde nossa prova é contínua por não sentirmos a presença d’Ele, por outro lado, temos a certeza de que Ele está sempre presente. Presença insensível, é verdade, mas inteiramente real e quão maravilhosa! Que coisa insondável!

Presença sempre insensível?

Sem dúvida, muitas vezes comungamos na aridez. Em várias fases da vida espiritual pode acontecer que um ou outro não sinta o que vou dizer agora; não por culpa, mas porque a graça dirige cada alma segundo desígnios inefáveis de Deus, levando-a para onde Ele quer, com vistas a realizar uma determinada forma de santidade pré-estabelecida pela Providência.

Mas creio não haver um nesta sala que, entrando numa capela, numa igreja onde está o Santíssimo Sacramento, não tenha sentido — se eu ousasse me exprimir assim — algo de “insensível”. Não é uma impressão que entra pelos olhos, nem pelo tato, nem por qualquer outro sentido; os sentidos estão alheios a isso. Mas a pessoa entra… e diz: “Ele está ali.”

”Magister adest et vocat te”

Lembro-me de uma antiga capela em São Paulo onde há o tabernáculo com o Santíssimo Sacramento. No alto da parede estão escritas estas palavras tiradas do Evangelho: “Magister adest et vocat te — o Mestre está aqui e te chama”(1). Como é verdade! Ajoelhamos ali e dizemos: “É evidente, não sei como, mas Nosso Senhor está presente! Tenho a sensação de que Ele me ouve”.

Sei, pela Fé, que Ele me ouve, e a impressão, que pelo menos eu pessoalmente tenho tantas vezes diante do Santíssimo Sacramento é de que Ele me diz qualquer coisa que não consigo explicar, mas poderia ficar um dia inteiro ali, sem recitar o Pai-Nosso, a Ave-Maria, o Glória-ao-Pai — orações excelentes, porém depende do caminho de cada alma. Digo que não seria preciso rezá-las, mas simplesmente estar ali e pensar: “O Mestre está aqui e me chama.” Mais nada.

Quantas e quantas vezes, encontrando-me numa capela do Santíssimo, de dia ou de noite, nas penumbras eucarísticas — para o mistério, convêm as penumbras — de repente a chama da lamparina junto ao sacrário aumentava e as sombras cresciam, depois diminuíam; e naquele silêncio a lamparina, de vez em quando, estalava e eu ouvia o frigir do óleo e pensava: “Que silêncio é esse em que tais barulhinhos se ouvem? Que solidão é essa em que a mudança das sombras toma tanta dimensão? O que há aqui para isso falar tanto à minha alma?”

É o silêncio criado pela presença d’Ele. É uma certa forma de penumbra cheia de unção, que é a penumbra eucarística, também criada a propósito d’Ele, na qual as coisas insignificantes tomam um vulto muito maior. Na vida cotidiana não se observa isso, mas fica-se fora da vida cotidiana, pois o eterno está ali.

Santos que tiveram a graça da permanência eucarística

Há santos que receberam a graça de ter o Santíssimo Sacramento continuamente presente em si, por exemplo, Santo Antônio Maria Claret, que foi Arcebispo de Cuba e capelão do Palácio Real na Espanha, e tinha um título lindo: Patriarca das Índias. Quando comungava, a graça da presença real permanecia nele e, portanto, era um sacrário até o momento da outra Comunhão, em que as espécies anteriores desapareciam, o fenômeno da digestão se operava e elas se transformavam, dando lugar às outras. Assim, ele tinha noite e dia a presença real.

Tenho ideia de ter lido a história de um ou outro santo que recebeu da Santa Sé o privilégio de carregar permanentemente consigo uma teca com o Santíssimo Sacramento. Eu gostaria de imaginar o grande São Tomás de Aquino — que, aliás, acho que possuía também esse privilégio da permanência eucarística — com uma teca contendo o Santíssimo Sacramento suspensa ao pescoço.

É lindo! É menos glorioso do que tê-Lo dentro de si durante o tempo inteiro. Mas podemos imaginar que companhia! E como o homem fica companheiro de Nosso Senhor!

Uma rosa nascida do Santo Sacrifício do Calvário

Monsenhor de Ségur(2) fala das três rosas dos bem-aventurados, que são a devoção à Eucaristia, a Nossa Senhora e ao Papa. Uma das rosas, portanto, é o Santíssimo Sacramento; rosa vermelha, purpúrea como o Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo. Não é possível considerar tudo isto sem pensar no Santo Sacrifício do Calvário do qual a Missa é a renovação incruenta. A presença real dá-se no momento da Consagração na Missa quando então se renova, sem a efusão de sangue, o Sacrifício do Calvário.

A piedade eucarística não pode consistir apenas em deleitar-se com a beleza desta rosa de cor púrpura. Se nós recebemos tanto desta rosa e a amamos, devemos provar nossa fidelidade e nossa coerência.

Importância de se fazer sério exame de consciência

Quantas vezes uma atitude corajosa, uma impostação de alma enérgica consigo mesmo, um ódio profundo aos próprios defeitos, um verdadeiro amor às qualidades que o Santíssimo Sacramento fez nascer em nós impõem ações mais duras do que um combate físico!

Era muito meritório o que em certas Ordens os religiosos faziam, não sei se ainda fazem: o sacrifício de se flagelarem todos os dias. É belo, muito nobre! Mas isto não é flagelar a alma. E o homem tem muito mais dor com o que lhe toca na alma do que no corpo.

Como se flagela a alma? Pelo exame de consciência: “O que você fez? Analise bem, entre em todos os pormenores, meça a sua culpa. Primeiro, descreva seu ato; depois avalie para si mesmo a malícia desse ato”. Isso obriga a alma a confessar para si mesma o mal que praticou.

Como isso é duro em muitas ocasiões! E quando vem uma lamúria: “Não, mas o outro também teve culpa…”, a consciência diz: “Ele pode ter tido culpa, mas você pecou por sua culpa, por sua culpa e por sua máxima culpa, porque você recebeu graças, sabia que aquilo não era bom e poderia ter dito não”. “Confiteor, miserere…” Que coisa bonita! Compunção, compenetração: “Andei mal, não vou repetir, perdão…” Como isso é a verdadeira batalha do verdadeiro guerreiro!

A limpeza e a honestidade de uma alma que deu tudo

Para ser bom polemista católico, saber discutir e sustentar a Fé, saber lutar com os adversários da Igreja no terreno da habilidade política e da manobra da opinião pública, para ser sagaz é necessário que o homem leve a sua capacidade até o fim.

Quando notamos que o mais modesto dos homens empregou seu esforço até o fim, nós o respeitamos. É um frutozinho minúsculo, mas nós o veneramos. Entretanto, se virmos o maior dos homens que empregou no esforço 80% de sua capacidade e 20% não utilizou, ele fica como uma lâmpada que ilumina, é verdade, mas deita mau cheiro e fumaça preta no ambiente. A fuligem escura vai penetrar no mesmo recinto iluminado pela lâmpada.

Para uma alma dar tudo e, no contato com ela, termos essa sensação de limpeza e honestidade de quem foi até o limite de si mesma — quão deleitável é esse limite, e como é belo tratar com almas assim! —, é preciso que essa alma saiba fazer exames de consciência, porque senão ela se defrauda.

Eu sei bem que quando se cobra com esta dureza o dever de um homem, ele tende a ter pena de si mesmo e a perguntar: “Dr. Plinio, o senhor não se compadece de mim? O senhor não mede todo o sacrifício que sou obrigado a fazer? O senhor não tem uma palavra de afago, uma expressão de afeto para me animar?”

É natural que eu fixe a minha atenção sobre essa consideração, que é o pórtico para o tema: “Nossa Senhora”.

(Continua no próximo número)

(Extraído de conferência de 24/10/1981)

1) Jo 11, 28.
2) Louis-Gaston de Ségur (1820-1881). Prelado e apologista católico francês. Entre as diversas obras por ele escritas, encontra-se “Les trois roses des élus”, à qual Dr. Plinio se refere nesta conferência.

Arca da Esperança

Durante o período em que Nosso Senhor jazia no sepulcro, só Nossa Senhora creu na Ressurreição.

Portanto, sobre toda a face da Terra Ela era a única criatura com uma Fé sem sombra de dúvida, uma expectativa imensamente dolorida por causa do pecado cometido, mas calma, às promessas evangélicas.

Maria foi a Arca da Esperança que continha em Si, como em uma semente, toda a grandeza e todas as virtudes que a Igreja haveria de desenvolver e semear ao longo dos séculos; todas as  promessas do Antigo Testamento e as realizações do Novo. Tudo isso viveu dentro de uma única alma: a alma da Santíssima Virgem.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 19/11/1971)

Uma das obras-primas da piedade católica

A família Scrovegni, muito poderosa em Pádua no início do século XIV, mandou construir um palácio e uma igrejinha. A família e o palácio desapareceram; ficou apenas a capela cujas paredes Giotto marcou com os tesouros de seu gênio de pintor

Antes de passar aos comentários de algumas pinturas de Giotto, é interessante tomar conhecimento de dados históricos a respeito da Cappella degli Scrovegni(1).

Restou a capela por causa das pinturas de Giotto

O trabalho de Giotto na Cappella degli Scrovegni – ou Capela Arena, pois ela está situada no interior de uma área outrora ocupada por um anfiteatro romano – data possivelmente do ano 1305. Os documentos do tempo nos informam que Enrico Scrovegni, membro de uma poderosa família de Pádua, comprou em 1300 todo o terreno das arenas romanas para ali construir sua própria residência, hoje inteiramente destruída, com a capela anexa.

Então aquela igrejinha cujas paredes Giotto marcou com os tesouros de seu gênio de pintor – e, ao que parece, também de sua grande piedade, porque os quadros são muito piedosos – foi capela  do palácio de uma família. A família e o palácio não existem mais, porém a capela ficou por causa das pinturas de Giotto.

A construção da pequena igreja, autorizada em 1302 pelo bispo local, desenvolveu-se rapidamente, sendo consagrada no ano de 1305. O Papa Bento XI concedera, no ano precedente, indulgências aos visitantes dessa mesma capela. Analisemos, agora, algumas dessas pinturas.

Nosso Senhor entra em Jerusalém com a fisionomia triste

No dia em que Nosso Senhor ressuscitou Lázaro, os fariseus comentaram entre si que era preciso matá-Lo. Realmente organizaram um caso, em torno do qual provocaram a morte de Jesus.

Vemos nesse afresco Nosso Senhor dar uma bênção e Lázaro, com seu corpo todo enfaixado, sair da sepultura. E ele e mais uma irmã, provavelmente Marta, estão empenhadíssimos em que se  preste atenção no acontecimento, porque um grande milagre está sendo praticado.

Esses dois santos, no primeiro plano do quadro, estão pasmos com o assombroso milagre realizado pelo Divino Mestre. Notem Lázaro, todo enfaixado como os judeus costumavam fazer com os seus mortos, e um pouco mais adiante um personagem com uma veste verde-claro, que está falando com muita animação. Parece ser da turma de canalhas que resolveu a morte de Nosso Senhor
Jesus Cristo.

Outro quadro representa o Domingo de Ramos. Observem a inocência da apresentação: Ao fundo, para dar a entender que Jerusalém estava em seu início, aparece um pedacinho de fortificação e uma torrezinha que não daria para defender-se contra um batalhão de cem homens. Porém, é evidentemente uma imaginação. Nosso Senhor entra em Jerusalém com a fisionomia triste, o rosto muito varonil, uma abundância extraordinária de barba, e a atitude de um prelado de altíssimo poder ou de um chefe da Religião verdadeira. Ele era muito mais do que isso: o Messias. No meio da multidão que O acompanhava percebe-se uma ou outra pessoa com o aro da santidade. Ele mesmo tem esse aro muito definido, quer dizer, sinal de santificação. Sem dúvida, Jesus era o maior de todos os Santos.

Descem os azorragues

Uma pintura nos mostra a parte do Templo de Jerusalém, onde havia mercadores vendendo suas mercadorias. Nosso Senhor, não conformado com isso, desce os azorragues nesses negociantes.

Vemos dois homens de pé, apoiando-se um no outro, e o Redentor, com uma fisionomia evidentemente indignada, açoitando como quem tem o direito de bater, de verdade e com força. Os dois estão apenas procurando defender-se contra as pancadas porque, na concepção de Giotto, não tinham muita facilidade de fugir no momento.

Dentro de uma gaiolinha veem-se uns pássaros, que estavam à venda para serem oferecidos como sacrifício. Ao lado, os Apóstolos assistem a essa cena para lá de edificante.

Na representação da traição de Judas, os dois personagens ao lado estão confabulando, urdindo. O homem que conversa com Judas é um fariseu velho, experiente, com ar sacerdotal, e que recomenda discretamente como o traidor deve proceder. Judas, inimaginavelmente cruel e sem-vergonha, ouve as instruções para aplicá-las bem exatamente, numa atitude respeitosa. Sem sabermos o  que dizem, temos a impressão de quase ouvir o murmúrio da voz deles.

Evidentemente, Judas já está recebendo o saquinho com o preço da traição, que vai junto com as últimas recomendações. Atrás do traidor se encontra o demônio que está mandando em tudo.

Gosto muito mais desta representação da Santa Ceia do que a de Leonardo da Vinci. São João encosta a cabeça junto ao Coração de Jesus e pergunta quem é o traidor. Nosso Senhor o recebe com carinho, mas não indica o nome. Todos estão confabulando entre si sobre o que quererá dizer isso, mas numa relativa calma, a qual é uma das vergonhas da atitude deles durante o prenúncio da Paixão. Por certo, o católico não deve perder a calma, porém não precisa ter esta fleuma que denota uma certa indiferença, à espera da chegada do banquete para eles comerem.

Cerimônia do lava-pés. O Divino Mestre está lavando os pés de uma pessoa, e Ele se humilha a ponto de praticamente Se ajoelhar para executar esse ofício de caráter servil. Os Apóstolos estão comentando, estranhados com o fato. Mas Nosso Senhor não faz questão da opinião alheia e vai realizando o que deve fazer.

A revolta dos anjos e o ósculo de Judas

Depois da revolta dos anjos, e talvez certos episódios ainda ocultos da História contemporânea, não creio ter havido na História dos homens nada de comparável a esse fato do ósculo de Judas.

Para mim, esse “face a face” entre Nosso Senhor e Judas é das coisas mais espantosas que um pincel humano tenha pintado.

Nosso Senhor está sério e olhando o traidor até o fundo  da alma. E Judas procurando mentir. É a Verdade eterna e subsistente, encarnada, a qual olha para um homem que mente.

Judas, procurando tornar a mentira dele aceitável, abraça seu Mestre e O olha com ares de quem quer dar a entender ser seu grande amigo. Nosso Senhor fita-o e diz: “Judas, com um ósculo trais o Filho do Homem?” (Lc 22, 48).

De fato, Judas combinou com os guardas que o homem procurado para ser preso, Jesus de Nazaré, era aquele a quem ele beijasse. Então, foi até Nosso Senhor e, aproveitando-se de sua intimidade de apóstolo, aproxima-se do Divino Mestre e oscula a Sagrada Face. Jesus recebe com paciência esse beijo imundo, acompanhado provavelmente de um mau cheiro asqueroso, cheiro do Inferno.

Giotto quis representar em Nosso Senhor Jesus Cristo o auge de todos os predicados intelectuais e morais, e em Judas o extremo de todas as abjeções. Consideremos os recursos de que o artista se serviu para isso. Primeiramente, a cabeça de Nosso Senhor é provida com certa largueza de cabelo, mas não é uma cabelama que dá a impressão desses tapetes felpudos, feitos para serem postos do lado de fora da casa a fim de limpar os pés. Judas, não. Ele está com uma grenha suja, abundante, e que ele tratou de pentear direito antes de cometer seu crime infame, pois não queria que nada atrapalhasse o “bom negócio” que ele ia fazer. Quiçá, se ele estivesse desgrenhado na hora do beijo, o Divino Mestre não o quisesse aceitar. Ora, era preciso que tudo se passasse com ares de cordialidade.

Então ele se enfeitou. Comparem a desordem capilar de Judas com a proporção e a ordenação adequada de Jesus.

Comparemos também a implantação da barba de Nosso Senhor e a de Judas. A barba de Jesus possui boas dimensões e se dispõe muito belamente em cima da pele, tudo muito direito, com muita proporção. O mesmo se deve dizer do bigode. Prestem atenção na barba de Judas! São uns fios raros, formando arquipélagos peludos em uns e outros lugares do rosto. Nem se sabe bem o que é barba e o que não o é ali.

Por outro lado, no traidor a parte que vai do alto da maçã do rosto até o queixo é enormemente desenvolvida em comparação com a de Nosso Senhor, em quem tudo é proporcionado.

Judas dá a impressão de uma gulodice porca, horrorosa, enquanto Jesus manifesta uma austeridade delicada e verdadeiramente divina.

O apóstolo traidor não responde à pergunta de seu Divino Mestre. Logo depois de tê-Lo entregue, ele se põe a delirar e começa a correr de um lado para outro à procura de um sacerdote a fim de ver que jeito dava no caso. Mas, não tendo sucesso, acaba recorrendo ao suicídio.

Nossa Senhora de pé, com força e determinação

No recinto de Caifás – onde este Sumo Sacerdote se apresenta com autoridade, sentado sobre um estrado com dois degraus –, percebe-se uma algazarra e uma politicagem. Os personagens falam, mexem-se, Caifás está raivoso e agitado, e todos querendo encontrar um meio de arrancar dos lábios de Jesus uma palavra que justifique a sua condenação, mas não conseguem.

Nosso Senhor está calmo, sereno, sem ódios, mas sem abandonar sua posição em nenhum instante, e confessando a verdade corajosamente em todos os momentos.

Por causa disso – e Ele o sabia – haveria de acontecer que os seus tormentos iriam crescer cada vez mais até o fim.

Eis a Flagelação: não pode ser mais triste a atitude d’Ele, penetrado de dor física como de sofrimento moral – já alheio a tantos desaforos, ultrajes, insultos que lhe dizem e aos quais Ele não deve responder –, com a vara de bobo na mão e padecendo sem fim para resgatar os nossos pecados.

“Baiulatio Crucis Domini Nostri Iesu Christi”, Nosso Senhor Jesus Cristo carregando a Cruz. O Redentor vai sozinho, com aro de santidade, todos os outros são pessoas estranhas a Ele, indiferentes, exceto um que eu suponho ser São João Evangelista, acompanhando veladamente e de longe. Jesus carrega a Cruz com decisão rumo à sua própria imolação. Os outros estão totalmente alheios, pouco lhes importa. É a crueldade dos adversários d’Ele.

Crucifixio et mors Domini Nostri Iesu Christi”. Trata-se, portanto, do que nós contemplamos e veneramos no quinto mistério doloroso do Rosário. O Corpo está lívido, parece que o Redentor já emitiu ou está por emitir o último suspiro. Uma das santas mulheres oscula seus pés. Nesse grupo de três pessoas vemos Nossa Senhora,
a sua esquerda São João Evangelista, e a sua direita parece estar outra das santas mulheres; os outros personagens não são mostrados.

Por esse cantinho do lado esquerdo da Cruz, observamos como o local se está enxameando de gente que quer assistir aos acontecimentos. Mas o céu se encontra crivado de Anjos cantando a glória d’Ele. Entretanto, os espíritos angélicos, por enquanto, estão invisíveis, de maneira que os homens viam apenas a dor e a vergonha.

Nossa Senhora como está? Muito contundida, mas de pé, com força e determinação para tudo. Ademais de ser concebida sem pecado original, Ela amava tanto a Deus que era capaz de, por causa desse amor, frear a sua própria dor em alguma medida, de maneira a sustentar-Se de pé o tempo inteiro. Esta é a Paixão segundo Giotto, para mim uma das obras-primas da piedade católica. 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 30/11/1988)

Contemplar maravilhas nos prepara para o Céu

Descrevendo as belezas existentes no palácio de Versailles, sua solidez e dignidade, Dr. Plinio afirma que todo católico precisa desejar o maravilhoso para amar a Deus, enquanto que a Revolução visa a abolir o amor ao belo.

 

O palácio de Versailles foi construído por ordem de Luís XIV, segundo os preceitos e princípios da arte francesa e do espírito francês, para simbolizar a glória da monarquia e o brilho da majestade real.

Le Nôtre: o maior jardineiro de todos os tempos

Notemos, em primeiro lugar, a vegetação. O europeu cuida extremamente da vegetação e tem por jardins, árvores e parques um zelo todo especial. Esta coloração tão bela é fruto do trabalho, ao longo de séculos, de pessoas que aspiravam ao píncaro em matéria de relva, e que por isso plantaram relvas maravilhosas.

O resultado é que olhamos para este panorama e temos uma sensação de verdor, de vida, de saúde, de frescor que descansa os olhos. Mas repousa principalmente a alma, ao considerar uma criatura de Deus tão cheia de viço primaveril. Trata-se, portanto, de alta cultura em matéria de relva, como encontraremos também em Versailles uma elevada cultura em matéria de arquitetura. Porque tudo ali é alta cultura e custou esforço, vontade de produzir maravilhas por parte de gerações inteiras.

É interessante considerar como a vegetação está toda ela bem aparada, formando desenhos, o que evidentemente dá trabalho também. Esses desenhos foram elaborados pelo maior jardineiro de todos os tempos: Le Nôtre(1). São desenhos geométricos nos quais entrou um mundo de pensamentos e o cuidado de estabelecer a harmonia com a fachada do castelo.

Dignidade, fortaleza, estabilidade

Analisemos agora o castelo. Ele visa exprimir a dignidade, a fortaleza e a estabilidade da realeza. São os três valores que caracterizam todo poder na Terra. Quando este é digno, forte e estável, ele impõe o respeito. Há, portanto, como pressuposto dessa obra, uma teoria do poder.

Ao contemplar Versailles surge logo a exclamação: Que bonito este castelo! Mas somente prestando atenção notamos como esta beleza é obtida. Encontramos três zonas de leveza diferentes no castelo: primeiro, o que chamaríamos o rés do chão. Tem-se a impressão de algo forte, que toca no solo e constitui um fundamento vigoroso. O robusto da base é acentuado pela abundância de pedras, todas rajadas, que dão a impressão de estarem postas umas sobre as outras, quase como um muro. É a ideia da solidez.

Vem depois a ideia da dignidade. Consideremos o andar de cima: são janelas altas, constituindo uma fachada muito longa. Mas enquanto no andar inferior os arcos não têm colunas, no superior cada janela está entre duas colunas. Por ser esbelta, a coluna dá um ar de leveza e confere a esta parte do castelo um caráter de nobreza. Este andar é leve e fidalgo, enquanto o anterior, forte e serviçal.

De vez em quando se destacam corpos do edifício formando terraços, para quebrar a monotonia da fachada. É o cenário apropriado para aparecer, por exemplo, o rei com a família real e outras pessoas da nobreza, constituindo moldura para o monarca. Quer dizer, é uma apresentação, para todos, de uma hierarquia política e social ornamental, decorativa, nobre, pomposa, que mostra a sua beleza, mas ao mesmo tempo manifesta-se afável, risonha, numa proporção humana com os que estão embaixo; sem esmagá-los pela sua altura, mas isolando-se.

O último andar é tão pequenino que a vista quase abstrai dele. O olhar se concentra no restante e quase prescinde desse pequeno andar que parece servir apenas para suportar troféus guerreiros e estátuas. E, por cima, tem o céu. Forma-se, assim, uma espécie de transição entre a ordem política e social, e Deus. O castelo parece não ter fim, ele se perde em figuras alegóricas, em formas etéreas, e se funde com o horizonte celeste. Foi esta a intenção ao construí-lo.

Degustar sua beleza como se prova um fino licor

Esta concepção arquitetônica corresponde bem aos erros da época: a atenção está toda voltada para o rei, para a esfera política e social; o elemento forte e o leve são quase molduras para ressaltar a realeza. Temos, assim, a glorificação da realeza feita pelo castelo.

Para explicitarmos o que o castelo tem de maravilhoso, é necessário que o contemplemos algumas vezes por espaços de tempo bem diversos. Só então essas considerações vão se destacando e percebemos toda a realidade. É como provar um licor fino: às vezes sentimos seu sabor somente depois de tê-lo engolido. Aqui também: é a segunda ou a terceira análise que nos torna mais palpável o que acabo de explicitar, e nos faz degustar completamente o que o castelo de Versailles diz para aqueles que o visitam.

Embora esse castelo exista como uma concha vazia, pois tudo quanto nele era vivo foi exterminado ou levado embora, até hoje os turistas do mundo inteiro vêm vê-lo. É uma fama de beleza que se mantém pelo consenso de todos que o visitam.

Como é bonito ter havido todas essas ideias no espírito dos que compuseram esse castelo e, séculos depois, alguém, olhando para ele, recompor essas ideias e, por assim dizer, dar-lhes vida! Tal é a densidade de pensamento que uma obra de arte pode conter.

Essas considerações ajudam-nos a readquirir o gosto pelo maravilhoso. A alma de um católico tem que desejar o maravilhoso para amar a Deus. Somos criados para ver a Deus face a face; e contemplar essas maravilhas é uma preparação para o Céu. Preparam-se para o Céu os povos dotados desse amor ao maravilhoso que a Revolução de tal maneira quer abolir.

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 29/3/1967)

1) André Le Nôtre (1613 – 1700). Foi jardineiro do Rei Luís XIV de 1645 a 1700.