Não leiam ou leiam meu próximo artigo

Poucos contrastes há tão frisantes em São Paulo – onde, entretanto eles não faltam, e de toda ordem – do que entre a Avenida Tiradentes e o Convento da Luz, com o Museu de Arte Sacra, que lhe ficam exatamente à margem. Um longo muro, que toma talvez mais de meio quarteirão, separa os dois mundos.

Do lado de fora, a avenida, com seu movimento emaranhado e ruidoso, complicado ainda pelas máquinas superpotentes destinadas à construção do metrô. Muro adentro, quase a mesma atmosfera de há duzentos anos atrás: a tranquilidade, a meditação, a oração e o bom gosto ali deitaram raízes e vêm florescendo há tanto tempo, que chegaram a impregnar de uma vez para sempre a atmosfera de um aroma espiritual sutil e envolvente. Tal envolvimento começa sem que a pessoa se dê conta, desde o momento em que transpõe o largo portão em cuja grade se lê a data de 1870. Penetra-se desta maneira em um jardim de uma despretensão, uma singeleza e uma calma desconcertante. E a não se visitar o lindo museu, caminha-se diretamente para a Igreja. A esta se acede por um átrio calçado de um venerável granito desgastado pelos passos de gerações e gerações de fiéis. Logo em seguida, uma alta porta ouro e branco, em estilo barroco, sólida e sisuda como se fosse a própria face da Meditação, apaga no espírito de quem entra a recordação de toda tralha que ficou a mexer-se e a febricitar pela rua. Entra-se no templo. E tudo é sorriso. Aquele sorriso leve, nobre e superiormente sério que constitui um dos encantos de nossa arte colonial. Alta cúpula, proporções graciosas, altares e imagens cheias de mimo e dignidade. A atenção se fixa, por fim, no presbitério.

Do alto do retábulo, uma imagem da Imaculada Conceição, na penumbra, faz descer de seu nicho sucessivos e ininterruptos eflúvios de meiguice materna, condescendência e esperança de socorro.

Um pouco aquém um tabernáculo, de linhas imponentes como se fora um palácio luisquatorzeano. No chão, uma lápide de mármore assinala dormir ali seu repouso final Frei Antônio de Sant’Ana Galvão, o franciscano fundador da Casa. Como elogio póstumo só estas palavras simples e supremas: “animam suam in manibus suis semper tenens, placide obdormivit in Domino die 23 decembris. Anno 1822”. – Ter sempre em mãos a própria alma para a governar continuamente!… Que elogio! Quanto isto vale mais do que dirigir um avião superpotente, um país inteiro, ou até um banco (uso aqui a escala de valores característica de certa mentalidade supermoderna). A memória de Frei Galvão resistem à poeira destes 150 anos. Continuamente por ali passam pessoas de todas as idades e classes sociais, pedindo graças de toda ordem. E são  atendidas. Daqui a 150 anos quem frequentará as sepulturas dos homens superpotentes, para quem sobem hoje tantos aplausos e tantas petições… nem sempre atendidas?

Enquanto os olhos estão postos no Sacrário, onde – segundo indica uma lamparina rubra como se fosse um rubi – está realmente presente o Rei dos Reis e Senhor dos Exércitos, e o espírito vagueia por temas desta índole, ouve-se inesperadamente, a certas horas do dia, um conjunto de vozes femininas, de uma pureza que os anos não fanam, a recitarem, em “rectus tonus”, salmos, antífonas e lições. Só então se percebe que, nos fundos da Igreja, uma imensa treliça oculta a olhares profanos esposas de Cristo, cujas faces uma rigorosa clausura impede de serem vistas. Ali passam, há mais de 150 anos, sucessivas gerações de freiras Concepcionistas, apartadas das coisas do mundo, mas voltadas à oração e à expiação, para que Deus perdoe e regenere este mesmo mundo.

Do grau desse distanciamento das coisas terrenas, um simples fato – verdadeiro “fioretti” – pode dar adequada ideia. Contou-me certa vez o grande Arcebispo paulista, D. Duarte Leopoldo, o caso de uma religiosa que entrara em clausura, em remotos tempos em que São Paulo ainda não conhecia estradas de ferro. Quando então apareceram os primeiros trens, seus apitos, rasgando os ares pacatos da urbe de então, chegavam aos ouvidos das religiosas. Como podia entretanto vê-los a velha freira, já que a clausura lhe proibia olhar pelas janelas? Comovido pela observância da religiosa, D. Duarte lhe deu licença para, por uma vez, uma só vez, postar-se à janela quando passasse um comboio. Mas a freira pediu licença para recusar a regalia. Queria morrer sem ver o trem, para com esta mortificação sofrer ainda mais pelos pecados do mundo. Não tardou muito que “animam suas in manibus suis semper tenens”, partisse para contemplar a glória celeste, ao lado do Fundador.

Alguns há a quem a narração deste pequeno fato terá asfixiado. Recomendo-lhes que não leiam meu próximo artigo; não o entenderiam. Os outros, a quem tenha deleitado com um pouco de ar puro, talvez gostem de conhecer o que narrarei sobre a fundadora dessa colmeia de anjos, Madre Helena Maria do Espírito Santo.

Plinio Corrêa de Oliveira 28 de julho de 1974

Frei Galvão

“Animam suam in manibus suis semper tenens” — reza a inscrição na lápide de mármore sob a qual repousam os restos de Frei Galvão, no Convento da Luz. Simples e supremo elogio de quem dominou a própria alma e traçou para si um caminho de salvação. Sensível à voz de Nosso Senhor Jesus Cristo, obedeceu em tudo à vontade d’Ele, custasse o que lhe custasse, doesse ou não doesse, e assim alcançou a perfeição para a qual foi chamado.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência em 10/2/1989.

Em visita ao Brasil, o Papa Bento XVI canonizou,  no dia 11 de maio, este santo nascido em nosso país:  Santo Antônio de Sant’Ana Galvão.)

A borboleta, o pavão e o cisne

Quantas maravilhas Deus criou no universo! Ao observá-las, o homem deve procurar entender não apenas suas razões funcionais, mas seus sentidos mais elevados, como fazia Dr. Plinio. Pessoa altamente contemplativa, tudo quanto caia sob seus olhos ele relacionava com o Criador.

 

Quando era criança, eu corria atrás de borboletas, encantadíssimo! Há borboletas com um tipo de voo do qual gosto muito: flutuam, brincam com o ar. Sem saber, servem de deleite para outros; e embora não tenham um pingo de faceirice, se fossem faceiras, mexeriam as asas e voariam daquele jeito, para serem mais admiradas. É uma coisa bonita de ver.

O azul luminoso

Em minha opinião, uma das mais belas cores é o azul luminoso, esplendoroso, mas discreto das asas das borboletas. Dir-se-ia que a luz está dentro dessa cor. Ao se movimentarem as asas, o azul desaparece e surge o prateado. É propriamente um furta-cor, ou seja, um roubo de cor, uma cor rouba a outra. A meu ver, isso produz um efeito ocular muito bonito, fantástico! Quase se diria que um inseto como esse não poderia existir.

Isso me faz lembrar uma frase de Nosso Senhor, a propósito dos lírios do campo. Ele ensinou que não devemos nos preocupar com as coisas desta Terra além do limite necessário, porque a Providência vela sobre nós. E, então, disse o Redentor: “Olhai como crescem os lírios do campo! Não trabalham, nem fiam. No entanto, Eu vos digo, nem Salomão, em toda a sua glória, jamais se vestiu como um só deles”(1).

Sem dúvida, se víssemos uma pessoa vestida com uma roupa feita de pétalas de lírio, ficaríamos maravilhados! Não existe um tecido como esse, assim como não há um tecido como as asas de uma borboleta.

Um manto real esplêndido

Outras duas belezas da Criação são o cisne e o pavão.

Poder-se-ia dizer que a cauda do pavão é um manto real absolutamente esplêndido e muito bem cortado. Há no pavão uma evidente nobreza, e uma beleza admirável das plumas da cauda, no furta-cor azul e verde das penas, no jeito, na anatomia — por assim dizer — do pescoço dele. Nessa ave tudo é grande, exceto a cabeça, mas esta constitui o centro pequeno e vivo que dá movimentação a todo o resto, enquanto cabe a um ser irracional.

O modo de um pavão se mover é como o de uma rainha. Ele anda com um estilo nobre, calmo, não se assusta com nada; quando corre, fá-lo com uma certa dignidade; e quando para, não fica ofegante, mas com compostura. Cessado o perigo, ele volta à contemplação, não tanto de si mesmo, mas do “pulchrum” formado por ele e pelo que o rodeia.

Quando o pavão abre a roda, prestem atenção no pescoço dele e nos ares que toma; ares de superioridade, como quem diz: “Eu sou dono desta roda magnífica atrás de mim; mas não é apenas uma exposição de penas que levo comigo; sou superior; olhem a minha marcha e o meu pescoço todo feito de ‘joias’! Olhem a posição de minha cabeça! Considerem o meu olhar, o meu bico… Eu sou o pavão!”

O rei da água

Outra expressão do belo é o cisne, entretanto tão menos ornado do que o pavão. Enquanto o pavão tem aquela sua “joalheria”, sendo uma das aves mais belas criadas por Deus, o cisne, não. Ele é de uma cor só: branco ou, então, simplesmente preto. Mas observem o seu jeito de deslizar sobre as águas. Quando quer mover-se um pouco, o cisne faz um leve movimento com as patas por debaixo da água e desliza suavemente. Tem-se a impressão de que ele se contempla nas águas, e que estas ficam contentes de refleti-lo.

Ao confrontar o cisne com o pavão, nota-se serem ambos insignes pela beleza: um pela pulcritude simples e elegante, e o outro pela beleza ornada e majestosa. São duas formas de beleza, levadas pelo Criador a uma perfeição que nos deixa pasmos!

O cisne tem tanta placidez, tal domínio da natureza líquida, onde se move com tanta facilidade, que parece ser o rei da água. E a massa líquida parece feita para adornar e manifestar a beleza do cisne.

Quanta diversidade no cisne! Acima, a cabeça; depois, o pescoço elegantíssimo e o corpo um pouco volumoso. Se considerássemos só a cabeça e o pescoço, seria uma víbora elegante; se olhássemos somente para o corpo, seria um pato elegante. Mas como o cisne é superior ao pato e à víbora! Que harmonia maravilhosa no encontro entre o pescoço tão delicado e o corpo grosso — para o qual, entretanto, não falta elegância… — e ressaltado pelo branco magnífico, feito para brilhar à luz do Sol!

Deixar o prático-prático e contemplar

Uma das razões de ser dessas maravilhas é tirar o homem do prático-prático, fazendo-o compreender que as coisas não existem apenas por um motivo funcional, mas também por um sentido mais elevado.

Quando se tem o frescor da alma católica, sente-se gosto em permanecer vários minutos olhando para o cisne que singra as águas. Contemplando sem nenhum pensamento definido; mas quanta riqueza existe em muitos pensamentos indefinidos!

Vem-nos a impressão de que há algo de mais delicado, mais gracioso, mais digno, mais nobre do que nossa natureza humana considerada só em sua decadência. O que Nosso Senhor disse sobre Salomão e os lírios do campo, poderíamos aplicar ao cisne: Nenhum rei jamais teve glória tão bela como a do cisne!

Então, para além do homem existe algo mais alto: Deus, Nosso Senhor, ao Qual nos convidam os esplêndidos movimentos de alma que quadros como esses sugerem.

 

Plinio Corrêa de Oliveira [Extraído de diversas conferências(2)]

 

1) Mt 6, 28-29.

2) 14/1/1974, 10/6/1985, 9/9/1988, 16/9/1989 e 6/1/1992.

Firmamento de misericórdia

É tão fácil, doce e animador rezar à Santíssima Virgem, que não compreendo como alguém possa não querer recorrer a Ela, que é nossa Mãe!

Quando se recita na Salve Rainha “Mãe de misericórdia”, isto não está escrito ali sem razão. Maria é toda misericórdia. Se pode haver mães que são para seus filhos como um mar de misericórdia, Nossa Senhora é muito mais do que isso: Ela é um firmamento!

Peçamos à Virgem Santíssima, firmamento de misericórdia, que tome a alma de cada um de nós e a ponha nesse firmamento para que, depois de uma vida mais longa ou menos, mais difícil ou menos, entretanto sempre fiel, brilhemos como estrelas no firmamento por toda a eternidade.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 15/1/1990)

Como enfrentar a dor

Ao receber com alegria um pedido de seus discípulos para discorrer a respeito do amor à cruz, Dr. Plinio traça importantes diretrizes sobre como enfrentar, com Fé e entusiasmo, os sofrimentos inerentes à existência humana.

 

Nada eu desejava tanto quanto o momento em que filhos meus me pedissem o amor da cruz. Pois se nossa Obra é, de um lado, um instrumento para a conquista do Reino de Maria, de outro é uma semente desse Reino. E não tenho como autêntica essa semente, como sendo efetivamente uma semente, a não ser quando notar nela o amor à cruz.

Grandes alegrias e grandes sofrimentos

É compreensível, portanto, que ao ouvir esta semente me dizer: “Pai, para ser uma semente falta-me ainda o amor da cruz. Dai-me isto!”, eu solte um brado do fundo de minha alma!

Veio-me ao espírito o episódio ocorrido com Constantino, quando ele viu no céu aparecer uma cruz na qual estava escrita a frase “Neste sinal vencerás — In hoc signo vinces”, e pensei: “Ele não terá sentido talvez uma alegria tão viva, tão intensa, quanto sinto no momento em que ouço meus discípulos me pedirem isso”.

A cruz! O que devemos pensar a respeito dela? O que pensar sobre o sofrimento?

As épocas históricas na vida de um povo, de uma área de civilização ou, conforme o caso, na vida da humanidade inteira, são mais ou menos parecidas com as da vida de um homem.

A vida humana padrão, comum, abrange grandes alegrias e também grandes sofrimentos, que se alternam segundo uma ordem disposta pela sabedoria divina, dentro dos planos da providência geral que Deus tem para o comum dos homens, e da providência especial para aqueles que Ele chama, ama particularmente e, portanto, dá vocações especiais.

Remédios, condecorações, sinais de glória

Então as cruzes não entram apenas num aparente acaso do vaivém aparentemente cego dos acontecimentos da vida, mas elas vêm escolhidas como curativos, remédios, como condecorações, sinais de glória.

Uma por uma, elas são colocadas pela mão do Divino Pastor a rogos d’Aquela por meio de Quem nos vêm todas as graças e, portanto, todas as cruzes. Estas nos chegam em momentos nos quais muitas vezes nós não as entendemos, mas elas se apresentam e temos que suportá-las.

E, neste sentido, há épocas históricas nas quais as cruzes se apresentam para os homens fazendo com que eles sofram muito. De outro lado, existem outras eras históricas em que os homens sofrem menos. Há também épocas históricas em que a alma dos povos está mais sensível à dor, e outras eras históricas em que está menos sensível à dor.

O modo próprio de considerar o que é, ou não é, sofrimento na vida, o que alegra ou não alegra a existência, decorre dessas mutações do espírito humano que vão se dando ao longo da vida de um homem legitimamente; mas que se vão sucedendo também no decorrer da vida dos povos. E que variam no homem de acordo com as disposições do seu temperamento, mutáveis segundo os dias, as circunstâncias, a ocasião; mutáveis nos povos também conforme os dias, as circunstâncias e a ocasião.

O sofrimento é o preço da vitória

Nosso Senhor Jesus Cristo, do alto da Cruz, ofereceu um sacrifício misteriosamente superabundante. Na circuncisão Ele verteu algo do seu Sangue divino. Uma gota desse Sangue — isto é certeza de Fé — teria bastado para operar a Redenção. Mas, por desígnios d’Ele, esse Sangue foi derramado abundantemente ao longo da Paixão e no alto da Cruz.

E esse Sangue seria mais do que suficiente para remir o mundo, mas assim mesmo Ele quis de Nossa Senhora o sofrimento terrível pelo qual Ela passou ao pé da Cruz. De maneira tal que Maria Santíssima é chamada Corredentora do gênero humano. Ela teve tal participação na dor d’Ele, que aquilo compôs, por vontade de Nosso Senhor, o preço que Ele pagou.

Mas o Redentor quer que os católicos, até o fim do mundo, continuem a sofrer com Ele junto da Cruz. E que, quando os ímpios forem punidos, os católicos padeçam também, e muitas vezes sofram mais do que os ímpios e queiram esse sofrimento, porque com isso eles estão comprando a vitória.

A condição da vitória é o sofrimento. A luta tem uma grande significação para a vitória, em muito larga medida porque ela faz sofrer. Se não fizesse padecer, ela teria uma significação muito menor para a vitória. O sofrimento é o preço da vitória. E este sofrimento é tal que — tendo sido os homens resgatados pelo Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, infinitamente precioso, e só pelo sangue d’Ele — sem embargo o Divino Salvador quer, para que isto seja inteiramente útil aos homens, que nós soframos juntos.

Um cálice resplandecente com o Sangue de Cristo

Então fica o sofrimento da Cruz, por assim dizer — a metáfora que vou indicar não é teologicamente muito correta — suspenso entre o céu e a Terra, com milhões de almas que o demônio vai tragando, e que Nossa Senhora está chamando com o seu sorriso, sua bondade, suas bênçãos; de um lado, os bons na Terra lutam por essas almas, e, de outro lado, o Inferno está avançando e conquistando.

Entre as duas cenas, imaginem suspenso num Céu maravilhoso apenas um cálice resplandecente, e dentro dele o precioso Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo; entre o mal tremendo e o remédio, é preciso que muitos homens saiam da multidão e bradem: “Senhor, caia sobre nós o vosso sofrimento, mas sobre o mundo o vosso Sangue redentor!”

Então, como que o cálice transborda, o Sangue precioso ferve, começa a extravasar e se derrama. Mas na Terra há homens que padecem cruelmente para que isto aconteça. Eles estão pagando o preço necessário para que desça esse Sangue redentor e divino.

Com o sofrimento isso acontece; sem sofrimento isso não acontece. Portanto, é preciso sofrer. E todo o entusiasmo que não conduza a esta resolução de sofrer, é vontade de festa, não de vitória; é desejo de desafogar contra o adversário nosso amor-próprio ferido, de se vingar porque ele nos fez mal, de limpar a Terra da presença abjeta dele, de cem coisas que consultam ao nosso egoísmo, não é vontade da vitória de Deus, Nosso Senhor.

A pessoa que possui vontade verdadeira da vitória d’Ele é aquela que pode dizer: “Ainda que um raio tenha que me torrar e liquidar, um incêndio me consumir, se este é o preço para que eu conquiste tudo o que deveria conquistar, eu quero!”

Não nos iludamos, o caminho, o preço, é este.

Vejo quanto Nossa Senhora visita vossas almas com consolação, com alegria, mas também com sofrimento. Percebo bem, nas ocasiões de provação, os pânicos, os desconcertos, a dor, as dificuldades.

Espero que, se encontrei um olhar sofredor, ele nunca tenha deixado de encontrar no meu olhar a consolação que eu lhe tenha querido dar. Mas é para ajudar a carregar a cruz, para exortar a que, em relação a esse sofrimento, ele seja varão, seja cristão católico! Quer dizer, meta o peito e diga: “Dor, tu és um gládio. Eu vou de encontro a ti até que o gládio me vare!”

Episódio do Horto das Oliveiras

Devemos compreender que a vida sem dor é uma espécie de “mula sem cabeça”, é a “mãe da natureza”, não tem sentido. No momento em que falta a dor, a cruz dentro do nosso panorama, é porque o panorama está mal visto.

Mas essa dor nós temos que entender como enfrentá-la!

Para compreendermos quais eram as disposições de Nosso Senhor Jesus Cristo, ao longo da sua Paixão, devemos prestar atenção nos Santos que o exemplo d’Ele foi suscitando ao longo da História. Tudo quanto eles sentiram diante de suas próprias dores, Nosso Senhor sentiu de um modo infinitamente mais perfeito, e foi assim que Ele enfrentou a Cruz.

Então, quando se toma o episódio adorável do Horto das Oliveiras — episódio que entre todos me toca, porque é a hora em que Nosso Senhor mediu o tamanho do cálice e disse “Eu quero!”, e fechou este trato com o Padre Eterno: “Meu Pai, se não há outro remédio, compro por esse preço esses filhos que Vós quereis que Eu resgate e que quero resgatar. Eu aceito!” —, percebe-se que havia em Jesus a grande dor clássica d’Aquele que o Antigo Testamento chamava “Vir dolorum”(1), o Varão de todas as dores, suando sangue no isolamento, durante a noite. E isto ocorreu enquanto a cidade dormitava à espera de acordar para o grande crime; e nas trevas da noite Judas e os outros deicidas já estavam com a trama feita, e começavam a procurá-Lo para matá-Lo.

Mas havia n’Ele o entusiasmo de Carlos Magno, o ímpeto dos Cruzados, o fogo de São Luís ou de São Fernando, ou do Bem-aventurado Nun’Álvares Pereira(2) e de todos os guerreiros cristãos de todas as épocas. E também a ênfase de todos os Doutores, de todos os apologistas, a severidade de todos os teólogos, as desconfianças de todas as inquisições equilibradas e santas, o ímpeto de ação de todos os missionários; tudo isso havia neste passo decidido com que Jesus tomou a Cruz e levou-A até o alto do Calvário!

Nesta Terra ninguém escapa da dor

Nós não interpretamos Nosso Senhor por inteiro se O vemos sentado, vestindo a túnica de bobo, com a coroa de irrisão na cabeça, e não pensamos que Ele carregou essa coroa com altivez muito maior do que Carlos Magno haveria de levar a sua.

Quer dizer, todos os belos atos de virtude praticados nas vastidões da História da Igreja até agora, e até o fim do mundo, encontram sua raiz naqueles fatos da vida de Jesus, Nosso Senhor. Recompondo esses atos de virtude e remontando até a raiz, compreendemos o que nesta havia. Mais ou menos como quem toma a raiz de uma planta: se não viu a flor nem o fruto que a planta dá, não conhece o conteúdo verdadeiro da raiz.

Ora, as frutas e as flores que Nosso Senhor deu foram essas, e não medita bem na Paixão d’Ele quem não é capaz de tomar a História da Igreja hoje e remontar para trás, até os dias de Nosso Senhor, e procurar no Sagrado Coração d’Ele todos esses aspectos que ali havia de um modo superexcelente.

Nesse sentido, todo o entusiasmo, todo o fogo de São Paulo, toda a firmeza de São Pedro depois de Pentecostes, todo o amor extático de São João, tudo, até as coisas mais recentes que estão acontecendo neste momento por amor a Ele, e que nós não sabemos, reproduzem uma aceitação da Cruz de Nosso Senhor, com um aspecto moral que a santíssima humanidade d’Ele tinha no momento que Ele sofreu.

A morte. O Céu está cheio de almas que passaram pela morte, a qual é sempre uma dor. É uma dor até para as criancinhas que morrem batizadas, sem consciência; no momento de morrer, elas sofrem — às vezes doenças crudelíssimas — e aparecem logo para receber, sem julgamento, a glória do Padre Eterno. Mas levam o seu contributo: elas sofreram. A vida é assim.

Certa vez, li numa revista francesa: “On entre, on crie: c’est la vie; on crie, on sort: c’est la mort — Entra-se e geme-se: é a vida que começa; geme-se e sai-se: é a morte”. Até as criancinhas entram com a sua moedinha de dor!

Fé e entusiasmo

Vemos, então, que vil sonegador de impostos é o tipo que faz o seguinte raciocínio: “Eu não quero sofrer porque é muito duro. Quero todo o resto. Mas como não posso sonegar todos os sofrimentos que tenho diante de mim, vou padecê-los mal sofridos, meio fraudulentamente, porque, no total, quero fazer parte da parada da vitória”.

Isso não tem sentido!

Na essência, o que é entusiasmo, convicção, Fé?

Fé é uma convicção adquirida em conformidade com as leis da razão, mas de fato incutida pela graça. Esta convicção deve ser tão forte, que o homem esteja disposto a morrer por ela. Porque o homem crê, e no momento em que ele creu lhe é dado o primeiro ato de amor, mas no primeiro ato de amor vem este pedido e esta exigência: morrer por Deus, se for necessário.

Amar a Deus sobre todas as coisas é isto; amar o Criador exceto em caso de morte não seria amá-Lo acima de tudo. Então, a Fé firme gera este amor à cruz, este desejo de pagar o tributo da cruz.

O que é o entusiasmo? É uma forma tal de amor, pelo qual a pessoa não aceita o sofrimento apenas com resignação, mas tem desejo de sofrer.

No que consiste esse desejo? Em pensar do seguinte modo: “Percebo que algo eu tenho que pagar, quero pagar, e terei vergonha por não fazê-lo. Mas vejo mais: há gente que não paga e a quem Nossa Senhora ama também e quer salvar. Compreendo que, se eu sofrer, concorro para a salvação daqueles que Ela quer salvar. Então, eu quero sofrer! Quero de um querer sobrenatural e varonil, católico, apostólico, romano!” É o ato de vontade fecundo que produz de fato o sacrifício.

O entusiasmo é filho da Fé e da razão, e está baseado na constância.

Pode acontecer que, vendo uma alma que Maria Santíssima quer salvar, eu note, pelas circunstâncias, que Ela quer tanto salvá-la que, provavelmente, quando eu tiver sofrido por ela e ela for resgatada, Nossa Senhora vai amá-la mais do que a mim. Vou ficar, portanto, num segundo plano na dileção d’Aquela por Quem eu dou tudo.

Um grão de areia que faz mover um imenso astro

Por exemplo, imaginemos alguém numa cidade do Império Romano do Ocidente, já evangelizado, que vê passar pelas ruas de Milão um jovem, roçando pela idade madura, com olhar de fogo, inteligentíssimo, deita os olhos sobre ele e percebe um chamado.

Esse jovem é um devasso, tem maus costumes, e frequenta um templo herético. É alguém que recusou todas as graças.

O observador olha e diz: “Entretanto, o chamado continua. Ele será um colosso se disser sim, mas para isso Nossa Senhora quer que alguém sofra. Minha Mãe, para que ele seja mais do que eu, Vos dê uma glória que não fui chamado a Vos dar, para que Vós o ameis mais do que a mim, e para que eu, no meu desinteresse, veja a vossa predileção por ele, ame a vossa predileção e vos glorifique, eu Vos dou o que sou, tão pouco e tão zero. Quem sabe se, desta gota que sou eu, Vós tirareis o necessário para converter este homem que se chama Agostinho, tem uma boa mãe chamada Mônica e nasceu em Cartago?”

Esse observador é talvez um homenzinho que está pedindo esmola à porta da igreja, ou um pobre escravo convertido, ou um medíocre atolado no arenal da pequena burguesia, que ninguém conhece e resolve aceitar uma coisa dessas.

Ele volta para casa, está se sentindo normalmente bem e de repente sofre um ataque cerebral. Começa a cavalgata das dores e a morte que vem.

Em certo momento, pouco antes de ele morrer, um Anjo lhe aparece e diz:

— Meu filho, julgas que sou teu Anjo da Guarda. Sou muito mais do que ele. A ti foi dado um Anjo servidor e vassalo meu; eu sou o suserano de teu Anjo da Guarda. Sou o Anjo da Guarda de Agostinho, por quem morres, porque homens como Agostinho são tutelados por Arcanjos e não por Anjos. Eu venho te dizer que Agostinho está se convertendo, ele terminará a conversão no momento em que tu expirares.

E o moribundo responde:

— Mônica gerou para a Terra Agostinho; e depois o gerou o para a santidade, pelas suas inumeráveis dores e tormentos. Faltava esta pequena nulidade para se acrescentar a tudo isso. Eu fui o pequeno grão de areia que pôs a mover esse astro imenso. Morro em paz. Magnificat por Agostinho!

É preciso levar o nosso desinteresse até lá! Se não, nada feito.

Então, devemos querer que os outros sejam mais santos do que nós, desde que sejamos tão santos quanto seja o desígnio de Deus a nosso respeito.

Se quisermos ser fortes, devemos rezar e receber a Sagrada Eucaristia

Há almas a quem Nossa Senhora pede: “Meu filho, tu és feito de tal maneira, tua constituição física, psicológica, o passado que carregas nas veias e tudo o mais são tais, que te é dado agora fazer um ato de vontade de aceitação — ou rejeição —, que marcará tua vida de modo decisivo. Diga “sim”, mas diga já, de boca cheia, de coração cheio, e durante toda a vida vá dizendo “sim” cada vez mais, porque um pouco que afrouxares diminuirá o brilho de teu “sim” final. De ti Eu quero que sejas como uma trombeta profética soando cada vez mais alto, implacável na exigência consigo mesmo, até que tenhas dado o último tom, e os céus e as terras se movam porque tu tocaste a tua trombeta certa”.

Pode haver almas assim, e elas devem ter uma generosidade total desde o primeiro momento. Mas há almas que não são assim, olham para si mesmas e dizem: “Compreendo que deveria fazer isso. Enquanto Dr. Plinio está falando, estou resolvido a tudo, mas eu me conheço. Depois, vou ser fraco. Tenho força para essa virtudezinha de todos os dias, mas para a grande virtude de um grande lance, quando é que eu vou ter força? E agora, o que fazer?”

Isso é assim com todo mundo. O homem mais fenomenal que pudéssemos imaginar, o mais perfeito… em certas circunstâncias lhe faltam as forças. Nenhum homem tem forças para cumprir duravelmente os Mandamentos na sua totalidade. E, portanto, ele precisa de uma força sobrenatural, com a qual ele pode tudo.

Se ele não rezar e não pedir é um derrotado, um espaventoso, um fanfarrão. Ele poderá até se fazer passar por um herói, mas não será verdadeiramente um herói aos olhos de Deus.

Portanto, é preciso ser humilde e reconhecer isto a respeito de si mesmo e dizer: “Eu tenho que pedir, pedir, pedir, até o momento em que efetivamente seja atendido”.

Pedir como, a quem?

As primeiras “Salve-Rainhas” que rezei aos pés de Nossa Senhora Auxiliadora(3) foram porque eu me sentia pavorosamente fraco. Fui fraquíssimo, debilíssimo, e eu pensava que “salve” queria dizer “salvai-me”; não sabia que era uma saudação. Então eu a rezava com esse sentido.

Muitíssimas vezes eu ainda rezo dando à palavra “salve” o mesmo sentido ingênuo e errado, mas que corresponde ao apelo de minha alma: “Salvai-me, Rainha, Mãe de misericórdia, vida, doçura, esperança, nossa. Salvai- me agora, neste momento, nesta situação, nesta ocasião, deste modo. Salvai-me, eu vos peço, salvai-me!”

E Nossa Senhora nunca faltou.

Se quiserdes ser fortes, rezai a Salve-Rainha e alimentai-vos com o Pão dos fortes, do qual o maná não foi senão uma prefigura: a Sagrada Eucaristia.

Quem comunga e reza a Salve-Rainha torna-se forte, se desejar a fortaleza.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 18/9/1982)

 

1) Is 53, 3 (Vulgata).

2) Canonizado em 26/4/2009.

3) Ver Revista Dr. Plinio n. 1, p. 4-7; n. 100, p. 33-34.

A bandeira da vitória!

Ignorada por alguns, pouco comentada por outros, a história do Santo Sudário demonstra como no expirar do século XIX Deus outorgou à Santa Igreja um verdadeiro pendão da ressurreição de Cristo. A seguir, Dr. Plinio comenta o valor e o significado mais profundo deste impressionante milagre.

 

Devido ao fato de a história do Sudário de Turim ser pouco conhecida, não se dá a esta relíquia toda a veneração merecida.

 Os tesouros de outrora

Havia na Europa um pequeno ducado, chamado Sabóia, cuja capital era Turim. Os duques de Sabóia pertenciam a uma dinastia, senhora de dois Estados: Sabóia e Sardenha — uma ilha do Mediterrâneo — tinham os títulos de duques de Sabóia e reis da Sardenha.

Sendo esta uma época de Fé, nela considerava-se tesouro não apenas os metais e pedras preciosas, mas principalmente aquilo que os homens prezavam mais do que tudo: as relíquias! Entre as que pertenciam a esta casa real, figurava um longo tecido trazido para o Ocidente, o qual constava ser o Sudário, ou seja, o pano mortuário no qual o Corpo Sacrossanto de Nosso Senhor Jesus Cristo foi envolvido a fim ser colocado na sepultura, onde ficou até o momento glorioso em que, por um ato de sua vontade, ressuscitou dentre os mortos.

O Sudário será de fato autêntico?

Qual a prova de autenticidade do Sudário?

Os incrédulos levantavam inúmeras objeções quanto à autenticidade da relíquia.

Por mais que seu percurso até ao Ocidente fosse conhecido, como, entretanto, teria ela passado a fazer parte dos tesouros da casa dos imperadores do Oriente? De que modo o Sudário fora transferido dos Apóstolos para eles? Esteve de fato em poder dos Apóstolos?

Não havia provas, era uma tradição. A propensão legítima que possuíam os antigos para acreditar nas tradições, levou os imperadores de Constantinopla e os príncipes da Casa de Sabóia a prestar a devida homenagem e o devido culto ao Sudário, incorporando-o a seus tesouros.

Por determinação dos duques de Sabóia, o Santo Sudário foi colocado numa capela entre o Palácio Real e a Catedral de Turim, em um monumento de mármore, no interior de uma magnífica caixa. De fato, trata-se de uma tão preciosa relíquia que todo o ouro e toda a prata da Terra não seriam dignos de contê-la.

A fotografia revela a autenticidade do Sudário

No decorrer do século XIX surgiu a fotografia.

Pelo emprego de determinados sais de prata e diversos processos científicos, foi possível fixar sobre o papel diversas figuras das mais variadas coisas.

Em certas ocasiões o Santo Sudário era exposto à veneração dos fiéis, e numa delas um fotógrafo experiente, que havia em Turim, deliberou fotografá-lo(1). Naquele tempo, a revelação de fotografias era muito complicada e lenta, exigindo uma manipulação de certos líquidos, sais e diversos objetos, num ambiente iluminado por uma tênue luz vermelha.

Quando o fotógrafo começou a revelar o negativo, verificou que havia um vulto no tecido, e por fim a fotografia demonstrou a existência dessa figura. Assim, ficou revelada a autenticidade do Santo Sudário.

O mundo, a Cristandade e a Igreja chegaram a receber este legado verdadeiramente inestimável: uma fotografia de Nosso Senhor Jesus Cristo!

As fotografias do Santo Sudário foram difundidas em todo o orbe, causando admiração geral e grande desapontamento nos incrédulos. Foi então possível observar a evidente analogia entre a Face do Santo Sudário e a das imagens correntes de Nosso Senhor Jesus Cristo. De dentro da fotografia salta uma verdade religiosa que destrói inúmeras incredulidades de uma só vez!

O tecido da humilhação se transformou em bandeira da vitória!

A impiedade, entretanto, tem artimanhas… A polêmica feneceu a partir de 1912, 1915. Não mais se punha em dúvida o milagre. Os ateus não queriam deduzir que Jesus Cristo provadamente existiu. Contudo já não o negavam.

Por ser um argumento triunfante contra os incréus, o Sudário não era comentado. Com o passar do tempo, o tema foi sendo esquecido: vitória do Santo Sudário.

Vitória tanto mais linda quando se considera o seguinte: José de Arimateia e Nicodemos, acompanhados por São João Evangelista e as santas mulheres, adquiriram o tecido para depositar Nosso Senhor Jesus Cristo no sepulcro. Cobriram de unguentos todas as suas feridas, segundo o ritual antigo. Foi grande a quantidade de unguentos, pois — como diz a profecia a respeito de seus sofrimentos: “Do alto da cabeça à planta dos pés nada havia que estivesse são” — Ele estava completamente coberto de lesões, devido aos golpes desferidos pelos algozes. Envolvendo Nosso Senhor no tecido e levando-O para a sepultura, lacrando-a, imaginaram eles que aquele Sudário, muitos séculos depois, seria um triunfo sobre a impiedade?

O que parecia ser o pano da humilhação e da derrota, da tristeza e da dor, do desconcerto e da aflição, foi transformado em bandeira de vitória! Isso eles não podiam imaginar.

Tinham eles diante de si um fato concreto: Aquele Cristo Jesus, a Quem tinham adorado e continuavam a adorar — Ele, o Vencedor e Rei tão majestoso, diante de Quem qualquer rei da Terra não poderia tomar outra atitude senão tirar sua coroa, prostrar-se e pedir licença para tocar seus divinos pés com o diadema — havia morrido.

Nas sombras da morte

Como seria o convívio com este Varão, estando Ele vivo? Quem ousaria falar-Lhe “está frio o tempo…”? Antes de terminar a frase, já se sentiria que era uma bagatela que não poderia ser levada à presença d’Ele.

Dever-se-ia então dizer-Lhe:

“Senhor, falai porque vosso servo escuta! Fito vossos olhos divinos e vejo que aí está a Sabedoria infinita! Vós dizeis qualquer palavra e esta vale mais do que todo o ouro da Terra! Vós dais um passo à frente e percebo que sois Rei, pelo semblante com que avançais! Vós encontrais um pobre, um pecador, e Vos dirigis a ele para lhe fazer bem ao corpo e à alma! Noto tanta bondade em Vós, que me vejo de azinhavre em comparação convosco! Senhor, diante de Vós, quem pode subsistir? Sou feito para Vos olhar e para Vos adorar, por misericórdia vossa, pois não sou digno disso.”

O Rei das nações — como se considerava a Nosso Senhor cuja genealogia régia indiscutivelmente chegava até David e Salomão, os dois grandes reis de Israel — estava ali morto entre dois ladrões, acompanhado pelo séquito da dor: uma Mãe em cuja alma não havia senão o sofrimento mais pungente que se possa imaginar. Fiel a Ele, somente um discípulo! Ele que tivera tantos! Dois homens que eram “cripto-discípulos” e não ousavam mostrarem-se em público como seguidores d’Ele: Nicodemos e José de Arimateia.

Santa Maria Madalena, vertendo copiosas lágrimas, e as santas mulheres carregam aquele Corpo Sagrado, após O terem embalsamado e envolvido no Sudário, e O depositam na sepultura. Era preciso andar depressa, pois em pouco tempo começaria a Páscoa, festa entre os judeus, não sendo permitido fazer enterros nem trabalhos manuais. Eles desejavam preparar tudo lentamente, tranquilamente, elevando os olhos e a mente para o último olhar a Jesus. Entretanto, fizeram tudo com rapidez. Fecharam o sepulcro. E, excetuando Nossa Senhora, acreditavam que tudo havia terminado, pois não entendiam bem o que Ele tinha profetizado acerca de sua própria ressurreição.

A morte e a sepultura O tragaram. Sonho maravilhoso… decepção cruel! Todos choravam. Portanto, sobre o Sudário caíram talvez as lágrimas deles… e possivelmente também as de Nossa Senhora. E esse pano entrou nas sombras da morte.

Cristo, Tu venceste!

Quando o século XIX estava no auge de seu orgulho, preparando-se para transmitir ao século XX muitos frutos da Civilização — infelizmente havia algo que tornava todos esses frutos podres: a impiedade triunfante —, surgiu o Santo Sudário como uma bandeira magnífica da ressurreição! Nosso Senhor morto foi envolvido naquele precioso tecido. Entretanto quem o guardou com tanta piedade, atravessando várias centúrias, não tinha conhecimento de que aquele invólucro continha também uma prova da ressurreição de Cristo.

Seu Divino Corpo emanou sinais que marcaram o lençol e foram revelados pela fotografia! A Ciência ímpia dobrava os joelhos e dizia: Cristo, Tu venceste!

Nota-se na figura de Nosso Senhor estampada no tecido os sinais, entre outros, da coroação de espinhos. O Santo Sudário é tal maravilha e tão grande prova da existência de Nosso Senhor Jesus Cristo e de sua ressurreição, comprovando nossa Fé, que em todos os ambientes religiosos se deveria falar dele. Porém, o homem contemporâneo dá as costas para o Santo Sudário.

Os meios de pesquisa se desenvolveram enormemente, e os processos existentes para se verificar a autenticidade do Sudário chegaram ao inimaginável.

Ora, os equipamentos científicos indicaram que o Santo Sudário tem restos de pólen de plantas da Ásia Menor, algumas das quais não existem no Ocidente, e na data precisa em que viveu Nosso Senhor. Foi mais uma confirmação de sua autenticidade, feita pela Ciência. Com o desenvolvimento dos microscópios e outros processos complementares, tornou-se possível colher em panos antigos fragmentos mínimos de restos de flores, e polens que voam pelos ares e impregnam os tecidos. Os do Santo Sudário são de flores da Ásia Menor, do tempo de Jesus Cristo.

Uma fotografia detalhada dos olhos de Nosso Senhor revela que por sobre as pálpebras foram colocadas moedas, para mantê-las fechadas. Foi possível fotografar umas moedas cuja marca ficou no pano, e verificou-se que eram da época de Nosso Senhor.

Verificamos assim que a própria Ciência comprova até à evidência a autenticidade desse tecido sagrado.

Grandeza, poder e bondade de Deus

Entre outras perguntas de ordem científica, surgiu a seguinte: o que marcou este pano da forma como está caracterizado? Foram apenas evaporações e transudações de um cadáver?

Feita a análise, chegou-se à resposta: não! Houve, isto sim, outra força que marcou o pano e desenhou a figura.

Qual é essa força? Sabemos ser a ação triunfante, onipotente, de Deus, que pousou sobre esse Cadáver e O fez ressuscitar. Por desígnios misteriosos, Deus desejou que essa ação delineasse aquela figura no pano. Ele quis, Ele fez! Cientistas estudaram-na, concluindo ter ela três dimensões.

Relembrando nossas considerações anteriores, dizemos que o século XIX recebeu, ao expirar, enorme manifestação de grandeza, de poder e de bondade de Deus.

O Santo Sudário é como um estandarte que afirma à Santa Igreja: Tu não morrerás!

 

 

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 28/4/1984)

 

1) O advogado Secondo Pia fotografou o Sudário em maio de 1898.

 

Firmeza, doçura e senso do dever

Ao contemplarmos o olhar de Santo Antônio Maria Claret, não é difícil perceber, ao lado de muita firmeza, uma bondade e uma doçura incontestáveis. É um homem movido por um alto senso do dever, fundado nas mais altas concepções religiosas e metafísicas. Esse varão está profundamente persuadido de que a posição por ele tomada é a certa, a Religião que ele professa e ensina é a verdadeira, de que ele é um ministro de Deus, e prega a doutrina imutável e eterna da Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/10/1987)

Santo Antônio Maria Claret, sacerdote fervoroso e pregador ardente

Florão da estirpe dos homens providenciais que Deus suscita em todas as épocas para servirem de modelo e guia aos seus semelhantes, Santo Antônio Maria Claret — cuja festa se celebra no dia 24 deste mês — reluz no céu da Igreja por seu extraordinário vigor de alma e sua destemida devoção ao Papado. Assim no-lo apresenta Dr. Plinio, ao nos evocar os principais aspectos da vida desse Santo.

Em 24 de outubro é comemorada a festa de Santo Antônio Maria Claret (1807-1870), Bispo e Confessor. Além de se destacar como insigne defensor da autoridade pontifícia, foi um grande devoto de Nossa Senhora, havendo fundado a Congregação dos Filhos do seu Imaculado Coração, conhecidos como claretianos.

Tive oportunidade de admirar o perfil de Santo Antônio ao ler uma pequena biografia dele — com a qual me maravilhei! —, a fim de reunir elementos para pronunciar uma conferência em Rio Claro, cidade do interior paulista. Não pretendo repetir aqui essa palestra, embora os extraordinários e numerosos aspectos da existência deste Santo pedissem comentários mais extensos. Limitar-me-ei, portanto, a considerar os lados mais marcantes de sua vida.

Fachada da Basílica do Vaticano

Período de tibieza na juventude

A Igreja desaconselha que se faça comparação entre os heróis da Fé elevados à honra dos altares. Não direi, pois, que Santo Antônio Claret foi o maior de seu tempo. Porém, penso que, se em cada quadra histórica alguns Santos sobrepujam os outros em importância aos olhos de Deus, nos planos da Providência um desses terá sido sem dúvida Santo Antônio Maria Claret.

Mais do que Fundador de uma congregação religiosa, ele nos aparece como um varão exponencial, dominando completamente sua época, pelo simples fato de ter existido.

Imagine-se um homem de baixa estatura, espanhol de temperamento ardoroso, catalão apimentado, filho de uma família bastante piedosa, dedicada à fabricação têxtil. Ainda jovem, morando em Barcelona, sentiu apelos divinos para algo de mais elevado, embora indefinido, pois não pensava na vocação sacerdotal. Mas, naquela cidade, envolveu-se com questões de tecelagem e se enfronhou nos assuntos práticos desse negócio, começando a esquecer o fervor da sua piedade dos tempos de menino. Passou alguns anos absorto no cuidado de máquinas, teares e coisas semelhantes.

Praça de São Pedro no dia da proclamação do dogma da Infalibilidade Papal

Praticava ainda a religião, mas, nesse período de sua vida, pode-se dizer que Santo Antônio Maria Claret — para usar a nossa expressão caseira — tendia a ser um “sabugo” 1. Continuava a frequentar a igreja, assistia à Missa aos domingos, comungava algumas vezes por ano e também recitava o Rosário. Mas, fora do cumprimento estrito dessas práticas de piedade, só tinha pensamentos para o seu trabalho na indústria têxtil.

Certo dia, indo nadar com os companheiros no litoral, o movimento muito forte das ondas o arrastou mar adentro. Apelou à Santíssima Virgem e, de forma inexplicável para ele, percebeu que flutuava na superfície do oceano, sendo levado por força misteriosa até a praia, sem ter tragado sequer uma gota de água. Salvo em terra, associou o episódio a uma lembrança que tinha tido, durante a Missa, das palavras de Jesus Cristo no Evangelho: “De que aproveita ao homem ganhar todo o mundo, se finalmente perde a sua alma?” (Mt 16,26).

Padroeiro dos “sabugos”

Eis um primeiro ponto de afinidade de Santo Antônio Maria Claret conosco. Pois ele resolveu levar uma vida nova, o que, sob certo ponto de vista, foi uma recauchutagem, uma “desensabugagem”(1) de sua alma.

Algo de semelhante acontece em nosso grupo. A Santíssima Virgem atrai as pessoas as quais, uma vez fixadas, em geral entram no processo de “ensabugamento”. E se a misericórdia d’Ela não o impedir, acabam nesse lamentável estado de tibieza. A partir daí começa a segunda fase: é preciso remar até conseguir que elas se recauchutem ou se “desensabuguem”.

E quando correspondem à graça, experimentam uma espécie de nova conversão. Em seguida, inicia-se a terceira fase de sua vida espiritual. Se, com o auxílio de Nossa Senhora, não tivéssemos o cuidado de “desensabugá-las”, é de se temer que muitas dessas pessoas não perseverariam na vocação.

Então, com profundo respeito, podemos dizer que Santo Antônio Maria Claret nos aparece como o padroeiro dos “sabugos”. Por sua fidelidade à graça da conversão, tornou-se um modelo de “desensabugado”, digno de ser imitado por nós. Ele alcançou esse triunfo sobre a própria indolência espiritual porque sempre nutriu particular devoção a Nossa Senhora, e a Santíssima Virgem, que o predestinava a grandes feitos, ajudou-o a se reerguer e se “desensabugar”.

Rumo aos píncaros da santidade

Desde esse momento, com imenso fervor, ele empreendeu a marcha ininterrupta até atingir os píncaros de santidade, como veremos.

Ordenado sacerdote, tornou-se missionário. E revelou-se como o típico pregador popular (e gostaria de acentuar a palavra “popular”), com algumas características eminentes. Por exemplo, tinha voz possante, capaz de se fazer ouvir pelas multidões que enchiam as praças públicas onde ele pronunciava seus sermões, pois o espaço interno das igrejas era insuficiente para conter todos os fiéis desejosos de escutá-lo. E não raro, as mesmas praças se verificavam pequenas para reunir o público que comparecia às suas pregações.

Imaculado Coração de Maria, em homenagem ao qual Santo Antônio Maria Claret fundou a sua congregação religiosa

Quando se dirigira de uma cidade para outra, sua fama de orador sacro era tal que grande parte da população de onde falara o acompanhava, processionalmente, até deparar com os habitantes da localidade vizinha, para a qual ele falaria. Durante o encontro, o Santo fazia um sermão de despedida de uns e de saudação aos outros, comovendo a alma de todos.

Sendo um orador popular muito vivo, interessante, ardente, profundo, sólido, substancioso e dotado de carismas extraordinários, davam-se fatos espetaculares durante as suas homilias. Por exemplo, às vezes ele interrompia suas palavras, apontava para uma mulher na assistência e lhe dizia de súbito: “A senhora pensa que não morrerá tão cedo, e terá vários anos pela frente. Sua morte se dará dentro de… — suspense! — seis meses”. Naturalmente, a indicada desmaiava, caía em prantos, etc.

Noutras ocasiões afirmava: “Vou expulsar o demônio que está pairando sobre este auditório”. E em seguida pronunciava a fórmula do exorcismo. Estrépito, raio em céu sereno, caem os sinos do campanário e a população fica apavorada. Havia conversões em massa, pois bem podemos imaginar o efeito de pregações dessa natureza.

Santo Antônio compreendia de modo claro ter sido destinado por Deus à vocação de missionário junto ao povo. Nunca desejou tornar-se teleólogo profundo, nem orador de alto porte, como um Pe. Antônio Vieira, um Bossuet, Bourdaloue, etc. Nascera para falar ao vulgo, e com sua oratória popular esplêndida, convertia multidões.

Compreendeu, igualmente, ser um homem feito para suscitar zelo, mais do que coordenar o zelo que suscitara. Por isso, passava pelas províncias despertando por toda parte o amor a Deus, deixando depois que outros utilizassem aquela semente e aquele fogo para melhores finalidades. Era, portanto, um modelo de desprendimento, sem a preocupação de colher para si, mas plantando para que outros colhessem.

Arcebispo em Cuba e confessor da Rainha

Depois de uma estupenda pregação nas Ilhas Canárias, afinal, foi promovido a Arcebispo em Cuba, então colônia espanhola cuja situação moral se apresentava muito decadente. Santo Antônio Maria Claret dedicou-se à conversão da Ilha, e quando começou a obter a emenda dos costumes, desencadeou uma reação intensa contra ele. Sofreu tantas e tão fortes oposições, e até atentados, que a Rainha da Espanha acabou intervindo e o retirou daquelas terras.

De volta à metrópole, Santo Antônio Maria Claret se instalou na corte, como confessor da Rainha Isabel II. Mulher de maus bofes, passou a se modificar e melhorar no contato com Santo Antônio, até que uma reviravolta política a destronou e a exilou para a França. Foi ele, portanto, quem provocou pelo seu zelo esse terremoto na Espanha, ao mesmo tempo em que desempenhava uma obra insigne, como missionário, em todo o país.

Santo Antonio Maria Claret

Defensor da infalibilidade pontifícia

Nesse período, fundou a Congregação dos Filhos do Imaculado Coração de Maria, cujo nome exprime o culto fervoroso que ele dedicava à Mãe de Deus, sob essa invocação.

Alguns anos mais tarde, durante o Concílio Vaticano I, deu-se um dos célebres episódios da vida de Santo Antônio Maria Claret. Ele já estava idoso, doente, porém aureolado pelas mais altas graças que se possa receber. Por exemplo, o Santíssimo Sacramento nunca se deteriorava dentro dele, de uma comunhão a outra, de maneira que era um sacrário vivo, assim como Nossa Senhora que tinha Jesus vivendo n’Ela durante o período da Encarnação e da gestação.

Pois bem, ao ouvir no Concílio Vaticano I pronunciamentos de alguns bispos contra a infalibilidade papal, Santo Antônio se levantou e fez um famoso sermão em que declarou: “Oxalá pudesse eu consumar minha corrida, confessando e dizendo da abundância do meu coração esta grande verdade: creio que o Sumo Pontífice Romano é infalível”.

A atitude de alguns irmãos seus no episcopado o acabrunhou e o encheu de desgosto, a tal ponto que sofreu um começo de apoplexia, pela qual viria a falecer pouco depois, na França, recolhido numa Cartuxa. Era o ano de 1870.

E assim terminaram os dias desse magnífico varão de Fé, ao qual nos honramos de tomar por patrono, como grande promotor que foi da devoção a Nossa Senhora, em especial ao Imaculado Coração de Maria, bem como por seu ardoroso amor à Santa Sé Apostólica. Além disso, é modelo para nós, pois demonstrou que, nas camadas populares, ao contrário do que pretende a Revolução, uma pregação autêntica e boa produz maravilhosos resultados.

Todas essas razões nos levam a, no dia de sua festa, confiar de modo particular no patrocínio de Santo Antônio Maria Claret, e lhe pedir que nos alcance as melhores graças do Céu.

1 ) Metáfora empregada por Dr. Plinio para exprimir o estado de espírito de quem, tendo aderido com certo ardor a um ideal, deixa-se depois arrastar pelo desânimo, a languidez e a inação. Esse perdeu o fervor com que realizava as boas obras e o entusiasmo que tinha em cumprir a vocação, assim como a espiga de milho que perde seus grãos e se transforma em sabugo.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 9/10/1987)

(1) – ensabugar – neologismo da espiga sem o milho aplicado às almas que deixam de florescer e dar frutos.

Santo Aretas, firmeza e grandeza

A coragem e firmeza de Santo Aretas diante do martírio fazem reluzir mais uma das maravilhas produzidas pela Santa Igreja Católica Apostólica Romana nos povos que se põem sob seu maternal domínio.

No livro do Frei José Pereira de Santana, “Os dois Atlantes da Etiópia”, encontramos alguns dados biográficos de Santo Aretas. Trata-se de uma prédica de Santo Aretas aos católicos da cidade de Najran, na Arábia, antes de ser martirizado pelo tirano Dun’an.

Invectiva cheia de grandeza

Ouvi-me, inumano Rei, doutores da Sinagoga, apóstatas franitas, bárbaros confederados, cortesões ilustres e esclarecidos habitantes de Najran.

Isto, sim, é saber dirigir uma apóstrofe!

“Apóstatas” é uma palavra de alta expressão. “Fulano é um apóstata!” Todo o horror da apostasia se descarrega nestes dois “tas”: “após–ta-ta”. Tem-se a impressão de que é uma coisa que caiu, que rola em dois “tas” e que se desfaz.

Um “apóstata franita” dá a impressão de ser alguém que se deu a uma das heresias mais infectas, aliciantes e, ao mesmo tempo, mais digna de rejeição.

“Bárbaros confederados” é também uma forma de ultraje; soa como se fossem bárbaros requintados, de tal maneira ligados a outros bárbaros que formam uma coesão de barbárie, uma espécie de ultra barbárie, pior do que todas as barbáries.

Então, os doutores da Sinagoga, os apóstatas franitas e os bárbaros confederados, todos juntos num conglomerado imundo, nefando e agressivo contra o Santo que está sozinho. Vai ser martirizado, mas, antes de morrer, diz o que quer. Não falta grandeza a essa introdução.

Cântico de coragem, transbordante de Fé

E continua:
Companheiros, amigos, parentes e outros quaisquer dos circunstantes, sejais nobres ou plebeus, ou católicos ou infiéis, ouvi-me todos, vos suplico, pois com todos falo. Bem vos pudera dizer que canto, se observardes que, por artifício dos anos, me converti em cisne nacional, conservada na cabeça a candura, no coração, sem temor de morte, a alegria.

Há uma lenda que diz que o cisne, quando vai morrer, canta. É o seu último canto, de uma beleza maviosa. A ideia é muito bonita. Imaginar um cisne que, antes de morrer, emite um canto suavíssimo em que vai toda a “cisnicidade” dele transformada em sons que batem na água, repercutem pelas árvores e morrem no céu. É uma coisa também à qual não falta poesia.

Este Santo diz que ele é como um cisne, que, antes de ser martirizado, dá o seu último canto. Mas é uma beleza! É preciso ser oriental para saber fazer isso.

Diz o seguinte:
Eu me converti em cisne nacional pois conservei na cabeça a candura, no coração, a alegria, embora não tenha temor da morte.

Ele vai morrer, mas é cândido, puro, é alvinitente na sua fronte, nas suas ideias e na sua alma; ele é alegre, apesar de que vai morrer. Com esta alegria e com esta candura ele vai deitar o seu canto de cisne, e esse canto é bom que todos ouçam.

Falo primeiramente contigo, ó Rei. Mais que as feras, como já te lancei em rosto, és desumano. Respondendo às cem razões em que me acusas queixoso, condenas injusto: verdade é que sou, co-mo dizes, a total causa, motor e única cabeça da firmeza dos najranenses, mas não dos seus padecidos escravos.

Desprezaram o meu conselho sem advertirem que, em proporção das minhas cãs, era o mais maduro. Perigaram, pois, nesse desprezo e naquela resistência se perderam. O que sempre a todos persuadi foi que perseverassem confiantes na oposição, pois, não obstante serem tuas forças superiores às nossas, mais fortes que as tuas armas eram os nossos muros, e mais inconquistáveis que estes, os nossos corações.

Com que poder saiu, em outro tempo, a pelejar contra tantos milhares de madianitas um Gedeão? Pois se es-te, porque o Céu amparava, pôde vencer com tão poucos a tantos soldados, que razão havia para que não triunfassem também os nossos do teu poder, tendo certa, do Senhor do Céu, a proteção e mais vigorosas forças do que as daquele príncipe?

Não imagines que és do castigo que experimentamos o autor, senão um instrumento; por tuas mãos nos castiga Deus a temeridade de crermos que seria fiel ás criaturas, quem, além de ser traidor do seu soberano, era mais que laivoso rebelde ao seu Criador.

Chama-me, ó tirano, zelador da honra de Deus. A este Senhor justa-mente invoco contra ti, vendo que desprezaste a sua lei, destruíste os seus templos, profanaste os seus altares, extinguiste, finalmente, os seus sacerdotes. Sabe, pois, que eu, à imitação do mesmo profeta que a tantos reis idólatras vaticinou a morte, te asseguro que, brevemente, serás desta púrpura despojado e deposto da monarquia.

De sorte que, sem ficar dos teus domínios parte alguma isenta, a todos sujeitará Deus ao etiópico império de Elesbão. Este insigne varão e pode-roso príncipe será, da nossa derrotada Cristandade o restaurador, prevalecendo-te de tal modo em desagravo de Jesus Cristo contra ti que, por Ele, verá admirada Najran suas igrejas nova-mente recuperadas e a ti, como soberbo edifício, sem que jamais seja reedificado, aos seus pés caído.

Firmeza e resolução

Santo Aretas, depois de dizer que iria deitar o canto do cisne, diz ao Rei: “Tu, ó Rei, és pior do que as feras e, entretanto, tu tens razão quando dizes que eu sou a causa, motor e única cabeça da firmeza e resolução com que os najranenses lutam contra ti”.

Percebe-se, pelo texto, que o Rei quis tirar a Fé a esses najranenses e que eles resistiram. O Rei, então, prendeu este Santo porque ele era a cabeça da resistência. Ele diz ao Rei, como homem que não tem medo de ser condenado: “De fato, eu sou a cabeça da resistência”.

Percebe-se que os tais najranenses fizeram uma resistência excessiva. O trecho não é inteiramente claro, mas dá a impressão de que eles foram temerários na resistência e padeceram muito, e Santo Aretas, então, disse a eles que não deviam resistir tanto. Por causa disto, então, o Rei o acusava, neste ponto, de uma resistência excessiva da qual ele não era o culpado. Ele, de fato, era a favor da resistência, mas de uma resistência pacífica, de uma resistência de caráter ideológico, enquanto que os najranenses tinham feito uma resistência militar.

No entanto, ele não deixa de louvar a coragem dos najranenses com uma expressão muito bonita: que as armas dele, Rei, eram menos fortes do que os muros dos najranenses, e os corações deles ainda eram mais fortes do que esses muros. Portanto, não havia razão para eles terem perdido essa batalha, mas perderam por causa de um castigo que eles mereciam e que os fez ser derrotados pelo Rei ímpio, porque eles tinham confiado, durante algum tempo, nesse Rei. Ora, num herege não pode ser depositada confiança. Um homem que está rompido com Deus é ímpio e nele não se pode depositar nenhuma espécie de confiança. O fato de eles terem depositado confiança, durante algum tempo, no Rei — isto se refere a algum episódio anterior, que também não se conhece —, este fato explica que eles tenham, então, sido derrotados.

“Ó Rei — diz Santo Aretas —, não imagineis, absolutamente, que vencestes”. Foi Deus Quem venceu pela mão dele, para castigar o povo. Mas esse povo que tinha sido condenado por Deus por causa disso, ia ser, por sua vez, reedificado. Viria um imperador da Etiópia, Santo Elesbão, e haveria de reconstruir toda a Cristandade na Etiópia e derrubar o Rei Eretas de maneira que, de todo o seu poder, não ficaria nada.

A misteriosa economia de Deus

Vemos, então, a economia de Deus. Havia um Rei ímpio, Eretas; havia um povo mole e ordinário, mas ainda católico. Deus quis punir a moleza desse povo católico, que consentia, provavelmente, em ter um Rei ímpio, e então permitiu que esse Rei perseguisse o povo católico. Ele se serviu do ímpio como açoite para flagelar o povo mole. “Se fosses frio ou quente Eu te aceitaria” — diz a Escritura —, “mas como és morno, começo a vomitar-te de minha boca” (Ap 3, 15-16).

Esse povo morno foi açoitado por Deus, pela mão do Rei ímpio. Mas o Rei ímpio fez isto porque Deus permitiu e não porque Deus mandou. Por causa disso, ele pecou, e Deus tomou um varão de sua destra, Santo Elesbão, e conduziu-o vitoriosamente para a derrota do Rei ímpio. Com isso ficaram naturalmente derrotados os doutores da Sinagoga, os apóstatas franitas e outras abominações do gênero, e, durante algum tempo, se reconstruiu a Cristandade naquelas regiões.

Onde a Igreja entra, tudo floresce

Eu não posso deixar, ao dar este fato, de chamar a atenção para a maravilhosa beleza da Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Por toda parte onde ela floresce, desde que os homens correspondam á  influência dela, nasce tudo quanto há de melhor, em toda forma, em todo grau, em todo jeito. É questão só de os homens corresponderem á  influência e á  ação dela.

A Etiópia, que depois passou séculos cortada da Cristandade por falta de comunicações, caiu na miserável heresia monofisita, mas houve tempo em que foi uma nação verdadeiramente católica. Apareceram esplendores de Fé católica na Etiópia como em qualquer outro país.

Esse episódio de Santo Aretas se-ria digno, por exemplo, da história religiosa da Espanha, nas suas melhores épocas. Ou seja, não é a Espanha que é magnífica, não é a Etiópia que é magnífica, como não é o Brasil, nem a Argentina, nem o Chile, nem o Uruguai, nem nada disso. O que é magnífica é a Santa Igreja Católica Apostólica Romana. Onde a Igreja entra, todas as maravilhas de todo gênero, de todos os modos, de todas as espécies se multiplicam do modo mais magnífico, desde que os homens digam“amém”, digam “sim” á  influência da Igreja.

Entretanto, desde que a Igreja saia, tudo decai, tudo rola por terra, tudo dá em apóstatas franitas, em reis que não prestam, em tudo o mais. A verdadeira fonte de toda grandeza, de toda beleza, de todo bem, de toda bondade, de toda santidade, de toda ordem, de toda cultura, é a Igreja Católica. Fora da Igreja Católica as coisas podem nascer, formar-se um pouquinho, mas ou estagnam ou decaem.

Por exemplo, a cultura da China, do Egito, culturas, afinal de contas, extraordinárias. Levantaram-se, chegaram a um certo teto, não progrediram. É a imobilidade do Oriente parado e por dentro apodrecendo.

Tomemos a cultura católica. Ela se levanta como um chafariz no meio das águas estagnadas, só ela é água límpida; e mesmo depois da Fé católica ter sido praticamente extirpada do Ocidente pela Revolução, o Ocidente, naquilo em que ainda progride, floresce na velocidade adquirida pelo fato ter havido a Fé católica. Razão pela qual nós devemos compreender que amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo por amor de Deus, isto importa em amar a Santa Igreja Católica Apostólica Romana sobre todas as coisas, e amar o nosso próximo na medida em que ele está unido à Santa Igreja Católica Apostólica Romana.

Graça de admirar somente o que é segundo Deus

Em conversas particulares, eu inculco tantas vezes a necessidade da graça da admiração única que é, a meu ver, um elemento integrante da graça do amor de Deus. É a graça de só admirar aquilo que é segundo Deus. Esta graça da admiração única em relação a Deus, na ordem concreta dos fatos, dá na admiração única à Igreja Católica. Tudo quanto é tocado pela Igreja e recebe a influência dela é admirável; tudo quanto está fora disso, quando merece admiração, merece com tantas reservas, com tantas restrições, com tantas condições, que praticamente não dá em nada.

Então compreende-se esse enlevo, essa paixão que se deve ter pela Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, verdadeira pátria de nossas almas, verdadeira prefigura da Igreja gloriosa, à qual nós devemos pertencer no Céu.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 24/10/1967)

Deus é admirável nos seus santos!

“A santidade torna o homem capaz de multiplicar-se por si mesmo, excedendo os limites de suas capacidades naturais.” Este princípio comentado por Dr. Plinio no presente artigo está muito presente na vida de São João de Capistrano: assistido por milagres, convertia multidões; com autêntica austeridade, contundia os desvios de sua época.

A figura de São João de Capistrano é simplesmente admirável. Ele representa a imagem por excelência do asceta franciscano.

Comentemos alguns dados biográficos a seu respeito(1):

Pelo fervor de suas prédicas, São João de Capistrano podia ser comparado a um leão que rugisse, ou a uma trombeta celeste. E seus exemplos confirmavam suas palavras. Viajava sempre a pé, carregando aos ombros os livros que utilizava. Após longos e veementes discursos, exausto de fadiga, acreditava nada ter feito. Tomava logo seu alforje e ia mendigar seu pão de porta em porta. Suas mortificações eram extremas: alimentava-se apenas uma vez ao dia.

Em compensação, Deus fazia acompanhar a palavra de seu servo por milagres extraordinários. Ele não se bastava para satisfazer todas as populações que reclamavam seu ministério.

Aonde chegava, auditórios imensos de até 150 mil pessoas se reuniam para ouvi-lo.

Os frutos de seu apostolado foram incalculáveis: restabelecia a paz em cidades divididas e convertia os pecadores irredutíveis.

Certa vez, o povo de certo lugarejo obstinava-se a não dar ouvidos aos convites do santo. Repentinamente o território da cidade foi invadido por uma multidão incrível de ratos, que devoravam os arbustos e as ervas.

Noutra ocasião, pregava numa praça pública: 60 mil pessoas estavam suspensas às suas palavras e nessa multidão havia numerosos endemoninhados. Em sua fervorosa improvisação, o homem de Deus, dirigindo-se a eles gritou: “Em nome de Jesus, respondei-me e repeti comigo três vezes: Ó Nome todo-poderoso, ó Nome terrível, ó Nome todo divino!” Os pobres possessos repetiam isso. Mas o mais admirável é que todos os demônios espalhados na região, ao redor de 8 milhas, o repetiram juntamente, como se tivessem ouvido a abjuração do santo.

Quando pregava contra a vaidade das mulheres, fazia-o com tanta energia que, após o sermão, elas lhe levavam suas joias e adornos, lançando-os publicamente na fogueira.

Durante os seus sermões, São João detinha a chuva nos céus e impunha silêncio aos pássaros que perturbavam sua pregação.

Um historiador assim descreve um dia desse santo, quando pregava em Nuremberg:
“Levantava-se antes da aurora a fim de recitar o Ofício e preparar-se para a Santa Missa. Dirigia, então, ao povo um sermão em latim, que um intérprete traduzia no idioma do lugar. Voltava ao convento, rezava Sexta e Nona. Boa parte da tarde era consagrada à visita aos doentes. Depois concedia audiência àqueles que tinham necessidade de lhe falar. Recitava Vésperas e voltava ao serviço dos doentes até à noite. Após as Completas e a oração da noite, concedia algum repouso a seu corpo, embora roubasse ao sono vários momentos para rever a Sagrada Escritura. Tal era a eficácia de suas palavras, que ele fazia chorar mesmo aqueles que não compreendiam sua língua.”

Com autêntica austeridade, São João contundia os desvios de sua época

A espiritualidade de São Francisco de Assis apresenta dois aspectos diversos: de um lado, a doçura, da qual nos dá exemplo o próprio São Francisco; de outro lado, a severidade.

A severidade dos capuchinhos da grande época tornou-se famosa na História da Igreja. Homens austeros, que praticavam a pobreza levada aos extremos limites, e que combatiam a infidelidade, a imoralidade, as heresias dos grandes e poderosos de um modo verdadeiramente admirável.

São João de Capistrano viveu numa época em que os efeitos do Concílio de Trento ainda não se tinham feito sentir, onde o amor exagerado ao luxo tinha invadido os ambientes eclesiásticos — fato que foi aproveitado como pretexto pelos pseudo-reformadores do protestantismo.

Os sacerdotes daquele tempo davam-se com o que era antigamente a classe dominante, a nobreza; por isso, tanto quanto podiam, aspiravam levar uma vida de luxo e de pompa, imitando os grandes senhores feudais.

Por outro lado, muitos ingressavam no estado religioso sem possuir vocação autêntica e, com isso, degradavam o estado sacerdotal.

Também os nobres daquele tempo levavam uma vida repleta de delícias, de opulências, uma vida de gozo sensual, oposto à austeridade evangélica.

Contra essa forma da Revolução, os religiosos capuchinhos e franciscanos aparecem como contra-revolucionários por excelência.

Por onde passava, São João de Capistrano aparecia como a personificação da austeridade.

Em estradas percorridas por magníficas carruagens, atravessadas por homens a cavalo ricamente ajaezados, viajadas por burgueses em cômodas liteiras, via-se também a figura austera de um franciscano todo ele sobrenatural, num passo veloz e decidido, recolhido em oração, varonil, forte, saudável, carregando às costas um saco cheio de livros de oração.

Isso constituía um tremendo contraste com toda aquela moleza, com toda aquela efervescência de sensualidade e de orgulho que já estava produzindo seus frutos e que os ia produzir intensamente mais adiante.

Assistido por milagres, o santo austero convertia multidões

Quando esses franciscanos ocupavam o púlpito faziam sermões tremendos, dizendo as verdades a todo mundo, increpando a moleza de vida, a sensualidade, o orgulho, a luxúria em que estavam se afundando.

Vemos na história de São João de Capistrano auditórios de até 150 mil pessoas ouvindo-o. Podemos imaginar o que era a vontade de ouvir descompostura — porque era descompostura grossa que vinha! — que aquele povo manifestava.

Ele falava contra o luxo das mulheres, contra os vícios do povo. Era dito tudo e o povo acorria em grande quantidade para ouvir. Naturalmente, isso causava impressão. Mas entre causar impressão e causar conversão, a distância é grande. E São João de Capistrano muitas vezes não conseguia o resultado visado.

Porém, esta era ainda uma época onde os milagres se multiplicavam. Então, quando ele falava, os ratos vinham roer as plantas; a terra que tremia; endemoninhados repetiam aquilo que ele exigia. Vemo-lo, portanto, alcançar enormes resultados no púlpito.

Pequeno repouso depois do fatigante labor cotidiano

Terminado o trabalho apostólico, o que fazia São João?

Retirava-se calmamente para o recolhimento de sua cela.

Ele — que acabava não só de abalar cidades, mas de arrancar milagres da própria misericórdia de Deus — dormia, então, no seu cantinho. Depois, enquanto a cidade ainda estava imersa no sono, ele começava longas orações.

Podemos imaginar a edificação de alguém que, voltando para casa às três, quatro horas da manhã, passando perto de um convento, vê uma luzinha acesa, e comenta: “É Frei João de Capistrano, um santo, que já está acordado. Um dos primeiros na cidade a acordar, enquanto a cidade ainda dorme. A esta hora o santo varão reza, ele lê o seu livro de Horas, ele se prepara para a Missa”.

Só de imaginar a oração de São João de Capistrano, um calor sobrenatural nos enche a alma.

Depois disso ele vai visitar os doentes, vai atender às pessoas. Come uma única vez ao dia. No final de contas, vai se deitar exausto. Mas no momento em que se deita, ele revê um pouco a Sagrada Escritura.

A santidade torna o homem capaz de multiplicar-se por si mesmo e exceder os limites de suas possibilidades naturais

Vemos, em São João de Capistrano, como Deus é admirável nos seus santos! Nele vemos bem o que é a santidade.

Trata-se de uma graça excelente que toca a alma no que ela tem de mais profundo, proporcionando-lhe dons magníficos que excedem a simples natureza.

A graça a completa de tal maneira que o homem, como que, multiplica-se por si mesmo e fica muito superior a uma pessoa comum: ele torna-se quase um Anjo; mas não somente um Anjo, ele fica uma figura do próprio Deus.

“Christianus alter Christus”. É Nosso Senhor Jesus Cristo dizendo as verdades, sacrificando-se, fazendo penitência, orando continuamente, visitando os pobres e produzindo milagres.

Temos, portanto, a figura de um grande contra-revolucionário em função dos aspectos da Revolução naquele tempo; um santo cuja biografia nos enche a alma.

Que São João de Capistrano reze por nós.

Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 27/3/1967)

1) Infelizmente, não possuímos a fonte da ficha utilizada por Dr. Plinio nessa ocasião.